Perdida escrita por Echerrevia


Capítulo 2
Encrencada


Notas iniciais do capítulo

boa leitura!!
o título era outro, mas não podia, enton



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ENCRENCADA

E o cardápio da manhã é: dor de cabeça empanada com olheiras à milanesa. Encarei aquele teto úmido e nojento. Respirei fundo, sentindo o cheiro de mofo em todo o ambiente.

Orochimaru é um nojento que realmente precisa fazer uma limpeza em seus modos de viver, pra começar pela quantidade absurda de LSD que consumiu no dia anterior. Saí do quarto que estava e caminhei por um corredor um pouco mais iluminado, desci as escadas seguindo o cheiro de ovos mexidos e uma música contagiante.

— Bom dia. — Falei encarando o carpete encardido.

Cruzei os braços, bocejei, passei a mão no rosto e peguei meu celular na bolsa pronta para encontrar milhares de ligações de Sakura e Sasuke. Se bem que, eu poderia aproveitar o tempo sem eles e... esquece, ficar na casa desse professor bizarro? Eu não fico mesmo!

— Que porra. — Bati o aparelho na mão, apertei o vidro, xinguei o telefone e olhei para Orochimaru, vendo-o desfrutar de uma xícara de café enquanto se remexia ao som da música que tocava, e sim aquela foi uma cena perturbadora.

— Preciso ligar para meus pais.

— Melhor não. — Disse e cantarolou. — Hey everybody, we don’t have to live this way.

Ergui uma sobrancelha para ele esperando que ele entendesse meu pedido de uma breve explicação; e que, se possível, não fosse resumida a um: estou te seqüestrando.

— Estamos em 2016, querida.

Como eu fui me enfiar na casa de um professor maluco, pedófilo e drogado em plena terça-feira?! Passei a mão no rosto e me virei pronta para ir para casa, ouvi os passos de Orochimaru me seguindo e logo tratei de correr para fora da casa. Corri pela calçada olhando para trás a cada dez segundos vendo que o professor louco de Química ainda me seguia.

Atravessei a rua e procurei ficar o mais distante possível daquele cara medonho, até que esbarrei em um carro que saía da garagem. Era um carro antigo e vermelho. O cara me xingou e então saiu com seu carro vermelho de marca levemente familiar. Um grupo de mulheres vinha correndo em direção oposta, elas conversavam e usavam roupas diferentes das que eram famosas ou normalmente vendidas.

— Vamos, Sarada! — Orochimaru me chamou. — Eu te levo até seus pais.

Parei de andar e me virei para ele.

Cruzei os braços e ergui uma sobrancelha, observando aquele professor de trejeitos duvidosos, ele se aproximou e sorriu.

— Com uma condição.

Dependendo do que ele iria me falar, eu estava pronta para invadir qualquer uma das casas desse bairro e chamar a polícia. Soltei meus braços e ergui os ombros:

— Você precisa fazer o que eu mandar.

Era o que faltava, não é mesmo?

Passei a mão no nariz e pus as mãos na cintura.

— Escuta aqui, Orochimaru, eu não vou fazer suas vontades, apenas quero ir para minha casa.

— Seus pais têm 17 anos e estarão entrando em aula em 20 minutos, querida.

Ele estava muito chapado. Suspirei.

— Cara, não cheira tão cedo. — Aconselhei e peguei em seu ombro. Franzi o cenho e tentei passar alguma coisa de conforto. — A dor de cabeça vai ser enorme quando o efeito passar.

Afastei-me e continuei a andar pela rua, percebendo que ela era sem saída, fazendo uma volta de casas. Eu tive que voltar tudo que andei, ocasionando em um esbarro em Orochimaru... de novo.

Ele estava parado, cantarolando a música do rádio de antes, quando me viu, perguntou:

— Você usa?

— De vez em quando, e você?

— Parei com 48. — Respondeu e meu senso de perigo entrou em ação.

— E qual sua idade?

— Aqui? 40. — Ri e entrei na loucura de drogas com ele.

— E em minha época?

— 48.

Sabendo que meus pais tem quarenta e que nos efeitos alucinógenos de Orochi eles têm dezessete, não tem muito sentido meu professor ter envelhecido oito anos em um período de vinte e quatro anos. Definitivamente, preciso ir embora daqui e avisar aos diretores do colégio que o professor necessita urgentemente passar um bom tempo em uma clínica de reabilitação.

