Sinestesia escrita por MaeveDeep


Capítulo 3
Três


Notas iniciais do capítulo

Para encerrar, mais um capítulo dedicado à linda da Júlia, a ariana mais endiabrada e também fofa que já tive o privilégio de conhecer. Que se apaixonou por esses dois personagens em tão poucas linhas, e que sonhou comigo a história dos dois. Obrigada por tudo ♥



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três

Isabella estava ansiosa, mas empolgada, de um jeito que a fez adentrar o restaurante com seu melhor sorriso para o homem que lhe abriu a porta. Com uma ligeira mesura, ele fez um gesto para pegar seu casaco, mas ela balançou a cabeça, escorregando-o pelos braços e então o juntando sobre o antebraço direito, seu olhar já percorrendo o salão.

William Martínez a aguardava em uma mesa sob um pequeno lustre dourado, e, naquela luz, sua pele morena parecia mais morna e mais tentadora. Isabella sorriu, encontrando seu olhar, e ele sorriu de volta, uma jaqueta de couro preta sobre sua camiseta branca e uma dose de whisky à sua frente.

Em um restaurante como aquele, Martínez parecia perfeitamente à vontade, e Isabella sabia o porquê. Era de qualidade, mas acessível: o tipo de lugar a que a mãe de Isabella a levaria em uma noite especial. Fazendo seu caminho dentre as mesas até ele, Isabella realmente esperava que aquela fosse uma delas.

Havia escolhido seu vestido de seda cor de creme, porque gostava da leveza das alças finas e da fluidez do tecido, que não chegava a seus joelhos. Seu cabelo escovado caía por seus ombros e costas em uma cascata escura macia e volumosa, e seus saltos eram pequenos. A atenção de Martínez foi deles até os olhos emoldurados pelo delineador escuro, e ele se pôs de pé com aquele seu jeito de sorrir sem mover os lábios; seus olhos castanhos faiscando enquanto se aproximava.

Isabella prendeu a respiração de leve, imóvel no lugar, perguntando-se se ele beijaria seu rosto, sua mão na base de suas costas; ou seus dedos, como um cavalheiro encantador faria. Aguardou, sua ansiedade a tornando irrequieta, mas Martínez parou a cinco centímetros de distância e estendeu uma das mãos para tocar seu casaco – Isabella teve a certeza de sentir o toque por debaixo de todas aquelas camadas de falsas peles.

— Costuma se atrasar para os seus primeiros encontros? – ele perguntou, tomando o casaco de seus braços com gentileza e dando a volta ao redor dela para pô-lo sobre o encosto da cadeira, puxando-a para que Isabella se sentasse.

Ela o fez, juntando as pernas em um gesto elegante, e William Martínez retornou ao seu lugar parecendo bastante tranquilo. Talvez devesse ter sido anticlimático, mas ele a encarava do outro lado de uma mesa coberta por linho branco e parecia tão provocador e desejável como sempre havia sido; Isabella forçou-se a não encolher os dedos em nervosismo.

— É para criar uma antecipação saudável – disse, mesmo que a culpa houvesse sido do trânsito e de seu taxista preguiçoso. – Um pouco de expectativa. Começou sem mim?

Martínez revirou a dose de whisky em certo desinteresse.

— Fui obrigado, já que eles não tinham uma sala de espera com revistas. Mas gostei da sua reserva – disse, com um meio sorriso, e foi a sinceridade em sua voz que fez o nó de ansiedade de Isabella lentamente se desfazer. – Só senti falta do candelabro.

Ela suspirou, afastando um pouco de seu cabelo para trás dos ombros.

— Todas as cantinas românticas da cidade estavam lotadas. – O garçom veio atendê-la naquele instante, e Isabella pediu seu mojito para começar. – Tem alguma coisa que você não coma? – perguntou a Martínez. – Eles fazem um peixe fantástico.

Ele encolheu os ombros.

— Minha mãe não acreditava em crianças que escolhiam o que comer. Aceito o que você preferir.

Ela pediu as postas de salmão que tanto amava, e, pouco tempo depois, o garçom retornou com seu drink maravilhoso.

— Obrigada. – E, para Martínez: – Sou uma cliente regular e uma grande fã de mojitos —sorriu, sem se embaraçar. – Você quer provar?

— Já estou bebendo – Martínez disse, erguendo um pouco o próprio copo. Não havia gelo nele, e Isabella sentiu um estranho prazer em ver aquilo; Heinrich só tomava o seu com gelo ou, em uma ocasião memorável, com energético em excesso. – Mojitos?

— É por conta do Gabriel – Isabella explicou-se. – Da época da Academia. A Lily trouxe um vasinho para colocarmos na cozinha, mas para usar na comida. Com quibe, entende, ou talvez para fazer sucos. Gabriel quis ir atrás de outros usos, e acabou se tornando um expert.

— Gabriel? – Martínez perguntou, mas havia algo de muito calculado em seu tom de voz.

Isabella sorriu de leve.

— Sabe quem ele é, não é?

— Talvez – Martínez disse, mas observando o whisky antes de beber um gole cheio. – Devo ter visto fotos dele vez ou outra.

Isabella lembrou-se tardiamente de seu celular, e o buscou apressadamente.

