Entre o amor e a guerra escrita por Ania Lupin


Capítulo 39
Vermelho, e não verde




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Sábado, 18 de agosto.

As malditas bombas provocavam um barulho ensurdecedor - tão ensurdecedor que mal ouvia a voz de Ginevra. Ela estava chamando seu nome, não estava? Deveria ter percebido antes a esfera preta arremessada tão perto, deveria nunca ter tirado os olhos do vermelho e os depositado nos cinzas de seu pai, tão iguais aos dele ao perceber o quão perto tinha estado de matar o único filho.

"Draco!" Apoiou as mãos no chão, a dor latente em suas costas o fazendo hesitar em se levantar por completo. Não conseguiu evitar um sorriso ao abrir os olhos e achar os chocolates da bruxa, ainda estava cobrindo o corpo pequeno com o dele - graças a Merlin por ela ser tão menor que o sonserino.

Queria muito beijar aqueles lábios, mas seria um erro tamanha distração, sabia. Batalhas afinal tinham se tornado sua maldita especialidade - ainda se orgulhava pelas memórias falsas que passara para seu pai. Lucio não estava mais em seu campo de visão - assim como nenhum outro bruxo -, pode concluir após uma rápida procura.

Merda.

Rolou para a grama, deixando a ruiva livre para se mexer novamente. Definitivamente não esperava sentir toda aquela dor quando suas costas fizeram contato com o chão - quando sentiu pontos penetrarem mais na sua pele, já sabia o que tinha cravado e o quão fodido estava. E o grito de angústia que não conseguiu segurar avisou a gravidade da situação para a bruxa ao seu lado.

Merda, realmente precisava de um medibruxo ao seu lado agora.

"O que eu faço?" Afastar a mão pequena que ia em direção a um dos ferimentos foi sua primeira reação. Não, não poderia apenar reagir, precisava pensar, precisava focar e pensar no que fazer primeiro. Qual era a prioridade?

"Tem algum," Caralho de dor, era o único pensamento ao sentar-se. "Em você?" Boa escolha.

Mas a ruiva não parecia estar focada em ouvi-lo, ao contrário, empurrou aquela maldita mão mais umas duas vezes antes de voltar a falar - sua mão esquerda, livre de qualquer sangue, a impedindo de tentar mais uma aproximação no ferimento aberto.

"Você está ferido-"

"Me escuta, Ginevra!" disse entre os dentes, sua outra mão indo para um ponto marrom-escuro que sentia ficar mais fundo, perto demais das costelas. A mão queimou ao entrar em contato com o espinho, e não soube como conteve a voz ao arranca-lo no segundo seguinte. "Tem algo se mexendo em você?" Ao menos ela parecia finalmente tê-lo ouvido. "Pare de se mexer." Precisava checar aquilo enquanto continuava acordado - eram muitos, conseguia sentir muitos. "Só sinta."

Mas não havia nenhum, tinha quase certeza. Seu corpo tinha pego todos que a acertariam, não havia nada além da bochecha arranhada de um lado, cortada do outro.

"Não." Já começava a sentir calafrios quando enfim veio a resposta. "Não, não tem." Merda. O quanto demoraria para ele perder a consciência com tantos? Se livrou da capa de festa que ainda usava, a mão tentando alcançar outro pedaço de madeira. "O que você está-"

"Preciso arrancar isso." E outra vez aquela mão. "Não toque!" Onde estavam todos? Onde estavam os bruxos da maldita Ordem? "Não toque no sangue." falou, antes de conseguir arrancar mais um, a mão agora mais queimada, o lábio inferior mais aberto com a mordida dada para conter outro grito. "Não toque, ouviu?" A mão que estava na grama enfim achou o que tanto procurava antes, o isqueiro sendo colocado dentro do bolso de sua calça - desconfortavelmente apertada, na sua forma de agora.

Aproveitou para levanta-se, encostado na parede da casa, quando a ruiva fez o mesmo, correndo alguns passos para frente. Não haviam mais feitiços cortando o ar, ao menos. Apesar de ainda estar com a audição prejudicada, sabia que também não haviam mais azarações sendo proferidas, assim daquela vez se conteve e não gritou para a bruxa voltar para trás dele - já estava certo de que não conseguiria fazer nada além de cair em cima dela.