Sem muito palavreado para ser usado, afirmei:

— Puta merda, você ta muito chapado.

Caminhei para o fim da rua, ele ainda me seguia cantando a mesma música que já me começava a ser irritante. Olhei o nome da rua na placa e tentei lembrar se estava muito ou pouco perto de minha casa, mas não fazia ideia de que rua era aquela, qual era o bairro e suspeitava estar fora de minha cidade.

Era o que realmente me faltava: ser sequestrada por meu professor! Sempre soube que ele era um louco psicopata. Aquele fetiche com meu sobrenome sempre foi estranho.

Puxei meu celular da bolsa e tentei ligá-lo, mais uma vez, sem vitória. Argh, que ódio! Nunca pensei que fosse dizer isso, mas como eu queria que meus pais me encontrassem agora.

Caminhei pela rua pouco movimentada e encontrei um telefone público, aproximei-me e coloquei algumas moedas, disquei o número de casa:

Número chamado não existe. — Disse a mulher de voz robótica do outro lado da linha.

Eu estava muito fodida. Muito. Eu não queria ser eu. Fechei meus olhos e coloquei o telefone no gancho.

— Me permite?

Afastei-me do telefone e vi Orochimaru digitar alguns número, ele sorriu para mim e me entregou o telefone, ouvi tocar uma, duas, três vezes para então uma voz sonolenta atender.

Aqui já começa estranho, se o número que Orochimaru discou for o de meus pais, a essa hora eles já deveriam estar muito bem acordados. Ainda mais se tiverem percebido que estou desaparecida.

— Pai? Mãe? — Relutante, perguntei.

Ligou errado, garota. — Percebi que o garoto iria desligar, então adiantei-me.

— Espera, Sasuke? Sakura? Vocês estão aí?

Apertei o telefone tendo um pouco de esperança que a voz preocupada de Sakura aparecesse naquela linha e perguntasse desesperada onde eu estava, banhando-me pela raiva em ouvir sua voz e o alívio em ir para casa e tomar um banho. Como estou perdida em minha própria cidade?

OH, SASUKE! LIGAÇÃO PRA VOCÊ!

Muito provavelmente eles haviam chamado todos os familiares, amigos e até os mendigos para se hospedarem lá em casa após uma corrente de oração. Meus pais são ridículos! Por um momento tive até raiva de mim mesma por ter desesperado e ligado para eles, seria mais inteligente ligar para a polícia! De lá, eles se viravam comigo.

Quem é?

A voz esquisita era similar a de meu pai, talvez a linha não estivesse boa e modificasse um pouco a voz dele.

Fechei os olhos aliviada e mandei:

— Pai, vem me buscar.

É alguma brincadeira do Naruto? — Perguntou cansado.

Imediatamente minhas sobrancelhas ergueram-se e o desespero prevaleceu em mim, olhei para Orochimaru e o vi balançar o corpo olhando para os carros. Era alguma pegadinha, não era?

Garota, passa para o idiota, agora!

Bati o telefone no gancho e olhei para Orochi, minha visão ficava turva, meus pais estavam fazendo isso de propósito, tinha certeza!

Respirei fundo e apertei meus cabelos com minhas mãos.

Eles me deserdaram foi isso? Resolveram me dar um chá de sumiço? Fazer-me sentir falta deles? É uma vingança idiota? Se for eu fujo de casa e foda-se esses miseráveis. Sério, eles que se fodam!

— É uma pegadinha com minha cara, não é? — Questionei ao homem que balançava os cabelos olhando para o céu.

— Não. — Respondeu e sorriu.

— Orochimaru, me leva até meus pais.

— Vai fazer o que eu pedir. — Repetiu.

— QUE PORRA! — Bati o pé e procurei um táxi que passava na rua.

— Sarada, eu te trouxe ao passado, acidentalmente.

Passei as mãos no rosto e olhei para ele, tentando acompanhar aquela porção louca e obesa de drogas que ele tentava me passar.

— Eu faço isso desde meus 48 anos, quando descobri o modo de viajar no tempo. Foi por pura vaidade, confesso. O medo de morrer foi mais alto e dediquei alguns anos de minha vida para a construção da máquina perfeita, que me fizesse viajar no tempo e continuar com essa mesma aparência.

