Mr. & Mrs. Black escrita por pnsyparkinson


Capítulo 9
Capítulo Oito.




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Ele poderia ter atirado ali mesmo, mas cometeu a burrice de olhar diretamente naqueles olhos de aço.

Não era o olhar tépido, enfastiado e oblíquo da mulher que Sirius pensava conhecer, mas um olhar de desafio, também duro como o aço. Aqueles olhos eram capazes de deter qualquer adversário com uma única mirada. 

E por um instante, o homem sentiu uma arrebatadora excitação — não o tipo de entusiasmo juvenil que um catálogo de roupa íntima é capaz de despertar. Era como se sua mente, e não apenas o corpo, estivesse subitamente subjugada por ela. Como ele poderia destruir o que despertava em si aquele desejo de posse tão incontrolável?

Quando hesitou um segundo para decidir se acabaria com ela ali mesmo, aqueles olhos de aço cintilaram de maneira quase debochada. Em seguida, com a naturalidade de alguém que entra num elevador, Marlene se jogou pela janela. Com o coração batendo a mil, correu até o parapeito e viu que ela deslizava por uma espécie de corda.

E naquele momento o tal desejo de posse bateu mais forte ainda. Sirius jamais deixaria aquele tesouro escapar. Pulou atrás dela. Isso mesmo. Pulou. Embora não contasse com o benefício de um fio de kevlar. Nem de um paraquedas.

Black despencava em queda livre de uma altura equivalente a cinquenta andares, tentando bolar um plano enquanto voava. Marlene o viu e ficou devidamente chocada. Furando a escuridão, continuou caindo até se chocar diretamente com o corpo de McKinnon, agarrando-lhe os pulsos e depois seguindo juntos, pendurados na mesma alça.

O peso adicional diminuiu a velocidade da descida, o fio começou a perder tensão até se afrouxar completamente.

Então ficaram ali, pendurados no meio do fio de kevlar, braços e pernas entrelaçados num mesmo desejo de sobrevivência, cinquenta andares acima das ruas, onde a borbulhante vida noturna da cidade prosseguia alheia ao pequeno probleminha do casal. Estavam em uma espécie de limbo, vertiginosamente suspensos no ar.

Sirius disse para si mesmo que foi aquela altura toda que o deixou um pouco zonzo. No entanto, não se importava de confessar que Marlene era o colete salva-vidas mais delicioso que ele havia vestido em toda a vida. Naturalmente, seu ego ficou um pouco avariado quando pôde constatar que o inusitado abraço não havia produzido nela o mesmo efeito que havia produzido em si.

— Você poderia ter atirado lá em cima - ela disse — Mas não atirou. Um gesto delicado, e um tanto suicida.

Sirius fez menção de pegar a arma no bolso, mas Marlene apertou sua mão com a força de um alicate.

— Fui descoberto lá em cima apenas porque eu quis - falou com sarcasmo, estreitando os olhos azuis para ela — Você é previsível, Lene. Sei exatamente o que se passa dentro de você.

Virando o punho, ela conseguiu enfiar a mão no bolso do homem, um gesto que ele teria apreciado muito se fossem outras as circunstâncias. Era de sua arma que ela estava atrás.

— Não era essa a impressão que eu tinha quando estávamos na cama, amor - McKinnon disse com a voz provocativa — Será que você mudou tanto assim?

O homem agarrou-a pelo braço e fez com que girasse no ar, de modo que agora ele a prendia pelas costas, seus lábios na altura das orelhas dela.

— Quem mudou foi você, querida. Fazia muito que não demonstrava tanto interesse por mim.

Marlene tentou se desvencilhar, mas quanto mais se debatiam, mais se apertavam naquele abraço quente e perigoso.

— E fazia anos que a gente não ficava tão juntinho assim - disse Sirius, sussurrando.

A morena ficou tão furiosa com aquela observação que encontrou forças para se desprender e virar, colocando-se face a face com o marido.

— Pode tirar o cavalinho da chuva - ela rosnou, contorcendo-se.

Se dependesse de Sirius, ficariam pendurados ali por mais um tempo, mas corriam o risco de chamar a atenção da polícia se não resolvessem logo aquela situação.

Black apertou seu corpo contra o de Marlene e prendeu o braço dela junto ao tronco, impedindo-a de levantar a arma e atirar.

— Quem vai tirar o cavalinho da chuva é você - rosnou ele — Vai sair da cidade.

Ela grudou os olhos nos dele, nariz contra nariz, peito contra peito e tudo o mais contra tudo o mais. Depois seus olhos faiscaram. 

