VOICES escrita por Rômadri


Capítulo 1
Confronto


Notas iniciais do capítulo

Não se assustem se não entenderem a princípio, prometo que fica mais claro depois.
Até as notas finais ;)



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/757044/chapter/1

Uma senhora idosa passa por trás de mim enquanto eu aperto a campainha do apartamento de Caleb com força. Ela me encara com certo julgamento, mas eu apenas desvio o olhar do seu, cruzando os braços em frente a minha blusa rendada. Respiro fundo algumas vezes, temendo que o efeito da tequila que bebi há pouco passe. Ao menos eu lembrei de escovar os dentes depois disso. Caleb detestaria saber que bebi. 

E eu não posso arriscar irrita-lo. Não agora.

— Lucy? – Caleb me olha com surpresa, a mão estática na maçaneta. Sua camisa escura de linho e mangas compridas parece deixa-lo ainda mais belo. Belo e imponente. Pelo cheiro de shampoo que sinto quando me aproximo dele, sei que acabou de sair do banho. Meu pai certamente o espera no escritório, para que ele confira todos os números de sua última transação - Você está bem?

O vinco em sua testa se aprofunda, tensão em seu semblante. Na minha mente, uma voz me diz para não seguir em frente com o que estou prestes a fazer.

Se eu fosse você falava rápido. Quem sabe ele não te escuta e você se livra dessa vergonha?

Ignoro a voz.

— Olha, eu sei que não sou normal. – Lágrimas involuntárias inundaram meu rosto e Caleb me encarou com preocupação. – Sei que não sou como as garotas as quais está acostumado. Sei que sou chata e mandona e crítica e mais uma infinidade de coisas, mas... - Parei por um instante, sabendo que só há uma coisa que realmente preciso dizer a ele - eu te amo, Caleb. Muito mais do que um amor de amigos.

Seus olhos se arregalaram levemente e ele fez um sinal pra que eu entrasse em seu apartamento. Estava tão cheia, com tantos sentimentos guardados que simplesmente despejei tudo quando Caleb abriu a porta. Eu deveria ter esperado, pensei, frustrada.

— Lucy, isso... que você sente não é saudável. Eu a amo, mas é diferente, entende? – Ele simplesmente diz depois de fechar a porta e me fazer sentar em seu sofá. Seu rosto mostra que está em conflito. Mal o ouço. Não importa o que ele diga, nada vai mudar o que sinto.

— Não se importe com papai... ele vai entender um dia. Sei que vai. – Caleb passa as mãos pelo rosto e tira seus óculos, repousando-os na mesa de centro.

— Você é uma criança, Lucy... – Sussurra, como se tentasse me fazer enxergar algo óbvio demais. Suspiro de frustração.

— Já estou prestes a fazer dezoito anos e você também é jovem. Sete anos de diferença não é algo grandioso. - Caleb sorri de forma compressiva, igual meu pai, como se eu fosse uma criança que ainda tinha muitas lições para aprender. Fecho meus olhos, irritada.

— Você ainda é uma menina, Lucy. – Sua mão aperta a minha de forma inocente, mas sinto minha pele aquecer ao seu toque. – É normal que seus sentimentos possam estar... confusos. Quero o melhor para você. Quero que conheça alguém do seu colégio, um rapaz que possa te fazer feliz e...

— Eu tentei, Caleb! – Grito de forma desesperada – Eu tentei conhecer alguém, eu tentei me apaixonar, mas não consigo porque cada vez que estou com outro cara, eu só penso em você!

Mais lágrimas surgem e Caleb parece assustado. Dói vê-lo assim.

— Nenhum toque é como o seu. – Pego sua mão e a repouso em minha cintura. Caleb engole em seco – Nenhuma voz é como a sua. Nenhum rosto é como o seu! Droga, Caleb! Eu te amo!

Pressiono meus lábios contra os seus e minha língua entra em sua boca. Ele resiste no começo, mas retribui depois, nossas línguas em harmonia. Seu gosto é incrível e intensifico o beijo, repousando suas mãos em meu corpo. Caleb suspira e eu sinto meu coração se encher de felicidade. Seus dedos me acariciam por baixo da blusa e sei que ele me deseja também. Jogo a blusa no canto da sala e Caleb me encara sem reação.

— Lucy... – Ele sussurra como se meu nome fosse uma espécie de adoração, até que seus olhos se arregalam e ele me afasta de seu colo. – Lucy!

Não sei como reagir. Fico em choque observando-o levantar do sofá num ímpeto e despejar minha blusa sobre mim.

— Nós não podemos, Lucy. – Sua voz ainda está abalada por mim e eu me levanto, enlaçando meus braços em sua cintura. – Deus! O que há de errado comigo?

