A Queda escrita por sandsphinx


Capítulo 3
Capítulo II


Notas iniciais do capítulo

Ciça, esse é pra você porque eu sei just how much you love Morzan. Não mais do que eu te amo, tho ♥



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Morzan estava deitado de costas na cama, lendo, sem nenhum interesse, um pergaminho sobre a cultura dos urgals. O texto falava, em detalhes que ele considerava inteiramente desnecessários, sobre desde como escolhiam seus líderes a como criavam suas crianças. Ele se virou com um suspiro entediado, ousando espiar pela janela. Ainda era cedo, talvez um pouco depois do meio-dia, e o sol de outono banhava o quarto com uma luz quente e agradável.

Pense assim, Raëdsel sugeriu, poderia ser pior. Experimente ouvir Glaedr discursar sobre os perigos da caçada; ele parece achar que eu facilmente poderia me tornar a caça ao invés do caçador.

Morzan riu. Seu dragão estava deitado no gramado lá embaixo, descansando no sol, e não tinha que se preocupar com prazos de leitura. Talvez seja possível, provocou. Deve existir algum ser capaz de derrotar um dragão.

Ele pensou que Raëdsel talvez tivesse bufado. Eu duvido.

Glaedr está desperdiçando suas lições com você, Raëd. Morzan se ergueu sobre os cotovelos ao ouvir passos no corredor, e não se surpreendeu de todo quando eles pararam perto de seu quarto. Quem é?

Não prestei atenção, Raëdsel respondeu simplesmente, sem se preocupar.

Morzan revirou os olhos. Muito útil, você.

As batidas na sua porta foram urgentes, mas ele não se deu ao trabalho de se levantar da cama para atendê-las. “Está aberta,” declarou, e sorriu para a garota que esgueirou a cabeça para dentro. “Oi, Lex.”

Alexis tinha doze anos, cabelos dourados que caíam em cachos rebeldes sobre seus ombros, e olhos verdes muito brilhantes; ela parecia saída de uma pintura, ou talvez uma princesa muito rebelde com suas calças de couro e o nariz empinado. E, realmente, ela e o irmão gêmeo eram mesmo filhos de nobres, parte de uma família muito antiga de Ceunon. Aleifar andava atrás da irmã, seus olhos do mesmo tom esmeralda muito entediados e os cabelos um tanto mais curtos; ele se recostou contra o batente da porta enquanto Alexis se aproximava para se sentar na cama de Morzan.

“O que está fazendo?” ela perguntou, puxando o pergaminho de sua mão sem a menor cerimônia.

“Estudando,” Morzan admitiu, a observando ler os primeiros parágrafos com ar de crescente descrença diante do assunto. “Nada muito interessante.”

Alexis fez uma careta. “Parece terrivelmente chato.”

“Não é?” Ele tomou de volta o pergaminho e o deixou sobre a mesa de cabeceira. “Mas preciso pelo menos começar a ler se não quiser desagradar Oromis.”

Aleifar ergueu uma sobrancelha loira. “E você tem medo do seu mestre?” perguntou, desdenhoso.

“Medo?” Morzan riu. “Não mesmo. Mas o discurso que eu teria que ouvir seria ainda pior que ler isso, eu te garanto.”

Alexis franziu a testa, pensando. “Você poderia dizer que não conseguiu se concentrar por conta de toda a empolgação de hoje,” sugeriu. “É um dia importante, você sabe. Principalmente se Oromis for querer o garoto como aluno.”

“Ele vai. Oromis acha que não é bom para mim, estudar sozinho.” Morzan deu de ombros. “Mas essa desculpa não funcionaria, de qualquer jeito.”

“E por que não?”

Porque Morzan seria forçado a passar o próximo mês meditando, Raëdsel interveio. Para melhorar a concentração.

Morzan riu. Não era um exagero tão grande assim. “Viu? É pior para mim.” Ele se sentou, afastando uma mecha de seus cabelos escuros dos olhos, e empurrou Alexis com o ombro. “Por que estão aqui? Eles já chegaram?”

Era sempre um burburinho quando um dragão nascia para um novo Cavaleiro, e melhor ainda quando para um humano; eles já tinham elfos demais em seu meio, e mesmo as crianças elfas não conseguiam ser muito divertidas. Talvez eles já nascessem frios e serenos, com a compostura perfeita de um adulto.

“Já,” Alexis confirmou. “Mas ainda estão trancafiados na sala com o Conselho, para receberem as boas-vindas e instruções. Acha mesmo que ele vai estudar com você?”