“O sentimento de lentidão, logo no inicio do processo, é devido ideia de que o passado é lento, antigo, já explorado. Vamos dizer que quando você tenta lembrar coisas que já aconteceram, no passado, sua mente demora a lembrar. O oposto acontece nas viagens ao futuro, elas são rápidas porque ele acontece rapidamente, dependendo de cada uma de suas ações no passado, ou seja, vêm sendo construído de acordo a velocidade de seus pensamentos e ações. Entende?”

— Não.

— Imaginei.

Estava confusa e queria vomitar.

— Deve estar se perguntando como fica o tempo no futuro, bom, a mesma coisa que em dias aqui. Para voltarmos preciso encontrar um alguns ingredientes raros, enquanto isso vou lhe pedir um imenso favor, certo?

Era muita loucura para processar, mas concordei aceitando o risco; e ao ser lançado o desafio eu vi que estava pagando todos os meus pecados.

Meu direito de barganha veio com mais provas de que aquele era mesmo o passado, para meu infortúnio Orochimaru não estava brincando: a televisão, aquele negócio chamando rádio e o que a mulher da transmissão dizia, o jornal impresso e uma coisa chamada fechadura, os grandes computadores e o mais incrível: relógios de ponteiro.

Claro que duvidei, aquelas coisas ainda podiam ser vistas em museus ou na casa de meus avós, mas quando ele me disse que em vinte minutos poderia conhecer os jovens Sasuke e Sakura, eu tremi.

Era muita informação, muita!

Orochimaru me deu algumas roupas e me mandou para o banheiro me arrumar, disse que o chuveiro elétrico já estava no quente e saiu sem me explicar o que era chuveiro elétrico quente, deixando-me temerosa por um banho que pudesse me fazer ter um choque quente... ?!

Usei meus produtos higiênicos que trago sempre na mochila (escova de dente, um hidratante para mãos e álcool em gel) e joguei na pia minha bolsinha com algumas maquiagens, resumia-se a pó e um brilho labial, saí amarrando meu cabelo.

Confesso que aquela roupa não era de meu agrado, calça jeans nunca foi a minha peça preferida e uma regata com um casaco por cima e All Stars muito menos. Enfiei minha mão no bolso do casaco e sentei na banqueta da cozinha olhando para Orochimaru.

Eu vim parar no passado, vou conhecer meus pais com minha idade e ainda estudar com eles e, para completar, morar com meu professor esquisito. Ele deve estar me drogando e me mantendo em cativeiro, fazendo-me ter alucinações. Não é possível.

— Seu nome será Sara Maro.

— Maro? — perguntei franzida, ele concordou.

— Meu sobrenome, Maro.

Entortei o rosto e neguei:

— Não faz parte de seu nome? OrochiMaru?

— Não, não, meu nome é Orochi Maro.

— Orochimaru.

— Sim, Orochi Maro.

Ergui as mãos e desci do banco desistindo de tentar entender esse cara.

Orochi Maro ou Orochimaru, levou-me para a garagem e entramos em um carro prateado diferente. Fiz questão de analisar todos os botões daquele automóvel e ousar apertar os que eu não fazia ideia do que significavam, e no final, recebi muitos tapas na mão e fui concebida a um passeio pela cidade totalmente diferente da minha, e ainda uma mão esquerda vermelha.

Se estou mesmo fazendo parte de uma pegadinha preciso admitir que meus pais precisaram de muito trabalho para montar toda essa cidade, os carros e as pessoas. Enquanto Orochi dirigia eu me senti em um filme, todos me olhavam, por trás das telas - ou vidros - eu era o espetáculo e todo o show era sobre minha confusão. A cada rua que entrávamos, a cada casa arquitetada diferente que eu via, eu tentava compreender a finalidade de toda aquela pegadinha.

— Chegamos. — Suspirou aliviado.

O prédio era o mesmo da escola. Aquela estrutura velha e sem graça de três andares e janelas vitorianas que mais me pareciam o cenário perfeito para um filme de terror, o meu filme de terror. Ainda esperançosa de que estava drogada, puxei as mangas do casaco e procurei qualquer sinal de heroína, alguma manchinha vermelha ou alaranjada, mas não tinha nada, e o que havia ali eram espinhas inúteis e as marcas dos apertos de Bolt.

Bolt... Como eu queria que ele estivesse aqui. Aguentar essa loucura de estar 24 anos atrasada, na época de meus pais com minha idade, ou melhor, drogada em um cativeiro por meu professor tendo altas alucinações ou sendo parte de uma baita pegadinha. Deus me leva.

