Filhos da Magia escrita por Taetación


Capítulo 19
Capítulo 18 - Caía e caía novamente




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Encaro a sussurradora mortal em minha frente. Sinto-me genuinamente amedrontada com tal revelação. Assim com Tyler e Ichiro, eu fui, novamente, espionada por seres místicos contra minha vontade. Já não deveria ser mais uma surpresa para mim, mesmo vindo de algo que me acompanha desde minha infância, um objeto que nunca deveria falar. Como eu ainda fico abobada com isso?  e principalmente, é estúpido demonstrar surpresa. Me faz parecer inexperiente, ingênua. Encho de ar os meus pulmões, sentindo a aura pesada que pairava.  

Confesso, o que ele disse é real, mas nada que eu não já saibia. Se finalmente alguém pode me mostrar a saída, porque eu recusaria? além de ser uma alma que me acompanha desde a infância, dada pelo meu pai. Então, sim, aparentemente, eu posso confiar.   

— Então, mestre … — digo hesitante lembrando de meu último tutor — Conte-me, como eu saio desse inferno?  

K’onar ri num tom malicioso.  

Pois bem, você, tecnicamente, conhece a saída”   

— Seja claro. — digo severa.  

Stagnum,, a cachoeira.”  

Ofego, rindo de nervoso.  

— Está brincando?  

Não, nem um pouco”     

— Mas Idas já morou lá … ele teria me contado se … — eu me interrompi ao perceber que falava demais. Inspiro fundo, tentando raciocinar e não me deixar levar pela emoção. — Não consigo ir a Stagnum sem a ajuda de Naomi. Ela está ocupada e suspeitará. No entanto, temos Idas ao nosso lado.  

Minha magia suporta apenas uma pessoa” disse no momento que terminei minha frase “Aproveitaremos o auge da noite para nos apropriarmos mais da energia que a lua nos dará hoje. Leve o mínimo de roupas e objetos que puder. Armas, tirando eu, serão dispensáveis. Mantenha equipamentos para auto-medicação. O livro é indispensável. Faça tudo isso agora.”  

Eu nem ao menos pensei. Levanto depressa em direção a minha mochila e retiro dela uma boa quantidade de roupa, depois, pego minhas armas e as jogo em baixo do colchão, em seguida, coloquei com cuidado remédios, agulhas, linhas e ataduras dentro da mochila, enfim, fecho-a. Das roupas em cima da cama, escolho calça e jaqueta jeans preta com uma blusa de manga comprida e botas da mesma cor. Começo a me despir indo em direção ao banheiro.  

Como precisaríamos da lua para completar o feitiço, aproveitei as últimas horas para me preparar. Realmente precisava de um banho. Não sei como aguentei meu próprio mal cheiro. Encho a banheira de água. Uso meu recém aprendizado para duplicar a quantidade de água que saía da torneira. Ela começa a transbordar. E eu não me importo. Lentamente, ponho o pé, depois a perna, seguida pelo corpo inteiro na banheira. A água não me suporta e sai, mesmo assim continuo com ela até o pescoço. Ergo a mão e pego o sabonete na pia, então começo a me lavar como se fosse a primeira vez.  

Talvez tenha tomado um tempo para mim por uns trinta minutos. Foi o suficiente para me sentir renovada. Levanto, pego a toalha reserva e uso minha magia para fazer a água escorrer pelo ralo, então, viro de costas indo me vestir.  

Minha jornada atrás de minha irmã nunca me garantiu um resort, então biquíni sempre foi considerado inútil. Confesso que na questão da água o que mais me preocupa é meu feitiço de respiração. Mesmo que eu tenha melhorado muito, isso ainda martela em minha cabeça.  

Termino de me vestir, deixo meu cabelo molhado solto, pego minha mochila, que estava meio pesada, e saio do meu quarto batendo a porta atrás de mim.  

— O que fazemos agora? — murmuro enquanto ando para fora do castelo, evitando olhar nos olhos das pessoas.  

"Suba na torre que você vai quando quer descansar." e assim eu fiz sem pestanejar.  

A cada degrau que eu subia, a coragem me enchia. E fui percebendo que a tão esperada noite chegava aos poucos. O sol estava se pondo, e eu pude observar pela última vez a bela visão alaranjada que Swamoris proporcionava. Nem uma alma nas ruas ou anjos no céu.  

Lembro-me de Idas, consequentemente, da promessa que não pudera cumprir. Meu coração aperta. Era pecado dar tanta esperança para ele e não se comprometer o final. Talvez seja nossa última vez juntos, talvez eu nunca mais volte. Mas eu prometo que nunca esquecerei o que fez por mim. Seu ajuda, presença e amizade foi o que me fez esquecer, mesmo que só um pouco, os problemas que me rodeavam.   

— Eu não posso levá-lo... — murmuro para K'onar.  

"Exato. Isso está fora do meu alcance."  

— Não irei me perdoar.  

"O tempo confortará seu coração, Akemi. Isso não é um adeus." franzi o cenho, retendo a vontade de chorar.  

— Não — olho para o céu — Não é. — sorri um pouco.  

