Ohana Dreams escrita por CanasOminous


Capítulo 3
Capítulo 3 - Dente de Huntail




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Fazia um silêncio perpétuo na noite, sua irmã estava dormindo na sala sob a luz baixa de um lampião e o chiado repetitivo do rádio. Hal subiu as escadas na ponta dos pés com o Popplio quase caindo de seus braços, o Pokémon resmungava e estava louco para ser colocado no chão, mas se lhe fosse dada essa oportunidade, Hal tinha certeza de que alguma coisa sairia errado e não conseguiria causar a boa impressão que precisava.

Tudo que tinha de fazer era convencer Miliani a aceitar mais um membro na família. Ela era a nova alfa, era ela quem decidia as coisas

Abriu a porta com todo cuidado possível e nenhum ruído se fez ouvir. Ficou descalço para que os chinelos não fizessem barulho em contato com a madeira e conseguiu atravessar a sala até seu quarto com sucesso. Assim que ele pôs Popplio no chão, o Pokémon observou os arredores interessado, mas não fez nada. Ele só andava de lá para cá, como se estudando o ambiente. Hal pediu mais silêncio que o necessário com a ponta do indicador e fechou a porta com cuidado, voltando para a sala para tentar acordar a irmã, Dia dormia tranquilamente entre as pernas da mulher e tudo estava calmo e tranquilo até então. Talvez fosse melhor esperar o dia seguinte quando ela estivesse menos cansada, mas também não queria que ficasse ali na sala sem o mínimo de conforto, por isso trouxe-lhe um cobertor e um travesseiro. Sem abrir os olhos, Miliani se acomodou e agradeceu o gesto de carinho.

— Não precisava...

— Precisava, sim. Você arrumou a casa inteira e cuidou de tudo. Acha que é fácil? — falou o irmão mais novo com um sorriso.

— Não quis jantar hoje? — ela perguntou, sonolenta. — Fiquei esperando.

— Desculpe. Eu estava ocupado conversando com alguns amigos meus — Hal omitiu o fato de ter ido encontrar-se com Ika e Uko. Nunca falara sobre eles com a irmã. Na verdade, ela também nunca perguntara quem eram os tais “amigos”. — E a propósito, eu os convidei para virem aqui no fim de semana comer pizza, tudo bem?

— Claro, querido — Mili respondeu, mas ela estava mais dormindo do que acordada e provavelmente não se lembraria de nada no dia seguinte. — Me ajuda a levantar?

Hal deu apoio para que sua irmã ficasse de pé, ainda  meio cambaleante. Quando a viu passar reto pelo corredor do seu quarto e ir direto para a cozinha, imediatamente ele correu e ficou em sua frente na tentativa de impedir o progresso.

— Não precisa preparar nada para eu comer, juro que estou sem fome!

— E quem disse que eu ia fazer algo pra você comer? — Mili deu um sorriso de canto. — Gosto de cuidar de você, mas você já é grandinho para algumas coisas, não sou a mamãe para te mimar toda hora. Só vou preparar um suco na geladeira.

— E-eu pego pra você.

Ela arqueou uma das sobrancelhas.

— Hal. Você não sabe mentir. O que você aprontou?

— Nada.

— O que você quebrou?

— N-nada.

Ouviu-se o barulho de vidro trincado na cozinha, e subitamente todo o sono de Miliani desapareceu. Ela dobrou o corredor e se deparou com a porta da geladeira entreaberta e três dos potes de comida esparramados no chão. Os peixes congelados estavam mordidos pela metade e o chão da cozinha que fora limpado naquele mesmo dia agora estava  sujo e fedendo à feira de domingo.

Hal saía de mansinho quando sentiu alguém puxar-lhe pela camisa.

— Ninguém dorme enquanto essa cozinha não estiver brilhando, ouviu?

— C-claro, com o maior prazer... — sua voz era mansa, em contrapartida com a de Mili que primeiro respirou, e por fim extravasou como um vulcão que entra em erupção.

— Como é que você consegue ser tão desastrado, Hal?! Olha só pra isso, parece que entrou um jacaré na cozinha destruindo tudo! Lembra daquela vez o Salandit foi atraído aqui para dentro e tivemos que chamar os policiais da vila para retirarem ele em segurança? E quando fomos atacados por um bando de Cutiefly selvagens e precisamos dedetizar a casa inteira?! Lembra como eu fiquei irritada? ENTÃO. Some daqui.

