Capuz Vermelho - 3ª Temporada escrita por L R Rodrigues


Capítulo 34
Alfa, Beta e Ômega (Parte 3.3)




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Ruínas Cinzas - 11h55. 

O sol cálido e causticante dificultava a andança de Eleonor em direção ao decrépito piso de ladrilhos verdes, no qual, em seu centro, encontrava-se o Templo de Mitra, praticamente caindo aos pedaços. A bruxa estreitou os olhos, pondo sua mão direita horizontalmente sobre a testa, caminhando devagar pelo solo arenoso e abafado daquele local definitivamente despovoado. Seu vestido de seda azul ondulava por conta da considerável corrente de vento. Mesmo com a turva visão proporcionada pelo calor, a bruxa conseguira visualizar, minutos depois de praguejar para si mesma em reclamação, uma grande marca circular enegrecida no piso.

A cada aproximação, a cada passo... a imagem se esclarecia aos seus olhos. "Ora, com certeza é ali que está!", pensou ela, andando mais depressa, afastando seus cabelos castanhos do rosto que esvoaçavam com o forte vento. Quanto mais próxima, mais ela divisava o formato da imagem, tendo plena certeza. "Uma lua minguante... foi naquele exato ponto que Abamanu usou seu talismã, a parte de trás dele.", constatou, sorrindo para si mesma e tirando a Ônix de dentro do vestido.

A quinta e penúltima parte do plano ocorreria de modo rápido e simples: Bastava pôr a Ônix no centro do símbolo, recitar o feitiço, esperar que toda a energia contida no símbolo fosse absorvida pela pedra e, por fim, voltar para o exato ponto no qual chegara ali graças à magia de teleporte.

E fizera à risca.

Eleonor colocara a pedra dentro do círculo, mais precisamente próxima à meia-lua. Tomara cuidado para não acabar pisando por acidente na marcação, tendo que sair dele na ponta dos pés. Voltou-se para frente, afastando uma mecha do cabelo, tornando a respirar profundamente em preparação. O único óbice daquele nível do plano seria a ventania, que arrastava com tudo uma grande quantidade de poeira e areia, e, tendo em vista o tamanho da Ônix obtida, seria possível que a pedra também sofresse essa influência, embora seu peso não fosse o mesmo de uma bola comum daquele tamanho.

Ignorando essa possibilidade, Eleonor estendera a mão apontando para a pedra, pronta para a realização do feitiço de absorção, seus cabelos cada vez mais esvoaçantes e inquietos em contraste com sua face séria.

— Effusio rem, Lactaverunt, Virtute introducam ad me. Accipere vobis, Pascenda insatiabilem famem. Archanus onychinos, Te potest impleat, Imple frigidam in materia. Pertinet ad omnem virtutem sip! Pertinet ad omnem virtutem sip! Pertinet ad omnem virtutem sip! — exclamara ela, sua voz em tom alto ecoando por todo o espaço.

A Ônix reagira de imediato às poderosas palavras pertencentes àquele dialeto primitivo, vibrando de modo inquieto. De repente, os contornos do círculo e da meia-lua foram preenchidos por uma luz azulada, que não tardara para se redirecionar para a Ônix, a energia movendo-se até ela feito um ectoplasma amorfo com vida própria. A energia, por fim, "entrara" na pedra, como forças sendo atraídas. O símbolo brilhava a cada vez que uma certa quantidade era absorvida, gerando o mesmo efeito, surpreendendo Eleonor que se mostrara boquiaberta.

"Incrível. Existe uma incontável quantidade de energia acumulada... tudo isso esteve impregnado por dois anos e não se apagou com o tempo, o que não é de se estranhar. Mas... o mais impressionante é a Ônix estar se alimentando dessa energia, que supera qualquer magia de nível máximo, sem exibir nenhum efeito adverso. Energia divina é aceitável e aplicável para magia primitiva de absorção, era somente isto que eu queria confirmar.", pensou a bruxa, em um misto de satisfação e espanto, sem tirar os olhos do estupendo processo.

"A cada vez que brilha, ele fornece mais energia para a Ônix absorver.", observou ela.

