Capuz Vermelho - 3ª Temporada escrita por L R Rodrigues


Capítulo 16
Senhor Escarlate (Parte 3)




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— Para trás! Agora! - berrava o soldado, desmascarado, seu semblante apavorado. Apontava o disparador de fumaça congelante para seu opressor... que se avizinhava a calmos passos, mostrando-se ameaçadores.

O homem de corte militar e rosto redondo recuava rapidamente, tremendo. Seus olhos ora voltavam-se para os corpos largados e banhados em poças de sangue, ora voltavam-se para a pessoa de corpo voluptuoso e sedutor que o afrontava. Os belos cabelos pretos e bem alisados, aliados ao sobretudo cinza, as calças de couro preto bem apertadas e os coturnos lhe davam a falsa ideia de alguém designado a lutar por justiça e honra.

— O que uma mera espiã faz no meio de uma missão sigilosa e especial como esta?! - disse o soldado, mostrando-se revoltado.

— Algo que certamente não diz respeito a um mortal estúpido com suas criações patéticas. - disse Sekhmet, observando-o com seus ardentes olhos azuis e chegando mais perto. - Quero ter a certeza disto! Talvez eu esteja o julgando precipitadamente. - aproximou-se com uma velocidade assustadora, logo em seguida puxando-o pela gola da farda. O olhou suavemente no rosto. - Deixe-me ver se és puro.

Propôs um movimento rápido, embargado com uma fantástica precisão, ao juntar dois dedos - indicador e maior - e penetra-los profundamente na veia carótida direita do pescoço do soldado. O jovem homem não encontrou forças nem mesmo para se debater, a dor o paralisou por completo, apenas deixando-o mover os músculos faciais que formavam uma expressão de puro pavor.

Uma hemorragia profusa espinchou do pescoço. A deusa retirara os dois dedos totalmente sujos de sangue, largando o soldado no chão, o mesmo tentando emitir algum grito enquanto tentava parar o sangramento.

Sekhmet, para comprovar sua teoria, pôs os dedos sujos na boca, sentindo o inconfundível sabor do sangue humano arder na língua. Uma sensação excitante de adrenalina a fez pensar em seguir em frente com a caçada.

— Não. - disse, olhando com frio desdém para o soldado ferido.

Passara por cima dele, dirigindo-se à porta do fim do corredor, deixando para trás uma extensa trilha de corpos ensanguentados, todos de soldados do Exército Britânico e caçadores.

                                                                                           ***

A parte central da rústica fábrica abrigava uma extensa sala mal-iluminada, repleta de grossos cabos metálicos espalhados pelo chão - estes conectados ao gigante furioso que exalava fumaça cinzenta e reproduzia barulhos rascantes e incômodos.

Na parte mais escura do compartimento, dois homens fardados militarmente se aproximavam...

Ambos ergueram as mãos e delas surgiram esferas de luzes alaranjadas. Agacharam-se e, finalmente, assentaram as duas energias de caráter solar no chão. Parte do piso irradiou um brilho de mesma cor - como se estivesse superaquecendo -, logo em seguida, por poucos segundos, desaparecendo.

Olharam para a enorme máquina barulhenta posicionada a alguns metros adiante, praticamente invisível graças ao breu do local. A fumaça negra produzida percorria um volumoso e pesado tubo de metal preto, direcionando-se à chaminé - felizmente a única daquela instalação.

— Hora de informamos ao chefe. - disse um deles, prestes a sair de lá.

— Não, não devemos tentar nenhum tipo de contato por enquanto. - decidiu o outro, categórico. - Passar pelas marcações já nos exigiu energia suficiente. Enfrentar aqueles soldados animalescos...

— Não há nenhum deles aqui.

— Como sabe disso?

— Os guardiões desta base não passam de meros combatentes temporários, o grupo de mortais pode assumir o controle facilmente. Confie neles, pelo menos por hoje. - aconselhou ele, apressado.

— Está bem. - aquiesceu o outro, andando até a saída. - Não sei se isto vai funcionar... Consigo sentir a presença de mais dois aqui.

— Um dos nossos? - perguntou seu companheiro, andando ao lado dele.

— Evidentemente não. - disse ele, o tom de preocupação, logo abrindo as portas duplas.

                                                                                                ***

A fúria das adagas de Rosie dilaceravam as cabeças daqueles malditos errantes. Desferindo golpes brutais nas faces dos miméticos, a jovem tentava encontrar uma maneira de sobressair ilesa e dar seguimento à missão. Derrubava cada um deles com um só corte, avançando aos poucos. Entretanto, um deles, ainda que estivesse combalido, agarrara velozmente a perna esquerda de Rosie. Caindo de joelhos, a jovem virou-se e tentou chuta-lo com a outra perna, dando desesperadas olhadelas para a frente, onde se aproximavam mais dois. "Seu nojento! Me larga!".

