Bulletproof Grower escrita por Jéssica Sanz


Capítulo 22
Correr o mundo


Notas iniciais do capítulo

Esse seria o último capítulo, maaaas...

Depois eu conto.



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Os espectros abriram as cortinas. Lá do outro lado, ele pôde ver a outra cortina sendo aberta e revelando-a. Os dois estavam separados por duas escadarias que iam para baixo e se encontravam em um patamar central, que dava na escadaria que ia em direção ao salão. Junggie queria descer aquelas escadas correndo, mas ficou paralisado. Primeiro, porque ela estava linda. O vestido vermelho parecia uma rosa, seus cabelos negros estavam soltos e cacheados com uma tiara de joias com formas de flores. Mas a coisa mais incrível nela era o tamanho. Ela era, definitivamente, uma adolescente.

A paralisia de Junggie acabou quando ela começou a descer os degraus. Seguindo seus instintos de performer que o diziam para manter a simetria da cena, ele também começou a descer os degraus, sem ouvir os aplausos, sem olhar para o público. A partir daquele momento, tudo era ela. Ele até queria desviar um olhar para seus pais, sem acreditar que o haviam benignamente enganado daquela forma, mas ela era mais importante do que qualquer questionamento. Causas, desculpas, planos, segredos, nada daquilo era relevante. Quanto mais se aproximavam, mais ele sentia vontade de correr até ela, mas estava travado em um tipo de hipnose.

Encontraram-se no patamar, onde ele ficou encarando-a. Agora de perto, podia ver como ela estava ainda mais linda do que antes, o quanto ela fazia seu coração bater rápido. Quase sem que ele percebesse, ela fez uma reverência real, que era parte da performance. Meio sem jeito, ele respondeu a isso, curvando-se elegantemente, mas voltando rapidamente seu olhar para ela. Então, estendeu-lhe a mão, e ela aceitou, e começaram a descer juntos o último lance de escadas, indo para o salão. Deveriam prestar atenção no caminho, mas ele não conseguia desgrudar os olhos dela, e ela, encantada com aquilo, sentia-se presa, completamente conectada a ele, como nos jogos de olhar das aulas de dança. Ele suspirava, ainda sem acreditar que aquilo realmente estava acontecendo, e ela começava a achar que ele teria um treco ali mesmo, mas segurava o riso. Não podia esconder o quanto ela também estivera esperando por aquele momento.

Chegaram ao térreo, ao piso onde dançariam, e caminharam até o meio. Viraram-se um para o outro, ainda encarando-se profundamente, e a música começou a tocar. Era a música Somewhere Only We Know, a mesma do filme do Pequeno Príncipe, que fazia jus não apenas aos personagens de que eles se vestiam naquela noite, mas também aos personagens que eles representavam em suas próprias existências.

Juntos, eles dançaram a coreografia com graça e delicadeza. Para eles, já avançados na arte, ela não era nada complicada. Junggie foi levado pelo domínio da coreografia, porque não conseguia pensar nos passos. Sua emoção falava muito mais alto, obrigando-o a manter os olhos fixos nela sempre que possível. Eles giraram pelo salão juntos, conectados como se tivessem ensaiado muitas e muitas vezes juntos. Afinal, todo mundo dizia que eles davam certo quando estavam juntos no palco. Nenhum dos dois sentiu o público, o salão, a decoração, eles apenas sentiam a música e um ao outro, imersos em um momento mágico e sublime, como se estivessem cercados de estrelas. Apenas o brilho do olhar de cada um já era suficiente para encantar qualquer um que assistisse.

Quando a música acabou, eles continuaram se olhando, agora bem mais próximos, sem se dar conta do som dos aplausos ou do anúncio da próxima valsa. Ele só percebeu quando Sunghee tocou seu ombro gentilmente. Acordando de seu transe, Junggie se soltou dela, que riu um pouco da situação antes de se afastar. Junggie demorou alguns segundos ainda para voltar-se para sua eomma, mas, de repente, estava tão feliz, tão agradecido por seu presente. Sorriu para ela e começaram a valsar.

— Obrigado — sussurrou ele, e ela riu levemente.

— Tudo ideia do seu pai.

