Pétalas de Girassol: Gemütlichkeit escrita por Pandora Imperatrix


Capítulo 1
Único




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 “Pela primeira vez na minha vida
Eu não vou deixar a tristeza me machucar
Não como ela me machucou antes
Pela primeira vez eu tenho alguém
Que eu sei que não vai me abandonar
Pois eu não estou mais sozinho”

Michael Bublé – For Once In My Life

 

— Mas eu quero ir hoje!

Ele tinha os pulsos cerrados e o rostinho vermelho de contrariedade.

— Eu já disse que hoje não, Boruto. – Ela respondeu pelo que parecia ter sido a quinta vez desde que aquela conversa havia iniciado dez minutos atrás, ela ainda conseguiu manter um tom duro, mas calmo, só que seu autocontrole já estava por um fio.

— Porque não?

— P-porque não! – Ele arregalou os olhos quando ela gritou e Hinata sentiu a pontada de culpa atingir seu coração dolorosamente. Ela respirou fundo e engoliu em seco, arrumando a posição de Himawari em seu colo. – Eu tenho outras c-coisas para fazer e não posso te levar.

— Mas a Hanabi-ba-chan disse que quando eu quisesse ir pra lá era só ligar que ela vinha me buscar – ela se orgulhava de seu filho, mas sinceramente preferia que as respostas não viessem tão rápido a ponta de sua língua.

— Sua tia é ocupada, não tem tempo para ficar a sua disposição a-assim não.

— Mas ela disse! E se ela tiver ocupada pode ser o Ko.

— Boruto, não é não. E você já foi para lá ontem e anteontem.

Naruto abriu a porta no exato momento que o bico segurando as lágrimas de Boruto, que já estava tão grande que quase encostava no nariz, foi desfeito e transformado numa bocarra aberta enorme de choro.

— Você é muito má, Kaa-chan!

E saiu correndo da sala antes que um de seus pais pudesse alcançá-lo.

Naruto estava pronto para lançar um olhar cúmplice para a esposa antes de ir atrás do filho, afinal, mesmo que fosse ele a “vítima” mais usual, os xiliques de Boruto não eram nenhuma novidade naquela casa, mas quando olhou para Hinata percebeu que havia algo de realmente errado.

— Não chora, mama – disse a voz doce de Himawari que com suas pequenas mãozinhas limpava desajeitadamente o rosto da mãe.

Naruto sentiu como se uma mão invisível tivesse apertado seu coração.

— ‘Nata... Você está bem'ttebayo?

Ela beijou a mãozinha úmida de Himawari e deu um sorriso lacrimoso ao marido.

— Estou. Estou. Eu s-só... – ela suspirou pesadamente. – Naruto-kun, vá ver como está nosso filho, p-por favor?

Pelo modo como a voz dela falhou no final e o tom dolorido de súplica, Naruto queria muito ficar e mais uma vez desejou que performar o kage bushin no jutsu fosse algo possível naquelas situações para estar em dois lugares ao mesmo tempo e com um último olhar de remorso à esposa, ele foi atrás de Boruto.

Hinata suspirou quando Himawari caiu no sono, ela esperou a menina parar de sugar seu seio para colocá-la sobre a cama, ajeitando seu corpinho adormecido, para que ela ficasse mais confortável. Depois, ela se sentou na beira da cama e começou a abotoar a blusa, seu olhar perdido no espaço, na cabeça a briga com o filho se repetia em flashes e pensamentos torturantes de autopunição faziam com que suas mãos tremessem transformando a simples tarefa de se recompor em algo penoso. Ela teve um sobressalto quando a porta rangeu com a entrada de seu marido.

— C-como ele está? – Sua voz soou fraca, ainda mais baixa que o habitual.

— Ele está bem’ttebayo. Se sentindo culpado, você sabe o quanto ele te ama e não gosta de brigar com você... Está jogando vídeo game no quarto dele.

Ela suspirou fechando as pálpebras trêmulas, um pouco mais aliviada, mas incapaz de relaxar.

Naruto se sentou ao seu lado e, sem dizer nada, a abraçou.

Como se seu autocontrole fosse um elástico esticado até o limite, aquele abraço, daquela pessoa, finalmente arrebentou e Hinata soltou as lágrimas reprimidas, abraçando Naruto forte e molhando sua camisa.

— Hey... – a voz dele soou com um desespero que fez com que o choro dela aumentasse. – Hime, o que aconteceu? Eu nunca te vi assim!

Ela demorou para responder, incapacitada pelos soluços que sacudiam seus ombros. Naruto não voltou a perguntar, apenas a consolou do jeito que podia, acariciando suas costas e beijando o topo de sua cabeça, provendo calor e conforto.

— D-desculpe... Eu estou sendo boba – ela disse quando conseguiu se controlar, afastando o rosto do peito dele para encará-lo.

— Eu não sei o que aconteceu, mas duvido que para você ter ficado assim tenha sido algo bobo. O que houve? Porque por mais que o Boruto seja uma peste não foi ele quem fez isso com você’ttebayo.

— Não chama meu filho de peste, Naruto-kun.

Ele sorriu, limpou as lágrimas dela e beijou sua testa.

— Aí está você de novo, Hinata Uzumaki, advogada oficial do pestinha número um de Konoha.

Naruto-kun.

Ele riu e ergueu os braços em rendição.

— Ok, parei.

— Bom.

Ele afastou uma mexa de cabelo para trás da orelha dela.

— Vai, me conta.

O rosto de Hinata se contraiu numa expressão de dor.

— Você vai pensar mal de mim.