— Está achando que vou me fazer de morta? - Marlene disse, a voz quase cortante.

— Por que não? - respondeu Sirius — Foi o que fiz durante cinco anos de casamento.

— Quase cinco, Black - rosnou ela, irritada.

O moreno deu de ombros, e ela aproveitou a ocasião para executar uma impressionante manobra: arqueando as costas, liberou o braço e levantou a arma contra Sirius.

— Não vou a lugar nenhum - falou secamente.

Ele então respondeu com outra manobrinha não menos impressionante: balançando o corpo e chutando para o alto, conseguiu arrancar com os pés a arma da mão dela. Um pouco de sorte e muita competência permitiram que ele pegasse a pistola no ar, antes que ela despencasse das alturas.

— Nem eu - disse sorrindo. Com a arma na mão, Black estava em posição de vantagem. 

Em um ato de resistência, Marlene retirou uma faca que estava escondida em sua roupa. 

— Já devia saber disso, Lene, não se traz uma faca para um duelo de fogo.

— O duelo acabou, Six - ela disse entre dentes. Depois rodou a faca no ar, cortando o fio de kevlar acima de suas cabeças.

Um milissegundo antes que a parte decepada do fio voltasse ao prédio do escritório de Marlene, Sirius soltou a arma e agarrou-se nela. Ele sabia que não haveria outra chance de salvação.

Num momento de Indiana Jones, o homem estendeu as pernas para a frente enquanto despencava a mil por hora na direção de uma grande janela.

Estilhaços voaram por toda parte quando atravessou a vidraça, rolou no chão e ficou de pé numa perfeita sequência de movimentos. "Tacada de mestre", pensou, tomado daquela euforia de quem sente em cada célula do corpo: "Ainda não foi dessa vez!"

Limpou os cacos da roupa, voltou para o buraco que se abrira na janela e varreu com os olhos o prédio da frente. Nenhum sinal de Marlene. Respirou fundo e tomou coragem para olhar para baixo. Nenhuma aglomeração de pessoas, nenhuma mancha esquisita no asfalto. Os dois haviam conseguido sair vivos daquela enrascada. Sua mulher estava à solta, em algum lugar, planejando sua próxima investida. 

Ele jamais havia enfrentado um oponente tão valoroso. Ainda sentia o sangue ferver com a excitação da caçada. Estava pronto para a batalha seguinte. 

"Pode vir, meu amor, estou esperando." 

Ajeitou suas roupas e se virou para ir embora quando percebeu, pela primeira vez, a presença de uma faxineira recostada na parede. Estava trêmula e agarrava ferrenhamente o cabo da vassoura.

Na verdade, Black ficou envergonhado.

— Sinto muito pela bagunça - balbuciou. 

E sentia mesmo. Mas não tinha tempo para continuar ali e ajudá-la na limpeza, afinal, Sirius tinha uma esposa para matar.

[...]

Cortar a linha fora um risco calculado por McKinnon.

Ela não teve escolha, estava pendurada sobre as garras da morte carregando um peso extra — seu quase ex- marido. Tinha de fazer algo drástico caso esperasse sair viva daquela situação.

Assistiu a um retrospecto de sua vida inteira num único instante. Foi salva pela lembrança da imagem de um trapezista que viu quando criança. Se ela queria sobreviver, não poderia pensar em seguir correndo em direção a um prédio, deveria acreditar que era um artista aéreo seguindo reto a uma plataforma. Quem sabe até ouvir a música do circo, sentir o cheiro da pipoca.

Caiu no parapeito de uma varanda um milésimo de segundo mais tarde, chegou a sentir os pombos abrindo espaço enquanto pousava. No mesmo momento ela se virou para ver como havia ficado seu ilustre adversário. E quando o viu, perdeu o fôlego.

Havia passado seis anos com um homem que acreditava merecer um prêmio por sua habilidade de beber enquanto dirigia um carrinho de golfe, e que o prêmio deveria ser uma nova rodada de drinks servidos à beira da piscina do clube.

O homem que voara pelos ares como o Tarzan pendurado em cipós não podia ser o seu marido.

Ele Tarzan, ela Jane.

Marlene olhava admirada o que o homem estava fazendo. Não era nada fácil voar pelos ares encarando uma vidraça pela frente. Ela sabia disso, e pelo visto ele também. Assistiu sua manobra no ar e não acreditou no que viu quando ele ficou de pé após um único e breve movimento.

