Além do Castelo escrita por LC_Pena, SpinOff de HOH


Capítulo 14
Capítulo 14 Mahoutokoro


Notas iniciais do capítulo

Vamos recapitular Mahoutokoro:

— Kurai e Akira se meteram em problemas e foram expulsos;
— Opa, algo aconteceu e eles não estão mais expulsos;
— Há dois Aidans: Dark Aidan e Good Aidan;
— Good Aidan está temporariamente abrigado na casa de Kurai, que é um dos herdeiros dos Shinoda, família líder de um clã da máfia japonesa, a Yakuza.

Agora sim:

Enjoy!



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Apartamento dos Shinoda, Kyoto, Japão, 11 de Setembro de 2021

Aidan desencostou do almofadão em que estava lendo pelas últimas duas horas, se espreguiçou, assustando de leve sua outra versão, que estava cochilando com um livro encostado na barriga.

—Desculpe, cara. - Disse passando a mão no pescoço, tentando relaxar os músculos. Estavam nessa mesma rotina de estudos exaustiva há noites, não sabia quanto tempo mais iria aguentar. —Acho melhor levar Akira logo, não estamos tendo nenhum progresso hoje.

O outro Aidan fez uma careta para o tom derrotista de sua cópia de outra dimensão, da dimensão “expulsão de Akira e Kurai”, no caso. O garoto recém acordado pensou que era suposto que ele fosse mais útil do que isso, já que não estava indo para a escola e podia literalmente dormir a hora que quisesse!

Mas a verdade é que essa rotina estava deixando a todos com um humor de cão: Dark Aidan, Akira e Kurai tinham poucas horas de sono, estudando tudo em que podia pôr as mãos e que fosse remotamente ligado ao tempo e depois tinham ainda que ir para as aulas em Mahoutokoro, que nunca foram conhecidas por serem simples.

Já ele ficava jogando videogame e lendo quadrinhos o dia todo, devia estar estudando mais...

—Vamos acabar encontrando algo, eu tenho certeza! Não é possível que não haja nada em lugar nenhum sobre viagens no tempo! - O lufa-lufa abrigado em um apartamento pertencente a máfia japonesa tentou parecer mais otimista do que sua cópia, mas o sorriso pouco animado do outro mostrou que falhou miseravelmente. —Queria poder ajudar mais, indo para a escola no seu lugar, mas o maldito uniforme insiste em me chamar de burro!

O outro garoto riu, porque nunca tinha tido a oportunidade de ver a si mesmo fazendo essa cara de indignação tão engraçada.

—As vestes não estão te chamando de burro, cara, elas apenas sabem que um de nós está com mais conhecimento que o outro, talvez se você tentar usar o...

—E trazer um terceiro Aidan para a equação? Obrigado, mas eu passo, Dark Aidan, nada de sonuit pra mim. - Aidan finalizou enfático e sua cópia o olhou chateado.

—Precisamos mesmo usar esses apelidos? Eu não sou das trevas... - Resmungou colocando o livro que estava apoiado em seu colo no chão para finalmente se levantar e levar Akira para casa via chave de portal.

—A gente precisa usar alguma coisa e só te chamamos assim, porque, você sabe, os meninos acham que você é um viajante de um futuro sombrio que está escondendo o jogo! - O garoto com uma camisa emprestada de Kurai que dizia “too kawaii to live, too sugoi to die”, falou inocente.

Aquela frase da camiseta era basicamente o resumo de sua existência.

—Isso é absurdo, se eu fosse um viajante no tempo de um futuro apocalíptico, eu não poderia ter a sua idade! - O outro Aidan, esse com uma camiseta “ Don’t you want me? - Good for you.”, falou sarcástico. —Às vezes eu acho que nosso irmão é de uma outra espécie...

—Ah bom, Dark Aidan, você é muito esperto mesmo, porque eu não tinha pensado nisso...— Essa última parte Good Aidan resmungou baixinho para si mesmo, fazendo o outro o olhar sem entender, não tinha ouvido nada. —Ok, senta aí, cara, precisamos conversar.

Dark Aidan se jogou de volta no lugar com uma expressão metade cansada, metade irritada, conversar não era tudo que tinham feito desde o fatídico dia 04 de setembro?

—Sobre o que quer falar dessa vez?

—Vamos repassar a sua viagem no tempo. - Good Aidan falou com seriedade, mas o outro não tinha o apelido de Dark a toa, ele era muito mais impaciente, irritadiço e fazia uma cara de “fala sério!” digna de um sonserino.