De pé, parado, descobriu que haviam pelo menos dez pontos abertos em suas costas - fora os dois já arrancados. Ao menos nenhum pegara na bruxa, usava aquela informação como seu conforto. Todos iriam acabar nela, não tivesse sido rápido o suficiente - morreria de bom grado sabendo que fora em troca de uma vida muito melhor que a sua.

"Gui!" escutou o grito no momento em que deixou todo o corpo apoiar na parede de madeira, e não foi capaz de evitar o seu ao sentir o erro que acabara de cometer. "Gui, me ajuda!"

Mas simplesmente não tinha um pingo de força para desencostar da droga da madeira, que já absorvia todo o sangue que escorria de suas costas. Nem sabia como ainda estava de pé. Maldição, realmente queria beija-la uma última vez, mas o sangue que cuspia fazia daquele um desejo impossível.

Que maneira mais estúpida de se morrer, pensava enquanto sua visão voltava a turvar. E de repente, um par de braços o apoiava - e com alívio sentia que não eram da ruiva.

"Malfoy? Malfoy, abra os olhos!" Escutou o barulho de uma porta abrindo, se concentrando ao máximo para continuar fazendo suas pernas obedece-lo até ser posto em uma superfície acolchoada.

"De costas não, Gui!" Era a voz dela novamente, e sentia seus lábios subirem ao mesmo tempo que sentia as mãos abrirem os botões de sua camisa - mãos dela. Abriu os olhos no mesmo instante. "Não estou tocando no sangue, seu sonserino paranoico." Nem sentiu-se ridículo ao deixar o sorriso aumentar ao ver as luvas grossas vestindo o par de mãos.

"Mantenha Malfoy acordado." Notou-a olhando para os ferimentos - tão corajosa. Qualquer outra teria saído correndo com aquela visão. "Como ele conseguiu tantos?"

"Bomba." achou sua voz para informar o Weasley mais velho. E então sentiu um pano úmido pressionado contra o nariz, e o cheiro o fez inalar forte, parecendo recuperar metade de sua quase extinta força. Pó de escama de dragão vermelho com firewhisky, como Ginevra se lembrava daquela informação tão específica? "Estão usando em bombas." Como a ruiva tinha aquilo, sendo que muitas vezes nem ele conseguia aquele ingrediente?

"Chame a mamãe, Gin." Gin. A maldita estava tão linda naquela cor. A expressão no rosto, tão preocupada - e com certeza a preocupação não era devido aos outros gritos que começara a ouvir. Merda, talvez fosse realmente morrer daquela vez. "Você pode ajudar os outros, vá chamar-"

"Eu não vou sair daqui." Teve vontade de gargalhar, e talvez o faria se a dor não fosse tanta.

"Teimosa pra caralho."

"Cala a boca, fuinha." escutou-a dizer num tom irritadiço, Ginevra tirando alguns fios loiros grudados em sua testa já suada.

"Segure ele, Gin." escutava o irmão instrur, colocando aquelas mãos pequenas em pontos que o fariam permanecer deitado. "Segure forte. Isso vai doer que nem o inferno." Espinhos do Diabo, afinal. "Malfoy, você sabe que eu preciso arrancar tudo, não sabe?" Fez que sim com a cabeça, já começando a se preparar para a dor. "Eles devem ter menos de dois centímetros, vai ser rápido - eu vou tirar rápido. Respire fundo." Outra vez sorriu - com certeza era a febre que soltava seus lábios -, lembrando-se da memória do Natal. "Pronto?"

"Você sabe que eu não vou desmaiar, Weasley." disse, os olhos não mais saindo de seu bem mais precioso. "Tudo que eu preciso ver está bem na minha frente."

...

Aqueles últimos minutos não pareciam reais - perdera a conta dos beliscões discretos que dava no braço direito.

"Está acabando." dizia numa voz quase maternal - maternal, até mesmo arrepiou-se com o pensamento - para o sonserino, que abafava mais um grito mordendo forte o pedaço de pano.

Queria que não fosse real desde que o viu arrancar o primeiro espinho. Desde que saiu correndo e por sorte achou Guilherme, que não demonstrara surpresa ao colocar os olhos no sonserino - ele sabia de Draco? Desde que o deitou em sua cama naquele estado lamentável.

"Está acabando, é o último." limpou mais uma vez a testa suada com a camisa que o bruxo antes vestia, vendo o irmão depositar na bacia o maior até o momento tirado. Mais um espinho arrancado, e viu Guilherme se livrar das luvas.