Hal já corria para seu quarto quando outro barulho foi ouvido, agora na sala. Se dessa vez os dois estavam presentes, quem estaria aprontando? Mili foi atrás da porta da cozinha e retirou dali um taco de baseball que deixava pronto para emergências. Hal suava frio. O abajur de Lanturn próximo à mesinha de canto estava no chão e o tapete de Stunfisk virado do avesso. Miliani estava para acionar a polícia quando um furacão passou debaixo de suas pernas e a derrubou no chão, indo correndo na direção de Hal que o pegou nos braços e desapareceu dali.

— Não acredito que você trouxe outro Pokémon para dentro de casa! — Mili gritou, furiosa.

— Mas ele precisa de mim! — uma voz distante ecoou em algum lugar na varanda.

— Eu já disse que não podemos cuidar de ninguém se não conseguimos tomar conta nem de nós mesmos, Hal! Já não basta o Dia comendo e roncando na sala!

— ...mas o Dia nos faz mais felizes!

— Às vezes acho que já temos felicidade o suficiente.

Miliani escondeu-se estrategicamente atrás do sofá, e assim que Hal apareceu ela pulou em cima dele na tentativa de agarrá-lo. Dia despertou na hora e começou a latir, pulando de um lado para o outro na tentativa de fazer com que os irmãos parassem a briga. O Pokémon que estava nos braços do mais novo acabou rolando e transformando-se em uma bola que girou para fora da casa e despencou escada abaixo. Os dois arregalaram os olhos e foram correndo ver o estrago que causaram.

— Meu Arceus, matamos o bicho! — gritou Mili.

O Popplio estava estirado no final da escada com a língua para fora. Dia começou a cheirá-lo, Mili estava para entrar em estado de choque. Hal ajoelhou-se perto da criatura e o cutucou com um graveto.

— Vish, olha só isso... Tá mortinho da silva.

— F-foi sem querer! Ninguém mandou você me assustar, primeiro eu pensei que fosse um bandido ou então outro Salandit gigante, aí você me aparece com um Popplio  sabe-se lá de onde! O que fazemos agora, Hal?

— Pegue a pá.

— O que você pretende fazer com uma pá? — Mili perguntou, desconfiada.

— O que você acha? Enterrar o pobrezinho. Se bem que a chance do Dia encontrar o buraco e desenterrá-lo durante a madrugada também é enorme, então teríamos de ter que conviver com um cadáver perambulando pela casa... Não é como se fosse novidade para ninguém, afinal, já estamos meio que acostumados com fantasmas na família, não é?

Miliani estava prestes a arrancar seus cabelos. Quando Hal se deu conta de que os olhos da irmã ficaram marejado, percebeu que a situação estava saindo do controle, e se havia algo que ele detestava era ver seu único porto seguro desabar.

— Ah, não... Mili, não faça isso.

— Desculpa — sua voz falhou e foi levada pela brisa do oceano. — De verdade, foi sem querer.

No momento seguinte, o Popplio abriu um dos olhos e deu um salto para trás, esticando as nadadeiras para o alto, como se aguardando os aplausos da plateia. Miliani olhou para o Pokémon que estava vivinho da silva, depois para o irmão que se segurava para não cair na risada, depois para Dia que babava ao seu lado.

— Vocês me enganaram — ela afirmou, mas a ficha ainda não tinha caído e ela precisava de uma confirmação. — Vocês estavam encenando.

Nesse momento Hal não se aguentou de rir. Se houvessem vizinhos ali por perto ele certamente teria acordado todos eles, Popplio se gabava por suas habilidades teatrais e Dia balançava o rabo sem entender o que tinha acontecido.

— Ele não é o máximo? Podia até ser ator! Qual é, estava claro que não tinha acontecido nada, mas você começou a levar tão a sério que eu entrei na brincadeira! — Hal tentou explicar entre seus surtos e falta de ar. — Não ficou brava, né?

— Vocês quase me fizeram chorar.

— Heh, heh. Pelo menos foi engraçado, não é?

