Shadowhunters: Cidade das sombras escrita por Vickysmeow
Julie sentiu-se vazia. Ela havia esquecido de Jordan o dia todo enquanto ficaram naquela sala.
Sentia falta do amigo ali presente e a olhando e encarando Melissa obsessivamente.
Sentiu-se sozinha. Como Charlotte dissera. Ela estava sozinha.
A caçadora de sombras não tinha a mínima ideia do que estava acontecendo com ela e com a vida dela. Não tinha nem certeza se realmente era uma caçadora de sombras. Pelo pouco que sabe, os Nephilins não tem magia. E ela a tinha. Forte e poderosa e o pior, sem controle algum.
O vento soprou seus cabelos para trás e a garota permitiu-se fechar os olhos por alguns segundos, sentindo a brisa calma, quente... E cheia de segredos que voam com ela ao redor do mundo.
Julieta voltou para casa - mesmo destruída a semanas - depois do que fizera no instituto. Por minutos e minutos, ela desejou não ter acordado naquela manhã, desejou que Gabriel Crossland não a tivesse acordado, e acima de tudo, desejou ter recusado feito uma covarde antes de lutar contra Melissa.
Culpa. Medo. Arrependimento. Vergonha. Ódio e angústia. Tudo isso batalhando dentro dela em um guerra de sentimentos. Culpa e medo por ter sido tão covarde e ao mesmo tempo tão curiosa por ter entrado naquele mundo estranho. Arrependimento e vergonha por ter fugido depois de ter ferido alguém. Ódio e angústia, por ter deixado Jordan sair daquele instituto, por ter se esquecido do amigo enquanto machucava outras pessoas, por ter aceitado fazer parte daquele mundo e por não saber quem está obrigando ela a fazer tudo isso. Seja quem quer que fosse, Julie jurou descobrir e acabar com cada partícula do monstro por trás disso.
****
James seguiu a garota pelas ruas da cidade. Ela correu como nunca havia corrido antes. Jam sentiu as pernas tremerem mas não parou e acabou concluindo que quando se está com medo ou em alguma situação semelhante, tudo ao seu redor, ganha mais força. Você corre mais rápido, você luta com mais precisão e você se esconde como se nunca mais ninguém fosse te achar.
O sol estava começando a se por, quando o garoto decidiu se desencostar da árvore onde estava a mais de meia hora observando a garota.
Aquela visão parecia de um filme. Julie sentada abraçando os joelhos, encima de uma escorregador dentro do jardim de sua casa destruída. O vento balançando seus cachos e o sol iluminando sua pele e fazendo sombra abaixo dela. E a casa, com as portas arrancadas das dobradiças, o telhado quebrado e o vidro das janelas estilhaçado no chão, ganhava um ar misterioso e um certo terror conforme a noite se aproximava.
A casa ficava em um dos bairros mais altos de Seattle e de cima daquele brinquedo infantil, dava para ver a cidade toda, debaixo dos raios quentes e coloridos da bola de fogo dourada entre as nuvens.
Jam se aproximou cautelosamente e sem nenhum barulho. As marcas de silêncio sempre ajudavam nas caçadas e em momentos assim.
O caçador de sombras hesitou no pequeno e baixo portão de madeira - que fazia conjunto com a cerca branca que foi feita ao redor da casa - e respirou fundo. Jam não fazia ideia do que iria dizer para ela. Por que ele a seguira, exatamente? Sabia que não tiraria a culpa de dentro dela, mas, pelo menos, tentaria ganhar um pequeno sorriso.
— Eu posso? - O garoto disse, atrapalhando o silêncio com a voz trêmula e suave.
Julieta abriu os olhos, separando os longos cílios, e o olhou. James percebeu que as bochechas dela estavam molhadas e vermelhas, assim como a pontinha do nariz. Ela estava chorando, porém, secou as lágrimas rapidamente quando encontrou os olhos dele.
A garota não disse nada, pois, se dissesse, choraria e não diria coisa alguma. E também, por que não queria magoá-lo, dizendo para ele ir embora e esquecê-la para não se machucar.
O caçador de sombras entendeu o silêncio como um sim. Por mais que soubesse, que não era aquilo que significasse. Jam caminhou até as escadas do escorregador e subiu dois degraus, para que seu rosto ficasse na altura do dela.
Uma lembrança boa o invadiu. Lembrou-se de quando ele, Gabriel e Melissa eram pequenos. Por volta dos sete, oito anos, quando ainda não precisavam se preocupar com matar demônios ou armas e marcas. Quando a vida, ainda era perfeita e calma. Apenas três crianças especiais, brincando em um parque no meio da tarde de um sábado. Quando seus pais e os Crossland, ainda tinham tempo para brincarem com seus filhos.
James abriu a boca para falar, mas nada saiu.
— Por favor, não faz isso! - Julieta murmurou de olhos fechados novamente.
Jam a olhou, esperando que abrisse os olhos castanhos e brilhantes. Sempre brilhantes. Como era possível, ele não sabia. Julie o fez e uma lágrima escorreu pela bochecha rosada.