"Agora sim foi o último. Não tem mais nada se mexendo, certo Malfoy?" o irmão perguntava, já se levantando da cama. "Não está sentindo mais nada?" Pareceu um grande esforço para o bruxo balançar negativamente a cabeça. "Precisamos fechar esses ferimentos. Gin-" Iria protestar, e que se dane o que Guilherme fosse pensar, quando o ruivo pareceu desistir da ideia inicial. "Fique com ele."

Sim, mais uma vez soube: ficaria para sempre. Independente da marca, de suas famílias, do gênio do sonserino, independente de qualquer fato.

"Vai ficar tudo bem." A frase era mais para si mesma do que para o bruxo, o qual ela sacudia novamente ao ver os olhos cinzas já quase fechados. "Vai ficar tudo bem Draco, você vai ficar bem, ouviu?" Sabia que ele confirmava com a cabeça apenas para acalma-la.

"Desculpa, Gin." As palavras vinham com esforço. "Foi injusto."

"Pare de-"

"Eu nunca quis isso." A mão pálida do bruxo apertava a dela, ainda vestida com a luva grossa. "Eu nunca quis fazer isso com você."

Tinha aguentado acordado com uma força que seu irmão desacreditara, mas com certeza havia usado o resto dela nos últimos minutos - precisava de mais pó de escama de dragão. Abriu a gaveta, lembrando-se de como tivera acesso aquela informação pela primeira vez: se algum dia você estiver com a pior ressaca da sua vida, cheirar isso vai te manter acordado por pelo menos alguma aulas, ruivinha - e não faz exatamente mal. Foi a primeira memória que recordara ter daquele outro sonserino.

"Por favor." Blaise.

"Você vai viver, fuinha." Ah, Colin - como queria Colin ao seu lado agora! "Você vai viver, ou eu nunca vou perdoar você, está me ouvindo?"

Dentro da gaveta de madeira não tinha mais nada além do frasco dado por Fleur - posto agora em seu bolso por precaução -, o recipiente onde guardava o pó vermelho vazio. Outra vez, não via mais a cor que tanto amava.

"Não, não Draco, precisa ficar acordado!" A mão ainda vestida pela luva foi para o ombro ensanguentado, enquanto a outra fez contato com a pele pálida do rosto do bruxo - e ele estava queimando. "Gui!" gritava já indo em direção a porta - onde estava seu irmão, mas que droga! "Guilherme!"

Sua mãe e Rony foram os dois que apareceram, a bruxa mais velha ainda terminando um curativo na cabeça do filho caçula, que olhava com uma mistura de confusão e ódio para dentro do quarto.

"Ronald, não." Molly o advertiu, sabendo do temperamento explosivo daquele ruivo, que já tinha o rosto tão vermelho quando o de Ginevra - que já voltava para o lado do loiro. "O que houve com ele?"

"Ele está queimando de febre!" explicava já sentada outra vez na cama, molhando a camisa na bacia com água e a colocando na testa do bruxo ferido. "E está sangrando tanto, e o Guilherme não volta-"

"Você está tentando salvar esse assassino?" Respirou fundo. Ignoraria seu irmão, ignoraria Ronald e continuaria a falar com sua mãe - que examinava com olhos espantados a bacia cheia de espinhos.

"Isso tudo estava nele?" Não, aquele olhar cheio de surpresa não era agradável. Uma das mãos de Molly foi para a testa do rapaz, a outra batendo a porta com um toque de sua varinha - fechando o outro ruivo para fora, graças a Merlin.

E no segundo seguinte, Molly Weasley tirava do bolso alguns frascos azuis - ainda revirando os demais na túnica, parecendo buscar algo mais específico. Mais uma vez passando o tecido úmido na testa ardente, viu a mãe esvaziar dois frascos sobre as costas do sonserino, a única reação deste além de continuar tremendo sendo a de franzir o cenho em dor - mais dor.

A luva que havia retirado foi-lhe empurrada de volta.

"Espinho do diabo é venenoso." Enfim confirmava o motivo da ordem que lhe fora dada ao menos três vezes pelo bruxo. "O sangue escorrendo está cheio de veneno."

"Gin, como ele- mãe?" Guilherme finalmente voltava para o quarto. "Mãe, onde estão os frascos que Snape-" Aquela balançada de cabeça não era coisa boa. "Merda."

"Que frascos, mãe?"

