Minha Vida em Uma Noite escrita por Rayon Jackson


Capítulo 2
Capítulo 2




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Uma e meia da manhã. Chorando. Muito. Evrelly não se calava. Sinceramente, eu não sabia o que ela queria agora, já que tinha tomado uma mamadeira inteira há meia hora atrás, dormindo instantaneamente. Logo após, eu a coloquei no colchão que tinha posto na sala, no chão, pra não ter o perigo dela cair, e fiquei no sofá. Ela tinha chorado algumas vezes, e geralmente estava com fome, mas e agora? 

Me levantei como se não tivesse descansado nada (e realmente, não descansei), liguei a luz e peguei outra mamadeira, bocejando no processo. Voltei e tentei enfiar a mamadeira na boca dela, mas ela simplesmente estapeava o objeto enquanto chorava. 

 – Vamos Ivi, papai quer dormir! – Ivi? É, eu estava com muito sono mesmo. 

Foi só então, depois que meus sentidos aguçaram, que senti um mau cheiro. Olhei pra Evrelly, e depois pra sua frauda. 

 – Merda. 

Era merda mesmo. Desde quando ela não era limpa? Talvez no hospital, mas nada depois disso. 

 – Ok, – suspirei – então vamos lá. 

Peguei Evrelly por entre seus braços e a carreguei bem longe de mim. O fedor de sua frauda estava quase insuportável, e se espalhou por toda a casa. Estranhamente, Evrelly parou de chorar e ficou me fitando, como se tivesse curiosa com o próximo passo que iria tomar. 

 – Ah, não me olhe desse jeito! 

Levei ela pra pia da cozinha e, quando estava prestes a colocá-la, parei. Sério mesmo que iria lavar cocô na pia em que lavava as louças? Isso era no mínimo nojento! Não, eu não podia fazer aquilo. Mas onde, então, se não tinha uma banheira? Chuveiro. Era o único jeito. 

Levei ela pro banheiro, mas não tinha como ligá-lo, já que minhas mãos estavam ocupados com ela, e então, dei um pequeno mata-leão na coitada. Rapidamente girei o registro, e debaixo da reclamação de Evrelly, voltei a segurá-la direito. A água caía enquanto tirava a frauda de Evrelly, (que por sinal estava lotada de cocô e xixi) e com uma careta, joguei dentro do lixo. 

 

Ok. Primeiro passo tinha ido. A água do chuveiro estava forte, e não considerei esse fato (me arrependo profundamente) então só coloquei o bumbum da bebê contra a água e deixei fazer o resto. Fez. Espalhou merda pra todo lado, principalmente em mim. 

 – Droga! Que nojo! Meu Deus! 

Estranhamente Evrelly começa a rir, mas por estar enojado demais com o ocorrido, simplesmente entrei debaixo do chuveiro com ela (a bagunça já estava feita mesmo!) e então, comecei a lavá-la direito. 

Depois do banho, enxuguei e deixei-a enrolada no lençol, deitada no colchão, só depois tirando minha roupa molhada e trocando por outra. Não fez nem dois minutos, e Evrelly abriu o berro, como se tivesse apanhando. 

 – Ah meu Deus, o que foi agora? 

Eu estava cansado, molhado, estressado e tudo o que queria era dormir, mas aquela garotinha simplesmente não deixava! Já estava desesperado, ainda bem que ia se desfazer dela a algumas horas, e minha vida voltaria a mesma rotina chata de sempre. Peguei-a nos braços e a olhei. Evrelly parou de chorar, e então, esfregou os olhinhos, sinal que estava com sono. Aninhei-a no meu peito e simplesmente comecei a balançá-la, torcendo que ela fosse dormir. E graças a Deus, ela foi, depois de brincar um pouco com minha boca. Será que ela só queria um pouco de carinho? Será que ela sabia que tinha sido abandonada pela mãe? Aquela criança teria uma vida cheia de amor? Eu não sabia. Deixar uma bebê assim em qualquer orfanato era o mesmo que não se importar com ela. Mas o que eu podia fazer? Adotá-la? Deitei no colchão com ela e fechei os olhos. Se eu disser que fiquei pensando no assunto, então estou mentindo, pois assim que eu deitei, dormi como uma pedra. 

 

 

Acordei com alguém batendo na porta. E um dedinho sendo enfiado no meu nariz. Afastei a mãozinha e só então percebi que era Evrelly, me olhando (e me babando) enquanto brincava com meu rosto (acho que ela amava meu rosto) 

 – Bom dia bonitinha. Que horas são? 

Peguei meu celular, e vi que eram nove horas da manhã. Embaixo do horário, havia uma notificação de dez ligações de Alice, e atrás, uma foto de nós dois que usava como tela de bloqueio. 

 – Jack? – a voz transpassa a porta – Jack, tá aí? 

 – Vou já! 

Me ergui com Evrelly, e ainda esfregando os olhos, abri a porta. Do outro lado, estava Alice. Ela usava uma blusa que caía pelos ombros (não sei ao certo como se chama essa peça), uma calça Jeans e uma chinela rasteirinha. Com o mesmo óculos de sempre, ela deixou duas mechas caírem sobre ele, enquanto o resto do cabelo era preso em um rabo de cavalo. 

 – Cadê a bebê gotosa da titia? – fala com uma voz geralmente usada pra falar com bebês. 

 – Titia? Não quer dizer ‘mamãe’? 

Ela me lança um olhar assassino enquanto pega Evrelly. 

 – E como foi a noite? – pergunta ela. 

 – A noite foi uma criança. Literalmente. Ela não me deixou dormir. 