Ao perceber que certamente o tempo não seria aliado o bastante para faze-la safar-se daquela situação, Rosie sacara outra adaga e a lançara contra os que vinham. A lâmina dançou no ar, girando horizontalmente até cravar-se com força no meio da testa de um deles - este imediatamente caindo para trás no chão, o líquido negro gorgolejando do ferimento. Notando a insistência do mimético remanescente em querer puxa-la, Rosie utilizara outra de suas adagas e fizera um rápido e severo corte no braço do inimigo - o que a fez revisitar o ato de pouco tempo atrás quando conseguira entrar na fábrica. Sacudindo a perna para soltar o membro decepado, a jovem ignorou os gritos de dor do mimético. O mesmo se debatia, babando profusamente o espesso líquido, os olhos negros evidenciando seu desespero.

Levantando-se, Rosie o deixara, voltando a correr. Os gritos incessantes foram ficando mais distantes à medida que a jovem atravessava mais uma parte do excruciante labirinto de corredores às pressas. O suor descia pelo rosto. "Essa não! Eu devo estar perdida...", pensou ela, olhando aflitivamente para os corredores que se podia seguir.

"Devia ter considerado essa desvantagem. Abamanu pode ter os recursos necessários para me espionar... provavelmente, através de algum método, soube dos meus planos e da minha ligação com o Exército. Armadilhas... foi isso que ele pode ter premeditado! De tanto pensar na minha satisfação ao reencontrar um dos meus amigos... acabei não percebendo a chance de vários soldados se perderem, inclusive eu.".

Sem muitas opções, a jovem resolvera adentrar subitamente numa sala vazia, fechando as portas duplas com um baque que claramente chamaria muitas atenções. Virou-se de costas, mas voltara-se novamente para a porta, olhando pelo vidro quadrado à sua esquerda se havia alguém prestes a vir.

Suspirando de alívio, apenas se limitou a andar de um lado para o outro na iluminada sala de paredes brancas - bastante sujas dando-lhe quase uma tonalidade de cinza - e piso de concreto cinza escuro. Fechou os olhos, pensando nas possíveis saídas de emergência que teria.

— Ótimo, Rosie, você, por enquanto, está salva. - disse ela consigo mesmo, em voz baixa. - Agora só lhe resta descobrir o porque de Áker não estar respondendo. - fez uma pausa, fechando os olhos brevemente para recuperar a calma. - Mihos disse que haveria baixas... obviamente matando vários soldados... sem intenção de comprometer a missão. Ele não está aqui somente por uma diversão barata... - retirara novamente o amuleto, colocando-o na palma da mão. Inclinou-se para refazer o aviso. - Áker... eu preciso que venha, por favor. - sua voz começava a ficar trêmula.  - Mesmo não achando que eu vá morrer... sinto pelo fracasso que a missão de resgate pode ter se alguma armadilha for descoberta.

Esperara mais 30 segundos. Nenhum sinal, como na vez anterior.

— Ah, droga! Vamos, Áker, eu preciso de você! Se quer saber de algo importante... Saiba que... Eu não vou morrer... pois sou imune à substância que...

Um forte braço agarrando o tórax havia cortado a frase de Rosie. O minúsculo amuleto dourado deixou-se cair no chão, cintilante. Uma lâmina gélida e perigosamente afiada encostou em seu pescoço. Sentiu o ar escapar aos poucos.

— Adoro informações privilegiadas. - disse Sekhmet, bem ao pé do ouvido de sua refém, mantendo-a presa com bastante força. - Afinal, seria um terrível desperdício de disposição ter que se esforçar tanto para depois vê-la ser corrompida por um potente agente infeccioso. - agarrou-a com força, sem alterar a proximidade da média espada dourada que segurava para ameaça-la.

— Sua desgraçada... - disse Rosie, a voz embargada de apreensão e raiva.

— Sei que teve um contato direto com meu filho. É bom que ele apareça, pois ele terá que dar algumas explicações... antes de eu cortar sua garganta e arrancar de você aquilo que pertence ao meu amado.

— Olha... - tentou dizer Rosie, mostrando-se o mais calma possível. - Seu querido bebezão está se divertindo por aí... Nós dois prometemos nunca mais nos ver, e além do mais ele não está nem um pouco interessado em ajuda-la com essa sua insanidade...