— Preciso dizer a ele que estou aqui – disse, em tom de desculpas. – Estávamos conversando.

Martínez encolheu os ombros, sem se incomodar. Isabella abriu a conversa com Gabriel e, logo após digitar que estava em segurança em seu encontro, buscou uma das fotos em suas mídias e a mostrou a Martínez.

— É ele – disse. Viu os olhos do fotógrafo observarem os detalhes (o cabelo sujo de alguma coisa marrom, as covinhas e o doce nas mãos) e então suas sobrancelhas grossas subirem um pouco, por mais educada que se mantivesse sua expressão. – É um tiramisu de boa sorte para o encontro de hoje.

Martínez lhe ergueu os olhos por cima da tela, e, se era possível que parecesse um pouco embaraçado, era exatamente aquela sua expressão.

— Tem...

— Um pênis. Sim – Isabella concordou, guardando o celular. – Ele tem um molde para o chocolate. Comprou pelo e-Bay. Não tem necessariamente a ver com o nosso encontro – considerou. – Essa parte, ao menos. Enfim. Pedirei a ele para fazer mojitos para você.

Martínez observou o rosto de Isabella com ar pensativo, e, com atraso, ela notou que havia lhe admitido ter feito planos, algo inadmissível para as regras de um primeiro encontro. Bebeu mais de seu mojito, embaraçada, mas logo Martínez falava de novo, sua voz baixa e pausada.

— Ele tem uma cafeteria – disse. – Em Boston. Não faz muito tempo que abriu. Usa um avental de cor diferente a cada dia da semana, e, apesar de suas especialidades serem os doces, parece fazer um café fantástico também. Eu não sei ao certo quem é o homem que às vezes aparece em suas fotos – admitiu – mas eles são provavelmente um casal.

— É o David – Isabella murmurou, com um sorriso pequeno que não transmitia ao certo a empolgação que dissolvia toda sua timidez. – Você não encontraria muita coisa sobre ele a menos que soubesse como procurar; ele é bem reservado. – Hesitou, estudando os olhos castanhos de Martínez enquanto imaginava se valeria a pena arriscar. – O que mais você sabe?

Martínez demorou-se um pouco, pensando no que dizer, e então suspirou. Ainda assim, não teve a delicadeza de parecer embaraçado; pelo contrário, sua expressão era quase presunçosa ao voltar a encará-la, seu sorriso muito tênue.

— Apolo Wright, formado pela faculdade Berklee de Música, coordenador de um projeto que leva arte a crianças de baixa-renda e, até onde sei, um músico extraordinário. Artemis Lancaster, bailarina formada pela Academia daqui de Nova York, que se mudou para Boston há poucos anos e está a um passo de profissionalizar no Bolshoi. Os dois estão juntos há mais ou menos dois anos, a contar do incêndio ocorrido na Academia. – Encolheu os ombros, bastante digno. – Eu sou formado em jornalismo, você sabe. Faço bem minhas pesquisas.

Isabella riu, deliciada.

— E o que descobriu sobre mim?

William Martínez demorou mais um pouco, como se escolhesse o que dizer. Seus lábios estavam ligeiramente curvados.

— Você acompanha mais marcas de roupas do que deveria. Não sabe usar o Pinterest. Tem uma conta no Twitter abandonada às traças desde 2011. Responde à maioria dos comentários que recebe no Instagram. Gosta muito da cor rosa. E tem um número assustador de fotos com seu amigo Gabriel, cujo usuário, gay-ponto-briel, tem igualmente um número assustador de fotos com você.

— Ele teve que comprar essa conta – Isabella comentou, com uma saudade carinhosa. – Queria muito, mas ela já estava em uso, então teve de pagar... acho que uns setenta dólares? Faz bastante tempo.

— Uma aquisição valiosa – Martínez disse, mas sem ironia, e Isabella sorriu de leve.

O jantar foi servido, e houve um instante de silêncio enquanto os dois começavam a comer. Isabella amava peixe, talvez porque sua mãe nunca houvesse aprendido a fazer; era o tipo de prato que sempre pediam em restaurantes. Isabella nunca sabia lidar com a casualidade com que David o fazia em casa, e, da primeira vez que o vira servir linguado à mesa de domingo, congelara na cadeira em verdadeiro choque.

— Não encontrei muita coisa sobre você – Isabella admitiu, depois de um tempo. – Sua conta no Instagram quase não tem fotos suas, e você segue pouquíssimas pessoas – lamentou-se, sem conseguir evitar.

Martínez nunca a havia seguido de volta, desde o momento em que Isabella o procurara ao conhecê-lo; agora, a enchia de vaidade imaginá-lo procurando seu nome para ver suas fotos, seu nome logo abaixo de sua caixa de pesquisa.

A conta de Martínez era um conjunto de fotos maravilhosas em um feed colorido e invejável. Ele não acreditava em legendas, contudo, e sua bio era curta e insatisfatória. Isabella era apaixonada, em especial, por uma foto de um céu estrelado em algum deserto do Texas; todas elas tinham muitas curtidas e comentários, mas Martínez sequer parecia notá-los.

