Quero. não Quero. talvez Eu Queira. escrita por wateru


Capítulo 2
Não quero


Notas iniciais do capítulo

O primeiro foi narrado pela Kallen. O segundo será narrado pelo Gino.



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O que diabos está acontecendo com a Kallen? Será que é culpa minha, por ter me insinuado... Peraí, mas eu não me insinuei. Ou me insinuei? Cara, eu estava com tanto sono que não me lembro de nada... Acho que é melhor tentar reorganizar as ideias:

 

A tia Matsuka me acordou, deu a maior bronca e o sinal tocou. Aí eu acabei demorando pra arrumar as minhas coisas, e por algum motivo a Kallen ficou lá. Daí a gente conversou, ela saiu da sala meio envergonhada – o motivo, até agora, eu não sei – e eu fui atrás dela pra tentar conversar. O que eu me lembro, depois disso, foi de ter falado pra ela que eu queria tomar uma ducha gelada antes de ir para casa. Será que ela interpretou isso como um convite para aparecer no vestiário também? Não, não pode ser, não faz o mínimo sentido.

 

E por que ela se esconderia na estante, já que o suposto convite era pra ela aparecer lá, e não se esconder lá? Isso eu não sei, mas foi até engraçado imaginar a Kallen me vendo pelado aquele tempo todo. Cara, será que eu fiz alguma coisa feia enquanto ela estava escondida? Deixa eu ver: primeiro eu fui tomar banho, cantarolei Canon D, daí eu fui pro meu armário, tomei um remédio pra dor de cabeça, peguei o livro pra devolver pra biblioteca – putz, esqueci a droga do livro lá no armário! – e deixei cair aquela porcaria de frasco. É, foi tempo suficiente pra Kallen admirar minha beleza. Mas não me lembro de ter feito nada demais... Tipo, fora o fato de estar nu na frente dela.

 

Será que foi o beijo que dei no rosto dela antes? Mas isso é tão normal na Europa, eu não acho que ela esteja nesse estado por causa de um beijo no rosto. Talvez, também tenha sido o fato de eu a ter deixado sozinha pra ir falar com o Suzaku sobre o fora que ele levou da Kuon... Será? Cara, é difícil lembrar. Mas a culpa só pode ser minha. Ah, não, será que foi porque ela viu... Oh, não, ela viu... Nossa, agora eu lembro: eu me virei de frente para o... Não acredito, será que ela viu o meu...

 

PÔSTER AUTOGRAFADO PELO JUSTIN BIEBER?

 

Ah, não, ela vai entender tudo errado... Será que é por isso que ela está enlouquecida? Aquele pôster foi uma das garotas que me deu! Não pode ser... Eu devia ter explicado tudo, eu tinha que ter ido até ela antes da cerimônia começar. E que cerimônia demorada foi aquela, não? Talvez pelo fato de serem dois acontecimentos importantes em uma noite, mas nada que justifique tanta demora! Coitada da Nunnally, quase dormiu na hora do sermão do frei. Mas, voltando ao pôster do Justin Bieber... Não, quero dizer, voltando à hora da recepção da imperatriz...

 

A noite chegou rápido. Se em casa eu tivesse um chuveiro com água fria, tomava banho lá mesmo. Mas eu precisava daquela ducha – sabia que a noite seria longa e cheia de surpresas. Não que eu esperasse essa surpresa, mas, enfim. É impressão minha ou meus pensamentos estão absurdamente confusos? Ah, lembrei, culpa do remédio pra dor de cabeça... Odeio efeitos colaterais. Efeitos colaterais, sono e garotas que enchem o saco. Peraí: garotas que enchem o saco? Mas qual o outro tipo de garota que eu conheço? Ah, é: garotas do tipo da Kallen. Grupo esse que, até agora, só tem uma representante: a própria. Ah, se ela tivesse vontade de dar pra mim... Não que eu quisesse, porque... Sei lá, acho que nunca admiti isso pra mim mesmo, mas ela meio que mexeu comigo... Será que isso é amor? Agora nem sei como chegar nela, minha investida no fim da aula não deu muito certo. E eu nem sei se ela entendeu minha indireta.