— Tudo bem, já sei que está mentindo. Não tenho a menor intenção de debater com ele minhas motivações, ele jamais entenderia, não passa de um desinteressado que apenas quer saber de matar coisas sem o menor escrúpulo. - disse Sekhmet, andando um pouco para trás, mantendo Rosie "presa" à ela. - Mas não o condeno por isso, sendo que foi esse o aspecto que ele mais herdou de mim, e por essa razão me orgulho dele, por mais intransigente que seja. Mas... a questão, neste momento, é: Onde está seu amigo caçador? - dera um sorriso de presunção, olhando-a com máximo deboche. - Não era para ele estar junto à você nesta tarefa?

Rosie franzira o cenho, julgando estranho o interesse esboçado por Sekhmet para com Hector.

                                                                                          ***

— Parado aí! - bradou um soldado do Exército Britânico, a voz abafada por conta da máscara protetora contra gases tóxicos. Apontava o disparador do aparelho congelante para um jovem rapaz de cabelo curto e loiro-dourado e vestindo roupas características de um caçador. - Quem é você? O que faz aqui desprotegido?

— Responda! - disse o outro, um pouco mais hesitante que seu parceiro.

Estavam entre o fim de um corredor e a entrada de outro, separados por uma porta que havia sido quebrada. Palitando os dentes despreocupadamente, Mihos não exibia nenhum sinal que o tornasse alguém suspeito. Ao que parecia, a ocasião exigia que ele fosse o mais discreto possível, sem apresentar nenhum elemento que o incriminasse, o que incluía limpar as manchas de sangue das mãos toda vez que cometesse um assassinato. Por mais irritante que isto pudesse ser, era de se aceitar, tratando-se de alvos que agiam em conjunto em uma missão extremamente arriscada. "Se misturar" aos seus alvos para escapar de uma acusação e de um risco máximo de ter seus atos informados para algum superior fazia parte do plano para manter o serviço sujo nos eixos.

"Rádios-transmissores... Interessante.", pensou ele, olhando de relance para os Crip-Talks nos coldres dos coletes dos soldados. "Só há um problema...". Olhou rapidamente para trás.

— Tudo bem, está bem... - disse, largando o palito e erguendo um pouco as mãos sinalizando pacificidade. - Faço parte da equipe de reforços.

— Nós não pedimos reforços. - retrucou o soldado da direita, ríspido.

— Alguém pediu sim. E estou aqui para informar ao chefe de qualquer incidente relacionado com algum soldado... como uma morte, por exemplo.

— É sério!? - perguntou o soldado da esquerda, tentado manter distância. - Se é verdade, então onde está seu rádio?

— Ah, é mesmo... - disse Mihos, coçando a cabeça e fingindo surpresa. - Acabo de lembrar que o deixei no carro. Meu equipamento de proteção também está lá. Ora, vejam só, meus amigos... É isso que a adrenalina e a empolgação acabam fazendo com a gente. - dera uma risada divertida. - Que descuido o meu, não? Mas fiquem tranquilos, não fui infectado e não há nada a temer.

— Por que parece que está escondendo algo? Até onde sei, nem a nossa líder ou o General nos alertou sobre a vinda de reforços. - voltou-se para o companheiro. - Sabia de algo parecido?

— Não mesmo. - respondeu o outro, firmemente.

— E então... Se me derem licença, acho que vou indo buscar meu equipa...

— Não, espera. - interrompeu o soldado da direita, mostrando-se confiante. - Venha conosco. Qualquer coisa, eu e você revezamos o uso da minha máscara. O que acha? - sugeriu ele, pronto para seguir.

Mihos sorrira abertamente para seus "novos amigos". Sua face radiante, contudo, parecia um tanto quanto suspeita para ambos.

— Mas é claro! Eu adoraria! Sabe de uma coisa? Este mundo precisa de homens generosos como você. - elogiou o herdeiro de Yuga, tocando o soldado no ombro amigavelmente.

— Ora, vamos. Está me deixando envergonhado. - brincou o homem, rindo levemente, logo seguindo em frente.

— É isso aí! Adoro quando me convidam para a festa. - disse Mihos, contente, andando entre os dois e pegando-os nos ombros.

Mal sabiam eles da verdadeira "festa" ocorrida minutos antes de descobrirem o estranho "caçador".

No corredor onde Mihos estava - mais precisamente em um canto não muito perceptível - haviam dois corpos de soldados completamente mutilados... as cabeças teriam, supostamente, explodido, deixando abertas as caixas cranianas e duas enormes manchas de sangue na parede.

CONTINUA...


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