Physalis escrita por Evelie Belinky


Capítulo 1
Desolação




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Não sei ao certo quanto tempo mantive-me trancada em meu quarto, mas pela primeira vez, em meses, senti a necessidade de sair. No entanto o medo, como sempre, sobressaiu. Eu costumava descer e passar todos os dias sentada em frente à janela da sala, era minha maneira de observar a vida sem realmente fazer parte dela. Até o momento que Peeta, em uma singela homenagem, plantou mudas de Evening Primrose, a flor que deu origem ao nome de minha irmã, ao derredor da casa. No começo as flores e a vida que emanavam delas me reconfortavam, então em um dia de rigoroso inverno as flores morreram e isso despertou o pior em mim. No dia seguinte não desci e nem nos próximos.

Minha querida irmãzinha, mais de um ano já havia se passado desde a sua morte e a única coisa que consigo pensar todos os dias, a cada momento, é na dor que eu sinto pela sua perda. Nem que eu vivesse mil anos estaria preparada para isso. Prim era minha vida, meu centro, minha certeza de dias melhores e tudo deixaram de existir com ela e, como tal, não voltariam a existir.

Permaneci em minha fortaleza, deitada em minha cama, remoendo a dor e a culpa que insistiam em me fazer companhia. Fiquei assim durante todo o dia levantando-me apenas para as refeições que Greasy Sae insistia em trazer, ela permanecia ali parada me olhando sem dizer nenhuma palavra, apenas certificando que eu coma tudo.

No começo ela parecia importar-se verdadeiramente comigo, me deixava a par de tudo que acontecia no distrito mesmo com a minha falta de interesse, insistia que eu me arrumasse e caminhasse um pouco - É do que você precisa minha querida, o ar puro vai te fazer bem. Ela dizia. E diversas vezes, entrou em meu quarto determinada a me tirar daqui de qualquer jeito – Eu sei que é difícil menina, mas você tem que dar uma chance para si mesma. A vida continua... Começava. E após um longo discurso percebendo minha indiferença, ela saía frustrada. Porém há algumas semanas sua missão tem sido apenas não me deixar morrer de fome, e assim como eu, ela também havia desistido de mim.

Logo a noite chegou e Greasy entrou trazendo o meu jantar, cozido de carneiro, era meu prato favorito, mas agora até o cheiro me enoja. Ela posicionou o prato em cima da mesinha no canto do quarto e esperou. Eu não me mexi.

—Você precisa comer Katniss. – Ela disse. E após tantos dias sem ouvi-la sua voz pareceu-me estranha.

—Não estou com fome. – Era verdade, há muito tempo a fome não me incomodava mais.

Ela esperou e depois de alguns minutos saiu sem dizer nada. Agora não havia missão alguma, eu estava definitivamente sozinha. A solidão nunca me assustara, existia até certo conforto nela. Antigamente, antes de tudo o que aconteceu desde que me tornei um tributo, costumava passar horas na floresta caçando e me escondendo de tudo. Era apenas eu, meu arco, os ruídos da floresta e depois de muita relutância da minha parte meu companheiro de caça e consequentemente amigo, Gale.

Gale, pensar nele desperta um novelo de sentimentos em mim. Raiva, rancor, decepção, tristeza e saudade, não do que ele se tornou, mas do que ele era antes de tudo. As últimas notícias que tive dele é que estava no distrito dois, juntamente com sua família, com algum emprego extravagante. Ele estava dando continuidade à vida.

Afastei esses pensamentos da minha mente antes que eles me levassem a um lugar da qual não conseguiria sair. Levantei-me da cama, minhas pernas um pouco trêmulas da falta de movimentos frequentes e rumei para o banheiro. Não dava mais para ignorar a dor em minha bexiga. Depois resolvi tomar um banho, havia dias desde meu ultimo banho por insistência de Greasy Sae e devo admitir a água quente é reconfortante, preciso fazer isso mais frequentemente.

Após o banho voltei para a cama sem fazer questão de pentear e nem secar os cabelos emaranhados. Deitei evitando ao máximo o sono, no entanto o cansaço de noites mal dormidas vence. Mais tarde os pesadelos vieram e eu acordei gritando tanto que minha garganta doía, já devia ter me acostumado depois de tanto tempo, mas não acho que isso seja possível. Levantei tremendo tentando reorganizar as imagens em minha mente – foi só um pesadelo, não é real, repetia como mantra. Porém parecia muito real e talvez tivesse sido um dia. Nesses momentos como em muitos outros, manter a calma é impossível e o desespero, o medo e a dor tomam conta de mim. Deito-me no chão empoeirado do quarto tamanho o peso da culpa que sinto e choro desesperadamente pelos rostos tão familiares em minha cabeça, que me assombram a cada maldita noite.

— Me perdoem! – Imploro, mas como sempre não obtenho respostas.

O sol finalmente nasce e me encontra ainda deitada no chão. Olho para as partículas de poeira cintilando na luz que entra pela janela. Isso me faz lembrar uma época não muito distante dessa, na ocasião eu estava nesse mesmo quarto me recuperando de uma lesão no tornozelo e Peeta estava sentado ao meu lado. Eu o observava enquanto ele trabalhava em seus desenhos para o livro da família. Reparava em sua expressão concentrada e em seus cílios, havia desenvolvido uma fixação por eles, que brilhavam com a luz do sol que entrava pela janela. Uma vez ele me pegou o encarando e isso me constrangeu absurdamente.

O que Peeta estaria fazendo agora? Talvez ele estivesse pitando mais um de seus quadros e talvez a luz que entra pela janela de seu quarto fizessem seus cílios brilharem. Ou quem sabe assando pães. De uma coisa é certa ele não estava pensando em mim. Logo após o episodio das flores nunca mais o vi, ele costumava vim bem cedinho trazer pães quentinhos, mas nunca se dignou a subir. Greasy falava muito dele no começo – O garoto veio trazer uma fornada de pães para você Katniss e perguntou como você estava. Ela dizia. Mas ao decorrer dos meses ela parou de falar e os pães pararam de chegar, então deduzi que ele também estava tocando a vida em frente.

Não posso evitar sentir uma pontada no peito com esse pensamento, eu sinto muito a sua falta. Admita Katniss você o perdeu e não a nada que possa fazer para mudar isso, minha consciência grita. E a ideia de não ter mais os seus braços fortes me abraçando e me protegendo durante o sono quebra meu coração e eu choro mais uma vez, não pelos rostos que me atormentam a noite, mas exclusivamente por ele. Meu garoto do pão.


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Notas finais do capítulo

Bem, é isso. Espero que tenham gostado do primeiro capitulo, trago a continuação em breve. Peço desculpas pelos erros ortográficos que passaram despercebidos, prometo melhorar cada vez mais.
Até a próxima. Bjs



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