Morzan afirmou com um aceno de cabeça, se levantando. “Tenho certeza. Vamos? Quero estar lá quando ele sair.”

Ela não se mexeu, franzindo as sobrancelhas e fazendo beicinho. “Não vai nos abandonar por ele, vai? Só porque ele vai ser aluno de Oromis também?”

Aleifar estalou a língua de onde observava. “Por um menino de dez anos? Nem Morzan seria louco a esse ponto, Alexis.” Ele usou o nome inteiro da irmã, como sempre; as ocasiões em que se distraía e a chamava de Lexi se tornavam cada vez mais raras. “E você terá a mim.”

“E desde quando isso é consolo?” Morzan perguntou, oferecendo a Aleifar um sorriso torto antes de se voltar mais uma vez para a garota a seu lado. “Você sabe que eu nunca te abandonaria, Lex.”

Ela ergueu uma sobrancelha. “Isso é uma promessa?”

“Se você quiser.” Ele ofereceu uma mão para ajudá-la a se levantar.

“Acho bom que seja,” Alexis devolveu, e se levantou da cama sem aceitar sua ajuda, cruzando o quarto para se juntar a seu irmão. “Não quero me arrepender de ter vindo te chamar.”

“E não vai.” Morzan trancou a porta de seu quarto e pendurou a chave em um cordão no pescoço. “Sabe que eu acabaria por conhecer ele de qualquer jeito, e se vamos conviver tanto quando eu acho que vamos...”

“É, mas ele vai gostar mais de você se você estiver lá para recebê-lo hoje.”

“Vocês vão estar lá também.”

Ela sacudiu a cabeça. “Sim, mas você é quem vai ser legal e simpático, com um sorriso charmoso e–”

“Você me acha charmoso?” Morzan interrompeu, rindo. Ele subiu para a mureta que protegia os canteiros ao lado dos caminhos dos jardins do castelo, andando equilibrado sobre ela. “É bom saber.”

“Não. Mas você tenta,” Alexis devolveu, empinando ainda mais o nariz. “É irritante, na verdade.”

Ele continuou rindo. “Se você quiser que ele goste de você, é só ser legal também, sabia? Você já é, na maior parte das vezes. E talvez ele até mesmo comece a andar conosco, já pensou nisso?”

Foi Aleifar quem respondeu. “Já, e essa é a pior possibilidade. Por que iríamos querer um menino de dez anos nos seguindo por Ilirea? Você vai estar preso a ele, Morzan, porque ele vai ser aluno de Oromis também, mas nós não precisamos desse problema.”

“Não sei,” Alexis ponderou. “Ele pode ser fofo. Crianças são fofas, certo?”

“São irritantes,” Aleifar corrigiu, pesando a palavra.

“Mais que você, Aleifar?” Morzan pulou da mureta antes que o elfo mais a frente o visse. “Acho difícil.”

A única resposta que recebeu foi um revirar de olhos e um riso descrente, e os três se aproximaram mais devagar do elfo que protegia o arco de entrada do saguão onde o novo Cavaleiro conhecia os anciões. Thuviel os examinou com olhos cinzentos muito calmos, e se demorou um pouco mais no rosto de Morzan. Morzan sabia que ele, como todos os que o conheciam desde que entrara para a custódia dos Cavaleiros, ainda o olhava com certa pena, e Thuviel tinha ainda um motivo a mais. Era chato, e aquilo quase já não levava Morzan a lugar algum; ele tinha todos os inconvenientes, e nenhum privilégio.

Morzan torceu a mão diante do peito naquele gesto élfico que todos pareciam achar tão importante, mostrando sua suposta admiração por alguém que considerava superior a ele ao tomar a iniciativa de fazê-lo primeiro, e esperou que o elfo o retribuísse antes de falar. “Thuviel-elda,” cumprimentou, fazendo o uso correto do termo élfico de maior respeito. “Podemos entrar e conhecer o novo Cavaleiro?”

Thuviel hesitou, examinando o olhar curioso de Alexis e o rosto entediado de Aleifar. “Ele é jovem, e acabou de chegar aqui. Lembrem-se de que tudo isso é muito novo para ele.”

Morzan tentou espiar atrás do elfo. “Prometo ser gentil,” disse. “Oromis está aqui, não está? Ele vai querer que eu conheça o menino. Acho que vamos estudar juntos.”