— Pare de falar. – Beijo-o novamente, ansiosa por senti-lo, mas desta vez, Caleb me afasta bruscamente. Seu empurrão quase me faz cair no sofá. Olho seu rosto sério e decidido e quero chorar de novo.

— Já chega, Lucinda. Por favor, vá para casa.

Suas palavras golpeiam meu coração e eu me sinto rejeitada, como da vez que meu pai me deixou com a babá por um mês inteiro. Caleb põe seus óculos e abre a porta para que eu saia.

Idiota, idiota, idiota! Por que você foi se declarar? Por que chegou assim, do nada?! Bem feito! Bem feito quebrarem seu coração tantas e tantas vezes. 

As vozes ecoam em minha mente e sinto vontade de gritar.

— Para casa, Lucinda. – Caleb me põe para fora novamente. Dessa vez ele segura meu braço e me arrasta até a porta. Ele nota minhas lágrimas e aproxima nossos rostos. Sua expressão se acalma um pouco e vejo pena em seus olhos – Você precisa de ajuda, Lucy. Tem ido ao psicólogo?

Louca. Você é louca como a sua mãe. Vai acabar numa casa cheia de gatos e repleta de fotos de Caleb.

— Não preciso de um psicólogo para fingir que se importa comigo. – Engulo em minhas lágrimas e soluço baixinho. As feições de Calebe relaxam mais e sinto-o acariciar meu ombro. Sei que minha maquiagem borrou toda extensão do meu rosto. Levei eras tentando passar o delineador corretamente pra parecer mais velha, mais determinada. Devo estar horrível agora.

— Você tem que entender que precisa de um acompanhamento com um especialista, Lucy. Os problemas dos seus pais tem a afetado muito e...

— Eu preciso de você, Caleb... Por favor, me dá um chance. Por favor. Por favor. – Sinto-me fraca e caio de joelhos no chão. Agarro-me às pernas de Caleb e encharco seus jeans. Ele repousa uma mão em minhas costas e me deixa chorar silenciosamente. Penso nas vezes que me escondi atrás dessas mesmas pernas quando era uma criança brincando de esconde-esconde. Eu, uma menina de sete anos, ele, um rapaz de catorze.

Você é fraca.

Você não o merece.

Choro com mais afinco ainda porque quero muitas coisas que não posso ter. Quero que Caleb me ame e não me veja como uma criança problemática. Quero que papai não me olhe como se eu fosse uma cópia de minha mãe. Quero que mamãe pare de me usar para extorquir dinheiro do meu pai enquanto faz compras na internet em seu hospital psiquiátrico intitulado como Spa de Revitalização. Quero tirar notas mais altas e me livrar da dislexia. Quero ter seios maiores e quero que os caras mais velhos babem por mim. Quero tanto, mas tenho tão pouco.

Caleb é o tudo. O ombro amigo, o ouvinte paciente, o conselheiro, o braço direito de papai. Agora ele pensa que enlouqueci de vez. Nada será como antes entre nós porque fui estúpida demais pra vir até aqui e dizer o que sinto.

— Venha, Lucy... Vou levar você pra casa. – Caleb me pega no colo e me leva até seu carro, no estacionamento subterrâneo de seu prédio. Por um momento, finjo que nos casamos e essa é nossa Lua de Mel.

Iludida. Mentirosa.

As pessoas nos olham com curiosidade e a síndica pergunta se precisa chamar ambulância ou algo assim. Caleb dá uma desculpa qualquer e me senta no banco da frente. Nossos rostos se roçam e quero beija-lo, mas sei que não posso. Sei que ele não quer. Encaro a janela, mas não vejo nada.

— Vista isso, está frio. – Ele diz quando o semáforo fica vermelho, me entregando a jaqueta que estava no banco de trás. Eu o obedeço porque sei que sua preocupação não é com o frio e sim com a enxurrada de coisas que meu pai dirá se me ver com essa blusa provocante, caso ele ainda esteja em casa – Você está bem?

Rio de escárnio.

— Vai ficar tudo bem, Lucy, você...

— Pare de falar como se eu estivesse louca!

Caleb me encara com frustração. Sei o que está pensando: Que sou louca de verdade. Meu coração pesa e eu choraria se ainda houvessem lágrimas em mim. Penso no que Caleb dirá a meu pai. Seus braços musculosos apertam o volante com força.

Até um volante tem mais sorte que você.

— Pare de me fazer sentir pior! – Coloco as mãos nos ouvidos e percebo tardiamente que falei em voz alta com os sussurros em minha mente. O rosto de Caleb fica branco como um papel e o ouço falar com meu pai pelo telefone.

Parece que alguém passará um tempinho com a mamãe no Spa de Revitalização.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Obrigada por ler
Me fala aí sua opinião ;)
Beijocas!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "VOICES" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.