— Nunca. – Ele disse num tom sério, tão sério que fez com que o amor que ela sentia por ele, já tão grande, se estendesse um pouco mais.

— É o meu pai.

Naruto trincou os dentes. Tinha que ser.

— O que aquele velho fez dessa vez?

Hinata quase riu, Naruto ficava tão transtornado quando o assunto era seu pai, ela nunca havia visto alguém pegar raiva secundariamente assim antes.

— Ele é um b-bom avô – seu marido fez sua cara oficial de “não estou entendendo mais é nada” e os lábios de Hinata tremeram, era incrível como a presença daquele homem tinha os efeitos mais diversos nela, ao mesmo tempo em que ele era refúgio seguro para ela desabar, também era apoio para ela se reerguer, de forma que ela passava das lágrimas para o riso em duração de instantes – ele é carinhoso, até. Imagine só, Hiashi-sama, carinhoso.

— Hinata...

— Eu não sei c-como explicar, Naruto-kun. É claro que eu estou feliz que meus filhos não passem pelo que eu passei, que eles tenham m-melhor tratamento que eu tive, mas dói assistir, dói m-muito. Porque se ele era capaz de tudo isso, porque comigo foi tão diferente? Me faz pensar que o motivo era eu e, eu sei que a gente já conversou sobre isso outras vezes, que da mesma forma que foi com você, nós não somos responsáveis pela violência que sofremos quando crianças, e e-eu entendo que o mundo era diferente, mas mesmo assim... Eu me culpei por t-tantos anos, foram esses pensamentos que moldaram minha personalidade, é d-difícil abrir mão.

— Eu... Eu não sei o que te dizer mais’ttebayo. Mas estou orgulhoso de você por ter pensado nisso tudo sozinha. O que você disse é verdade, não é culpa nossa... E se é validação o que você precisa agora, o que você está sentindo faz todo o sentido. Você não acha que eu sinta um fundo de raiva que agora todo mundo me procure porque precisam de mim para proteger a vila? Que eu não sinta um pouco de mágoa mesmo que não demonstre? Hinata, nós não somos perfeitos, mesmo que a gente perdoe, não tem como esquecer... Você não é uma pessoa pior por isso.

Ela deitou a cabeça no ombro dele e ficou em silêncio alguns minutos, deixando as palavras dele penetrarem em seu coração como bálsamo curativo. Em um certo momento, ele começou a acariciar os cabelos dela e Hinata fechou os olhos, agradecendo silenciosamente o quão doce o destino havia sido com ela para ter colocado aquele homem em sua vida.

— O-o que eu faço agora? – Ela perguntou com uma voz mais baixa que o costume, mas calma, em paz.

— As pazes com nosso Boro. – Ele a abraçou pela cintura.

— O que eu digo para ele? – Ela levantou a cabeça, buscando o olhar azulado do homem que amava.

— A verdade.

— Mas eu não queria que ele pensasse mal do avô, não quero que ele fique igual a você. – Ela terminou com uma nota de divertimento.

— Hey! Mas meu relacionamento com o velhote é ótimo dattebayo! Eu até finjo que não noto quando ele usa o Byakugan pra ver onde tem mais peixe quando a gente sai pra pescar.

Ela riu baixinho e encostou a testa no peito dele.

— Você não precisa dizer os detalhes... De qualquer forma ele tem que entender que não é sempre que a gente tem o que quer e, realmente, ir todo dia para casa do seu pai é um pouco demais.

Ela inspirou profundamente e se afastou dele, se levantando.

— Eu... Eu v-vou lá.

— Ganbatte. – Ele disse simplesmente.

Ela sorriu.

E as palavras saíram antes que ela pudesse se impedir, não que ela fosse de qualquer forma, afinal, era verdade.

— Eu te amo.

Foi a vez dele sorrir, aquele sorriso que ainda fazia ela perder o fôlego.

— Eu amo mais.

Ela sentiu as bochechas esquentarem um pouco e balançou a cabeça antes de, detestando deixá-lo e abandonar aquela bolha de paz, entendimento e amor, partir em direção ao quarto de Boruto.

Gemütlichkeit: Palavra germânica intraduzível para a o sentimento de se sentir aceito, confortável consigo mesmo e querido depois de uma interação social.

 


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Notas finais do capítulo

Aí está mais um capítulo autoindulgente de Pétalas de Girassol. Este inspirado por uma montagem do anime Boruto que a Sofia (BruceChickinson) me mandou no twitter e me levou às literais lágrimas & pelas minhas próprias questões.

Quem me conhece sabe, porque eu já devo ter comentado, eu e a Hinata temos muito em comum, eu também fui a filha mais velha menos querida e embora eu nunca irei poder passar pelo que a Hinata passou nessa fic, já que eu não tenho mais pai, mas pelo modo que eu via ele agir com meus irmãos mais novos e com o sobrinho que ele amava tanto (eu disse que eram muitas coisas em comum xD), como ele demonstrava ser capaz de dar o que eu queria dele, só nunca pra mim, eu me perguntava se a culpa não era minha e imagino que em algum momento isso deva ter passado pela cabeça da Hinata quando ela viu o modo como o Hiashi age com as crianças. Eu confesso que fiquei chocada quando descobri que ele era um avô carinhoso. Mas entendo até, tempos de paz e os netos dele não são herdeiros do Clã Hyuuga.

Anyway, eu espero um dia encontrar alguém como o Naruto na minha vida, mas por enquanto vai ser a base de fanfic que eu vou tratar meus traumas mesmo haha.

Fim do oversharing.

Espero que vocês tenham gostado.

Beijinhos.



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