— Não pensei em procurar seu Twitter – Isabella continuou. – E seu Facebook é inútil como o meu, feito só de marcações. Mas eu vi seu portfólio – contou. – Várias e várias vezes.

Martínez comeu devagar, como se não soubesse como responder àquilo, e por isso Isabella continuou falando (era um de seus grandes talentos).

— Você tem família aqui em Nova York?

— Não. Toda ela está em El Paso-Juárez. É uma família grande – acrescentou. – Tenho três irmãos mais velhos.

— Então você é o caçula – Isabella comentou. – Que coisa mais fofa. Eu sou filha única, obviamente. Mamãe nunca se casou. Eu passei boa parte da minha vida querendo irmãos, até que me mudei para a Academia. Isso basicamente acabou com a fantasia de várias pessoas convivendo em harmonia sob um mesmo teto.

Martínez sem dúvida sabia do que havia ocorrido na Academia. Isabella havia suportado perguntas curiosas acerca daquilo nos últimos meses, e preparou-se para mais algumas, só por precaução, mas Martínez a surpreendeu.

— E o seu pai?

Era um tanto pior, e por isso ela encolheu de leve os ombros, tentando resistir à vontade de desviar os olhos.

— Eu não o vejo há um tempo.

Martínez juntou as sobrancelhas.

— Mas ele é daqui – disse, sua voz genuinamente confusa. – Você não mora em um dos prédios dele?

— Sim, sim – Isabella concordou, com um suspiro. – Mas... – hesitou. – Ele foi péssimo para a minha mãe – admitiu. – Eu o vi pela última vez quando tinha... – tentou se lembrar – nove ou dez anos. Foi sem querer, na verdade. Ele nunca ligou muito para mim. Já era casado – contou, abaixando a voz de leve. – Quando minha mãe engravidou. Então ele basicamente me manda dinheiro e eu finjo que não existo.

Martínez não disse nada, e Isabella jamais teria dito nada daquilo a Heinrich ou seus amigos. Seu pai era conhecido em Nova York, e de um jeito que abria várias portas e vários sorrisos para Isabella. Culpada no começo, com o tempo tentara se acostumar, mas agora só sentia vergonha de novo.

— Eu não sabia – Martínez disse apenas, sua voz limpa de qualquer condenação. – Você disse que iria voltar a Boston – lembrou, com o tom de quem havia pensado a respeito daquilo antes. – É por ter saído da Agência? Ou saudade?

Parecia um jeito canhestro de perguntar se seria provisoriamente ou para sempre, e por isso Isabella demorou um pouco a respondê-lo, observando seus olhos enquanto calculava o risco.

— Eu não sei – admitiu, por fim. Era por estar com saudade de quem costumava ser, e pela falta de espaço que sentia naquela cidade tão imensa. – E então você é do Texas – provocou, para mudar de assunto. – Onde está seu sotaque?

— Não sou do Texas – Martínez respondeu, horrorizado. – Sou de Juárez, do outro lado da ponte.

Isabella quis lhe dizer que não seria tão horrível se ele fosse texano, mas na verdade era um pouco, e por isso riu.

— Se você diz – pontuou, aprumando-se na cadeira. Por melhor que fosse sentar-se à sua frente, talvez fosse gostar mais de sentar-se ao seu lado, só pelo conforto da proximidade. Talvez pudesse ter a oportunidade de apoiar-se nele, o queixo em seu ombro; estava tão distante que mal sentia seu perfume. – Mas você... – parou, se lembrando. – Você já disse a Heinrich que era texano.

Ele encolheu os ombros, sem culpa.

— As cidades são ligadas por uma ponte. E seu namorado é um imbecil.

— Ex-namorado – Isabella o lembrou, mas sorrindo um pouco. – É meio evidente que você não é texano. Rumores de que os sulistas são famosos por seu charme.

— Você não me acha charmoso?

— As pessoas tinham medo de falar com você na Agência – Isabella apontou. – Porque você fazia cara feia para elas.

— As pessoas na Agência têm uma expressão permanentemente feia – Martínez contrapôs. – Eu acho que me misturo bem.

Isabella riu pelo nariz. Observou-o de novo, do cabelo castanho-escuro cacheado aos olhos tão atentos, e perguntou-se como havia passado tanto tempo sem conhecê-lo direito.

— Eu gosto do seu sobrenome – disse, sem pensar muito. Martínez estava impossivelmente bonito, mesmo a jaqueta de couro lhe parecendo macia, e Isabella contou até cinco, bem devagar, antes de suspirar dramaticamente. – E você é péssimo nisso. Era para ter me dito que ficaria lindo depois do meu.

— Ficaria – ele disse, tão fácil que Isabella soube de imediato que já havia pensado naquilo antes; a mera ideia talvez pudesse deixá-la vermelha. – Mas eu não esperaria que o tomasse. Parece convencional demais para uma mulher que me chama para um encontro só de calcinha na minha cama – considerou, com um meio sorriso, e Isabella sentiu o rosto começar a arder. Lutou contra o embaraço, melhorando sua postura.

— Era um cenário extremamente profissional – afirmou. – E eu estava com uma blusa também.

— Eu me lembro – ele murmurou, e então notou que o drink de Isabella estava quase no fim.