Pareceu que não iria terminar tão cedo. Após dois minutos de espera, o círculo que representava o emblema do império de Abamanu parara de reluzir, indicando o esgotamento e que a pedra sugara absolutamente tudo o que estava impregnado na marca.

"Mas só isso?!", pensou ela, apanhando a pedra de volta, que brilhava de modo intermitente a mesma luz azul e vibrava de modo intenso. "Achei que duraria, no máximo, uns 8 minutos. Está... vibrando muito. Acho que mais um pouco e ela racharia.". Pôs-a nas palmas das mãos juntas, esperando ela estabilizar. "Está ótimo assim. Agora é hora da parte mais difícil... Saber de que modo ela vai reagir no corpo de Hector. Aliás... como Hector, e sua licantropia que me preocupa, vão reagir à ela.".

Correra depressa, segurando a pedra com as duas mãos, em meio a uma nuvem de poeira formada por uma ventania mais forte, direcionado-se ao mesmo ponto no qual chegara ali, que não se situava à uma distância muito longa.

                                                                                              ***

Com os fuzis e metralhadoras em punho, os soldados percorriam o escuro corredor terroso que conferia acesso direto à prisão onde Êmina estaria. Alguns usavam pistolas numa mão e lanternas na outra. Rosie vinha logo atrás, seguindo os fachos cruzantes das lanternas rasgando a escuridão.

— Me diz uma coisa. - disse ela, baixinho, conversando com o soldado ao seu lado, o mesmo que a agradecera e interrogou o mimético minutos antes. - Eu... simplesmente não entendo o porque de vocês não terem pegado as três lanças largadas. É a única arma física que pode mata-los.

— Me diga você primeiro. - retrucou o soldado, atento ao seguir seus aliados. - Por que não continuou com a que usou para matar aqueles?

— Eu sou a líder desta operação. Não devo satisfações a nenhum de vocês. - disparou Rosie, olhando-o sério.

— O que está querendo provar achando que pode se defender sozinha? - perguntou o soldado, sem se render.

— Tenho meus truques. - respondeu Rosie, evasiva.

— Ah é? - indagou ele, cético e olhando-a com um sorriso enviesado. - Por que não se deu ao luxo de compartilhar isso conosco?

— Medo de ser incompreendida. - disse ela, direta. - Nenhum de você entenderia.

— O.K. - disse o soldado, sem paciência para questionar. - Ainda ponho fé nas balas de prata que colocamos nas armas.

— Continue sonhando. Não vai funcionar. - afirmou Rosie, sem olha-lo.

— São lobisomens, não são? Prata é a fraqueza de um monstro desses, pelo que pude aprender com os caçadores com quem tive contato. - disse o soldado, passeando os olhos pelo corredor, mantendo-se alerta ao seguir os outros. - Sei que trouxe armas brancas. Caçadores também usam lâminas.

— Eu não sou uma caçadora. - disse Rosie, logo rindo de leve em baixo som. - Só quero resgatar meus amigos, me reunir à eles para... destruirmos a coisa maligna que quer nossa extinção. Depois, quem sabe... eu finalmente tenha alguma paz, longe de monstros me atormentando.

O som de estática de um rádio-transmissor de algum soldado quebrara o silêncio e interrompera o seguimento. Ele pegara o aparelho, puxara a antena e levara-o ao ouvido.

— Sim... ótimo... tudo bem... O.K. Nós já estamos prestes a completar a missão. Já contactamos o grupo C a desativar o vaporizador, parece que eles enfrentaram vários daqueles monstros e... Sim, sim, está ótimo, quando terminarmos aqui, vamos organizar tudo. Acredito que o grupo B ainda esteja cuidando dos infectados lá fora... Sim, O.K, até. - desligara, baixando a antena.

— Pessoal - disse ele, voltando-se para o grupo. -, acabei de receber a informação de que o resgatado da fábrica de Birmingham é um caçador chamado Lester Cooper. Ele já foi encaminhado para uma das bases de apoio. Além disso, o General foi sedado e está passando por uma cirurgia de emergência, mas garantiu que tudo está correndo bem.