A valsa ocorreu normalmente. Por último, ele valsou com sua querida avó, Yumi.

— Agora, — anunciou ela — existe mais alguém que merece valsar, não é mesmo?

— Sim — concordou Junggie, firmemente. — Appa, eomma, o palco é de vocês.

O público aplaudiu enquanto Yoongi e Sunghee se dirigiam ao palco. Eles valsaram por um minuto e meio, mais ou menos, quando Yumi e Jungkook também entraram. Depois, Junggie e Florzinha, e aos poucos os casais do Juízo foram entrando e formando um grande baile. No final, foram se dispersando. Junggie e Florzinha ficaram por último, que foi quando a maioria percebeu que havia um guarda-chuva entre as mãos unidas deles. Ao fim da música, eles foram para perto da escadaria. Com uma mãozinha de Taehyung, logo estava chovendo dentro do salão, e Junggie abriu o guarda-chuva. Os dois encenaram uma despedida, e Florzinha subiu as escadas, enquanto Junggie caminhava feliz para o centro, já ao som de Singing In The Rain.

O cover foi um pouco mais curto do que o do pai, mas mesmo assim, valia a lembrança. Já era um agradecimento pela brilhante surpresa. Depois disso, a festa continuou normalmente. A ajuda para secar Junggie veio do avô, com uma potente e quente ventania como um secador gigante. O jantar foi servido e eles comeram. Na mesa da família, acabou ficando o Juízo todo, Florzinha e Minji. Junggie ainda estava tentando acreditar que ela estava ali. Bom, aquele era o momento, ele não teria outra chance.

Quando terminaram de comer, Junggie perguntou a Florzinha se poderiam dar um passeio no jardim, ou seja, conversar a sós.

Junggie levou Florzinha para o meio das roseiras. Queria ver como ela era única entre as outras, não só porque era uma flor que crescia, mas porque era dona do seu coração, então tratou de deixar o céu bem aceso, as estrelas bem brilhantes.

Ela pôs-se a observar as outras flores. Olhava para elas, sentia seu toque aveludado, e sem pressa, andava por aquele caminho, permitindo-se estar presente nele.

— O mundo diminuiu.

— Sim, mas quem o viu? Poucas pessoas. Mas eu e você…

Junggie se aproximou, fazendo-a olhar para ele. A flor que sempre fora espivitada estava tímida, recolhida. Não conhecia mais aquela terra como sua, e o mundo estava menor. Ela estava completamente deslocada.

— Tinha algo para me dizer.

O lembrete foi ainda tímido, mas escondendo uma ansiedade em desabrochar. Ela queria estar ali com ele naquele momento, ele precisava chamá-la.

Junggie, de repente, se viu quase em apuros. Tivera tanto tempo para se preparar para dizer o que precisava ser dito, mas não podia dizer assim, jogado no ar. Seria muito para qualquer um dos dois.

— Eu esperei por você — ele disse, em tom solene, olhando-a bem fundo nos olhos.

— Sim, aqui estou. Ou melhor, aqui estamos.

— Depois de tantos anos — ele não deixou a conversa morrer. — E você está maior. Está do meu tamanho! Eu esperei por isso.

— Nós esperamos.

— Como aconteceu?

— Como da primeira vez. Durante meu sono. Em prol de uma realização importante. Da primeira vez, foi para ser de Daegu. E agora, para dançar com você.

— E mesmo depois disso você deixou Daegu. Vai me deixar também?

Florzinha suspirou, embora escondesse um sorriso. Deu a volta em Junggie e continuou a andar pelas roseiras. Ele se virou para ela e ficou observando-a, até que ela parou, um pouco adiante, e olhou para ele.

— Acha que é fácil assim?

— É só seguir seu coração.

— Meu coração pede muitas coisas. Eu não sei a que atender. — Ela olhou para o horizonte, para as ilhas além de Omelas, e ergueu a mão como se quisesse alcançá-las. — O mundo me chama. Você sempre soube.

— Ainda sei. Também sei que eu sempre chamei por você.

— Sim, mas você está aqui — ela disse, voltando para perto dele, mais perto que antes.

— Estou aqui agora, e você também.

— E quando eu não estiver?

— Farei como sempre fiz. Esperarei por você.