Isabella o observou fazer sinal para o garçom e pedir mais um; levou sua taça ao copo dele em brinde. A borda de vidro estava manchada de batom, e talvez ela devesse ter usado um batom líquido diferente, mas amava o brilho e o cheiro de baunilha daquele gloss.

Em outra vida, poderia ter sido um anjo da Victoria’s Secrets.

— Como descobriu este lugar?

Martínez manteve a conversa fluindo com mais facilidade do que Isabella poderia ter esperado de alguém tão quieto, e parecia prestar atenção a cada palavra sua; sem fazer que sim com a cabeça todo o tempo, dava a impressão de armazenar tudo em um bloco mental minucioso, bem-organizado como seu quarto.

Quando Isabella pensava a respeito, era estranho que houvesse ido a seu quarto; mais estranho ainda que estivesse com certa saudade dele.

— Por favor – Martínez lhe disse, na hora de ir embora, sua voz um pedido irresistível.

Ou quase. Isabella balançou a cabeça, acertando a conta.

— É um encontro – disse, muito séria. – E eu te convidei. Caso você pagasse – explicou – poderia chamar isso como quisesse.

— Quer ter certeza de que é um encontro? – ele perguntou, achando graça. Levantou-se para ajudá-la, retirando seu casaco do encosto. Talvez fosse ajudar Isabella a vesti-lo, mas ela balançou a cabeça e o tomou nos braços.

— Não vai sentir frio? – ele perguntou, enquanto saíam para o vento noturno.

— Sua jaqueta parece bem quente – Isabella disse. – Você poderia me emprestar. Está muito decidido a me impressionar, vestindo sua melhor camiseta branca e tudo mais.

Martínez lhe dirigiu um olhar esperto, quase sorrindo.

— Você veio de táxi?

— Sim. Não sei dirigir – Isabella admitiu. – E Nova York não me decepcionou no tocante a táxis. Talvez no tocante a muitas outras coisas – reconsiderou – mas não nisso.

— Não posso te levar de moto com esse vestido – ele explicou, e então pôs as mãos nos bolsos. – Seu apartamento não é longe daqui, é?

— Vai me acompanhar até lá? – Isabella perguntou, com um sorriso.

Martínez encolheu os ombros, já andando ao seu lado.

— Deveríamos ter ido a uma feira, também, para eu ter conseguido um urso de pelúcia para você.

— Eu dormiria abraçada a ele todas as noites – Isabella prometeu, solene, só pela satisfação pequena de embaraçá-lo de leve.

Mesmo um pouquinho mais alta, se sentia próxima demais dele. Juntou os braços à frente do corpo, abraçando o casaco, mas não o vestiu. Não estava tão frio. Martínez andava rápido, ela sabia, e percebeu como ele diminuía o passo para que de salto ela o acompanhasse; o vento bagunçou seu cabelo, e ele não se importou, mas Isabella afastou o dela para trás de uma orelha.

Reviveu aquele encontro; de pé, ao seu lado, sentia a ansiedade cheia de expectativa consumi-la de novo. Martínez a havia escutado, realmente ouvido, e não só as histórias engraçadas de Gabriel ou os feitos de Artemis; perguntara dela, por mais que Isabella não se achasse tão interessante assim. Era uma sensação diferente, que lhe trazia um pouco de vergonha (mesmo que ela não sentisse aquele tipo de embaraço fazia tempos), e, mesmo assim (teve de reconhecer, tristemente), ela ainda o chamava pelo sobrenome, não havia um braço passado ao redor dos seus ombros e nem a menor insinuação de dedos enlaçando os seus.

Talvez Martínez estivesse lhe dizendo, a seu próprio modo, que o encontro fora divertido, mas não o que ele estivera esperando. Isabella sabia o que ela havia esperado: ao menos um beijo – com sorte, dois, e Martínez lhe murmurando seu nome inteiro próximo o bastante para que Isabella não se esquecesse dele nunca mais.

Mas estavam a oito quadras de seu apartamento, e Martínez andava ao seu lado em silêncio. Isabella observou os carros passarem na rua, insegura, perguntando-se talvez se teria feito algo de errado; se teria procurado por coisas a mais em seu interesse que, afinal de contas, poderia ser apenas curiosidade. Talvez o comentário dele, acerca de sua indignidade ao sentar-se em sua cama de calcinha e uma blusa de seda apenas, fosse mais uma crítica do que uma provocação divertida.

— Você mentiu para mim – ela disse, com um suspiro e um pequeno sorriso, observando-o pelo canto dos olhos.

— Como? – virando-se para ela como se Isabella o houvesse despertado de um devaneio, Martínez juntou as sobrancelhas. – Menti para você?

— Aquilo tudo de não estar a trabalho – Isabella disse, ainda com o meio sorriso e o inevitável ar resignado. – Promessas vazias, não eram?

O canto dos lábios dele se curvou um pouco, e era uma pena que aquilo o deixasse tão lindo.

— Não se impressionou muito, foi?

Ela encolheu os ombros, tentando aparentar pouco caso.

— Foi decepcionante, na verdade.

Martínez riu.