"Melhor não mencionar o plano de contaminação global. Acho que o pelotão alternativo já deve ter entrando em ação, sei lá. Só espero que impeçam o falso prefeito e protejam os rios e as redes de esgoto, que cheguem antes se for possível. Falar isso agora só os deixaria aflitos e causaria mais atraso. Edgar... deve estar junto dos outros caçadores congelando uns miméticos.", pensou Rosie, tornando a seguir em frente.

Passados poucos minutos, as luzes das lanternas encontraram o que qualquer visitante incauto consideraria como fim da linha. Arquejos de surpresa vieram de algum soldados ao depararem-se com uma parede barrando o caminho. A primeira teoria veio quase que automaticamente.

— Uma passagem secreta? - arriscou um, dando de ombros.

— Ou aquele infectado filho da puta nos enganou. - apontou outro, mais aborrecido.

— Tudo bem, vou tentar empurra-la. - disse o grandão, entregando sua lanterna a um soldado próximo à ele. Andou até a parede, estralando os dedos em aquecimento.

— Tome cuidado. - aconselhou um mais na frente, preocupado.

— Se a parede não se mover - disse Rosie, observadora. -, terá sido uma perda de tempo.

— Também está muito silencioso, o que aumenta a suspeita de que fomos enganados. - teorizou o soldado ao lado da jovem. - Acreditei que, no mínimo, conseguiríamos ouvir a voz abafada da vítima, gritando por ajuda, do outro lado da parede quando estivéssemos nesse ponto, mas não... - estreitou os olhos.

— Uma garota... foi isso que ele disse, certo? - perguntou Rosie.

— Sim. É uma amiga sua, não é? - perguntou o soldado.

— Na verdade, todos os resgatados tem uma ligação comigo. - informou Rosie. - Ela se chama Êmina, e é uma alquimista. Mas não sei se ela está capacitada para usar sua alquimia...

— Primeiro saberemos se ela realmente está do outro lado. - disse o soldado, quase aos sussurros, olhando mais fixamente para o companheiro que se preparava para empurrar a parede. - Lá vai ele...

O homem musculoso pressionara suas manzorras na rígida parede. No entanto, em uma assustadora questão de segundos, uma corrente elétrica passara por seu corpo, logo se materializando na forma de um raio azul que o atingira no abdômen e o lançara para trás violentamente.

De súbito, os soldados afastaram-se, colando seus corpos nas paredes laterais, abrindo caminho para que o pesado corpo do grandalhão caísse no chão após o inesperado efeito resultante do seu toque na parede.

— Caramba! Mas o que foi isso? - espantou-se o soldado, logo voltando-se para Rosie, o semblante estupefato. - Você... - gaguejou ele. - Você viu aquilo?

Rosie se limitou a assentir positivamente, desnorteada com o que presenciou... muito mais quanto ao que estava vendo, algo que certamente nenhum dos outros percebia. Na visão da jovem, um sigilo estava gravado na parede, brilhando uma luz de mesma cor da do raio, tal luminosidade enfraquecendo-se gradativamente. Tentou disfarçar, voltando os olhos para o corpo do soldado de grande porte caído. O abdômen do militar estava com uma ferida aberta, a farda manchando-se com sangue fresco.

— Ele está inconsciente. - constatou um deles, verificando o pulso com um dedo na veia carótida. - E parece que está tendo hemorragia interna. Precisa de cuidados urgentes! - disse ele, alarmado, olhando para os demais.

Enquanto cerca de três soldados reuniam-se em torno do ferido para levanta-lo e leva-lo para fora, Rosie irrompia por entre alguns soldados, pedindo licença em tom baixo, visando a parede com o sigilo que somente sua ótica enxergava. O símbolo apagava-se aos poucos, prestes a desaparecer por completo. Os demais homens a olhavam com um misto de descrença e preocupação.

— Ei, senhorita Campbell! - gritou o soldado que estava ao lado da jovem, passando pelos outros. - O que pretende fazer? Não me diga que...

— Sim, é exatamente isso que farei. - retrucou Rosie, sem se abater com os olhares reprovadores, caminhando determinadamente até a parede. - Eu posso tentar, parem de frescura. - disse ela, categórica.

— Podem leva-lo. - disse o soldado, assentindo para o pequeno grupo que se dispôs a prestar socorro imediato. - Disparem quantas balas forem precisas caso cruzem com aqueles monstros de novo.

