Quantas dúvidas escrita por DiHen Gomes
— Vai, fi! Levanta o rabo desse sofá e vai procurar um emprego, um bico, qualquer coisa!
— Ah, mulher, vai tomar banho! Deixa eu zerar meu jogo aqui de boa, falou?
Minhas entranhas se apertam. Há uma pressão dentro de mim, e não por causa do bebê. É o nervoso que me dá ver o Elton aqui na minha casa, sentado, ou melhor, deitado no meu sofá, jogando videogame na minha televisão e ainda querendo mandar na minha pessoa. Ah, eu não aturo isso! Não aturo, mesmo! Dá até uma coceira!
— Elton, mozão, daqui a pouco a Karla chega pra almoçar, e aí você fica atrapalhando. Ela assiste jornal.
— Dá nada, não. Ela não manda nada aqui.
Nem você, seu preguiçoso. Ah, que raiva de mim mesma por ter me envolvido com essa pessoa.
— Aí, Val, traz o rango aí pra mim. Minha barriga já tá colada nas costas — Elton tem a audácia de dizer antes de voltar para o jogo. — Nossa, que tiro, esse quase me pega.
Ao virar-me para ir à cozinha, ouço a porta da sala se abrir. O toc do salto fora de ritmo denuncia a entrada da Karla passando por cima da bagunça que o Elton fez para instalar seu joguinho idiota. Ela anda pesado, e mesmo com o jaleco tem um corpão típico das colegas periguetes de seu país de origem, o Brasil.
— Vamos, homem! Vai trabalhar, ô! — ela grita batendo palmas parada na frente da televisão. Escuto ele reclamando e continuo andando até a cozinha.
Depois de algumas reclamações e gargalhadas, o toc-toc chega até a cozinha. Karla se encosta na parede com uma mão na cintura para o lado e a outra acima dos longos cabelos castanhos lisos de pura química.
Num olhar bravo dela percebo o questionamento.
— Ele apareceu cedo aí, logo que você saiu — respondo.
— Amiga, dá um jeito nesse cara. Manda embora da sua vida de uma vez. Ele só tá te atrasando de encontrar um amor de verdade.
— Mas eu até gosto dele.
Recebo uma notificação de mensagem, mas não tenho tempo agora para ler. Karla toca no meu telefone, que está no carregador sem fio, e acende a tela.
— Obr. Bianca. Você ainda fala com as meninas lá da igreja?
A Bia? O que ela quer dessa vez? Ela não manda mensagens para mim há meses.
— Não falo com ela faz tempo, nem imagino o que seja. Deve ser pra me chamar pra ir lá de novo.
— Tá vendo, é o que eu sempre te falo.
— O quê?
— Mulheres são muito mais atenciosas, perfeitas e lindas que os reis da penca. Até as mulheres da igreja são melhores que esse mala.
— Se bem que, pra você, qualquer coisa é melhor que ele — respondo com uma gargalhada.
— Cadê meu almoço? — Elton grita da sala.
Karla olha em meus olhos sem dizer nada. Eu olho também, e não aguento segurar. Soltamos outra risada antes de eu ir até o armário pegar um prato para preparar o almoço do Elton. Querendo ou não, ele é o pai do meu filho, e, de certa forma, meu companheiro. Preciso dele por perto como parte da família para a criança. Ele é vagabundo? Sim. Preguiçoso? Demais. Fedido? Nossa! Chato? Deus me livre! Mas gosto dele assim mesmo. Só precisa de algumas mudanças para se tornar meu príncipe. Será que ele muda? Ah, minha cabeça começa a doer tentando imaginar tamanho milagre.
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