 

Começo a imaginar que, se a Kallen me desse bola, ela seria a mulher perfeita pra mim, ela é bonita, inteligente, charmosa (quando está vestida de terrorista, claro), corajosa, e ainda é boa de luta. E, no momento da coroação, enquanto eu estava lá em cima, desejando que ela quisesse minha presença perto dela, ela parecia odiar aquilo tudo – será que ela ao menos reparou que eu a olhava o tempo todo? Pelo visto, não...

 

Quando a cerimônia acabou, saí correndo pra falar com ela, mas a Nina já a tinha levado para o carro. Espero que ela vá para a festa, pensei comigo. Não podia deixar de falar com ela. Havia decidido, terminantemente, que iria expor todos os meus sentimentos a ela, e não estava nem aí se ela iria me achar um completo idiota ou uma bicha com crise de identidade.

 

Já estava super-feliz com tudo o que já tinha acontecido até então: dei, de bandeja, sete motivos para que ela me odiasse, estava com o braço doendo por ter ficado tanto tempo fazendo teto de aço para a imperatriz e o Suzaku ainda me chama para tirar foto com umas meninas sem sal – se alguém me ouvisse dizer isso, com certeza me chamaria de gay –, e eu ainda tive que fazer sinal de dois com os dedos! Só não falei coisa feia porque estava dentro de uma igreja – e porque o remédio já havia feito efeito (N/A: gostei da musicalidade das palavras. ^^), pelo menos não sofreria mais com dor de cabeça e sono – é, a cafeína contida no remédio me ajudou nessa parte. Era pra eu já estar dentro do Tristan, chegando na Babel Tower II (Mas não, o Suzaku tinha que dar moral pras Marias-Knightmare). E eu lá ia enfrentar engarrafamento? Preferia sobrevoar aquele monte de aristocrata e político bandido que ia pra festa só pra jantar de graça. Odeio esse tipo de gente. Esse tipo de gente, efeitos colaterais de remédio pra dor de cabeça, sono e garotas que enchem o saco.

 

Só consegui aterrissar na cobertura dois minutos depois. E olha que a nova localização do prédio nem é tão longe da igreja.

 

Quando cheguei, todos os puxa-sacos já estavam de prontidão aos pés da recém-proclamada imperatriz, que posava para fotos nas mais variadas poses – sentada sorrindo, sentada séria, sentada fazendo joinha, sentada com língua de fora... A Nana parecia espantar os fotógrafos de propósito. Ela sabia que os tabloides não teriam coragem de divulgar fotos como aquela... Então, era só ficar fazendo caretas estilo “quero mijar, mas não dá” que sua privacidade estaria garantida. E, mesmo depois de ter andado um pouco, ainda não havia avistado a Kallen.

 

Ela estava simples e elegante. Às vezes, é difícil ficar bonita, com a mesma roupa, em um funeral, uma cerimônia de posse e uma festa para gente chique. Ela conseguiu: estava com um tailleur (eu acho que o nome é esse) roxo-quase-preto, com uma blusa laranja por baixo. Ela estava linda, e acho que arrancaria suspiros nos dois ambientes. Por incrível que pareça, dez minutos depois e ela ainda não havia chegado. Pessoas do mundo da política, militares e repórteres enlouquecidos, mas nada da Kallen. Ah, lá estava ela: entrando no salão, linda, com seu jeito singelo de Stadtfeld – a personificação do fetiche masculino. Corri rapidamente em sua direção, mas acabei me perdendo pelo caminho – Porcaria! Por que alugaram um salão tão pequeno, e mesmo assim, tão difícil de chegar do outro lado?