Desci do carro e enfiei as mãos nos bolsos do casaco, Orochi caminhou ao meu lado e passou mais algumas informações. Bom, como se não fosse mais esquisito eu, aqui, nesse mundo drogado, eu ser um ovócito e um esperma, eu seria a sobrinha problemática de Orochimaru. Sobrinha. Cogitar ter ele como parente é brochante.

Entramos no colégio e varri o local com meus olhos, curiosa e nervosa.

Então, o temor de estar mesmo no passado me invadiu e as perguntas sobre eles nessa época foram inevitáveis: Será que meus pais eram legais? Nessa época eles já namoravam? E os pais de Bolt? Naruto eu tenho certeza que era lindo e muito gente boa, eu tenho uma queda por ele, nossa. E a Hinata? Ela é adorável, e nesses tempos?

Não, nunca vi fotos de meus pais mais jovens, meu pai disse que guarda em um HD, este que nunca me interessei em ver.

Caminhamos para a coordenação e conversamos com o secretário que mascava um chiclete nos dando a vista deliciosa da goma mergulhada na saliva.

— Genma, esta é minha sobrinha. Fiz a matrícula dela ontem a tarde.

Ele murmurou algo e saiu da bancada, voltando minutos depois com uma porrada de apostilas, uma chave e um papel com cheiro de tinta fresca.

— Suas apostilas. A chave de seu armário. Seu cronograma, esses são os números das salas. Boa aula.

Orochimaru sorriu e disse:

— Boa sorte, você sabe as salas.

Passei os olhos pelo cronograma e percebi que tudo continuava a mesma coisa, em vinte e três anos nunca mudaram as ordens das salas. Bando de preguiçosos, ao menos passassem uma tinta nessas paredes grudentas.

Caminhava pelos corredores lotados em busca do armário 375, nem para Orochimaru vir me ajudar a carregar essa pilha de livros, mas nãoooooo, “Eu sou Orochi Maro”.

Como se não bastasse aquela porra não abria. Chutei o armário e vi a porta soltar, enfiei as coisas dentro e peguei a apostila de Inglês e Artes, as emocionantes primeiras aulas que teria naquele dia.

Alguém me mata.

Esperei o sinal tocar para ir para a sala de Língua Inglesa e aproveitei para sentar em um banco e tentar acordar do pesadelo ou encontrar as câmeras da piada sem graça ou tentar, inutilmente, fazer meu telefone voltar a funcionar. Sacanagem da porra, hein? Possivelmente alguns anos no passado e esse pedaço de vidro digital não funciona.

Os adolescentes iam e vinham, conversavam, riam, andavam em bandos. Um fato que não muda é a separação dos bandos. Os góticos juntos, emos próximos, os atletas, líderes de torcida, hippies e assim se segue. Lembrei de meus pais e me perguntei qual seria o bando deles, e acima de tudo, se teria lógica aqueles chatos de galocha, serem adolescentes legais. Juntei minhas mãos e olhei para o céu.

— Por favor, seja uma pegadinha.

Era só o que eu pedia, é sério. Isso não pode ser real. Eu preciso estar em um sonho.

Abaixei meu rosto, belisquei meu braço, fechei meus olhos e esperei que quando os abrisse, estivesse em algum lugar deitada e morgada, tentando gritar por socorro. Qual a lógica de voltar ao passado?

Ou seria, vir ao passado? Não sei.

As pessoas iam e vinham e eu não era capaz de reconhecer ninguém, parece que quando esse povo velho era novo até a cor dos olhos muda.

Levantei-me e rumei a sala de Inglês sem tirar meus olhos das cabeças que passavam, empurrei a porta e vi apenas um garoto concentrando no caderno e debruçado, não me deixando ver seu rosto. Cruzei meus braços e sentei-me ao lado dele, vai que é alguém, né?

Olha, na boa, se for uma pegadinha, eu juro que fujo de casa e só volto para o enterro de Sasuke e Sakura e garantir meu dinheiro.

Bufei e cruzei meus braços sem tirar os olhos do moço, ele rabiscava o caderno e hora ou outro bagunçava o cabelo. A curiosidade em perguntar se ele se chamava Sasuke era maior, mas a vergonha superava.

— Te achei.