— O que? - Ele perguntou hesitando quando ela sorriu sarcasticamente, como se ele não soubesse do que ela estava falando.
— Não pergunte como eu estou. Por que eu vou mentir dizendo que estou bem. Mas, é óbvio que eu não estou. E você sabe disso. - Julie respondeu e fez uma pausa para engolir o bolo de lágrimas na garganta. - As pessoas sempre mentem dizendo que estão bem, mas na verdade, elas nunca estão! E o pior de tudo isso, é que elas acham que enganam os outros, mas elas não veem que estão enganando a si mesmas.
Os segundos de silêncio que se seguiu foi de longe o pior que já tiveram na vida. Ambos envergonhados. Julieta por desabafar daquele modo e James por não conseguir ter mais nada para dizer e não conseguir desviar o olhar do dela.
— E... Eu não ia dizer isso. - Jam disse por fim. Sim, ele iria perguntar aquilo.
E mais nada. Nenhum dos dois disse coisa alguma depois daquilo. Apenas, ficaram olhando o horizonte. Os prédios que acendiam as luzes lentamente enquanto o sol se punha atrás dos mesmos, as pessoas passeando pela rua e provavelmente pensando por que havia uma garota sentando em um escorregador em uma casa destruída? Mas, ela não estava sozinha. James estava lá, porém os mundanos não o viam.
— O meu pai - Julie murmurou e Jam percebeu que ela o encarava. - Bem, o homem que eu achava que era meu pai, fez esse escorregador para mim quando eu tinha seis anos. Eu o amava mais que tudo, amava os meus pais.
— Eu imagino que sim. - Jam comentou e sorriu. Porém, ela não.
— E não é por que eles eram humanos. Mas, por tudo. As tortas de morango da minha mãe eram perfeitas. Doces e macias, como um piquenique num domingo a tarde. E meu pai, sabia contar histórias como ninguém. Ele lia algo para mim toda noite. E quando eu tinha medo do escuro ou de monstros embaixo da minha cama, ele dizia: Você é mais corajosa do que pensa que é. Não são os monstros e a escuridão que você deve temer. Eles devem temer você.
— Ele deveria ter sido um bom pai. - O garoto disse e achou ter visto um pequeno sorriso no canto dos lábios dela.
— Ele era. - Julieta respondeu e lembrou-se de uma coisa. Algo, que não havia lembrado antes. Uma memória guardada bem lá no fundo. - Jordan. Nos conhecemos no meu aniversário de cinco anos. Sua bola de baseball caiu bem encima do meu bolo cor de rosa.
— Você deve ter ficado brava para uma criança de cinco anos com o bolo de aniversário arruinado. - Jam sorriu enquanto dizia as palavras imaginando um pequena Julieta irritada e um pequeno Jordan babaca.
— Na hora eu fiquei. Mas, agradeço aquela bola até hoje. Sem ela, nós nunca teríamos nos conhecido. - Julie terminou e se calou depois disso, desejando que o amigo estivesse do lado dela agora. - E eu acabei com tudo.
— Você não acab...
— Sim, Jam. Eu acabei. Quebrei cada pedaço da nós dois e joguei fora. Eu deixei ele ir embora. Não deveria ter deixado...
— Ei! - James murmurou tocando o rosto dela. A bochecha macia e úmida, os olhos brilhantes nos dele e os cachos negros que ele havia enrolado no dedos, sedosos. - Vai ficar tudo bem!vamos dar um jeito! - Julie pegou a mão dele que acabara de por uma mecha de seu cabelo para trás de sua orelha e a acariciou, dando um sorriso tímido. - Eu prometo.
Os centímetros que separavam ambos, estava cheio de segredos e sentimentos que nenhum dos dois sabia direito o que era.
Julieta sentia a respiração dele em seu rosto, quente. O cheiro, já era familiar para ela. Jam cheirava a sabonete e.... Enxofre?
Algo estava errado. De repente, Julie sentiu-se observada e cortou a ligação que haviam feito entre ambos. O clima ficou tenso e Jam sentiu a irritação queimar de leve lá no fundo. Por que ela quebrara o momento perfeito?
****
— Que lindo. Ah! Não se preocupem! Podem continuar! Finjam que eu não estou aqui!
A voz familiar de Jordan invadiu os ouvidos da garota. Julieta escorregou pela rampa rapidamente chamando o amigo que se virara para ir embora.
— Jordan Avord! Volte aqui! Eu ordeno que pare! - Julie gritou enquanto Jam caminhava lentamente até ela.
— Ordena? - Jordan repetiu com ironia. - Me desculpe princesa do submundo! Talvez as trevas dentro de você não gostem que eu desobedeça suas ordens!
Julieta encarou o amigo. Aquele não era Jordan. Ele nunca havia falado assim com ela. Não daquele jeito e tom. E como assim, "princesa do submundo" ?
— Estou começando a entender por que Gabriel te acha irritante, mundano. - Jam se pronunciou falando com a mão também.
