“Ainda chovendo?” Lysandre perguntou, entrando de volta no quarto. Sam estava deitado com a barriga para baixo na otomana, encarando a janela com determinação.

“Uhum.” Ele apenas assentiu, sem nem ao menos se virar. Parecia quase como se ele acreditasse que, caso ele não cortasse contato visual com a chuva, ela iria parar mais rápido.

Lysandre fez um movimento como se fosse se aproximar, mas então uma batida na porta chamou a atenção de ambos. Havia uma expressão confusa em seu rosto.

“Ainda está cedo demais para Leigh voltar…” ele disse, saindo novamente do quarto. Sam voltou a ficar sentado, e, pouco mais de um minuto depois, Lysandre voltou… Com Castiel.

“Hey, Sammy! Não te esperava ver aqui tão cedo!” O rapaz sorriu. Estava completamente molhado da cabeça aos pés, o cabelo vermelho um pouco grudado ao rosto.

“Castiel, por favor…” Lysandre balançou a cabeça em desaprovação, pegando uma toalha no guarda-roupa e a jogando para o amigo. “Vá tomar um banho, é mais fácil do que tentar secar o couro. Eu acho que você deixou algumas roupas suas aqui da última vez…”

“Sem problemas, mano.” Castiel pegou a toalha no ar, e a colocou por cima dos ombros. “Eu volto em menos de dez minutos!”

Após ele sair do quarto, Sam decidiu finalmente abrir a boca para falar.

“O que ele quis dizer com ‘tão cedo’?” Perguntou, com uma sobrancelha erguida.

“Não é nada demais. Ele só gosta de provocar.” Lysandre sentou-se na beirada da cama. “Você já avisou aos seus pais que vai ter que voltar mais tarde?”

“Sim, eu liguei pra eles.” Sam assentiu. “Minha mãe está um pouco decepcionada que eu vou perder o jantar de novo, mas ela prefere que eu não pegue um resfriado.” Riu.

Lysandre suspirou, observando a chuva também por alguns poucos segundos.

“Novamente, eu sinto muito. Nosso guarda-chuva está quebrado há uma semana e eu sempre esqueço de ir comprar um novo.”

“Não tem problema, sério.” Sam insistiu. Já era a terceira vez que ele pedia desculpa por isso. “O pior que pode acontecer é eu ter que dormir aqui. Se bem que eu não tenho mais nenhuma roupa além dessa aqui então isso poderia ser um problema…” Hesitou por um instante.

Castiel não demorou muito a voltar.

“Hey, Lysandre, eu deixei minhas roupas secando na sua lavanderia, espero que não seja um problema.” Ele disse, só de toalha, abrindo a porta do guarda-roupa.

“Certo. Eu acho que tem roupa sua na terceira gaveta… ?”

“Ah, sim. Eu não vejo essa camisa faz um tempão, não lembrei que tinha deixado ela aqui!” Castiel parecia agradado com sua recente descoberta, exibindo uma camisa vermelha com uma grande estampa de banda na frente.

Castiel em seguida pegou uma calça preta e roupa de baixo limpa da gaveta, tirando a toalha sem cerimônias e a jogando em cima da cama.

“Castiel, por favor!” Lysandre corou, cobrindo os olhos de Sam de imediato.

“Qual o problema? Nós usamos o mesmo vestiário.” Castiel sorriu, provocativo. “Tá com medo que ele se apaixone pela minha bunda primeiro?”

“Só se vista logo.” Lysandre desviou o olhar, descobrindo os olhos de Samuel com certa relutância.

“Hey, Sammy, me dá uma nota de um a dez.” Ele continuou, parecendo se divertir com aquilo.

“Hmm… Seria onze válido?” Brincou, decidindo que iria se divertir com aquilo também.

“Mais do que válido, e sim a única resposta correta.” Riu, voltando a se vestir normalmente. Castiel se jogou de costas sobre a cama de Lysandre após terminar de se vestir, tentando chamar a atenção do rapaz vitoriano que no momento parecia estar se segurando para não pegar fogo de vergonha. “Hey, Lys. Eu tô vestido agora. Sem mais perigos do meu corpo perfeito.”

Lysandre não reagiu, apenas respirando um pouco mais pesadamente do que o normal. Seu rosto parecia estar ficando um pouco menos vermelho. Castiel, entretanto, parecia querer se divertir mais um pouco com as reações exageradas dele. O rapaz de cabelos vermelhos rolou na cama, aproximando-se de Samuel que ainda estava sentado na otomana.

“Sam, vamos fazer disso uma competição, qual sua nota para a bunda do Lys?”

“Eu diria que oito e meio, mas não tenho como ter certeza… Nunca vi ele completamente sem roupas.”

“É, você sempre está um pouco atrasado pras aulas de educação física… Lysandre, o que acha de tirar suas calças pra fazer disso um julgamento justo?” Ele riu.

“Castiel, isso não é uma boa hora.” Ele finalmente reagiu, com o rosto ainda extremamente vermelho.