 

Mesmo com a minha altura, não conseguia encontrá-la sobre aquele mar de cabeças ricas. Olhei mais atentamente, procurei por aquelas madeixas rosadas, e nem sinal dela. Já estava ficando com medo de que tivesse acontecido algo no caminho – fora o medo de estar ficando perdidamente apaixonado por ela. Até aquela pasta escolar horrível parecia ficar bem nela. Mas eu não quero me envolver dessa forma. Às vezes eu acho que sinto algo especial por ela, mas em outras ocasiões penso que é apenas um surto, uma vontade esporádica de constituir família, ter filhos, engordar e deixar a barba crescer. Talvez essa vontade seja normal nos garanhões, mas isso aos dezessete anos?

 

Achei. E deixei de pensar em tudo imediatamente, só para olhar para aqueles cabelos, de um tom cor-de-rosa natural, belo, chamativo e aconchegante... Os cabelos da garçonete travesti do outro lado. Jurei que fosse a Kallen, cacete! Nem acredito que praticamente me declarei para uma peruca rosa de um traveco. É, minha obsessão já está passando de todos os limites aceitáveis. Vou tomar cuidado da próxima vez que começar a apreciar um cabelo rosa. De qualquer forma, tive um pouco mais de sorte na terceira vistoria pelo salão: um círculo de pessoas se afastou rapidamente de alguém que dançava e gritava, com um copo de sidra sem álcool na mão. Quem ficaria bêbado com sidra sem álcool? Ah, lógico que era a Kallen. Continuava linda, porém completamente pirada e fora de si. E eu não fazia idéia do porquê. Ela pareceu tão natural na igreja, e agora dança como se ouvisse Greyson Chance! (N/A: Ele acabou de despontar na Internet. Suponhamos que, em 2018, ele seja famoso). Acho que Bach não é nem um pouco parecido com Greyson Chance, e mesmo assim ela estava empolgada e malemolente, dançando como uma louca.

 

Para mim, não importava: eu iria cumprir minha promessa e chegar junto, sem ligar pro fato que ela poderia pular em cima de mim ou sacar uma arma e mirar na minha testa – vai saber! Uma mulher na TPM já bota medo, imagine a Kallen bêbada! Quero dizer, não que a Kallen não seja mulher. Eu não a confundi com um traveco de propósito, viu? Mas, voltando... Passei por um garçom e peguei um copo de cerveja. É aristocraticamente belo chegar em uma dama com alguma bebida na mão, mesmo que não vá tomá-la. E foi fácil, já que o caminho estava livre, ninguém tinha coragem de ficar a uma distância menor que dois metros e meio. Até a própria Nina ficou observando de longe. Ela tinha medo de ser vista com a amiga enlouquecida.

 

– Está tudo bem com você, Kallen? – Perguntei querendo ajudar. Ela abaixou os braços, tirou um pouco dos cabelos bagunçados da frente dos olhos e olhou fixamente para mim. Suas pupilas estavam bem dilatadas. Com um ar distraído, vago, ela perguntou:

 

– O que é isso? – e apontou para o copo de cerveja em minha mão.

 

– Acho que é Inoble Light, não sei ao certo. Mas porque...

 

– Inoble Light? Adjoro! – Gritou, arrancando o copo da minha mão e bebendo em três goladas.

 

- Adjoro? – Interroguei, com uma sobrancelha arqueada.

 

- Não, você não adjora, só eu adjoro. – Ela falava enquanto lambia a espuma no interior do copo. Kallen estava visivelmente entorpecida. A voz estava arrastada, e ela quase não se mantinha ereta – eu adjoro qualquer tipo de cerveja... Desde que seja boa. Adjorável. – A garçonete traveco passou do seu lado, e ela não perdeu a oportunidade: pôs o copo de cerveja e a taça de sidra na bandeja, e pegou duas tulipas de vinho.