—O que você não entendeu dessa vez? - Ele perguntou irritado, demonstrando que as vestes podiam até não estar realmente chamando Good Aidan de burro, mas ele estava.

Podiam se chamar de Aidan ligado e Aidan desligado..

—Eu quero que além de me contar por alto o que aconteceu, que você demonstre! Vá narrando os fatos, preciso ver tudo, me faça estar lá, para a gente ficar no mesmo nível! - O Aidan refugiado na Yakuza procurou ao redor por algo que pudesse ajudar na encenação. —Aqui, finge que essa almofada é o santuário, me mostra o que fez.

O outro garoto respirou fundo, com impaciência, mas aceitou a almofada.

—Ok, por onde eu começo? Tá, eu estava... Estava almoçando na colina dos petréis, conversando com Cesc por vídeo chamada, quando Akira e Kurai subiram o morro assustados. - Apontou para os dois dormindo largados na cama grande do garoto herdeiro da máfia. —Nessa hora eles já estavam expulsos, então eu desliguei a chamada e Cesc não me deixou esquecer isso desde então, inclusive, como você bem sabe.

—Ok, eu tenho uma pergunta sobre essa parte, mas vamos deixar para o final, continue.

—Akira insistiu que eu precisava ajuda-los, que tinha sido tudo um acidente e sacou o sonuit da mochila. - Aidan contou irritado, porque a culpa era do garoto de 12 anos que agora, ironicamente, o olhava como se ele fosse um vilão, mesmo ele contando toda a história!

Como podia ser o vilão se tinha apenas tentado ajudar usando o plano bolado pelo próprio Akira?

—Como ele... Ele roubou, não foi? - Good Aidan olhou para o irmão mais novo dormindo na cama, ele parecia tão inocente... —Ele roubou o sonuit de novo.

—Sim, antes mesmo da gente chegar ao Japão, ele disse no dia da expulsão “Papai não usa e eu pensei que precisaríamos de toda a ajuda possível na escola e, como sempre, eu estava literalmente certo”. - Aidan falou imitando o irmão e o outro fez uma careta, porque aquilo soava exatamente como Akira.

—E então você usou o sonuit.

—Sim, porque eles dois já haviam tentado antes, sozinhos e não funcionou, só funcionou comigo. - Respondeu exasperado e Good Aidan fez um sim reflexivo com a cabeça, porque aquilo era estranho. —Nosso avô diz que não funciona com todos, papai não usa porque não é lá muito útil pra ele e...

—Isso você não havia me contado! - Good Aidan sinalizou surpreso e o outro só deu de ombros.

—Aparentemente é muito comum, certos artefatos “gostam” de uns e não de outros, tipo o manto da levitação do Dr. Strange. - Dark Aidan usou apenas a referência dos quadrinhos do personagem favorito deles no mundo todo, então sua cópia arregalou os olhos com o entendimento. —Quem diria que a Marvel estava certa sobre a magia esse tempo todo, hum?

—Eu diria! - Good Aidan respondeu de pronto e os dois deram risada. —Melhor fonte de conhecimentos do mundo!

—Ok, enfim, o sonuit gosta de mim, então nosso avô me deixou ficar com ele sem nem questionar como eu tinha conseguido e tipo, cara, a gente virou os fodões na escola! - Dark Aidan falou com um sorriso ladino no rosto, falando com um pouco de arrogância. —Vestes vermelhas em menos de duas semanas de aula, super artefato de família, chutando bundas na aula de Pepakura graças a Gamoshi... Nós somos como o spidey, só que sem a máscara!

—Eu quero essa vida, eu quero... Espera e a Hui? Ela está... - Good Aidan gesticulou para que o outro continuasse, mas ele parecia ter perdido a animação.

—Ela se afastou.

—O quê? Por que? Olha aí! Por isso que o Spider-man não tira a máscara... - Aidan falou chateado e sua cópia da outra dimensão o olhou igualmente chateado. —Por que não me contou que as coisas tinha mudado assim?

—Eu sei lá, acho... Bem, essa é a sua vida, cara! Às vezes penso que só está funcionando porque não é a minha.... Se fosse a minha, eu já teria estragado tudo. - O outro riu disso, porque era bem verdade. —Eu me sinto... Me sinto um usurpador.