Florzinha abaixou o olhar, pensativa.

— Por quê?

— Meu coração chama por você.

Ela se virou de novo.

— E se o mundo gritar mais alto? — ela foi andando, novamente em direção ao limite da ilha.

— Então você deve ouvi-lo. Pode ir.

Ela olhou para ele.

— Por que está hesitando? Não hesite.

— Já não estou crescida demais para correr pelo mundo?

— “Todas as pessoas grandes já foram crianças um dia, mas poucas se lembram disso”. Não deixe sua criança morrer. Nunca é tarde para correr. — Junggie fechou os olhos. — Dez. Nove.

Os olhos de Florzinha brilharam. Ela tirou os sapatos, deixando-os no chão, e começou a correr. Não pelo mundo, mas pelo jardim, que era seu mundo naquele momento. Que fora seu mundo em uma parte preciosa de sua longa infância. Quando terminou de contar, Junggie começou a correr atrás dela. Brincaram de pique como duas crianças novamente.

— Tá com você! — gritou Junggie, quando conseguiu alcançá-la e tocar seu ombro. Correu, então, na direção oposta, se aventurando pelos corredores do jardim, formados pelas fileiras de plantas. Florzinha ria escandalosamente enquanto ia atrás dele. Depois de algum tempo, o alcançou, e o jogo virou novamente. — Aish! — reclamou ele, antes de correr em direção a ela.

Depois de mais alguma correria, ela parou, ofegante.

— Tô de licença — anunciou, entre risos.

Junggie diminuiu a velocidade, mas ainda foi até ela.

— Dez, nove…

— Seus convidados estão lá dentro. Não deveria estar dando atenção a eles?

— Deveria — concordou Junggie, dando de ombros. — Para o azar deles, meu coração chama por você. Ele não quer saber de outra coisa, e eu estou pronto para ouvi-lo. Então, pode correr atrás do mundo, eu corro atrás de você como uma criança. Hoje é minha última chance, Flor. Eu não vou mais deixar você ir embora.

Florzinha o encarou por um tempo, ainda normalizando a respiração da qual nem precisava. Depois, olhou para a margem por dois segundos, e depois para ele, que mantinha seus olhos fixos nela. Ela ainda tentava aceitar aquela ideia.

— Mas você é daqui, Junggie.

— Não importa.

— Sua família está aqui, você é herdeiro do Juízo.

— Nunca quis ser juiz.

— E herdeiro da Casa Daegu.

— Não interessa. Já pertenci a esse lugar por muito tempo. Sem nunca ser feliz de verdade, porque faltava alguma coisa. Nem tente me impedir, eu vou para Delfos.

— Não sei se quero ficar em Delfos. Também já fiquei lá por tempo demais, e não é Delfos que me chama. É o mundo.

— Eu vou te seguir. Por onde você for. Eu já disse!

Florzinha riu.

— Você é como uma criança pirracenta.

— Sou uma criança crescida.

— E como vamos fazer isso? Como vamos correr o mundo?

Junggie hesitou.

— Pouco antes de você partir pela primeira vez, te levei ao meu quarto de infância e fizemos uma coisa. Eu tenho até hoje, guardado na minha sala de estudos. Tenho estudado com meu avô alguns projetos, sempre tentando deixá-lo mais aerodinâmico. Estive preparando tudo para correr pelo mundo. Você viria comigo?

Florzinha, que parecia tentar esconder o quanto estava encantada com aquele plano louco e inesperado, se aproximou muito dele, sem pressa. Colou testa com testa e ficou encarando-o.

— Eu adoraria correr o mundo com o menino que tem o universo nos olhos.

Eles ficaram algum tempo ali, se encarando, apenas aproveitando o momento, aproveitando o olhar um do outro, a presença um do outro.

— Junggie, o que realmente tinha para me dizer?

Junggie segurou o riso. Ela sabia muito bem que aquilo não estava completo, mas estava a ponto de ficar. Ele voltou a ficar sério. Deveria ser o momento mais importante da sua existência.

— Eu te amo. Ah Peuro, a mulher da minha existência todinha.