Ambos ficamos em silêncio. Acredito que K'onar se calou por respeito a minha tristeza. Mas eu fiquei com medo. Medo de Idas me encontrar e me perguntar quando iríamos embora ou medo que mentir enquanto o olho. Eu apenas não queria ser má para conseguir o que quero. Mesmo que a vitória agrade meu paladar com mel dos deuses, a perda me cortará com seus afiados espinhos, então, talvez a vitória não valha tanto a pena.  

Eu fiquei deitada até a noite vir. Quase me rendi ao sono, mas a katana me impediu. As estrelas enfeitavam o céu límpido, o vento estava calmo, a lua enormemente cheia – tudo estava lindo. Sinto uma pequena alteração na aura, eu estava mais animada.   

— O que eu faço agora? — indaguei.  

"Suba na beirada da torre. Eu espero que você tenha equilíbrio." arregalo os olhos com a fala.  

— Como uma garça — era algo simples. Logo que subi, olho para baixo, aí então o nervosismo me atingiu — E agora?  

"Há um feitiço que mostra os segredos dos locais que você está. No nosso caso, precisamos saber onde está Stagnum. Agora, como entrar lá deixaremos para daqui a pouco."   

— Que feitiço é esse?  

"Respira e diga: Alerarium sit latum."  

 Alerarium sit latum… Alerarium sit latum...Alerarium sit latum. — eu repito de olhos fechados. O formigamento me perfura. Estava funcionando.  

Abri meus olhos, e como o feitiço de invocação, o mundo estava cinza. Mas, dessa vez era diferente. Uma aura laranja saía de mim contrastando com o mundo acinzentado e algumas auras coloridas estavam espalhadas pela cidade, eram azuis e bem fracas.  

— O que exatamente esse feitiço faz? — indaguei.  

"Mostrar todas as coisas mais poderosas usando auras coloridas. Mas isso não vem ao caso."  

—  Então, onde está?  

"Suba mais alto" meus olhos rodaram nas órbitas enquanto fazia o que mandou “Não conseguiremos enxergar apenas daqui.” 

Me virei para poder subir no telhado da torre. As telhas estavam direcionadas para baixo, tive medo de subir e cair na hora por isso escalei lentamente aos murmúrios de reclamação de K’onar. Me agarro no metal frio fincado no topo da torre, nesse tinha uma bandeirinha que nunca havia reparado, estava escrito “Swamoris”.  

Ótimo, garota. Faça o feitiço novamente. Rápido!” eu fecho os olhos e respiro fundo. 

— Alerarium sit latum!  — devagar, eu abro meus olhos, mas nada tinha mudado — Então, seus feitiços são horríveis.  

Você é tão sortuda que tem belos olhos nas costas…” riu. 

Estreito os olhos, desconfiada. Dou uma averiguada atrás de mim. A vista foi tão surpreendente que me faltou ar, aperto firme o metal em que me sustentava.  

Como eu tinha ignorado esse fato antes?  

Era a ilha inteira! Lembro-me de quando cheguei aqui pela primeira vez quando Idas me salvou. A ilha em forma de um estranho polvo coberta de árvores estava tão brilhante quanto a lua, um verde escuro fluorescente fantasmagórico. Quase certeza que essa luz era alucinógena, pois juro que vi os “tentáculos” se mexerem, olhos vermelhos e enormes me encarando seguido de uns barulhos ensurdecedor de água em meus ouvidos como se eu estivesse na praia. 

“K’onar… isso é incrível” disse em meus pensamentos pois estava boba - e surpresa - demais para falar. 

"E perigoso. Agora que encontramos a entrada de Stagnum precisamos pular na… boca.” 

— Espera, o quê? — olho novamente para a criatura enorme — MAS POLVOS NÃO TEM BOCA!  

Sim, por isso você vai pular nos olhos dele. Ele ficará irritado e talvez tentará te matar já que é uma intrusa e não tem tanta confiança quanto Idas e Naomi, mas ainda assim dá para sobreviver” 

— Ah, Deus… ok, vamos fazer isso. — digo meio receosa.  

Não que você tenha muita opção” provocou, mas estava certo.

— Efeitos colaterais? — pergunto sem graça. 

Falta de ar, tonteira, morte, essas coisas” eu riu falso “Veja, não demore muito para tomar suas decisões. Guardas protegem o castelo de noite" olhei para trás. Alguns homens fardados andavam pela cidade e logo chegariam no castelo, se é que já não tinha outros aqui. “Você está tentando fugir. Se te acharem, provavelmente, te prenderão no quarto e sei que você não quer isso. Estamos. Sem. Tempo.” 

— Se meu rosto ficar desfigurado… 

VÁ AGORA!

Eu tomo impulso e pulo da torre encarando os olhos vermelhos da criatura que era a ilha de Swamoris. Sentindo o vento em meu rosto, com a cara perto do chão, gritei o feitiço de respiração. 

— Respirare! 

Mas, para o meu desespero minha mão tocou no chão e uma dor imensa percorreu pelo meu braço. Tudo parecia em câmera lenta e a dor pelo meu corpo aumentava, minha visão começou a ficar turva. Porém, minha mão passou pelo chão, seguido pelo braço, torso e pernas. E uma vez que entrei por completa na escuridão que passou a me cercar, a dor cessou, e eu caía no nada. 