Olhei para a porta e meu queixo caiu.

Era ela.

Tinha que ser ela! Ela estava ali em minha frente, em carne, osso e cabelo rosa. Aquele cabelo rosa ridículo de uma falha genética e que dei sorte de não ter herdado. Minha mãe estava ali em minha frente! Os olhos verdes, o nariz arrebitado, o cabelo ROSA! Era ela, sim.

E ela era linda.

Altura nunca foi o forte dela então as ankle boots pretas de salto faziam algum trabalho de destaque, calça jeans, uma blusa amarela folgada com o sutiã preto aparecendo dando a impressão de mais seios (só impressão, essa aí é uma tábua) e um casaco vermelho.

Ela sentou na cadeira em frente a ele:

— O que ta desenhando?

Puta merda, meu coração ta muito acelerado! Ela está em minha frente, é verdade!

Ou uma atriz muito igual!

O rapaz ergueu a cabeça e bufou olhando pra ela. ERA. ELE. Meu pai estava ali também, eles são amigos! Eles estão ali juntinhos se olhando! Alguém me ajuda. E nossa, como ele é lindo! Pai, ta louco? Tu é mô gato.

Ela tomou o caderno das mãos dele e franziu o cenho:

— O que ele fez?

Quem fez o quê?! Me contem!

— OI! — E sim, eu gritei. — Puta merda. Oi.

Os dois repararam em minha presença, Sasuke me olhou de canto e depois virou o rosto para Sakura, voltando a me olhar mais uma vez.

— Olá. — Ela respondeu. — Me chamo Sakura e esse é o Sasuke. Você é nova, né?

São eles mesmo, caralho. O que eu faço? Não dá pra ser chata com adolescentes sem querer comprar briga, porra tudo seria mais fácil se eles fossem quarentões.

— Sim, sou sim. Sarad… Sara Maro.

— Você é parente do professor Orochi? — Perguntou simpática.

Não acredito que tô caindo nessa palhaçada.

Simpática meu cu, bufei frustrada por não poder respondê-la e concordei. Até aqui ela é chata, por que fui puxar assunto mesmo?

— Ahh, legal. — Olhei-a de esguelha e a vi sorrindo para Sasuke que já puxava o caderno e voltava ao tal desenho. Meu pai desenha, desde quando eu não sei, mas agora sei que puxei alguma coisa dele e não o nariz, o cabelo, a cor dos olhos.

Sakura ficou virada para a cadeira dele, fazendo cafuné em seus cabelos e observando o que ele desenhava. Ela fazia cafuné nele. Eles já estavam juntos desde essa época? Nossa, eles são muito bonitos, será que eles fazem sexo ou são cultos? Céus, são meus pais! Não um casal bonito qualquer.

Não, são atores. Contratados para fingirem ser meus pais.

Eu não sabia como reagir, se deveria falar algo, se deveria parar de encará-los, eu só conseguia olhar aqueles dois atores terrivelmente iguais a meus pais, todavia, com expressões joviais.

Aos poucos a sala foi enchendo. Um gordinho sorridente com as mãos no bolso do casaco verde conversando com um cara de olhos baixos e rabo de cavalo, liderados por uma loira de barriga de fora que falava alto e me lembravam seriamente Shikadai, Choucho e Inojin. Uma garota de cabelos pretos e seios enormes, olhos claros ao lado de um descabelado e risonho. Já na porta, junto a alguns membros do time do colégio de algum esporte, um loiro, alto, de olhos azuis, forte e lindo.

Eu suspirei quando o vi, a semelhança com meu namorado era gritante e me fez não só sentir falta de Bolt como também esquecer completamente que aquele poderia ser mesmo o passado, e não atores.

Ele caminhou até a cadeira de Sakura. Ela sorriu para ele. Ela se ajoelhou na cadeira e envolveu os braços no pescoço do loiro, beijando-o avidamente. Eu desviei o olhar.

Estava errado, muito, muito, muito errado.

Sakura não está beijando Sasuke, Sakura está beijando, quem aparentemente é, Naruto! É tipo ver minha mãe toda bonitona beijar meu namorado. Eca.

Virei meu rosto pela sala procurando Hinata, a morena lixava as unhas conversando com alguns amigos, totalmente alheia aos beijos que minha, aparente, mãe dava em seu, aparente, marido.