“Quer dizer que há uma boa hora?” Ele levantou uma sobrancelha.

“Você sabe muito bem o que eu quero dizer…”

“Lysandre não tá entrando na brincadeira.” Sam riu. “Vamos, tira só duas camadas de roupa. Ainda vai sobrar treze então sem problemas.”

“Eu não posso negar isso.” Castiel riu também.

Em pouco tempo, Sam e Castiel estavam apenas rindo um com o outro, murmurando algumas coisas minimamente indecentes sobre o Lysandre ou mesmo completamente sem relação a isso, parecendo se divertir a cada novo tom de vermelho que o rapaz atingia. Lys acabou se levantando bruscamente da cama, pegando seu bloco de notas em cima da cabeceira e sentando-se de pernas cruzadas por cima de um de seus travesseiros e escrevendo nele com um foco hipnotizante.

“Acho que chegamos no limite dele.” Castiel voltou a se levantar. “Vamos deixar ele aí por um tempo. Tá ficando tarde. Quer me ajudar a decidir o que a gente vai comer pro jantar?” Perguntou, enquanto abria a porta para fora do quarto.

“Ah… Claro, sem problemas.” Sam respondeu, parando por um instante para admirar Lysandre escrevendo em seu bloco com tamanha dedicação, antes de voltar a seguir Castiel.

Eles pediram pizza.

A chuva estava diminuindo, mas não completamente parada. Castiel deu uma boa gorjeta ao entregador por ter chegado tão rápido naquele clima.

“Leigh acabou de me ligar ligar para avisar que está na casa de Rosalya por hoje.” Lysandre disse, entrando na cozinha onde Castiel e Samuel pareciam estar decidindo quem ficava com o pedaço de pizza com aparentemente mais recheio. “Aparentemente a chuva ainda está bem forte do outro lado da cidade.”

“Já faz um bom tempo que eu não vejo tanta chuva de uma vez.” Castiel comentou. Sam aproveitou sua distração para pegar o pedaço de pizza para si.

“O outono está vindo com força. Em breve teremos pilhas de folhas no chão!” Sam comemorou. “Mal posso esperar para o Halloween!”

“Você não tem tipo dezesseis anos?” Castiel levantou uma sobrancelha, aparentemente ainda não percebendo que seu desejado pedaço de pizza havia sido roubado na frente de seus olhos.

“Nunca se está velho demais para fantasias e doces, Castiel.” Sam deu uma grande mordida na pizza. “Me pergunto do que eu deveria me vestir esse ano. Zumbis e vampiros são sempre legais.”

“Você tem certeza de que já deixou de ter doze anos?” Ele hesitou por um instante. “Hey, eu queria esse pedaço!”

“Nunca tocou, nunca foi seu.” Sam comeu o restante rapidamente.

Lysandre se sentou entre os dois, evitando que Castiel acabasse partindo para cima de Sam — não se deve mexer com a pizza de um homem —, e pegou um pedaço para si mesmo.

“Deveríamos fazer algo enquanto esperamos a chuva passar.” Lysandre sugeriu. “Talvez possamos simplesmente assistir televisão por algum tempo, a menos que um de vocês tenha uma melhor ideia.”

“Eh, não acho que tenha qualquer ideia melhor. Quero dizer, poderíamos jogar alguma coisa, mas isso normalmente fica mais divertido com mais do que três pessoas.” Sam deu de ombros, pegando um segundo pedaço de pizza, que começou a comer mais lentamente do que o último.

“Nosso verdadeiro problema aqui é: o que a gente faz se a chuva continuar por tempo demais?” Castiel também já estava no seu segundo pedaço, falando entre uma mordida e outra. “Já são oito e meia. Se ficar tarde demais, eu não acho que seria uma boa ideia voltar ainda. Andar de moto na chuva é uma merda.” Revirou os olhos.

“Iremos assistir alguma coisa então. Fiquem de olho na chuva, de qualquer modo. Caso acabem tendo que dormir aqui, nós daremos um jeito.”

“Eu só espero não ter que dormir de jeans. Isso parece desconfortável.”

Mais ou menos uma hora depois, a chuva havia finalmente parado. Castiel ofereceu carona para Sam até a casa dele, mas a chuva voltou quase que momentos depois deles chegarem lá.

“Ah mais vai pra pu- !” Castiel ia gritando, antes de Sam o interromper.

“Hey, está tarde, não vá xingando deus e o mundo a essa hora da noite.” Sam foi andando até a porta. “Anda logo, não é possível que a chuva não pare logo em breve, você pode ficar na minha casa por enquanto.”

Samuel bateu na porta, torcendo para que seus parentes já não estivessem dormindo. Não mais do que trinta segundos depois, Cédric abriu a porta.

“Sammy! Está bem tarde já, estava me perguntando se você conseguiria voltar ainda hoje.” Seu irmão o abraçou.