— Significava que eu poderia me divertir com você – disse. – Sem precisar ser profissional. Conversar, talvez rir se você fosse engraçada. Talvez te conhecer. Coisas que não poderia fazer enquanto estivesse a trabalho.

— Achei que significasse me seduzir – Isabella disse, com sua melhor expressão inocente. – Talvez me beijar, se eu estivesse afim. – Imitou seu tom. – Coisas que não poderia fazer enquanto estivesse a trabalho.

William Martínez balançou a cabeça solenemente.

— Essa ideia nem me passou pela cabeça.

Isabella teve de sorrir, seu coração apertando um pouquinho. Ele combinava tanto com aquela cidade; firme e certo de quem era e do que fazia, as mãos nos bolsos e o andar seguro. As luzes da cidade se enroscavam nos cachos de seu cabelo castanho-escuro, e ele parecia realmente macio, quase chegando à sua nuca.

Isabella havia pensado em apoiar a mão ali.

— Você deve me achar louca – disse, suspirando, sua voz mais baixa e mais real. – Por tudo o que fiz ao posar para você na Agência, por ter lhe pedido de repente aquele tipo de ensaio. E os flertes hoje à noite – acrescentou, quase suspirando de novo. – Por favor, não me ache uma louca desesperada.

Martínez tinha os olhos atentos nela, e era estranho como Isabella havia se acostumado àquilo, mesmo sem uma câmera entre eles.

— Eu te acho linda – ele disse. – E, se você flertasse com uma pedra, ela flertaria de volta.

Isabella abriu um meio sorriso, observando a rua.

— E por que não você?

Estavam quase na metade do caminho. Martínez demorou a respondê-la, e Isabella decidiu não esperar por nada conclusivo. Talvez ele só estivesse a entretendo sem qualquer propósito, só porque seu namorado a havia traído com uma modelo muito mais linda e muito mais detestável.

(Um canto da sua mente lhe apontava, contudo, que William Martínez não era o tipo de homem que ia a um encontro por pena).

— Você vai embora para Boston – ele murmurou, e seu tom quieto chamou a atenção de Isabella. – É perto, mas nem tanto. Não de verdade.

Embora estivessem no meio da calçada, Isabella parou no lugar. William Martínez fez o mesmo, embora talvez a contragosto, e, quando seus olhares se encontraram, ele parecia atormentado. Isabella não disse nada, contando os segundos, mas ele se rendeu fácil; qualquer coisa em sua expressão suavizou-se um pouco, e suas próximas palavras foram um sussurro perdido naquela cidade imensa.

— Eu resisti por oito meses, Isabella. E não vou me render só para te perder no fim do ano.

Isabella. Isabella, com todas as sílabas, saindo como uma carícia daqueles lábios cheios; Isabella. Oito meses, da festa da Agência até aquela noite; oito meses dela lhe sorrindo com os olhos e com a boca, sensual e também gentil, atiçada pela impenetrabilidade de seu olhar escuro.

Entreabriu os lábios, sem saber o que dizer.

— Melhor tentar do que imaginar para sempre como poderia ter sido? – tentou, um pouco sem ar.

— Eu sou um pouco dramático – ele disse, embora quase sorrisse. Seus olhos encontraram os dela, e Isabella poderia ter se derretido. – Ficarei feliz de ficar para sempre encostado na janela observando a chuva cair.

Isabella sequer o sentia escorrer pelos dedos; tinha a certeza de que jamais o tivera de verdade. A distância entre eles era pequena, e, no entanto, ela a respeitou; inconformada e entristecida no lugar, sem saber o que fazer. Seu coração batia rápido, e Isabella sabia que não aguentaria outro encontro como aquele – conversas mansas e provocações suaves ignoradas, William Martínez a mantendo por perto sem realmente tocá-la.

Parecia uma espécie particularmente terrível de tortura, e ela não fazia ideia de como ele poderia suportá-la.

— Eu deveria ter tentado isso mais cedo – disse apenas, sua voz trêmula.

— Você tinha um namorado – Martínez lhe disse, encolhendo os ombros em desconforto. – E estava começando uma carreira.

— Eu tinha um péssimo namorado – Isabella o dispensou. – E uma carreira de mentira.

Martínez não contestou. Isabella observou seu rosto, da curva de seu maxilar até suas sobrancelhas escuras. Gostaria que chovesse, só para que, encharcados, ela tivesse uma desculpa para fazê-lo subir até seu apartamento, para aproveitar o que mais ele se permitisse ter de sua companhia.

A mera ideia de repente lhe pareceu cruel, e Isabella se arrependeu de tê-lo provocado por tanto tempo. Angustiada, perguntou-se se aquela seria a última vez que o veria.

Meu nome é William Martínez, e eu gostaria de te fotografar.

— Eu posso... – tentou. Era absurdo e injusto, mas ela não poderia fazer aquilo sem pedir; talvez fosse pior. Sustentou seu olhar, o vento da cidade esvoaçando seu vestido leve e seu cabelo comprido. – Posso te pedir um beijo? Pelo menos?

Viu o exato momento em que a respiração de Martínez se suspendeu, e aguardou enquanto os olhos dele se arregalavam de leve. Perguntou-se como seria se ele negasse, mas, então, ele assentiu com a cabeça em um movimento muito breve. Talvez as palavras lhe houvessem faltado, ou talvez Isabella houvesse acabado de se consolidar como uma garota bastante louca.