Se xingou mentalmente ao perceber o que estava fazendo. Ela não deveria estar admirando aquele homem, suas habilidades ou seu físico. Ele era um mentiroso, uma fraude e era esse pensamento que deveria se manter fixo em sua mente.

Chicoteou a linha kevlar que ainda estava consigo, enrolou-a no ombro e foi abrir a porta da varanda. Precisava sair dali o mais rápido possível e reencontrar sua equipe.

No fundo Mckinnon esperava que ele não tivesse sentido o que ela mesma sentiu enquanto estavam pendurados. Nem farejado seu medo. Não o medo de cair ou de morrer.

O medo dele.

"Por Deus... esses momentos sob as estrelas..."

Aquela era uma das melhores noites que passaram juntos em vários anos. Ela não sabia quem era aquele maldito homem armado e perigoso, e não carregava nenhuma arma capaz de se proteger dele.

[...]

Mais uma vez Sirius buscou refúgio na casa de James, onde andava de um lado para o outro como um tigre enjaulado. As artérias latejando com a adrenalina, os músculos crispados, prontos para darem o bote: a conhecida síndrome da "luta ou fuga".

Mas lutar com quem? Fugir do quê? De sua própria vida ao longo dos últimos cinco anos?

Ele estava paralisado. Subjugado pela intensidade de emoções conflitantes, não conseguia enxergar direito, não encontrava nenhuma explicação.

Sabia apenas que precisava cobrir alguém de porrada.

Para piorar as coisas ainda mais, James estava mais intragável do que nunca.

— Você está dizendo que...

Ele se sentou no sofá da sala, vestindo um roupão de banho e fumando um cigarro atrás do outro, enquanto Black examinava uma pilha de entulho carbonizado que havia surrupiado do escritório de Marlene.

— Está dizendo que poderia ter atirado à queima roupa e não atirou?

Sirius não queria falar sobre o assunto, então continuou a trabalhar, vasculhando aquele entulho em busca de alguma coisa. Algo que pudesse dar sentido a história toda.

Ou talvez estivesse apenas adiando o inevitável.

— Cara! - exclamou James — Isso aí parece coisa da era plistocênica. Deixa de molho de um dia pro outro, a gente acorda com uma pilha de diamantes no chão.

— Continua procurando, Jay, caladinho.

— Procurando o quê? Fósseis? Sirius, meu chapa, você não está com tempo pra brincar de arqueólogo. Eles te deram quarenta e oito horas, e só te restam o quê? Vinte e duas? Vinte e três?

Black sabia que estava dando uma de James Dean, mas não conseguia evitar. Olhou para o relógio e disse:

— Dezoito e uns quebrados.

— Dezoito horas até despacharem vocês dois para o inferno! Six, chega de embromação. Você precisa apagar essa vadia já!

Naquele momento, Black olhou para ele.

— Não preciso que você me diga como lidar com a minha própria mulher - disse sério, ainda mexendo na pilha de escombros.

Potter balançou a cabeça, impaciente. Não era de tapar o sol com a peneira e não faria aquilo agora, ainda mais com seu melhor amigo.

— Ela não é sua mulher.

E então o silêncio pareceu reinar por um instante, e Sirius demorou um pouco para digerir aquelas palavras.

— Você precisa aceitar isso, meu amigo - ele continuou, um pouco mais ameno — A gata não é sua mulher. É o inimigo. Vai por mim. Ela agora deve estar lá, com as amiguinhas, arrumando um jeito de acabar com você. E ficar com a casa, o carro, o gato, até a porra da torradeira...

— James! — gritou.

Ele estava indo longe demais, talvez em direção ao campo de guerra ao qual se resumira quase todos os seus relacionamentos no passado. De repente, o homem avistou um pedacinho de papel, minúsculo e poeirento, que o deixou intrigado. James se aproximou para ver o que estava escrito nele. Apenas quatro letras: TZKY.

— Pô, será que dá pra comprar uma vogal? - Sirius disse em tom de brincadeira. Talvez fosse uma pista, mas Potter não concordou e preferiu continuar a importuná-lo.

— Você tem que apagar a Marlene, cara.

"Sim, mas como?" ele pensou. Não se tratava de uma cabecinha de vento qualquer, nem de uma matadora de aluguel ordinária. Marlene era boa no que fazia, por mais que lhe custasse admitir isso. Muito boa. Mas não era páreo para ele. Apenas um desafio.