O sorriso desapareceu no rosto de Miliani, quando ela subiu para a cozinha e só voltou depois de encontrar seu taco de baseball. Popplio e Hal se entreolharam, e nesse momento tiveram certeza de que estavam encrencados.

O sol escaldante ardia lá fora, eram oito horas de um dia típico em Alola, perfeito para uma tarde com os amigos na sorveteria. Kailani não cansava de bater na porta, já estava ali esperando fazia cinco minutos e, impaciente do jeito que era, não queria esperar nem um segundo a mais. Quando estava para começar a gritar, a porta abriu-se e ela se deparou com Miliani toda descabelada em sua frente, ainda vestida com os pijamas da noite anterior.

— Bom dia, meu lírio do campo! Uau, essa é aquela camisola branca que eu te dei? Lembro do dia que a escolhi, fica muito bem em você.

Miliani não respondeu, seus olhos se fechavam automaticamente, carregados por olheiras e o entusiasmo de alguém que passou a noite em claro. Kailani respirou fundo e foi entrando para preparar uma xícara de café para ela. Ao chegar na sala encontrou Hal que brincava no chão junto do Rockruff e uma nova visita. Parecia que sua irmã finalmente fora convencida de deixar o Popplio passar uma noite na casa.

— E aí, guri! Quem é o seu novo amigo?

Popplio foi pulando até ela, e quando Kailani ajoelhou-se para ficar na mesma altura o Pokémon beijou sua mão num gesto teatral.

— Nossa, e pelo visto ele é dos românticos! A-D-O-R-E-I — disse Kailani, dando um forte abraço na criatura. — Que demais, eu não imaginava que algum dia a Mili deixaria outro Pokémon entrar nessa casa!

— Nem eu — respondeu Hal, olhando para a sala que só estava organizada porque alguém passara a noite inteira arrumando a bagunça e controlando três crianças exaltadas. Miliani agora dormia de pé no encosto da porta da cozinha.

Kailani sorriu e voltou-se para o garoto ao dizer:

— Combinamos de tomar sorvete hoje.

— Aproveitem. O dia está mesmo muito bonito — respondeu Hal, recebendo um empurrão de leve no ombro.

— E acha que eu não levaria meu cunhadinho junto? Sei que faz um tempão que você está morrendo de vontade de passar na sorveteria VaniDelluxe e preparar um belo sorvetão daqueles com direito a calda de chocolate, flocos, guloseimas e quatro bolas de diferentes sabores! Malhei a semana inteira por este momento. Hoje é por minha conta, e vamos levar os Pokémon junto!

Hal abriu um sorriso de orelha a orelha, e Mili soube que não conseguiria dormir naquele dia de qualquer maneira.

Foram necessárias algumas horas de preparo, desde a maquiagem reforçada até a escolha da roupa perfeita para sair. Pentear o cabelo, escolher os biquínis perfeitos, preparar as bolsas e, finalmente, depois de dois copos de café, Mili estava pronta para passar um dia agradável ao lado do irmão e de sua melhor amiga. Dia já carregava a coleira na boca, e Popplio não conseguia conter sua ansiedade. Hal colocou seus chinelões e vestiu só uma camisa e sua sunga. Por um instante lembrou-se de quando seus pais o levavam até a maior cidade de Alola na ilha norte, adorava viajar de barco e sentir o vento na cara, e qualquer lembrança daquela sensação confortava seu coração.

O dia estava perfeito para uma caminhada, não era temporada de turistas, logo poderiam aproveitar cada atração da cidade sem ter que competir por uma mesa e duas cadeiras num barzinho mixuruca. Aos poucos Miliani foi se sentindo renovada, ela sorria muito mais quando estava ao lado de Kailani, as duas eram como o sol e a lua, e Hal não conseguia imaginar sua vida sem elas.

A sorveteria VaniDelluxe tinha mais de cinquenta sabores diferentes, incluindo alguns bem exóticos como gosma de Muk e ferrugem de Klinklang, quem ousou provar diz até que eram deliciosos, e gosma na verdade era só uva enquanto ferrugem algum tipo de creme com flocos. De fato a sorveteria fazia sua fama por atender tanto os gostos tradicionais quanto os diferenciados com algo diferente para cada tipo existente no Mundo Pokémon.