Florzinha riu um pouco. Era engraçado ser chamada de mulher, tendo passado tanto tempo como criança. Ainda estava se acostumando. Apesar disso, ela não tinha mais o que esperar. Virou um pouco o rosto para finalmente começar a beijá-lo. Enlaçou seu pescoço, enquanto ele segurava sua cintura.

Beijaram-se, tocaram-se, meio que de forma a recuperar o tempo perdido, mas ainda teriam a eternidade, então não havia pressa. Depois de algum tempo, Junggie alertou que deveriam voltar para a festa.

— Só mais um pouquinho — pediu ela.

— Só mais um pouquinho — aceitou ele, rindo. — Também estou com saudade.

— E, aliás… Eu também te amo, Pequeno Príncipe.

 

~

 

Quando a carruagem de Apolo apareceu convenientemente às seis da manhã, Florzinha teve que explicar que não voltaria mais, a não ser em visitas. Hospedou-se por tempo indeterminado na Casa do Juízo enquanto ela, Junggie, Jungkook, Yoongi e Namjoon desenvolviam a potente máquina de voar inspirada na montagem que os dois tinham feito na infância. Ela até começou a frequentar algumas atividades na Casa Daegu.

Poucos dias depois, Minji foi embora para a ilha Seorabeol, mas prometeu visitar de vez em quando. Já o tal menino que brigou com Junggie foi expulso de Omelas e voltou para a ilha das Mães-sem-filhos.

Junggie já tinha feito alguns projetos de balões, o que adiantou bastante o processo. Namjoon fez a maior parte dos cálculos, Yoongi ajudou com o queimador e todo o aparato de segurança que manteria a chama acesa e sem oferecer perigo. Jungkook cuidou mais da parte aerodinâmica e de navegação. O difícil mesmo foi conseguir matéria-prima e colocar a mão na massa. Uma das partes descampadas de Omelas se tornou uma verdadeira área de construção. Depois de alguns meses, começaram a fazer alguns testes com a primeira versão já montada. Depois de mais alguns meses de ajustes e reparos, o Estrela do Destino foi finalmente considerado próprio para voos de longa distância. Antes disso, é claro, passou por viagens curtas, onde as crianças de Daegu se esbaldaram.

Com o balão pronto, Junggie e Flor começaram a agir as coisas mais práticas: Primeiro, finalizaram o itinerário do balão, ou seja, a definição de locais pelos quais passariam e datas, adicionando algo bem importante: de quanto em quanto tempo retornar para casa, e por quanto tempo ficar. Felizmente para a família Min, os dois escolheram Omelas como a base deles. Depois, mobiliaram a grande cesta, fazendo-a parecer um navio. Era bem grande para uma cesta de balão, mas pequena para um navio. Tinha um local de navegação, cabines para dormir e traçar rotas, uma área de alimentação, etc, mas tudo muito pequeno. Para isso, a cesta era muito bem organizada, abusando das técnicas de aproveitamento de espaço. A miudeza também foi desculpa para as crianças mais aventureiras que queriam ir junto.

No dia da primeira partida, houve grande festa em Omelas. Música, dança, uma grande comemoração envolvendo os moradores das duas casas, que tanto consideravam os tripulantes. Minji até tinha vindo para assistir ao grande feito. Nos momentos finais, eles discursaram, assim como os pais. Yoongi não conseguiu segurar o choro estando prestes a ver seus amados filhos crescidos abrindo as asas para o mundo. Junggie se comoveu com o pai que tanto amava.

— Não se preocupe, pai — consolou ele. — O bom filho à casa torna. Nunca vamos esquecer nossas origens, nosso ninho, nossa família. Esses meses vão passar rápido, anota o que eu tô falando! Molecada, a gente tem mesmo que ir agora, mas vamos fechar com uma música das boas. Cantem com a gente!

Nana soltou “Nosso Lindo Balão Azul”, do Balão Mágico. Enquanto cantavam junto com toda Omelas, Junggie e Flor subiram no cesto e começaram a navegação.

Em direção ao mundo que os chamava.


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Notas finais do capítulo

Aqui terminava nossa história, mas como as ideias não param de surgir na minha cabeça, vem mais. Se fosse algo banal, eu até deixaria pra lá, mas realmente é algo que ficou mal resolvido e que pode ser a maior reviravolta de toda a saga.

Esperem por isso ^^



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