— Pode deixar - disse um deles, levantando o grandalhão ao segurar o pesado braço esquerdo dele.

Rosie tocara na parede com as duas mãos, sem temer absolutamente nada, pressionando com toda a força. "Vamos lá... Ao menos até agora não sinto nada me afetando.", pensou ela, por um lado estando aliviada por não ter uma sensação perigosamente incômoda perpassando seu corpo.

Um dos soldados céticos em relação à tentativa de Rosie se aproximara, olhando-a estranho.

— Mas o que ela...

— Deixe. - disse o soldado que estivera ao lado da jovem, erguendo levemente sua mão direita para impedir seu companheiro de dar mais um passo, sua face sisuda destacada. - É nossa líder. O que custa depositarmos nossos votos de confiança?

— Por enquanto. - disse ele, irredutível.

Rosie já começava a suar pela testa, seus dentes rangidos e olhos fechados denotando a força que fazia para que a parede movesse-se.

— Ela não vai conseguir. - disse outro, virando as costas.

— O que é estranho - comentou Franz, o soldado com quem Rosie conversara minutos antes. - é ela ter tocado na parede, mas não ter sido repelida por aquele... raio. - franziu o cenho, confuso e intrigado. "De fato, ela possui truques... até demais.", pensou, a desconfiança brotando de sua mente.

Após vários segundos, a parede, finalmente, demonstrara um movimento discreto. "Como acreditávamos! Não é só uma parede qualquer, é uma passagem. O cativeiro de Êmina pode estar bem do outro lado...". Motivada, forçou mais um pouco para sua direita. "O sigilo não teve nenhum efeito sobre mim, como eu esperava. A energia residual... eu sinto ela queimar, arder profundamente em mim, mas não me sinto mal com essa... sensação. Consegui matar aqueles três monstros... de uma só vez, apenas usando ela ao meu favor. Mas agora não posso manifesta-la aqui, preciso fingir ser uma reles humana... mas o fato de eu não ter sido atingida pelo raio... só os faz desconfiarem de mim... e se reportarem isso ao General...".

Surpreendentemente, a parede movimentou-se de modo mais progressivo, deixando cair uma fina poeira do teto com alguns ínfimos pedaços de terra. Sem desistir, a jovem empurrou novamente, priorizando mais o uso do ombro direito do que o das mãos. Os soldados observavam, praticamente hipnotizados e meio boquiabertos com a persistência de Rosie, produzindo entreolhares de espanto.

Franz deixara um fraco sorriso formar-se na face ao ver o êxito da jovem concretizar-se sem grandes complicações, embora ainda estivesse em dúvidas quanto aquela facilidade.

A parede virara até ficar quase na diagonal, revelando um compartimento escuro no qual via-se uma figura espectral encolhida ao fundo, em um canto severamente opaco

Rosie visualizara bem o recinto, aliviada por ter conseguido. O vulto se ergueu rapidamente e caminhou de modo desajeitado na direção da jovem, intencionando balbuciar alguma palavra.

— Ro... - gaguejava chorosamente. - Ro... Rosie?!

Com os olhos nitidamente marejados, Rosie encarou a pessoa, logo reconhecendo a fisionomia e a voz. Os soldados se aproximaram, dois deles rapidamente entrando na cela.

— Eu ouvi sua voz... - disse Êmina, revelando-se à luz das lanternas dos demais soldados. - Ai, caramba! - praguejou, protegendo os olhos da intensa claridade. - A tocha que havia aqui se apagou faz cinco meses e aqueles vermes nunca vieram trocar! Então minha visão está hipersensível à luz e...

O súbito e forte abraço de Rosie cortara a frase da alquimista. Êmina, visivelmente emocionada, retribuíra.

— Oh, Rosie. - disse ela, derramando algumas lágrimas. - Mal posso acreditar...

— Você vai para casa, Êmina. Hoje você vai acordar deste pesadelo. - disse Rosie, ainda abraçando-a e chorando.

— Eu já acordei... assim que ouvi sua voz. - disse Êmina, agradecida.

Barulhos de passos não-humanos ecoavam ao longe. A maioria dos soldados virara seus rostos para a escuridão do corredor, na direção de onde vieram, hesitantes em levar os fachos das luzes das lanternas à frente.