Miliani ficou só no chocolate tradicional enquanto Kailani pegou duas bolas de Sitrus Berry mais leves. Hal misturou doce de leite de Bidoof, baunilha de Reshiram, morango de Ditto e leite condensado de Miltank, sempre que tinha a chance de visitar a sorveteria provava um sabor inédito. Dia estava sem a coleira e mesmo assim não se distanciava, ele ficava andando na rua e chamando a atenção das pessoas que passavam por perto junto do Popplio que adorava se exibir para o público. O ventilador no teto não era o suficiente para aliviar o calor, Kailani sentia seu corpo suar, mas quando olhava para a amiga ao seu lado só conseguia pensar no quanto aquilo era sexy e em como gostaria de estar abraçada a ela.

— Já imaginaram se nós vivêssemos em uma região fria como Sinnoh? — perguntou Miliani. — Eu estava lendo numa revista outro dia que estão construindo um hotel de luxo chamado Deluxe Heart na cidade de Hearthome, eu gostaria de ter a chance de visita-lo algum dia da minha vida.

— Não acho que eu aguentaria viver sem o calor — respondeu Kai. — E tem mais, não tenho vontade alguma de deixar Alola. Adoro o sol, adoro vestir roupas curtas, adoro o povo  hospitaleiro daqui e fazer programas como esse. Se vivêssemos em um lugar que neva metade do ano, ninguém iria tomar sorvete! Seria melhor ficar em casa debaixo do cobertor trocando carícias.

— Eu acho que nós faríamos um baita sucesso — brincou Hal. — Digo, olha só para a nossa pele! Já estou com marcas de camiseta só de vir pra cá. Bem que eu devia ter passado protetor solar em casa, como a Mili falou...

Os três riam e ficaram à toa naquela tarde monótona quando dois surfistas também chegaram ao VaniDelluxe. Eles se sentaram em uma mesa ao lado das garotas, e por um breve instante Mili trocou olhares com um deles. Ele era bem alto e bonito, com cabelos loiros e olhos azuis, de uma beleza típica dos turistas; estava sem camiseta e tinha um peitoral definido, sem contar que andava por aí de sunga vermelha só para chamar a atenção mesmo. Ele era tão bonito e atraente quanto um salva-vidas que Miliani tivera alguns rolos no verão passado. O outro amigo praticamente desaparecia ao seu lado. Sua atenção só foi desperta quando Kailani fez um estalo com os dedos.

— Ei, seu sorvete tá derretendo.

— Ah! — Mili enfiou a colher inteira na boca e sentiu sua garganta congelar.

— Eita, vai com calma, linda! Desse jeito vou ficar com inveja — Kailani riu, principalmente depois que sua amiga fazia caras e bocas. — Vou comprar uma água para você e já volto.

Kailani havia se distanciado. Hal comia seu sorvete, mas não prestava muita atenção no que acontecia ao redor. Mili decidiu que daria uma espiada por trás da franja, e quando virou-se notou de imediato que o turista mais atraente olhava para ela. O contato visual foi um acidente. Má ideia. O outro rapaz riu e coçou a barba, mas foi o loiro quem ofereceu seu refrigerante para ela.

— Melhor você tomar isso antes que sua garganta congele.

— Obrigada — Miliani agradeceu e bebeu tudo numa só golada.

— Ei, acha que eu e meu amigo poderíamos nos sentar com vocês?

— É claro. Quer ajudar para juntar as mesas?

— De maneira alguma, uma dama como você não precisa fazer força!

Aconteceu rápido demais. Dois estranhos agora se uniam a eles e falavam sobre suas vidas, o que faziam na região e como adoraram Alola na primeira vez em que estiveram lá. Hal observava tudo, quieto. Quando Kailani voltou com a garrafa de água na mão, viu que sua amiga  estava perto demais de um cara sarado sem camiseta que parecia bem preocupado em fazê-la sorrir e sentir-se à vontade. Eles mal tiveram tempo de se apresentarem quando Miliani viu nos olhos da amiga que eles não eram bem vindos.

— Oi, Kai! — ela ficou de pé no mesmo instante. — Espero que não se importe, mas convidei estes dois rapazes para se unirem a nós.

— É. Tá. Bacana. — a amiga respondeu com um sorriso forçado. — Quem são vocês?