Eu conheci uma modelo uma vez, ela imaginou, enquanto ele fechava a distância entre os dois, que me provocava quando estávamos trabalhando. Ela se curvava e se movia, pensou, erguendo as mãos para apoiá-las em seus ombros, confirmando a maciez de sua jaqueta, me mostrando seu corpo e seus olhos escuros para ver se conseguia me desconcentrar.

As mãos dele estavam em sua cintura, muito mais mornas do que ela poderia ter imaginado naquela noite gelada, e também mais firmes. Ela conseguia, sempre, percebeu, enquanto o rosto dele se aproximava e palavras rodavam em sua mente, oito meses, oito meses, oito meses; não vou me render só para te perder no fim do ano.

Era urgente, e também não era. Isabella se derreteu e reconstruiu, o arrepio de corpo inteiro a acomodando melhor dentre suas mãos. A noite lhe pareceu insuportavelmente fria, e Martínez a beijava como se buscasse gravar nela seu nome para sempre. Isabella afastou-se talvez meio centímetro, lábios entreabertos enquanto seus olhos buscavam os dele. Ela me procurou uma vez para que fizéssemos um ensaio e, quando vi, estávamos no meu quarto. Ela dançou para mim e, dias depois, estávamos nos beijando na calçada.

Martínez jamais se esqueceria daquilo. Isabella encostou o nariz no dele, apaixonada pelos tons de castanho de seus olhos, suas mãos firmes em sua jaqueta escura como se jamais fossem deixá-lo ir. Sentia o próximo coração acelerado, e gostaria de estar mais perto para que sentisse o dele, também.

— Não me deixe ir – pediu, num murmúrio. – Eu ficaria, por você.

Martínez fechou os olhos e estreitou a distância entre eles de novo; seus lábios tocaram os dela, tão suaves, e o beijo foi uma carícia mansa e um pedido de desculpas.

— Essa é uma péssima maneira de se tomar decisões – ele murmurou. Isabella conseguia sentir seu perfume de novo, e por isso respirou fundo; apoiou o rosto na curva do seu pescoço e esqueceu-se, por um instante, da existência do mundo. – Você acabou de sair de um relacionamento – sua voz tinha um tom de pesar. – Eu não vou ser seu estepe, Isabella. Não posso.

É claro que seria Martínez, tão inconveniente, a forçá-la a sair de suas pequenas bolhas de felicidade. Isabella segurou mais firmemente a jaqueta dele entre os dedos e, ao encontrar seu olhar de novo, suspirou baixo.

— Sabe o que ser um estepe significa, não sabe? Alguém que infle sua autoestima após um coração partido, que seja divertido e satisfatório e também descartável. Você não é nenhuma dessas coisas – ela apontou – especialmente divertido. Poderia ser mais satisfatório, se parasse de ser tão dramático.

Poderia lhe dizer mais. Queria, de verdade; estava na ponta de sua língua a confissão de como passara os últimos minutos ansiosa e preocupada que o encontro não houvesse sido bom o suficiente; que o visse como uma pessoa tão inalcançável e o desejasse tanto; que não se recordasse da última vez em que uma pessoa a intrigara daquele jeito.

Mas não disse nada daquilo, porque sua insegurança já era grande demais e, honestamente, se ele não conseguia ver nada daquilo em seus olhos, talvez falassem mesmo línguas muito diferentes.

— Eu não sei – Martínez disse, como se a confissão lhe escapasse, e Isabella respirou fundo.

— Por favor, William. Por favorzinho?

O ar de surpresa dele logo se transformou num meio sorriso, e ela já o conhecia o suficiente para notar o ligeiro embaraço em sua expressão.

William?

Isabella o cutucou no peito com o indicador, sorrindo ligeiramente.

— Não posso te chamar pelo sobrenome agora que estamos saindo. Ou você prefere Will?

— William – ele a garantiu, e Isabella abriu um sorriso, aproximando-se para beijar seus lábios de novo.

Enroscou os dedos em sua nuca e permitiu que ele a abraçasse, grata pelo conforto de seu corpo morno e pelo carinho do gesto; talvez todos os seus namorados a houvessem beijado errado em toda sua vida. Ou talvez só fizesse muito tempo desde a última vez em que alguém a deixasse daquela maneira, nervosa e entusiasmada, apaixonada antes de tudo.

Separaram-se e William Martínez a manteve por perto, o casaco de Isabella mal apoiado sobre seu braço, a noite estrelada cheia do barulho de pessoas e de carros. Isabella se lembrou da música que ouvira em seu voo, em praticamente toda sua mudança, porque era um sinal de boa-sorte e também de amor – everybody here wanted somethin’ more; searching for a sound we hadn’t heard before.

William acariciou seu rosto, ainda reservado, mas quase entregue, e Isabella percebeu que estavam os dois vivendo exatamente a mesma coisa e, mesmo assim, momentos tão diferentes. Oito meses, ele lhe havia dito, enquanto Isabella redescobria borboletas e uma primavera inteira no estômago.