Minha cabeça doeu naquele instante. Por que minha mãe está beijando o pai de meu namorado? E por que meu pai está achando isso normal? Por que Hinata não fala nada? Que desgraça é essa?

— Bom dia, turma. — Eu conhecia aquela voz, era de Kurenai, a gagá que precisa se aposentar, mas aqui ela não é nada gagá, na verdade, é um mulherão da porra. — Abram suas apostilas e vamos continuar… Opa, aluna nova, você deve ser a sobrinha de Orochi, certo?

Anuí, remexendo minha bolsa ignorando completamente o que acontecia naquela sala, concentrando-me apenas em pegar o caderno e o estojo. Fora agonizar aquela loucura. Isso tá errado. Isso tá errado. Eu to drogada. Ou tô em uma pegadinha.

— Quer se apresentar?

— Sara Maro, 17. — Falei sem levantar o rosto, recoloquei a mochila no chão e cruzei minhas pernas levantando o rosto para Kurenai. — Daqui mesmo.

Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa.

— Ok. Espero que goste de minha aula, Sara.

Meu sorriso, mesmo sem que eu quisesse, foi falso. Eu já conhecia a aula dela, conhecia o modo com que ela lecionava e tangenciava o assunto a cada fala e não muito diferente do que eu imaginava, assim se passou toda a aula de Kurenai.

Eu passei a manhã só, rabiscando meu caderno e fazendo anotações sobre esse passado tão estranho e falso.

Eu segui o roteiro. Eu esperei o efeito da droga passar, mas nada aconteceu. O pessoal agia normal, não normal estilo filmes americanos e figurantes em escolas, mas normal. Gente desesperada por nota, gritos, discussões, debates que não deveriam ter acontecido, secretaria movimentada, correria e muita conversa. Aquilo não me cheirava bem e alguma parte ébria de meu corpo queria crer que aquilo era verdade.

Bateu o sinal para o intervalo, saí da sala e desci todas as escadas, caminhei pelos enormes corredores e enfim cheguei aos fundos do colégio onde todos almoçavam. Havia uma mesa dos atletas e junto a eles estava a cabecinha rosa de Sakura guiando as conversas, Naruto ao lado sorrindo e respondendo-a, vez ou outra beijando o pescoço e acariciando seu rosto.

Meus olhos queimavam com aquela imagem. Naruto e Sakura? É sério? O que querem de mim? Uma revolta no meio do refeitório, talvez?

Carregando minha bandeja caminhei pelas mesas, observando as pessoas, observando os gestos, o linguajar, vendo tudo e ao mesmo tempo nada. Assim como parte de minha mente viajava com a ideia que eu poderia sim, estar alguns anos no passado. Meus pais com a minha idade. Meus pais com 17 anos.

Eu viajava em pensamentos e só saí deles quando esbarrei em alguém e quase derrubei toda minha comida nele. Ironicamente, era o meu pai. Sasuke me encarava e infelizmente seus olhos negros estavam terrivelmente amedrontadores.

— Desculpa, Sasuke. — Pedi com a voz baixa.

Ele não disse nada, apenas colocou as mãos nos bolsos da calça e saiu rumo a uma mesa. Havia algumas pessoas em um extremo e no outro apenas ele tomando uma caixa de leite e desenhando de novo. Eu sentei com ele, na frente, e remexi minha refeição com certo desgosto. Segurei o hambúrguer e mordi-o, constando que estava melhor do que aparentava, uma rodela de tomate em cima da carne e então outra em baixo.

Eu conheço Sasuke, meu pai, há dezessete anos, anos suficientes para conhecer um horror de coisas sobre ele, mas aqui, em frente ao Sasuke de 17 anos, eu não sei nada. Ele desenha, a esposa dele namora com o futuro melhor amigo, ele é sozinho, toma leite. O Sasuke de quarenta anos que conheço, vive pelo trabalho na advocacia e pela família, ama a esposa, tem muitos amigos, toma whiskey e o mais irritante, tem uma filha! Que sou eu, que está aqui, na frente do de 17 anos.

Eu vou enlouquecer.

Por trás de Sasuke, vi Sakura vir na direção dele, ela se jogou nas costas de meu pai e beijou-lhe a nuca, ele não expressou nada, nem se quer um arrepio, apenas escorregou no banco. Ela sentou ao lado dele, de costas para mim e pegou o caderno de meu pai.

— São meus olhos? — Perguntou ela, sorrindo para ele.