— Jam, não. - A garota interrompeu e se aproximou de Jordan.
Um cheiro estranho emanava dele. Enxofre. Azedo e ardido. Mesmo que ele não toasse banho uma semana e rolasse no lixo, cheiraria daquele jeito.
— Olha só! O que vai fazer? Arremessar uma de suas lâminas sagradas em mim? - Jordan provocou com ironia e depois riu.
— Jordan, chega! - Julieta se colocou entre ambos. - Eu sei que está magoado e eu sinto muito. Não deveria ter deixado você sair daquele instituto!
— Por que, não? - Jordan a encarou de uma maneira como Julie nunca havia visto antes. - Espera! Eu já sei! Por que lá dentro você podia me manipular. Sabia onde eu estava o tempo todo e podia dar uma escapada com ele ou como o idiota do Crossland para dar uns amassos sem que eu percebesse?
— Jordan isso... Eu nunca... Amassos? Eu não...
Os dedos de James se enrolaram no pulso da garota e ela o olhou. O caçador de sombras se aproximou de sua orelha e sussurrou:
— Não é ele. Ignore. Não é o Jordan. - As palavras saiam quentes e arrepiavam os pelos da nuca da garota.
— Você é esperto, Caçadorzinho de sombras! - Disse a voz que estava dentro do corpo de Jordan.
Depois do que James disse, Julieta percebeu o que havia de errado. Aquele não era seu melhor amigo, não o verdadeiro pelo menos. Aquilo que estava ali a sua frente, era um demônio. Por isso, o cheiro ruim.
— Diga o que eu sou? - A voz se tornou mais áspera e ameaçadora. - Diga-me Julieta, por que sentiu tanto medo quando pensou que seu melhor amigo mundano tivesse visto essa cena maravilhosa?
— Jam? - A voz de Julie era uma mistura de medo e pressa.
James olhou do demônio para ela e depois, para o demônio novamente.
— Ele é o demônio do medo.
Julieta olhou para o corpo de Jordan. O demônio dentro dele, sorria como se aquilo fosse a coisa mais divertida para se fazer. Para ele, com certeza era. Um sorriso maligno e cruel tomava os lábios do melhor amigo e os olhos estavam totalmente pretos, sem o castanho claro familiar dos olhos do verdadeiro Jordan.
— Onde ele está?! - Julieta gritou e se lançou para a frente, com uma adaga grudada na garganta do demônio.
Ele riu.
— Seguro. Por enquanto.
A lâmina se apertou ainda mais, fazendo uma linha escarlate brotar do corte fino.
— Estou curioso, Julieta. - O demônio disse e a garota estremeceu por ouvir seu nome vindo da boca dele novamente. - Ainda não quis saber quem eu sou.
James, que segurava em ambas as mãos, lâminas serafins, - inúteis, pois elas não funcionavam muito em demônios maiores. E aquele monstro, era um deles - estava tenso e esperando o momento certo para atacar e proteger Julieta custe o que custar.
— Não me importo com quem você é ou o que faz! Só vou avisar que se não devolver o corpo do meu melhor amigo intacto agora mesmo, eu em pessoa vou matar você, picar em pedacinhos e te mandar para o inferno de onde veio!
— Oh! Alguém está irritada! - O demônio zombou e riu sarcasticamente. - Guarde as ameaças para mais tarde, pequena.
O demônio ergueu as mãos no ar, como se estivesse se rendendo. James foi rápido e puxou Julie para longe dele e para trás de si, onde ficasse mais segura.
O monstro sorriu convencido e se curvou, porém, sem tirar os olhos dos dela.
— Prazer em te conhecer! - Jordan, que não é Jordan, ainda sorria, mas desta vez, cruelmente.
Julieta piscou e ele desapareceu de onde estava. Mãos a tocaram nos ombros e ela virou-se cortando o ar com o chicote. A serpente se desenrolara de seu pulso. E a garota agradeceu Charlotte por ter esquecido com ela sua cobra elétrica.
— Sou Agramon.
Julie e Jam viraram-se rapidamente para leste, com as armas preparadas para a luta. Agramon estava encostado na cerca branca analisando as unhas de Jordan.
— Eu sou o monstro preso em sua cabeça! Eu sou o monstro debaixo de sua cama!
E ele sumiu novamente. E reapareceu a oeste. As pernas separadas e os braços ao lado do corpo com as mãos em punhos. O último raio de sol deixando seu cabelos castanhos, em tom de dourado e seus olhos com um certo brilho maligno. O sorriso apareceu novamente, cruel como sempre.
Com apenas um olhar, James gritou e voou para dentro da casa. A parede foi quebrada quando ele a travessou e caiu, inconsciente.
Agramon encarou Julieta. A garota não conseguiu gritar. Sua voz havia sumido e seu corpo não a obedecia. O medo era evidente nos olhos dela e o demônio sorriu, maligno.
— E eu vou pegar você, garotinha.
Não quer ver anúncios?
Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!
Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!