— Putz, que vacilo, não nos apresentamos! — disse o rapaz loiro. — Eu sou o Dylan, e esse é meu mano Izrael “IZ”. Nós somos nativos de Hoenn e estamos aqui de férias, Alola é a melhor região do mundo pra pegar umas ondas!

— É irado — respondeu o sujeito que tinha cabelos bem longos que desciam pelo seu rosto e se misturavam com a barba malfeita. Ele falava de forma bem lenta e com sotaque carregado, fazia gestos estranhos com a mão e vivia balançando a cabeça, como se estivesse viajando em outra dimensão.

— É. Irado. — A voz de Kailani saiu seca. — Tá aqui sua água. Vou ao banheiro.

Ela praticamente enterrou a garrafinha na mesa e saiu no mesmo instante. Dylan deu uma risadinha e Iz riu só para acompanhar enquanto Mili se desculpava pelas atitudes da amiga.

— Ela é bem esquentadinha, né?

— Digamos que seja só um pouco... ciumenta — respondeu Mili, ajeitando o cabelo atrás da orelha. — Mas não se preocupem com isso, se tiverem a chance de conhecê-la vão ver que ela é um amor!

— Então seu nome é Miliani? Desculpe a apresentação informal, é que dá para ver de longe esse seu cabelo prateado, e eu nunca vi uma garota com a cor assim! Você pinta ou é natural? Parece até uma celebridade. Adorei o contraste com a sua pele.

— Achei irado — repetiu Izrael, balançando a cabeleira.

Mili sentiu o rosto ficar tão vermelho quanto uma maçã de tanta vergonha. Adorava quando falavam de seu cabelo.

— Bem, a história é meio boba, vocês não iriam querer ouvir...

— Eu ficaria ouvindo você falar o dia inteiro, se pudesse.

Hal engasgou com o sorvete e teve que levantar-se para não vomitar. Dylan deu alguns tapinhas em suas costas.

— Vai com calma, pivete! Qual é o seu nome?

— É Hala Kameahookohoia, moço. Mas todo mundo me chama só de Hal mesmo.

—  Caramba, como é que você lembra de escrever tudo isso na prova? Hah, hah. E você é o que exatamente dessa formosa princesa de lindos cabelos prateados?

— Marido.

Dylan e Izarel começaram a rir enquanto Miliano corava, mas dessa vez de vergonha. Ela trocou um olhar severo com o irmão, como se pedindo para que ele parasse com a brincadeira.

— Saquei, então você curte as mais velhas, não é? Um pouco de experiência é sempre bom.

— Ele é só meu irmão mais novo — respondeu Mili com pressa, como se tivesse o intuito de deixar bem claro que não tinha um relacionamento com ninguém. Pelo menos até agora.

— Na verdade eu sou o segurança delas — Hal entrou na brincadeira. — Pode não parecer, mas eu tenho a força de um Tyranitar, corro rápido como um Arcanine e nado como um Gyarados!

Dylan bateu na mesa e esticou a mão para ele:

— Maninho, eu já gosto de você! Precisamos surfar qualquer dia desses!

— Surfe é o meu segundo nome.

— Pensei que fosse Kameahookohoia — Izrael coçou sua barbicha. —  Mas Hala Surfe também é irado.

Emendando no assunto, Dylan afastou-se da mesa e ergueu sua perna direita sem muita classe, só para mostrar uma cicatriz que ele tinha mais ou menos na altura da panturrilha e que subia quase até sua coxa.

— Tá vendo isso aqui? Essa cicatriz é um troféu, mano. Uma vez eu estava surfando nas praias em Hoenn e fui atacado por um Huntail das profundezas. Ele me mordeu e quase arrancou a minha perna, tive que tomar quase cinquenta pontos, e o desgraçado inclusive deixou um dente preso na minha pele, dá uma olhada!

Dylan ergueu seu colar e mostrou um dente de Huntail preso na ponta. Um Deep Sea Tooth autêntico. Hal reconheceu aquela preciosidade no mesmo instante, e tanto ele quanto Mili se encantaram com a história.

— Minha nossa, você poderia ter perdido a perna de verdade? — disse a irmã. — Assim você nunca mais poderia surfar!