“Você...” eu não conseguia abrir a boca ou os olhos. Minha garganta estava dolorida, meus olhos secos e não conseguia respirar normalmente. Era como se estivesse me afogando “ K’onar...” 

Olhe para onde você está caindo, Akemi!” 

Eu jogo meu corpo para o lado e avisto a imensidão verde-água que chegava cada vez mais perto de meu rosto. Sinto o impacto vigoroso da água em meu corpo. Me arrepio por inteiro com a sensação eletrizante da água em minha pele. Abro a boca sentindo finalmente o ar entrar em meus pulmões, meus olhos visam claramente debaixo d’água as rochas, peixes, algas e corais, e escuto o som hipnotizante da água e uma voz. Não era K’onar. A voz vinha de fora da água. 

Eu movo meus braços dando impulso para ficar na superfície. Respiro fundo mais uma vez, meu coração acelera ao ver Idas escorado nas pedras gritando algo para mim e apontando para água. Subitamente, faíscas de felicidade me enchem e sorrio para ele. Mas um massivo sentimento de atenção me fez olhar para trás. Uma barbatana cinza estava se aproximando rapidamente. Não hesitei me defender hora.  

— Imperium aquam! — a criatura enorme começa a emergir da água rosnando e exibindo se enormes dentes afiados, começa a se debater no ar enquanto uso minha magia para levitar ele. A água começa a alcançar o tubarão e o envolver como uma grande bolha, então começa a diminuir, comprimindo o animal que lá tinha. 

Quanto mais perto a palma de minha mão estava da outra, mais apertado ficava para o tubarão que agonizava lá dentro. Pouco a pouco, ele vai sendo amassado até que a bolha estoura num estrondo ensurdecedor e pedaços da carne do animal voam pela cachoeira.  

Fui perceber que mal estava cansada, extasiada e com adrenalina, mas longe de cansada. Começo a nadar para a margem da cachoeira e sou recebida pela mão amiga de Idas, dando-me uma ajuda para subir, e claro, eu aceito.  

— Sempre entrando em problema. — ele sorri. 

 — Eu sou a favorita do universo. Tudo conspira ao meu favor. — digo sarcástica. Dou um rápido abraço molhado no anjo.  

— Então nossos encontros sãos coisas que o destino programou. — seus olhos disparam em minha direção, provocantes, com a companhia de lábios maliciosos. 

— Eu considero como azar — Idas faz uma careta. — Mas, afinal, o que a aqui? 

—  Te pergunto o mesmo… 

—  Oh… — eu cubro a boca, escondendo o sorriso ladino — Eu encontrei uma saída! 

Ele piscou. 

— Mesmo? —  assenti positivamente — Akemi… — se interrompeu — Você já estava indo embora? 

— Sim, a alma me indicou que aqui era o local para a nossa saída. 

— Nívia disse isso? 

—  Não, K’onar! 

— K’onar? —  ele olhou para a katana — Oh… 

Algo não está certo.” disse a sussurradora para a minha desgraça. 

—  O quê? — disse para ambos. 

—  É confiável?  

—  Ele é um conhecido da família, então, sim — encaro os olhos heterocromáticos do anjo — Você confia em mim? 

— Sim! —  disse de imediato, e eu sorrio. 

A água está se mexendo mais do que o normal” olho para o lado e vejo os tremores quase imperceptível “Consegue ver os peixes se afastando” meu corpo começa a tremer de nojo por algum motivo “Você está conectado com a água agora. Sentirá na pele essas mudanças

—  Você está bem, Akemi? —  seus olhos brilhavam preocupação — Seu rosto fechou de repente. 

Um tremor nos surpreendeu. As pedras nas quais pisávamos começaram a se afundar, todas, um por um. Idas pegou em minha mão e me guiou até o final da cachoeira. Ficamos encostados perto da queda d’água, nos agarrando no que restou das pedras. 

— Use suas asas! — gritei para Idas.

Ele se afastou e suas asas rasgaram sua camisa branca, virou-se para mim estendeu e eu apeguei, abraçando seu torso nu enquanto ele levantava voo. O som assustador das rochas caindo me fizeram olhar para o lado, mas não fui rápida o suficiente para alterar o anjo quando um grande pedaço da cachoeira caiu sobre nós.

Eu grito de dor com o impacto entre a água, eu e o pedaço rochoso que me esmagava. Inconsequentemente eu me afundava mais e mais. Minha visão que estava límpida começava a fraquejar, eu perco a força no corpo. Não sinto mais o calor de Idas em mim. Não sinto nem meu próprio calor. O pedregulho que me afundava cobria meu pescoço e pernas. A extrema dor me impedia de ao menos piscar. Mas ainda via a bela visão debaixo d’água, a luz chamativa da superfície, as bolhas de ar que saiam de minha boca, e com elas, toda minha esperança de que conseguiria sair de Swamoris. 


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Notas finais do capítulo

até outro dia



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