Welcome to New York, ela ouviu, em algum canto eufórico de sua mente, em que fogos de artifício explodiam e era um prazer compartilhar aquele momento e aquele beijo inesperado com William Martínez. It’s been waiting for you; welcome to New York, welcome to New York.

— Vai machucar seu rosto – ele lhe disse – continuar sorrindo desse jeito.

— Você podia tentar de vez em quando – Isabella acariciou seu rosto com a ponta dos dedos. Sua barba arranhava muito de leve. – Antes que seu rosto fique para sempre fixado em uma carranca. – Apoiou os dedos em seu queixo, observando-o com atenção. – Eu gosto mais quando você sorri.

Beijou seus lábios de novo, antes que William tivesse a oportunidade de respondê-la. Ele protestou com um murmúrio sufocado, mas era absurdo que resistisse quando tinha as mãos tão seguras ao seu redor. Isabella beijou seu rosto e também a linha de seu queixo, e teria beijado seu nariz se William não fosse provavelmente se ofender com isso (talvez mais tarde).

Ele a afastou como se precisasse tê-la longe para pensar direito.

— Você precisa voltar para casa.

— Não – ela retrucou. – Eu não tenho mais toque de recolher. Sabe que é uma das coisas da Academia que eu deixei para trás com muita felicidade?

— Não é sobre toque de recolher – ele revirou os olhos, afastando uma das mãos. A outra deslizou até a base de suas costas, e Isabella permitiu que ele a fizesse andar de novo. – É sobre estarmos no meio da rua.

— Você é tímido?

— Você beija seus namorados desse jeito no meio da rua?

— Você é meu namorado agora?

Ele suspirou, desviando os olhos, e, talvez pela luz de um letreiro, Isabella viu seu rosto vermelho. Gargalhou.

— Eu te fiz corar?

— Eu não-- – William revirou os olhos de novo. Isabella havia achado que ele se daria bem com Apolo, mas talvez estivesse parecido demais com Artemis. – Eu não fico vermelho.

— Você é lindo.

Ele não a respondeu, e Isabella aproximou-se mais, desejando apoiar o rosto em seu ombro; beijar a base do seu pescoço de maneira preguiçosa e então sorrir ao deitar sobre ele, seu cabelo comprido caído ao redor dos dois para isolá-los do mundo.

— Eu não iria embora – disse. – Por você. Só estava voltando para Boston porque não tinha motivos para ficar.

William encontrou seu olhar, mas não disse nada, e Isabella já estava muito acostumada aos seus silêncios.

— Mas eu gostaria que você fosse comigo, por alguns dias. Para conhecer todo mundo. Eu estou realmente com saudade. E então nós voltaríamos. Eu tenho planos, sabe. – Desviou sua atenção para os carros que passavam na rua. – Iria fazê-los lá, mas pode ser aqui também. Quero estudar moda e ir para a parte desse mundo de que eu sempre gostei. Mais do que das passarelas – admitiu. – É que antes eu não achava que seria boa o bastante. Mas eu posso ser – disse, sua voz mais tímida. – Se eu tentar.

Não havia dito aquilo a qualquer outra pessoa, nem mesmo a Gabriel, e talvez soasse frágil demais; um murmúrio naquela cidade caótica. Virou-se de novo para William quase que com receio, mas ele acariciou de leve a base de suas costas por sobre o vestido.

— Vai ter de aprender a costurar.

— Eu sou horrível – Isabella reconheceu, com uma careta de derrota. – Minha mãe vai mostrar tudo o que já tentei fazer. Não sei porque ela guarda aquelas coisas – suspirou. – Não vai poder desistir de mim depois disso. E vai ser você a remendar as coisas que seus cachorros rasgarem.

— Eles não rasgam coisas – William protestou, indignado, mas Isabella tinha um meio sorriso ao continuar:

— E minhas sandálias são sempre escolhidas a dedo, eles não podem arrebentá-las também. E eles não sobem na cama, sobem?

— Que tipo de pessoa você acha que eu sou?

— O tipo bonito e mal-humorado. – Isabella de uma olhada para trás. – Vai ter de buscar sua moto depois?

— Por que não iria?

— Eu poderia te oferecer um café. As garotas de Nova York fazem isso?

— Achei que já houvéssemos decidido que você não era como as garotas de Nova York.

Isabella sorriu.

— Eu poderia te oferecer um café, e meu sofá cheio de almofadas. Parece terrível ter de fazer esse caminho todo de volta sozinho – concluiu, dramaticamente.

— Terrível – ele disse – é tentar não te levar a sério.

Ele parou exatamente em frente ao prédio de Isabella, e ela sorriu um pouquinho.

— Há quanto tempo exatamente você sabe onde eu moro?

— Você não vai – ele afirmou, sério – ficar se divertindo às minhas custas por conta disso.

— Eu não acredito que passei tanto tempo tirando a roupa para você e achando que você me detestava – ela disse, correndo as mãos pelas lapelas de sua jaqueta – só para descobrir que você gostava de mim o tempo inteiro.

— Você não tirava a roupa para mim – William a corrigiu, e ainda era um pouco estranho não chamá-lo de Martínez mais.