James prosseguiu com a saraivada de conselhos:

— Tem que entrar na vida dela... na cabeça dela... encontrar uma porta... Vá pra casa, meu irmão! 

A ideia não quis sair da cabeça de Black. Ir para casa. 

Humm... Ridículo? Talvez não.

— É melhor você não ir sozinho - advertiu Potter — Leva um escudo. Alguém pra levar o primeiro tiro caso ela esteja escondida e armada até os dentes na porra da chaminé.

Sirius revirou os olhos e jogou os braços para o alto.

— E onde vou encontrar esse escudo, cara?

Depois parou e pensou. Um rosto lhe veio à mente. O escudo perfeito, que além de tudo morava debaixo do seu nariz.

Em dois segundos ele já estava na soleira do vizinho. Afinal eram amigos. Tocou a campainha e esperou. Quantas vezes naqueles últimos cinco anos ele havia parado diante daquela mesma porta, levando uma garrafa de vinho ou um pacote de cerveja debaixo do braço? Ou segurando uma bandeja de salgadinhos enquanto Marlene dava os últimos retoques na maquiagem?

O anão no jardim dos Longbottom parecia rir dele, e Sirius teve de calar a boca dele com um discreto chute. O pouquinho de culpa que ele pudesse estar sentindo pelo que estava prestes a fazer agora havia dado lugar a um ódio incontrolável e indefinível.

Esmurrou a campainha outra vez.

Frank Longbottom teve o azar de estar em casa. "Carma ruim, meu amigo", pensou ao vê-lo abrir a porta com um chapéu de chef na cabeça e um avental de churrasco.

— Aloha - Black disse, animado, entrando rapidamente no papel de vizinho amigo.

Não foi difícil convencê-lo a dar um pulinho até sua casa. Sirius disse algo como "preciso de uns conselhos, vamos ali tomar um drinque."

De repente percebeu, com uma pontinha de remorso, que nunca o tinha convidado para ir à sua casa, muito embora tivesse comparecido à dele inúmeras vezes.

Frank praticamente saltitou até a varanda alheia. Com muito cuidado, Sirius passou os olhos pelos arbustos do jardim, a procura de armas apontadas em sua direção. Mas as azáleas pareceram inofensivas.

Destrancou a porta da frente e empurrou-a com a ponta do pé. Silêncio.

A porta se abriu lentamente, e ele espiou para dentro. Nenhum sinal dela.

Na qualidade de anfitrião perfeito, fez sinal para que seu convidado entrasse primeiro. Frank entrou na casa como se estivesse entrando na Disneylândia pela primeira vez.

Quanto ao anfitrião, preparou-se internamente para ouvir o hall de entrada explodir.

Mas nada aconteceu.

— É inacreditável que eu nunca tivesse vindo aqui antes - exclamou Frank, olhando ao seu redor sem nenhum constrangimento.

Alerta, ele seguia atrás de Longbottom, com a cabeça baixa e uma das mãos no coldre do revólver.

— Esse piso é sensacional! O que é? Teca? 

O moreno olhou para o o piso e fez uma careta.

— Não tenho a menor ideia. Vem, vou te mostrar a casa inteira.

E então ambos seguiam de olhos bem abertos enquanto atravessavam a penumbra em que se transformara sua antiga casa. Frank, por causa da curiosidade. Sirius, por causa da apreensão.

— Olha só pra isso - disse Frank, retirando um troféu da prateleira — Você ganhou o Master do Country Club esse ano.

Mas Sirius estava aflito demais para se vangloriar do que quer que fosse naquele momento. Aos poucos chegaram a sala de visitas e subitamente Frank deu um gritinho.

Em uma fração de segundo, o agente se abaixou o mais rápido que pôde e, sem tirar a mão do coldre, varreu a sala com os olhos. Mas não viu nada de interessante.

— O que foi?

O vizinhou apontou para o lavabo, cuja porta estava semi-aberta.

— Mármore de Carrara!

Sirius soltou a respiração e acenou para que ele seguisse em frente e olhasse o que quisesse.

Assim que Frank entrou no banheiro para admirar o acabamento, o homem saiu de fininho e subiu as escadas.

Arma em punho, quebrou para a esquerda e entrou no antigo quarto. 

"Você não mora mais aqui", disse a si mesmo. "Se é que um dia você morou..."

Depois de uma rápida olhada atrás da porta, vasculhou as gavetas de Marlene, procurando por armas. Mas as gavetas estavam meio vazias. Talvez McKinnon já tivesse retirado dali o pouco que queria guardar para si depois de cinco anos de casamento. Na verdade, o lugar dava a impressão de ter sido saqueado por uma gangue de profissionais. E ele sabia muito bem que gangue era essa.