Franz, alerta, preparou-se para dar sua sugestão de segurança.

— Desliguem as lanternas. - disse ele, equilibrando o tom de voz a fim de não chamar muita atenção.

— Não tem jeito, já sabem que estamos aqui. - sussurrou outro soldado, cedendo ao pedido.

As luzes das lanternas apagaram-se sequencialmente, deixando o corredor inteiro mergulhado em profunda escuridão. Êmina, por sua vez, não se inquietara, permanecendo lado à lado com Rosie. Acostumara-se naturalmente a conviver com as trevas de seu confinamento, como método de sobrevivência auto-imposto. Somente ela sabia o quanto teve de se esforçar, e o quanto sofreu para fazê-lo.

— Nenhum movimento brusco. - aconselhou Franz, agachando-se lentamente. - Pelo que consigo ouvir, eles estão andando bem devagar...

— Eles realmente sabem que estamos aqui. - disparou Êmina, sussurrando.

— O quê?! Mas... mas eles talvez enxerguem com dificuldade no escuro total. - apontou Franz, incerto pelo seu tom.

— Além de estarem usando receptáculos de quimeras licantrópicas - disse Êmina, mantendo a voz baixa. -, são soldados de uma divindade lunar conhecida como Abamanu, que é o comandante de todos os planos malignos que estamos tentando evitar. É óbvio que podem enxergar sem dificuldades no escuro, pois são predadores sem igual. Estão saboreando a vantagem de seus sentidos apurados, enquanto esperam uma reação de algum de nós, para assim poderem atacar. Mesmo com nenhuma fonte de luz, é inútil esperar que eles desistam, pensando que talvez estejamos mortos, sei lá...

— Êmina, algo me diz que você... - disse Rosie, apreensiva.

— Que eu tenho um plano? - perguntou a caçadora, interrompendo a amiga. - Ora, comigo sempre existem saídas de emergência.

— Shhh... - chiou um soldado, recuando alguns passos. Os outros mantinham-se tensos e silenciosos. - - Estão se aproximando mais rápido desta vez...

— Acho que é porque não deveríamos estar falando. - disse Êmina, elevando o tom de voz, logo virando-se e andando até a parede da cela. Tocou-a com as duas mãos, olhando para sua direita, produzindo uma luz azulada que irradiara de um símbolo alquímico e desencadeara uma explosão.

Uma grande quantidade de poeira terrosa ergueu no corredor. Rosie usou sua capa vermelha para se proteger da poeira nos olhos e no nariz. Os soldados, por outro lado, tossiam e reclamavam do ato desesperado da caçadora. Os quiméricos reverberaram seus rosnados, seus passos selvagens evidenciando-se por definitivo, em uma perigosa proximidade.

— Mas que merda! - praguejou um soldado, em voz alta,, pegando sua metralhadora, sem hesitar, logo disparando uma saraivada de balas nos lobos bípedes que corriam para atacar o grupo.

Os outros imitaram a atitude, também descarregando suas munições a todo vapor.

— Anda Rosie! Vem logo! - gritou Êmina, passando pelo buraco na parede causado pela explosão, logo tornando a correr pela passagem.

— Não se esqueça de nós! - berrou Franz logo atrás de Rosie, correndo no mesmo ritmo frenético. - Está sob nossa proteção, por ora! - virou-se perto do buraco para atirar em um dos quiméricos que entrara na cela, disparando com intensidade. O monstro, no entanto, defendia-se ora com sua lança ora com sua armadura de prata.

Infelizmente, uma das balas ricocheteara, cravando-se com profundidade na perna esquerda de Franz, sem saber se a mesma provinha do alvoroçado tiroteio no corredor ou pelas constantes defensivas do soldado quimérico por conta do metal que compõe sua lança e armadura, o qual inexistia no mundo dos mortais. Franz dera um rápido urro de dor, ajoelhando-se e queixando-se de seu estado.

Rosie cessara a corrida, voltando-se para o outro lado, preocupada com o que ocorrera ao soldado.

— Essa não... - disse ela, quase sentindo-se obrigada a voltar para realizar salvamentos.