Quase. Aquele vestido não escorregou sozinho, você sabe.

William Martínez riu pelo nariz, inconformado, e o fato dele saber exatamente a qual ensaio ela estava se referindo fez Isabella gargalhar.

— Sem café? – perguntou, sua voz mais baixa.

Ele afastou uma mecha de seu cabelo escuro para trás de sua orelha, uma certa tristeza em seus olhos castanhos. Se havia um motivo de consolo para Isabella, era saber o quanto aquilo lhe custava.

— Não hoje – ele disse, encontrando seu olhar. – Você assume riscos demais, Isabella, mas não eu. Vamos devagar para que você não retorne a Boston e eu seja deixado na janela vendo a chuva cair.

— E eu me achava dramática – ela disse, mas estava sorrindo um pouco. Não tinha intenção alguma de deixá-lo para trás. – Você é bastante pior.

— Sou um pessimista de nascença.

Mas também era muito mais do que aquilo, e Isabella queria muito beijar seu nariz, as maçãs de seu rosto, sua testa e seu cabelo; queria vê-lo de óculos e de pijama, e também tirando aquela jaqueta pesada. Acariciou seu rosto, sem querer se afastar.

— Obrigada pela noite de hoje – disse, como havia aprendido. – Eu me diverti muito.

Os olhos dele faiscaram, e William Martínez sorriu de leve.

— O prazer foi todo meu.

Ela ainda tinha sua jaqueta entre os dedos.

— Quando vamos nos ver de novo? E eu quero minhas fotos.

— Estão sendo encadernadas. O álbum é presente meu.

— Você vai manter cópias?

— Que tipo de pervertido você acha que eu sou? – ele retrucou, ofendido, e Isabella riu.

— Um homem profissional como você – suspirou. Observou seus olhos castanhos, rendendo-se por inteiro. – Obrigada.

Agradecia por mais do que apenas por aquele encontro, por melhor que ele houvesse sido, e William Martínez a respondeu com um beijo; por ela, poderia fazer aquilo sempre. Poderiam ter conversas inteiras daquela maneira. Enroscou os dedos em seu cabelo e se derreteu de volta, sem se recordar do último instante em que sentira frio naquela noite.

Queria dormir com ele, aninhada em seu colo, beijando seus braços e sua clavícula, abraçando-o e enroscando suas pernas nas dele. E talvez estivesse criando esperanças demais, de novo, sonhando em demasia, como era tão boa em fazer, mas talvez – e aspirava àquilo presa à maneira com que ele a olhava – não estivesse sonhando sozinha.

William Martínez beijou seu nariz. Isabella gargalhou, escondendo o rosto em seu ombro, e não fazia diferença que estivesse três centímetros mais alta. William beijou ao lado da alcinha esquerda de seu vestido, eriçando o corpo de Isabella inteiro, e, quando se afastou, tinha um meio sorriso.

— Boa noite, Isabella.

Ela sequer sabia como conseguia ouvi-lo com seu coração batendo tão alto. Aquela noite tinha luzes fortes demais, barulhos ruidosos de carros e o cheiro de milhares de restaurantes próximos e também de perfumes; cheiro de cidade acordada e cheia de vida. Isabella tinha a sensação de prová-la inteira.

Acariciou a mão morna de William antes de deixá-lo ir.

— Boa noite, William. Não posso mesmo te chamar de Will?

— Não. – E então ele levou a mão de Isabella aos lábios, beijando seus dedos como se para ter certeza de fazê-la se apaixonar da maneira correta. – Posso te ver amanhã?

E ela deveria ser mais difícil do que aquilo, realmente deveria, mas acabou sorrindo.

— A qualquer momento.

Quatro beijos, o mais suave dos toques de suas mãos e seus lábios sobre os ombros e dedos; Isabella sequer entendia o desfecho daquela noite e já tinha certeza de que era o começo de algo muito, muito maior do que qualquer coisa que já conhecera. E mesmo assim tão particular, secreta no coração daquele labirinto imenso.

Observou-o partir, mas não como se William Martínez levasse consigo um pedaço seu ou a deixasse incompleta – observou suas costas e seu cabelo, seus passos curtos e as mãos escondidas nos bolsos, e se sentiu melhor e mais realizada desde que pusera os pés para fora de casa.

Sorriu sozinha, e a cidade não se importava, não com ela, não com qualquer outra pessoa; mas Isabella se sentia finalmente no lugar certo, e poderia sorrir até que o universo inteiro se alinhasse com ela. O vento esvoaçou seu cabelo e as luzes da cidade iluminaram seu rosto: ela olhou ao seu redor, extasiada, e se sentiu em casa.


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Notas finais do capítulo

E chegamos ao fim, meus amores. Sinestesia talvez tenha mais leitores fantasmas do que o sistema do nyah poderia computar, e até mesmo vocês eu espero que tenham apreciado a jornada. Comentários são, como sempre, muito bem-vindos.

Poucos sabem, mas em meus próximos planos está a reescrita de O Lado Escuro da Lua, e é lá que mataremos apropriadamente a saudade de todo mundo. Algumas coisas vão mudar, outras nem tanto, e eu realmente espero que vocês apreciem também.

Muito obrigada ♥



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