Seguiu para o closet logo adiante, abrindo caminho com o revólver, só para garantir. Ela havia deixado um montão de roupas para trás, fantasias de esposa suburbana já sem nenhuma serventia. Afastou uma das camisolas de seda com o cano do revólver e suspirou. Lembrava-se daquela, e muito bem.

Antes que pudesse se conter, puxou o tecido contra o rosto e fechou os olhos.

O cheiro lembrava o silêncio da noite, os lençóis amassados sobre a cama, sua mulher. "Ela não é sua mulher, ela não é sua mulher...", repetiu para si mesmo, como um mantra.

Virando a cabeça, viu um corpo jogado num canto: o urso de pelúcia que ela havia ganhado numa feira de rua em Little Italy. "Sorte de principiante", foi o que ela disse então.

O urso estava com o peito dilacerado e Black sabia muito bem como ele estava se sentindo. Em seguida viu um objeto escuro na lata de lixo. Uma fita de vídeo.

Guardou a arma na cintura da calça, pegou a fita e leu a etiqueta pregada no dorso. Era a fita de sua lua-de-mel.

Sentiu uma pontada no estômago. 

"Ela não é sua mulher..."

— Então, qual é o seu segredo?

Assustado, teria metido uma bala na testa do intruso se não tivesse percebido a tempo de quem se tratava. Frank Longbottom, parado no vão da porta, o olhar fixo em Sirius.

Teria visto a arma? Teria encontrado naquela casa algo que revelasse os segredos que ele e Marlene haviam guardado um do outro durante tantos anos?

— Vamos lá, pode se abrir - ele disse, sorrateiro — Afinal, pra que servem os vizinhos? 

Black sacudiu os ombros, com dissimulada inocência. Insistente, Frank piscou o olho e entrou no quarto.

— Como você faz para... você sabe... manter as coisas... interessantes? - ele perguntou, apontando o queixo para as mãos de Black.

Com uma delas ele segurava a fita de vídeo e com a outra, a camisola.

A vontade era quebrar aquele plástico contra a parede e rasgar a seda em pedacinhos. Mas não podia perder o controle na frente de uma testemunha bisbilhoteira. Além do mais, já tinha se safado de situações muito mais intricadas do que aquela.

— Bem, Frank... - disse calmamente — Não é fácil. É preciso prestar muita atenção um ao outro. Observar os detalhes...

Perdeu o fio da meada quando reparou no bloco de anotações ao lado do telefone, na mesinha de cabeceira. Dava ainda para ver a marca da última anotação sobre a primeira folha.

Ora, ora, ora.

— ...e nunca se esquecer da importância do elemento surpresa - concluiu.

Então pegou o bloco, deu as costas para Longbottom e tirou do bolso do paletó um spray mais ou menos do tamanho de um batom. Uma rápida baforada de vapor ultravioleta sobre o papel bastou para revelar o que estava escrito ali: Lubetzky Corretagem Imobiliária. E um endereço.

 Ali estavam as quatro letras misteriosas: TZKY.

Obviamente a Triple-Click precisaria de uma sede nova depois do inesperado incêndio da véspera. E Marlene, muito gentil, havia deixado para ele um cartãozinho com o novo endereço.

Rapidamente inventou uma desculpa para seu convidado. Disse que havia subitamente se lembrado de um compromisso e prometeu que muito em breve Marlene e ele teriam o maior prazer em recebê-los, ele e a mulher, Alice, para uns drinques ou para jantar. Uma mentirinha esfarrapada e fácil de dizer.

Acompanhou o homem até sua varanda e depois deu meia volta, seguindo direto para o quartinho de ferramentas. Uma vez na escuridão, trancou a porta, buscou uma lanterna e abriu o alçapão. Pulou para dentro e...

"Mas o que foi que..."

Mal acreditou no que viu. Ou melhor, no que não viu.

Seu dinheiro, suas armas. Tudo havia sumido. Nem mesmo um mísero canivete tinha ficado para trás. Seu arsenal secreto havia sido totalmente pilhado por Marlene e suas fiéis escudeiras, não restava nenhuma dúvida. 

Foi o banho de água fria que faltava para dissipar de uma vez por todas a recaída sentimental que ele havia tido.

Com o ânimo redobrado, subiu a escada e deixou para trás o subsolo vazio. O profissional estava de volta.

E agora era guerra.

 


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