Não iria chorar. Não iria chorar, por Draco. Draco, que graças a Merlin ainda respirava, mas que havia acabado de se entregar a inconsciência, percebia pela expressão um pouco mais suave naquele rosto pontudo.

"Nós não temos mais antídoto."

Não iria chorar.

...

Sabia que Snape não estaria ali - o bruxo, agora tão bem visto aos olhos Dele, estava na mansão, sendo um dos únicos que não participara do ataque - então não se importou com descrição ao entrar na casa e começar a revirar o estoque do mestre de Poções. Ele o acobertaria, sem dúvida, não falaria nada sobre aquele pequeno deslize. Severo era padrinho de Draco, Severo não o deixaria morrer - e seu filho com certeza não sobreviveria sem a merda de um antídoto com, com certeza, mais de dez espinhos fincados nas costas.

Tentava não pensar na casa para qual teria que retornar, ou no ato de heroísmo tomado por Draco. Tentava não pensar principalmente no fato de quase ter eliminado seu próprio sangue - e ele não falaria nada. Morreria quieto, morreria e ele saberia apenas após a maldição, não fosse pela maldita cria sardenta.

Não precisou entrar na mente do filho para deduzir o que acontecia entre aqueles dois, quando que Draco faria uma coisa daquelas não estando apaixonado? E quando começara a amar aquela traidora de sangue? Seu único filho e uma Weasley - se é que ele sobreviveria, se é que estava vivo ainda, no meio da Ordem, carregando o peso daquele assassinato.

Aparatou de volta ao local de antes assim que achou um saco contendo recipientes cheios de um líquido verde claro, minimamente aliviado em não ver mais ninguém por aquele mato. Soube ter sido o corpo do filho o encostado contra a madeira ensanguentada assim que a avistou, e a visão o fez ter a coragem que precisava para entrar porta adentro, conseguindo automaticamente a atenção de todos naquilo que parecia ser uma cozinha.

Era a varinha de Arthur Weasley que estava quase fincando em sua jugular, tão forte quanto fizera com a filha do mesmo minutos antes.

"O que você está fazendo na minha casa, seu comensal de merda?" As palavras foram cuspidas em sua cara, enquanto Lucio se controlava para não reagir, deixando sua varinha cair no chão. "Que merda você quer aqui, Malfoy?" E logo haviam mais apontadas para ele, praticamente a de todos os outros presentes no cômodo. "Vamos, me dê um bom motivo para não acabar com a sua raça nojenta."

Porque você é um maldito grifinório, quis responder, mas se conteve.

"Meu filho, Weasley." Mas o bruxo claramente não entendeu a resposta.

"Seu filho é um assassino tão desprezível quanto você." Merda. Merda, Draco não estava ali! "Me alegra o fato que sua raça quer tanto o couro dele quanto a nossa." Onde diabos estava o moleque, então?

Precisava sair dali, mas para onde? Algum comensal o vira e agora estava com ele? Para onde aparataria? Conseguiria fazer aquilo sem a varinha - a sacrificaria, a deixando no chão daquele maldito muquifo -, mas qual seria o destino mais provável?

Estava prestes a executar a ação - para qualquer lugar aleatório longe dali - quando uma voz feminina encheu o cômodo.

"Lúcio?" Molly Weasley estava com as roupas cobertas de sangue, luvas vermelhas ainda calçando suas mãos, que seguravam uma bacia com espinhos, água e panos ensanguentados.

"Molly." Sentia-se enojado: nunca imaginara ficar feliz ao ver um ruivo, ainda mais daquela laia. Mas a ruiva era mãe, ela entenderia muito melhor o desespero dele - o desespero que Narcisa vivia há tantas semanas. "Por favor Molly," Se humilharia, se fosse para conseguir poupar aquele garoto estúpido. "Onde está meu filho?"

Eram poucas as coisas que Lucio Malfoy amava realmente em sua vida. Adorava seu dinheiro, sem dúvida, assim como sua influência e todas as possibilidades que ambas coisas lhe davam. Mas se precisasse abrir mão de qualquer dessas coisas, não pensaria duas vezes se fosse para a segurança de sua família. Havia cedido sua casa afinal, e cumprido todas as ordens Dele, a fim de manter essa segurança. Amava Cissy com uma força quase sobre-humana, e o amor pelo filho chegava a ser ainda maior.