 – Percebi. Você tá com uma cara horrível. – ela cheira Evrelly – Você passou seu sabonete nela? 

 – E você queria que eu passasse o quê? Lama? Ela tava toda cagada, tive que fazer alguma coisa. 

 – Ela pode ter uma alergia. 

 – Pelo que eu me lembre, você me deixou com ela. Sozinho. 

 – Você sabe que eu não pude ficar. 

 – Então não reclame do que eu fiz. 

 – Você tá muito estressado. Tá de TPM? 

 – O que você acha Alice? – comecei a aumentar a voz – Eu não dormi, passei a noite toda preocupado com ela, pensando em tudo o que eu estava fazendo se era certo ou se uma hora iria matá-la sem querer, e agora tô com uma dor de cabeça horrível, vou faltar trabalho hoje, e você chega e a primeira coisa que diz é algo que eu fiz de errado? Sério? Nenhum elogio? Ela tá viva, não tá?... 

Alice me olha espantada. Evrelly começa a chorar. E então, um arrependimento cai sobre mim. Eu nunca, nunca tinha falado daquele jeito com ela. Todas as nossas brigas, se é que tínhamos uma, eu fazia de tudo para ficar calmo. Mas naquela ocasião, eu me senti como se tudo o que tinha feito não valesse nada. 

Respirei fundo, tirei Evrelly de seus braços (pois Alice não conseguia acalentá-la) e então a aninhei nos meus. 

 – Xiii, xiiii. Desculpa, desculpa, papai não quis gritar. 

Eu estava com meu emocional à flor da pele. Não bastava todos os meus problemas pessoais, agora tinha que lidar com tudo aquilo. Não sabia se ia aguentar. De repente, sinto os braços de Alice envolverem meu corpo, e então, ela me dá um abraço apertado. 

 – Me desculpa Jack. Não queria te aborrecer. Não sei o que você passou com ela nessa noite, e... Sinto muito. 

 – Tá. Olha, me desculpa também. – passei meu braço por cima do ombro dela a apertei-a ainda mais – Não devia ter gritado. 

 – Tá mais calmo? 

 – Sim... 

Estranhamente, Evrelly nota o ato de carinho entre eu e Alice, e então, tenta dá um abraço em nós dois, colocando sua mãozinha no rosto de Alice. Éramos como se fossemos uma família. 

— Ok, tá ficando estranho. – falei pra quebrar o clima e Alice se afasta – Segura ela que eu vou me arrumar. 

Dito isso, Alice pega Evrelly e começa a brincar com ela, jogando a coitada pro alto (que aparentemente ela gosta) e parto para meu quarto. 

 

 

Não sei como diabos encontramos um orfanato, mas encontramos. O problema era que, pra onde eu olhava, não reconhecia nada; nem uma rua, ponto de referência ou mesmos as pessoas. Estávamos em uma outra cidade ou eu tinha ficado fora da sociedade a tanto tempo que não reconhecia a minha própria? 

 – É por aqui. – fala Alice. 

Mas, ela já conhecia o caminho? Ah, não importa. 

Continuei sendo guiado por Alice enquanto eu levava Evrelly nos braços, que agora vestia um vestido com estampas de bolinhas (não faço idéia de onde conseguimos a roupa) e finalmente, encontramos o orfanato. Assim que entramos, vejo uma mulher atrás do balcão, (uma senhora na verdade, com óculos redondos e um coque mal feito nos cabelos grisalhos) e nos dirigimos até ela. 

 – Bom dia, em que posso ajudar? – apesar da aparência, sua voz não era tão velha assim. 

 – Queremos deixar essa criança aqui. – falei, colocando Evrelly sentada no balcão. 

 – Ah, – ela nos olhou com um olhar de repúdio – fizeram besteira e agora não querem a consequência não é? 

 – Não é isso! – Alice se explica – Achamos ela no lixo e... 

 – Querem abandonar a coitada aqui. Não é problema de vocês mesmo! 

Nossa! Aquela mulher gostava mesmo de jogar coisas na cara dos outros. 

 – Não é isso – tomo a palavra – a gente só não sabe o que fazer com ela. Aqui pelo menos ela estará segura. 

 – E porque não adotam ela? 

Fiquei pensativo e olhei para Evrelly. A garotinha (que agora estava maior do que lembrava, e conseguia até ficar sentada sozinha) me olha de volta e faz beicinho, pronta pra chorar. Só então percebi que a gente estava deixando ela como se deixasse qualquer caixa nos correios. Eu já tinha se apegado a ela, e por mais que tivesse um pouco de dificuldades, consegui cuidar dela por uma noite. Porque não a vida toda? 

 – Jack? 

 – Ah, oi. 

 – Você quer fazer isso? 

 – Isso o quê? 

 – Adotar a Ivi. Se você quiser, eu quero. 

 – Peraí, como assim? Você quer ser a mãe dela? 

 – Só se você quiser ser o pai. 

 – Tá sabendo que a gente tem que casar pra isso né? 

 – A gente casa. Sem problemas. 

 – Na verdade vocês não precisam casar – diz a mulher – é só registrar como os pais adotivos dela. 

 – A gente precisa. – falei – É que... Você não vai entender. – olhei pra Alice – tem certeza Alice-chan? 

 – Tenho. – ela responde com um sorriso meigo no rosto. 

Peguei Evrelly de volta nos braços e a abracei, junto com Alice. 

 – Nesse caso, vamos adotar ela. – falei. 

 – Ok, vou preparar os papéis. 

Olhei pra Evrelly e depois pra Alice, que fazia cosquinhas na barriga da garotinha. 

Evrelly agora era oficialmente minha (nossa) filha. 


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