Nenhum dos dois disse mais nada quanto a isso, porque era algo que concordavam, em parte. O silêncio se prolongou até o máximo que podiam aguentar, então Good Aidan voltou a falar, afinal essa teoria de “usurpador” não era a única que existia.

—Não há muito o que possa ser feito e... Eu sei lá, eu provavelmente teria feito o mesmo.

—Não tem nada de “provavelmente” nisso, porque nós somos literalmente a mesma pessoa! - Dark Aidan falou irritado, usando a palavra favorita de Akira. —Tudo que nos separa são exatos 22 minutos, cara! 22 minutos onde eu podia ter escolhido não fazer nada e continuaria  com a minha vida normal, onde eu teria deixado Akira e Kurai serem expulsos, porque não é como se eles não merecessem!

—Nunca faríamos isso. - Good Aidan olhou para os dois garotos idiotas e inconsequentes dormindo na cama tranquilamente. —Nunca teríamos deixado o nosso irmãozinho na mão.

—Mas os dois parecem que não se lembram de nada nessa versão! Tipo... E não de um jeito bom! Quero dizer... - O garoto estava com dificuldade de falar, porque tinha muito medo de ser verdade. Tentou controlar o tremor de choro na voz. —Meu maior medo é que ele continue fazendo esse tipo de coisa e a gente continue salvando e salvando e salvando e... Akira não se importa com o sacrifício que eu fiz por ele! Ele não dá a mínima...

—Akira tem 12 anos, ele não se importa com nada, não leva para o lado pessoal...

—Quando nós tínhamos 12 anos, a gente não era assim, cara! E se... Aos 22, aos 32 anos ele continuar desse jeito? - O garoto com o sonuit repousando alegremente no pulso esquerdo falou exausto. —E se ele nunca mudar?

—Se ele não mudar, a gente muda e deixa ele resolver as coisas sozinho, mas por hora... Por hora a gente se concentra aqui, ok? - Aidan nunca imaginou que teria que confortar a si mesmo, mas isso até que era algo adulto, não era? Coisa de terapia? Claro que a frase nunca antes havia sido tão literal...

—Ok, enfim... Em relação ao nosso problema atual, eu tenho essa ideia que fica martelando na minha cabeça... - O lufa-lufa fora de sua realidade continuou olhando para o vazio, como se não estivesse naquele quarto nesse exato momento. —Os sábios sempre dizem que as respostas para os problemas mais difíceis são sempre as mais simples, certo?

—Os sábios geralmente sabem quais são as respostas, o que eles chamam de simples não conta! - Aidan tentou animar a sua versão mais Dark, mas ele definitivamente não estava no clima de ser animado.

—Nosso problema é simples: se temos um Aidan a mais, qual a solução para isso? - O garoto continuou seu raciocínio, sem ligar para a interrupção. Prosseguiu sombrio, dessa vez olhando nos olhos de sua cópia. —Talvez a profecia de Uagadou seja sobre nós depois de tudo, porque eu roubei sua vida e... Talvez seja só questão de tempo até eu começar a destruir tudo que eu toco!

—Cara, eu não tenho certeza se estou acompanhando o seu raciocínio....

—Bem, Aidan, talvez a gente não esteja vendo a solução mais óbvia de todas, porque a gente tá pensando com o coração e não com o cérebro: se eu estou aqui e essa é sua vida... - O garoto limpou o suor em cima dos lábios antes de dizer o seu maior medo de todos. —Eu acho que eu  tenho que me matar então.

Os dois garotos iguaizinhos, com as exatas marcas de nascença no pescoço - três pintinhas formando um quase triângulo na base do ombro - a mesma cicatriz de um dia que bateram o queixo ao escorregar na neve na entrada de casa aos 7 anos, o mesmo corte de cabelo aleatório que o barbeiro do seu pai fazia sempre, mesmo sabendo que não duraria nem uma semana... Se encaram seriamente.

—Não vou deixar que isso aconteça. - Good Aidan foi categórico. —Seria como cometer um suicídio assistido. Assistido por mim mesmo, o que eleva tudo a um grau ainda mais alto de loucura! Não vou permitir que faça isso, você não vai a nenhum lugar!

—Eu também não estou animado com a ideia, mas pensa só e se...

—Está fora de cogitação! E quer saber do quê mais? Cesc! - Good Aidan falou como se o nome do espanhol fosse a resposta para todos os seus problemas. O outro garoto o encarou sem acreditar na maluquice. —Cesc sabe sobre a expulsão dos meninos! Como ele poderia saber disso se a sua versão da história sumiu com o feitiço, hum? Como ele poderia saber disso se você não precisa mais ficar vivo?