“Parece que sim,” Thuviel concordou, mas não parecia convencido. “Posso deixá-los entrar se me garantirem que se comportarão adequadamente.”

“Mas eu sempre me comporto, Thuviel-elda.” Morzan lhe lançou seu melhor sorriso. “E eu agradeço.”

Ele entrou no saguão, Alexis e Aleifar logo atrás, sentindo os olhos de Cavaleiros tanto elfos quanto humanos os seguindo enquanto faziam seu caminho por entre os adultos. No fundo de sua mente, Morzan sentia o interesse de Raëdsel se aguçando conforme seu dragão começava a prestar atenção ao que ele fazia.

Avistou Oromis primeiro, notando os cabelos prateados e olhos cinzentos de seu mestre, e só então viu o menino a seu lado. Ele era pequeno, não mais velho do que haviam especulado, com cabelos castanhos finos e olhos claros, e o dragão em seus braços parecia uma fêmea, com escamas azuis muito escuras e traços de dourado em seus olhos. Verdadeiramente bonita, Morzan julgou.

“Mestre,” Morzan cumprimentou Oromis primeiro. Quando se voltou para o menino, sorrindo, percebeu que ele observava seus olhos, quase como se não pudesse se conter, e tentou perdoá-lo. De cores diferentes – um azul, um negro – eles costumavam dar pausa até às pessoas mais educadas. “Sou Morzan,” se apresentou. “Sou um Cavaleiro, também. E esses são Alexis e Aleifar.”

Alexis sorria, mas Aleifar tinha o ar mesmo entediado e arrogante de sempre. O menino olhava para os três como se intimidado, e disse em uma voz fraca, “Sou Brom.”

“É um prazer, tenho certeza.” Morzan sorriu para ele. “E seu dragão? Já deu um nome a ela?”

Brom assentiu, já mais a vontade. “Ela é Saphira.”

“Saphira?” Aleifar repetiu, arrastando a palavra. “Você deu a ela o nome de uma pedra?”

“Uma gema,” Morzan corrigiu, observando como Brom franzia as sobrancelhas. “Existe uma diferença. E faz sentido, não é? Ela é azul.”

Aleifar revirou os olhos, provavelmente contendo um comentário sobre como eles não haviam dado a seus próprios dragões nomes relacionados a suas cores. Então voltou a olhar para Brom, apertando um pouco os lábios. “Bom te conhecer, mas tenho coisas a fazer. Vamos, Alexis.”

O sorriso dela foi mais gentil. “Foi um prazer,” disse também. “Nos vemos amanhã, Morzan?”

“Claro,” ele respondeu com facilidade, e os observou partir.

Não sei como você o suporta, Raëdsel comentou em sua mente.

Não posso ter Alexis sem Aleifar, não é? E Lex vale a pena. Morzan se voltou para Brom mais uma vez. “Saphira é um bom nome,” o tranquilizou, como sabia que era esperado dele. “Meu dragão se chama Raëdsel, como o das lendas, mas foi besteira lhe dar esse nome. Não é dele, sabe? Agora Raëd e eu precisaremos fazer algo muito incrível se ele quiser ficar mais famoso que o primeiro.”

E faremos, Raëd estava confiante. As pessoas saberão seu nome, Morzan, e o meu também.

Oromis escolheu aquele momento para intervir. “O propósito de um Cavaleiro não é ficar famoso, Morzan. Não lutamos por nós mesmos.”

“Sim, mestre.” Ele não deixou que seu sorriso morresse. “Mas nossos feitos não serão com esse intuito. Ficaremos famosos porque eles significarão algo por si só.”

Oromis sorriu um pouco, e deixou o comentário passar. Guardaria aquela lição para outro momento, sem dúvidas. Morzan olhou para Brom mais uma vez, e por um momento o menino deixou de olhar, fascinado, para o dragão em seu colo, e retribuiu seu sorriso.

“Mestre,” Morzan chamou, afastando uma mecha de seus cabelos escuros dos olhos. “Brom vai mesmo ser seu aluno?”

“Sim,” Oromis respondeu. “Ele começará seus estudos ainda essa semana.”

“Cedo assim? Não podiam dar a ele mais tempo para se acostumar com isso tudo?” Morzan não esperou pela resposta antes se voltar para o menino. Ele tinha olhos azuis, e o nariz um pouco curvo. Fofo, tal qual Alexis desejara. “Mas isso é bom, acho. Tenho certeza que seremos ótimos amigos.”


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado!!! E nos vemos nos comentários ♥



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