“É, conseguimos aproveitar a pausa na chuva. Falando nisso, está chovendo de novo, tem problema se Castiel entrar?”

“Oh? Uhm…” Cédric olhou para Castiel por cima do ombro de Sam, que estava no momento aparentemente brincando com os fios de sua franja. “É claro. Sem problemas.”

Samuel indicou para que ele entrasse, tirando os sapatos logo na entrada.

“Hey, eu estou indo ali em cima me trocar.” Sam disse, já se sentindo um pouco desconfortável de estar usando aquelas roupas por tanto tempo. “Pode se sentir à vontade, Castiel! Só não a vontade demais. Cédric é um pouco desconfiado com novas pessoas.”

“Eu ouvi isso!” Cédric gritou da sala.

“Eu sei, eu não estava escondendo nada!” Sam gritou de volta. “Eu volto em menos de dez minutos.”

Sam subiu as escadas rapidamente, entrando em seu quarto logo em seguida. Perguntava-se se deveria colocar seu pijama agora. Já estava tarde, mas provavelmente não se sentiria tão confortável em ser visto por Castiel com ele. Sam acabou decidindo que uma camisa de mangas longas sob outra de mangas curtas e uma bermuda eram mais do que o suficiente por ora. Desceu as escadas com uma maior calma, sabendo que já havia causado mais acidentes descendo do que subindo, e voltou para a sala imediatamente.

Cédric e Castiel pareciam… Estar tendo uma conversa bastante casual.

“Huh, eu já desconfiava.” Castiel ia dizendo enquanto Samuel entrava. “Kymo definitivamente não reagiria bem se eu dissesse isso a ela, entretanto.”

“Oh, hey, eu não saio por nem dez minutos e já chegamos no assunto ‘Kentin’?” Sam sentou-se numa poltrona vazia na sala. Sentou-se não é bem a palavra certa… Ele se jogou mesmo.

“Como você sabia?” Cédric perguntou, levantando uma sobrancelha.

“Eu te conheço e também não existem muitos assuntos que você possa trazer a tona que decepcionaram Kymo.” Sam revirou os olhos. “Eu não recomendaria espalhar isso tão cedo, de qualquer modo. Eu nem tenho certeza se ele começou aquilo de verdade. Algumas coisas parecem… Inconsistentes.”

“Sinceramente, a única coisa consistente nesses rumores é como eles fazem questão de enfatizar o quão impulsivo você é. O que sinceramente é algo óbvio quando se passa mais do que dois minutos em sua presença.” Castiel comentou.

“Eu não tenho a menor ideia do que você está falando.” Sam respondeu, agora com as pernas por cima do encosto da poltrona. “Meu pescoço tá doendo agora. Acho que isso não foi uma boa ideia. Cédric, como eu saio daqui sem me machucar?”

“Eu sei lá, tenta fazer o inverso do que você fez pra ficar assim?” Ele deu de ombros. “Mas eu acho que é esse o ponto. Eu vivi mais de dezesseis anos com ele e eu tenho certeza de que Samuel é muito mais do que simplesmente impulsivo. O quão mais perigoso for a coisa, menos ele pensa antes de fazer.”

“Hey, isso não é verdade. Não é como se eu fosse pular na frente de um carro pra salvar alguém algum dia!” Sam protestou. Ele também pareceu decidir que se empurrar até o chão era a forma mais eficiente de sair da poltrona sem se machucar. Castiel parecia estar tentando — e falhando — segurar o riso.

“Talvez não. Mas você ainda quebrou a sua perna por causa daquele desafio estúpido.”

“Qual era o desafio?” Castiel perguntou, agora parecendo um tanto quanto interessado.

“Pular de mesa em mesa numa sala entre uma aula e outra.” Sam murmurou. “Em minha defesa, eu estava indo muito bem! A culpa foi daquela professora que gritou que aquilo era perigoso o que aí sim deixou as coisas perigosas. Eu escorreguei na hora.”

Sam lembrava desse momento de vez em quando. Ele ficou insistindo o tempo todo que não havia sido nada demais, que ele ficaria bem em breve, segurando o choro que definitivamente queria sair naquela hora porque, oh deus, como havia doído. Era um osso quebrado afinal!

Foi também a primeira vez que Kentin lhe chamou de Samuel. Isso lhe rendeu a falsa esperança de que ele iria começar a tratá-lo pelo nome e pronomes certos… Oh, como ele estava enganado…

“Hey, eu acho que está parando de chover.” Sam disse, olhando pela janela após finalmente se levantar. “Castiel provavelmente deveria ir logo, antes que a chuva decida que quer voltar de novo.”

“É, eu acho que sim. Já está bem tarde também. Quero dizer, eu provavelmente só vou dormir daqui umas três ou quatro horas, mas não é exatamente divertido andar de moto durante a madrugada.” Castiel levantou-se do sofá. “Nos vemos segunda, Samuel.”

“É claro!” Ele sorriu. “Até segunda!”

A segunda feira havia começado bem mal.