Aidan havia cruzados os braços com superioridade porque tinha tido muito tempo livre para pensar nessa ideia do Dark Aidan estar aqui nessa dimensão por algum motivo sério, mesmo sua própria vida tendo desaparecido.

Tinha cogitado essa hipótese enquanto ignorava as ligações e mensagens de Cesc no celular. Inclusive só existia um aparelho e um sonuit, porque artefatos não se duplicam nunca, havia visto isso em um dos muitos livros que haviam lido sobre vira-tempos.

O celular e o sonuit haviam sumido da sua mochila e da de Akira porque estavam com o Dark Aidan o tempo todo, o que era só mais uma prova de que ele fazia parte desse mundo sim!

—Do que está falando?

—A gente tá sempre partindo do pressuposto que você não deveria estar aqui na minha vida, mas... Cesc sabe sobre a expulsão, ele continua mandando mensagem sobre isso, a última foi ontem, às... - Aidan pegou o celular que ambos concordaram que tinha que ficar com ele, que estava longe de casa e precisava de um meio de comunicação para caso acontecesse algo. —Aqui! Ontem às 15 horas!

—Como Cesc sabe sobre a expulsão? Isso ficou na dimensão anterior, eu... Eu consertei isso, ele não devia lembrar! - O garoto olhou para o sonuit confuso, porque seu outro eu tinha toda a razão. —O que isso significa?

—Eu não faço ideia, mas te matar está fora de cogitação! Por todas as coisas horríveis que isso implica, mas principalmente porque aí sim poderíamos ferrar com tudo. - Good Aidan falou conclusivo. —Talvez a gente devesse falar com Cesc sobre...

—Não, a gente combinou que não iria envolver ninguém nessa encrenca!

—Mas e se...

—Cesc está tentando ser uma pessoa melhor, vamos dar essa folga a ele!

—Mas e quanto a Enrique? - Good Aidan perguntou como última tentativa, o outro parou sua resposta pronta na boca, porque Enrique Dussel era outra história... —Ele sabe também e ele é tipo um adulto... Não mandam a gente falar com um adulto quando estamos com problema?

—Ele é um adulto?

—Ele tem 19 anos, dããã, claro que é um adulto! - Good Aidan falou como se aquilo fosse óbvio, mas o outro o olhou sem tanta certeza. Eles não eram a mesma pessoa? Como podiam não concordar nisso? —Eu vou ligar pra ele!

—Você tem o número dele?

—Tenho, Cesc me passou há alguns dias... Aqui, Enrique Dussel. Tá chamando... - Good Aidan havia escolhido a chamada tradicional, mas Enrique mudou para vídeo quando atendeu. Aidan empurrou sua cópia para longe do alcance da câmera.

—O que manda, Hataya? Por que me ligou? - Dussel estava suado e sem camisa, parecia que estava deitado no chão também. —Eu tô no meio de um treino de abdominais, seja rápido.

—Pode continuar seu treino, acho que dá para fazer as duas coisas... - Aidan olhou para seu “gêmeo” por cima da tela do celular, que fez sinal para ele ir em frente. —Então... Você soube sobre a expulsão do meu irmão?

—Humrum, o que tem? - Enrique falou rápido, parecendo soprar as palavras com esforço. A câmera do celular focava um teto ao longe agora.

—Certo, é que... Eu estou com um probleminha com isso. - Aidan falou com cautela, o celular do sonserino continuou mudo, mostrando o teto, apenas a respiração ritmada de Enrique ao fundo era ouvida.

Ficaram assim por mais 30 segundos, até o sonserino pegar o celular no chão e focalizar no seu rosto suado, pós-exercício.

—De que tipo de problema estamos falando? - O garoto mais velho perguntou levemente sem fôlego, bebendo uma garrafa de energético, metade do conteúdo de uma vez. —Quebrar o tempo uma vez não foi o suficiente pra vocês Hatayas?

Good Aidan não tinha resposta para isso, porque a ironia era muito grande para ser ignorada. De fato os Dussel ajudaram ele sua família a escapar de punições mais severas naquele episódio do peru carbonizado, então...

Dark Aidan puxou o telefone para entrar no foco da câmera também, Enrique cuspiu o conteúdo da garrafa na tela do seu celular ao ver os dois Aidan juntos, lado a lado.