— Rosie! - disse Êmina, a uma certa distância, com um isqueiro aceso emprestado pela jovem. - Anda, vem! A gente não tem muito tempo! Eles sabem se virar!

— Não contra esses monstros! - retrucou a jovem, pensando em voltar. O quimérico que atacara Franz entrou pela abertura, correndo a toda velocidade, parecendo ter esquecido sua lança. - Muito bem... É agora ou nunca. - fechara os olhos. - Vamos lá, concentre-se... - ergueu a trêmula mão direita.

"O que está havendo? Por que não funciona?".

Forçou um pouco mais... sem sucesso.

Com um golpe que demonstrava toda a sua impaciência, Êmina tacara sua mão direita no chão terroso, após desenhar um círculo de transmutação com uma pequena lasca de carvão que trazia consigo. Antes que o quimérico abocanhasse a cabeça de Rosie, uma parede surgira na frente, bloqueando a passagem. Sobressaltada, Rosie recuara vários passos, logo virando-se para a amiga.

— Eles ainda estão lá! Por que fez isso? - perguntou ela, aborrecida.

— E o que estava tentando fazer? - perguntou a caçadora, franzindo o cenho. - Você levantou o braço e travou de repente. O que esperava que acontecesse? Que raios saíssem das suas mãos feito mágica?

— Não, eu estava... - disse Rosie, logo deixando a frase no ar, suspirando longamente. - Olha... Não importa. Vamos dar o fora daqui, rápido. - afirmou, tornando a correr.

— Finalmente, voltamos a falar a mesma língua. - disse Êmina, também voltando a correr, mantendo o isqueiro aceso. - Não quero te recriminar, Rosie... mas é que... salvar aqueles caras poderia ter sido um erro.

— Eu entendo perfeitamente. Não quero discutir isso. - disse a jovem, desconversando. - Só quero que saiba... que Adam e Lester já foram resgatados.

— Ah... que ótimo. - disse Êmina, aliviada, apressando ainda mais o passo. Ouviu-se um baque abafado atrás, vindo da parede que a caçadora criara alquimicamente. - Aquilo não vai durar por muito mais tempo. A primeira coisa que penso é: Que final trágico para aqueles nobres e bravos homens.

— Espera aí. Está pensando que...

Êmina parara de correr de forma abrupta, entregando o isqueiro aceso para Rosie. Arregaçara as mangas do sobretudo que usava desde a fatídica noite nas Ruínas Cinzas.

— Não tem saída. - disse Rosie, olhando para o fim da linha de modo aflito.

— Não quero abusar da sorte. - disse Êmina, desenhando um círculo de transmutação na parede de pedra. - Posso estar meio enferrujada, mas o que temos ao nosso dispor... acho que dá para o gasto. - estralou os dedos ao esticar os braços. Olhou enviesadamente para Rosie. - Afaste-se.

— Êmina... - disse Rosie, recuando vários passos conforme o pedido da caçadora, a voz tensa. - ... sabe que cometemos um péssimo erro. - fez uma pausa, olhando para trás. - Nós deixamos aqueles homens... morrerem.

— É, eu sei, uma pena. - lamentou ela, logo pondo a mão no símbolo com toda a força, fazend-o brilhar, mantendo uma distância menos segura da qual Rosie estava. Por fim, a parede de pedra explodira, levantando uma enorme poeira. Rosie, novamente, protegera-se com a capa vermelha, consequentemente tendo a chama de seu isqueiro apagada.

A fumaça aliada à poeira meio cinzenta amenizava aos poucos, mas o tempo urgia de modo a não permitir mais nenhuma espera prolongada.

Êmina saíra pela abertura feita pela explosão. Rosie correra atrás dela, após guardar o isqueiro em um dos bolsos presos no seu cinto de utilidades.

A parede provinda da alquimia de Êmina estava rachando-se devido à insistência dos soldados quiméricos que tentavam destruí-la, o som dos baques aumentando de volume a cada segundo.

As duas depararam-se com uma longa escadaria de concreto, cujos degraus subiam diretamente para a saída da área subterrânea da fábrica.

— E aí, o que estamos esperando? - perguntou Êmina, ofegando e sorrindo fracamente para Rosie.

CONTINUA...


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