Então, perceber a tristeza nos olhos chocolate quase o fizera enfartar - Merlin não deixe Draco estar morto, não deixe ser tarde demais.

"Afaste a varinha, querido." viu Arthur olhar desacreditado para a esposa, e viu a irritante semelhança entre ela e sua mulher: com certeza Narcisa falava muito menos do que aquela bruxa, mas quando ordenava uma coisa, não havia muita escolha. Logo sentia seu pescoço livre da ponta. "Venha comigo."

Sentia os olhares surpresos de todos os bruxos até sair dali, todos da família provavelmente querendo responder a matriarca e nenhum tendo coragem para tal. Foram poucos segundos até chegarem frente a uma porta fechada, ainda naquele mesmo andar, a mão com ainda manchas de sangue da bruxa parando na maçaneta.

"Lucio, ele precisa de um antídoto." Fechou os olhos e deixou-se soltar um suspiro aliviado, tirando o saco cheio de frascos de dentro da capa.

"Você usa um, e caso a febre não baixe, outro após quatro horas." Entregou-os para a ruiva, esta enfim abrindo a porta.

A visão o fez não passar do batente - graças a Merlin a Weasley já abria um frasco e dava para a filha caçula, que no segundo seguinte colocava nos lábios do bruxo pálido que tremia em seu colo. Draco estava tão mais magro do que se lembrava, e sentiu algo apertar no peito ao ver o estado dos ferimentos nas costas - ao ver outras cicatrizes, já fechadas, além daquelas que seriam novas.

"Eu não vou sair daqui, mãe." Era a garota quem falava, provavelmente a única com coragem o suficiente para contestar a velha Weasley. A garota que ele quase matara anos atrás - minutos atrás. A que seu filho havia escolhido para proteger, e sabe para que outras coisas.

Molly deu um suspiro frustrado e voltou-se novamente para ele.

"Não quer entrar?"

Não era exatamente confortável estar ao lado das duas bruxas ruivas enquanto observava o filho mais de perto. Ao menos os tremores haviam cessado, e uma expressão mais suave havia tomado conta daquele rosto, tão pálido quanto seu próprio, parecendo quase relaxado enquanto a mão da jovem grifinória passava pelos fios platinados - mais compridos do que costumavam ser mantidos.

Foi só quando virou-se para a mãe Weasley que viu não ser o único a observar com estranheza o cuidado - Molly também não sabia. Ao menos até aquele momento, a mulher tinha tanto conhecimento da situação quanto ele tinha há horas atrás.

Mas ali, agora, era tão irritantemente claro. Agora, aquela atitude tão delicada, aqueles olhos tão preocupados, denunciavam o maldito relacionamento. E se ele tentasse, se entrasse por um momento naquela mente, confirmaria ainda mais os sentimentos divididos pelos dois. Não, não iria entrar. Não iria forçar-se a ver ainda mais os erros do bruxo.

"Como está meu filho?" deixou escapar a pergunta após mais alguns minutos de silêncio.

Olhos castanhos se voltaram para ele fixando-se por alguns segundos em seus cinzas, uma mistura de raiva e agradecimento.

"Com medo." A mão ainda acariciava os cabelos tingidos de sangue, ora brincando com os fios, ora deixando-se correr até as pontas finas. Engraçado como havia uma barba que até o último verão não existia - ou ele achava não existir, percebendo somente naquele momento o quanto não reparara no filho naqueles dois últimos anos. "Cansado. Mais magro. Mais pálido."

"Nós não o víamos desde junho." Não, não iria entrar naquela mente - já bastava todo o vermelho que via frente aos seus olhos cinzas. Não o viam desde junho, e Narcisa só não havia perdido a sanidade pelo voto perpétuo feito por Severo Snape. Não iria entrar naquela mente. Mas Bellatrix sabia que seu filho estava vivo. Bellatrix sabia que era ele quem havia desarmado o velho direto. Bellatrix sabia, e o caçava por todos os cantos prometendo mentiras - nós apenas precisamos desarma-lo, Lucio.

Graças a Merlin não o acharam - porque agora ele sabia que Draco nunca faria nada que beneficiasse o Lord, nunca mais.

Foi um grito no corredor que tirou a bruxa mais velha do quarto, Molly com certeza apenas deixando o recinto por ter certeza da filha estar mais armada do que Lucio.

"Eu também não."