 

– Bebe comigo? – Falou, com cara de pidona. Ainda lambeu a espuma que tinha ficado nos lábios. Nossa, se ela não estivesse tão bêbada, eu levava ela pra minha casa agora. Mas tive que recusar a oferta:

 

– Desculpe, não posso. Como você deve ter visto – Dei ênfase nessa parte para lembrá-la da invasão no vestiário, horas antes. – acabei tendo que tomar um remédio para dor de cabeça, e bebida fermentada, mesmo sem álcool, não é uma boa combinação.

 

– ‘Xê tá maluco? Pirô? – Ela rodou o dedo indicador em volta da orelha esquerda, ainda segurando a tulipa. O vinho derramou quase todo no chão. – tá me enganando, né? Aquilo era pastilha pra mau hálito. Eu vi, tá?

 

– Hum... Bom saber que você andou me espionando... – e, antes que eu concluísse, ela disse:

 

– Culpa é sshua que dehxô a porta do armário aberta.

 

– Mas você está enganada. – falei, sorrindo – minhas pastilhas acabaram há uma semana. Eu devo ter me esquecido de jogar o frasquinho fora.

 

– Não, meu bem. – ela se aproximou cambaleando, parecia que ia se jogar nos meus braços. Mas parou e virou rapidamente. – tinha umas paxtilhas caídas em volta do vidrinho. Eu até peguei duas. – ela voltou a se virar para mim, rapidamente, fazendo sinal de três com os dedos, e derrubando mais um pouco de vinho no chão. Seus dois indicadores, agora, apontavam para sua boca sorridente. E foi assim mesmo, com os dentes cerrados, que ela disse:

 

– E aí? Meus dentes já tão bonitos e brilhosos? Já posso conquixtar unj gatinhux por aí?

 

Juro que gelei por dentro quando ouvi isso. Agora tudo fazia sentido. Então aquela bobinha resolveu mexer nas minhas coisas... Tentei me segurar pra não rir, e ser sério com ela. Talvez ajudasse. Senão ela poderia pensar que eu estivesse brincando. E não estava, de jeito algum.

 

– Kallen, eu não sei como dizer isso, mas... O que você tomou não eram pastilhas para mau hálito.

 

Ela me olhou com uma expressão confusa. Eu aproveitei para continuar:

 

– Naquela hora, eu acabei esbarrando no frasco de remédio. Foi quando eu o peguei, tentei tampar e, com raiva, joguei para o fundo do armário. Aquelas “pastilhas” das quais você fala eram... São remédios pra dor de cabeça. E, enquanto eles fazem efeito, o usuário não pode ingerir nenhuma bebida fermentada.

 

Kallen parou à minha frente. De um lance, vi as duas tulipas de vinho caírem de suas mãos. Ela estava assustada, mas, pouco a pouco, eu vi um sorriso se delinear em seu rosto. Alguns segundos depois, ela estava gargalhando. Eu só havia ouvido um barulho parecido com aquele duas vezes: em uma viagem ao pantanal brasileiro, onde tive contato com animais chamados garças, e assistindo a um documentário na TV a cabo sobre as hienas. A música parou, todos se voltaram para ela – para nós, já que eu estava ao seu lado – e o silêncio reinou por dois segundos. Até ela parar de rir, olhar em volta... E arrotar. Arrotar muito, como se não houvesse amanhã. Aí vai mais uma pra lista de coisas que eu odeio: ricos bajuladores, efeitos colaterais de remédio pra dor de cabeça, sono, garotas que enchem o saco e pessoas que arrotam em público. Mas, por incrível que pareça, eu não odiava a Kallen. Eu até achei... Bonitinho! É, eu estava perdido.


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Notas finais do capítulo

Antes que vocês falem: Eu sei que a Kallen nunca agiria dessa maneira, mas lembrem-se, ela está dopada!
Quando alguém bebe, tudo pode acontecer.



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