— Eu pintei de preto, burra. — Respondeu ele e eu ri da expressão que Sakura fez, resultou nos dois me olhando e depois trocando olhares.

— Olha novata, já tem um fã. — Disse-me e eu franzi. Vendo-me desentendida, Sakura explicou — Ele desenhou seus olhos.

Meu rosto enrubesceu imediatamente e sem que eu quisesse eu sorri, um sorriso completamente sincero e grato. Meu pai de dezessete desenhou meus olhos.

Eu vou enlouquecer.

— Posso ver?

Sakura me entregou o caderno, por trás dela vi que Sasuke não estava tranquilo com a ideia. Como sempre, eu o ignorei e vi a mistura deles dois ali desenhada, o reflexo em grafite de meus olhos. Eu os olhei, ambos se olhavam e eu vi a metáfora dos dois mostrando a criação deles, à própria cria.

— Ficou legal, Sasuke.

Ele desviou o olhar de Sakura e pegou o caderno. Não podendo ficar mais estranho, Hinata apareceu e se sentou ao lado de Sakura.

— Vamos ao shopping hoje, né? Eu vi um vestido na Forever lindo e eu não empacotei cinco mil compras de supermercado todo meu fim de semana à toa.

— Vamos, mas eu só vou ficar olhando, tô dura.

— Cara, o jogo sexta foi animal demais. — Naruto se juntou, sentando ao meu lado.

Eu sou uma fã dos Uzumaki, sou suspeita pra falar algo sobre ele, principalmente com a espécime rara e cheia de sex appeal que é o pai de Boruto.

E eu sem vergonha alguma na cara, fiquei olhando pra ele e lembrando de meu namorado e o quanto ele me faz falta, e também tirando uma casca do namorado de minha mãe que é o pai de meu namorado.

Espera, eles são amigos? Os quatro? Naruto, Hinata, Sakura e Sasuke? E minha mãe não namora meu pai, mas sim o pai de meu namorado?

— Você vai, né? — Hinata pediu de novo e Sakura respirou fundo.

— Sua namorada vai?

Não sei se fiquei pálida, surpresa, chocada, sem saber pra onde correr, confusa, vermelha. Não sei se gritei, não sei se fiz um escarcéu. Porque em minha cabeça eu estava tudo aquilo. Estava a beira da loucura. Hinata é lésbica? Minha mãe namora o pai de Boruto? Sasuke é um emo? Como vou dizer a meu namorado que a mãe dele, nessa dopamina, nessa série, nessa droga, é lésbica? O nome de Orochimaru é Orochi Maro?

Queria vomitar. Tá tudo errado nessa porra.

— Não, ela tem coisas da faculdade pra fazer.

— Que bom, não gosto dela. — Sakura respondeu.

Virei meu rosto para Naruto e Sasuke, um comia enquanto o outro ria de algo mexendo no celular e vez o outra mostrava a meu pai, que ignorava. As meninas ainda conversavam sobre as novas roupas na Forever. Eu estava verdadeiramente desesperada por uma explicação. Esperava loucamente que a câmeras aparecessem a qualquer hora e meus pais me dissessem que deveria respeitá-los, seja lá qual for a lição de moral de agora.

Afastei a bandeja e coloquei os cotovelos na mesa, massageando minha cabeça em busca de alguma lembrança. Talvez eles tenham comentado isso ontem de manhã ou escondido e eu possa ter ouvido, é capaz. Sakura não sabe falar baixo e muito menos guardar segredos.

— Ei, Sara, quer vir com a gente?

— Ela adoraria.

Orochimaru estava atrás de mim, virei meu corpo e o encarei. Ele sorria para o pessoal da mesa e o pessoal não estava nada confortável. Nem parece que quando tem reunião dos pais, eles encaram Orochi nos olhos, conversam com ele e não ficam nem um pouco desconfortáveis na presença do antigo/atual professor.

— Posso falar com você? — Perguntei concentrando toda minha educação e calma.

— Estamos falando. — Ele disse sorrindo, revirei meus olhos.

Me levantei, esquecendo todo meu almoço inacabado e puxei o braço fino de meu tio para longe do refeitório, para a área externa da escola. E ali, próximos a quadra de futebol americano, eu surtei.


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Notas finais do capítulo

espero que tenham gostado.
próximo capítulo não tenho previsão.
beijos e muito obrigada.



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