E então havia visto antes de conseguir se conter - e a jovem sabia que ele tinha conhecimento daquela dúvida no instante seguinte. Havia sido tão sutil, e poderia passar tão despercebido, não fossem seus anos de experiência em decifrar um único lampejo de pensamento. Nem mesmo poderia arrancar seu filho daquele monte de vermelho - nunca mais poderia, estava certo.

Tentava o conforto da única forma que lhe restava.

"Toujours pur." o sussurro havia sido para si, mas não passou batido pela bruxa ao seu lado. "Cuide dele."

Precisava achar Snape antes de achar ela. Precisava sair dali, achar Snape antes de sua cunhada insana, e pedir para esquecer de tudo que aprendera naqueles últimos minutos.

"E sumam daqui."

E com um último olhar para o filho, deixou o quarto.

...

Domingo, 19 de agosto.

Sempre que Fred passava pela porta, lançava um de seus piores olhares para o loiro que repousava, a cabeça ainda em seu colo. Sua mãe ainda não voltara, e por mais que quisesse utilizar o presente de Fleur, não exatamente confiava em deixar o sonserino desacompanhado naquela casa - por mais que já houvesse sido gritado aos sete ventos sobre sua ausência de responsabilidade na execução da morte de Dumbledore. Havia fechado os olhos duas ou três vezes - deveria ter conseguido dormir algumas horas, pelo menos era o que dizia o relógio que agora marcava três e meia da manhã. E sim, dormir debruçada numa cama não era a melhor posição para se dormir, descobriu quando voltou a sentar-se na mesma, esfregando os olhos.

Somente quando viu a ruiva mais velha entrar novamente no quarto, um prato cheio de salgados nas mãos, foi que tomou coragem para levantar dali - o olhar de Molly querendo explicações pelo até agora visto, mas a bruxa a deixando passar pela porta.

"Preciso de uns minutos, mãe." Pegou uma pequena torta antes de rumar para o fim do corredor, a colocando por inteiro na boca segundos antes de virar a maçaneta da porta de madeira. Maldição, estava com fome - aquele pedaço de comida parecia ter acordado seu estômago, que já pedia por mais.

Depois.

Trancou a porta do banheiro antes de sentar-se no chão, por um momento apreciando o frio proporcionado pelo piso do cômodo. Tirou a rolha do frasco e o levou aos lábios, ingerindo todo o conteúdo em um só gole. Cinco minutos, segundo Fleur.

"Por que você está me ajudando?"

"Você faz parte da minha família agora, Ginevra." a loira disse, jogando os cabelos. "Faço por você o que faria por Grabrielle. E não se preocupe, não vai haver uma palavra disso para seu irmão, ele nem sabe que tenho essa poção."

"Você-"

"Não precisei usar, soube por outros meios. Gui nem ficou sabendo de minha dúvida." pegou o recipiente que Fleur colocava discretamente na palma de sua mão esquerda. "Você toma, e espera cinco minutos. Já tome no banheiro, você fica com muita vontade. Se sair vermelho, não tem nada."

Realmente a vontade de urinar era desesperadora, sentiu-a em com certeza menos de três minutos. Talvez fosse porque estava tudo bem. Estava tudo bem, ela estava bem, e quando se levantasse, veria vermelho, apenas.

"E se tiver?"

Vermelho, e não verde, vermelho, e não verde.

"Se tiver, eu ajudo você no que quiser fazer. É só me falar."

Pegou um pedaço de papel higiênico e se limpou, sabendo que já conseguiria ver ali seu resultado. Nunca se sentiu tão covarde ao jogar um papel dentro da privada, de olhos fechados. Demorou mais para reunir coragem e se levantar do que a poção para fazer efeito.

Seja mais mulher, Ginevra.

Mas foram dez minutos até voltar a ficar de pé e olhar para dentro do vaso sanitário.

Vermelho, e não verde, vermelho, e não verde, vermelho, e não-

Ginevra não era uma bruxa que xingava muito. Falava um palavrão ou outro, tinha algumas atitudes masculinas, no entanto para uma menina criada com mais seis irmãos, ela se comportava como uma verdadeira dama. Mas ao ver a cor do líquido, aquelas primeiras palavras saíram naturalmente.

"Puta que pariu." levou as mãos para a boca logo depois.

Verde.


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Notas finais do capítulo

Oi gente! Pra todos que me perguntaram se ela estava ou não grávida, taí a resposta ;)

Espero que tenham gostado do capitulo! ;*



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