Quantas dúvidas escrita por DiHen Gomes


Capítulo 84
84 - Valéria




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— Pode deixar comigo, Valéria. Eu a entrego pra Karla.

— Vê se não vai fazer besteira, hein? Obrigada, Silvana.

Respiro fundo para compensar o gasto de energia que meu sistema nervoso fez ao pedir esse favor à vizinha. Combinei de ver a Bianca hoje, na igreja. Minhas pernas não querem andar até lá, mas sigo pensando no bem-estar dessa lindeza em meu colo, o que me daria força para ir até o continente nadando, se preciso.

Tomo bastante cuidado com o trânsito, e mesmo assim presencio um acidente leve: um carro de bebê bate em outro na esquina da calçada. Nada acontece de mais, mas só penso no meu filho. Chego no endereço que não reparo há anos. Estive aqui esses dias para buscar cesta básica, mas sequer cheguei a atravessar a segunda porta. Nem agora tenho vontade de entrar. Fico na escadaria da entrada, olhando para o céu cheio de nuvens, segurando meu filho.

Lembro de ter visto várias mães entrarem nesse lugar com filhos doentes e eles ficarem curados. E o meu? Será que Deus funciona para mim, uma pessoa tão desprezível?

— Valéria! — diz a obreira de cabelos castanhos claros que corre para me abraçar. Bia continua com o costume de mudar a cor do cabelo de tempo em tempo (e dizia que não é para chamar a atenção de homem).

O abraço inesperado da Bia me faz sentir especial. Não que eu não receba abraços. Karla não cansa deles. Mas o de Bia traz uma sensação diferente, um conforto.

— Quase não chego — digo após ser solta. Michael dá risadinhas para Bia. Esse menino gosta mesmo dela. — O trânsito nessa cidadezinha de merda tá pior a cada dia. Me desculpa pelo...

— Eu que peço desculpas, Valéria. Não quis ser chata com você. Apenas me preocupo com sua alma. Por isso que tanto te chamo para vir à igreja buscar a Deus. Mas, independente disso, você pode contar conosco para te ajudar. Não precisa ter vergonha das cestas básicas. Posso contar um segredo? Eu também pego cestas às vezes.

— Você, Bia?

— Passei pelo pior momento da minha vida. Mas venci, e você também pode vencer. Acredite.

Entramos e trocamos experiências por minutos. Talvez dezenas deles. A cada palavra da Bia, apesar de um lado meu querer sair daqui logo, fico mais animada. Quando ela começa a falar do grupo que eu tanto amava, não consigo conter as lágrimas.

— Essa é a oportunidade perfeita, Val! Não neste, no próximo sábado vai ter um evento em Kalyboz, e você vai comigo! Nem adianta...

— Que evento?

— Hã? Você não lê as mensagens que recebe? Mandei quase todo dia um convite falando do Cultura Day. Poxa...

Eu rio sem jeito e sem vergonha. Não sou obrigada a ler mensagens de ninguém mesmo. Paro de rir ao cair a ficha: convidada especial. Quantas vezes já usaram esse termo para vários jovens que convidamos, antigamente? E mesmo assim ela me faz sentir especial.

Decidi! Vou neste evento com a Bia. Quero ver como o Cultura está se saindo sem mim! Eu fazia ótimos teatros, até os líderes da capital pegavam minhas ideias para fazer nos seus Centros maiores. Era muito bom. Eu era útil, importante.

Quero voltar a ser.

— Ah, você não quer uma oração do pastor? Para o Michael?

— Meu filho está perfeito, não precisa.

Após dizer isto, passa na minha mente um filme: Michael na escola sendo xingado por alunos idiotas por ser mais lento de raciocínio. Não quero vê-lo sofrer. Já chega eu.

— Na verdade, quero sim, Bia.

— Tá ligado! Vamos lá. Eu creio que o Michael será curado e ficará perfeito... Ainda mais.

Empolgada na conversa, só agora que me levanto percebo alguns jovens lá no fundo. Devem estar esperando a Bia para um ensaio. Ela chama o pastor, e quando ele vem, ela vai até os jovens. Ele fala com fé, determina várias coisas, e com esta eu concordo: Michael será um rapaz feliz.


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