— Podia mesmo. Mas se tivesse mesmo acontecido, acredite, eu daria um jeito. Poderia ter sido um Sharpedo, mas quer saber? Se fosse, eu teria acertado ele bem no nariz. Não existe Pokémon selvagem que me impeça de pegar uma boa onda, onde haja um desafio eu estou lá para superá-lo!

— Posso ver seu colar? — perguntou Hal.

— Claro, maninho.

Eles conversaram por tanto tempo que nem se deram conta de que Kailani demorava para voltar. Talvez ela tivesse saído para dar uma volta e tomar um ar fresco, e quando Mili pensava em ir atrás dela, percebia que estava tão entretida que jamais poderia deixar alguém tão bacana quanto Dylan ficar sozinho. E ele não era gentil apenas com ela, ao notar que Hal estava fissurado pelo dente de Huntail, fez-lhe uma oferta irrecusável.

— Por que não fica pra você, cara?

— Eu não poderia — respondeu Hal. — Esse dente é um troféu seu, são memórias. Não podemos abandonar memórias assim tão facilmente.

— Mais do que essa cicatriz que vai me acompanhar pro resto da vida? É só um dente, parceiro, se prometer que vai guardar direitinho creio que fará melhor uso do que eu.

Hal olhou para Miliani, como se pedisse permissão para aceitar a oferta.

— Com uma condição — Dylan abriu uma ênfase. — Só se sua irmã me convidar para jantar qualquer dia desses. Que tal amanhã?

Mili prendeu a respiração e Hal caiu na risada. Por mais que achasse aqueles dois bem esquisitos a princípio, estava começando a gostar deles. Izrael balançou a cabeleira e concordou.

— Pô, mano, um jantar ia ser irado!

Dylan deu uma forte cotovelada nas costelas do amigo.

— Quero dizer, pô, mano, tô ocupadão amanhã... Nem vou poder ir. Foi mal.

— Perfeito! Só nós dois num jantar ao luar, faço questão de levá-la ao restaurante mais caro em Alola!

— Mas eu não posso deixar o Hal sozinho em casa — respondeu Mili.

— Ele não pode ficar com seus pais uma única noite?

— Nossos pais morreram.

O silêncio foi constrangedor. Até Izrael que era meio lento percebeu que era hora de ir embora. Dylan levantou-se, deu dois tapinhas no ombro do garoto e pediu que ele ficasse com o colar do dente de Huntail até que se reencontrassem. Em seguida, olhou para Mili, e naquela época não haviam celulares nem nada para que eles pudessem manter algum tipo de contato. Dylan usou um papel de guardanapo mesmo para anotar alguma mensagem secreta, e depois a deixou na mesa para que Miliani lesse com calma e pensasse com carinho no assunto.

— Bem, então... eu acho que a gente se fala depois —  Dylan deu uma piscadela.

— Espere! Você vai continuar na ilha até quando? — ela perguntou.

— Até o fim do mês. Mas dependendo da ocasião posso estender minha estadia.

Dylan olhou para Hal e bagunçou seus cabelos mais uma vez.

— Cuida bem do meu amuleto, maninho. Que ele traga tanta sorte para a sua vida quanto trouxe na minha.

Assim que os dois foram embora, Miliani imediatamente abriu o guardanapo para ver o que estava escrito. Hal tentou espiar de relance, mas sua irmã escondeu na mesma hora.

— O que ele falou? O que ele falou?

Seus lábios tremiam e seus olhos estavam perdidos.

— Disse que adorou me conhecer. E para eu encontrá-lo perto nas pedras na Rocha do Wailmer.

— Quando? — Hal a pressionou.

— Hoje.

— Quem?

...e dessa vez era Kailani quem falava, que havia acabado de retornar. Miliani amassou o papelzinho e jogou-o no prato, tentando disfarçar.

— Onde você esteve esse tempo todo?

— Eu estava sentada duas mesas atrás naquele cantinho.

— Ah, então... você ouviu tudo?

— Eu lá tenho cara de quem quer se meter nesse assunto? Você acha mesmo que sou ciumenta? Nãooooo, imagina, eu, hein... A vida é sua! — respondeu Kailani de braços erguidos, dando as costas e falando de uma maneira claramente aborrecida. — E a propósito, me passa a comanda do Hal para eu pagar a conta dele. Você paga a sua.


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