—Não, não foi o suficiente.

—Caralho, Hataya, que merda você fez?!?!?! - Enrique estava assustado e achando graça, mas soltou a garrafa no chão para limpar o líquido em sua tela e depois voltou, parecendo que o medo tinha ganhado a batalha contra a diversão.  —Como isso aconteceu? Por favor me diga que você apenas encontrou seu gêmeo perdido no Japão!

—Bem, como você já sabe, os garotos foram expulsos por terem quebrado o santuário do fundador de Mahoutokoro, mas acontece que o Japão é um planeta estranho, eles não chegam com a polícia gritando na sua cara “Você está expulso, meliante!” - Dark Aidan começou, tentando resumir a história.

—Sim, aqui as vestes ficam simplesmente brancas e significa tamanha desonra para o seu nome, que você mesmo pede para ir embora. - Good Aidan completou e Enrique revirou os olhos para a lógica fodida dos orientais. —Mas Akira e Kurai pediram a nossa... A ajuda dele para mudar isso.

—Pronto, em resumo eu fiz o exato feitiço do peru e era só para o santuário passar de quebrado para não quebrado, como o peru passou de queimado para não queimando,  mas algo saiu errado e ao invés da vida continuar comigo sabendo o que eu fiz, mas aquele problema ficando em outra dimensão, acabou que eu fiquei preso em um lugar onde a expulsão nunca aconteceu com a versão desse... Desse lugar!

—Você deve ter errado no feitiço... - Enrique cogitou pensativo.

—Eu não errei no feitiço! Eu já disse isso mil vezes: os mesmos símbolos se acenderam no sonuit e eu disse o mesmo encantamento, era para ter atingindo só o santuário, do mesmo jeito que atingiu só o peru no Natal! - Dark Aidan falou exasperado, porque alguém tinha que ter uma resposta melhor do que um “você fez alguma coisa errada!”.

—Mas no caso do seu feitiço natalino, não atingiu só o peru! - Enrique falou tentando se lembrar do caso de meses atrás.  —Eu li os documentos por alto, a pedido de Cesc, e lá consta quebra temporal ou algo assim, significa dizer que naquela época você, de certa forma, também voltou no tempo.

—Como... Como assim, cara? Voltar no tempo não pode ser tão simples, quero dizer, se fosse assim, qualquer um faria a qualquer hora, toda vez que você rasurasse uma carta, plim, volta no tempo e conserta! - Dark Aidan falou exasperado, estalando os dedos no final.

—Agora você entende o porquê dos Inomináveis terem irrompido porta adentro quando identificaram seu feitiço? - Enrique falou sarcástico e os dois Aidan se entreolharam, finalmente entendendo tudo.

—Então a gente voltou no tempo e eles souberam?

—Exatamente outro Aidan que eu... Desculpe, como devo chamar vocês? Qual dos dois é o original? - Enrique perguntou debochado.

—Eu!

—Eu, claro! - Dark Aidan olhou para a cara de pau do outro. —Eu sou o original, fui eu que fiz o feitiço e dei origem a tudo!

—É, mas essa é a minha dimensão, então eu sou o original daqui! - Good Aidan falou como se estivesse falando a coisa mais óbvia do mundo. Enrique deu risada daquela discussão absurda.

—Por mais que eu esteja adorando tudo isso, precisamos de reforços, aguardem na linha. - O sonserino mexeu na tela do seu celular - estava sem óculos, por isso o cenho franzido - e apareceu no de Aidan a mensagem “conectando novo participante ao chat”.

—Quem você está chamando? - Aidan perguntou com suspeita e o garoto mais velho deu de ombros, não fazia ideia de qual dos dois era dessa vez.

—Bem, Aidans, estou ligando para o meu irmão Heitor que... Ah, oi, Jweek, Heitor está aí com você? - A tela se dividiu em Enrique e na famosa batedora do Vrasta Vultures.

—Oi, gracinha! Ele tá aqui sim, espera! HEITOR, SEU IRMÃO NO TELEFONE! - Ela voltou a sorrir depois de ter gritado para alguém fora do alcance da câmera. Os Aidans se entreolharam e Enrique retribuiu o sorriso da cunhada. —Ele já tá vindo, mas e aí, o que é que você anda aprontando, cunhadinho querido?

—Dessa vez eu sou inocente, juro! Estou ajudando Aidan aqui a não ferrar com o mundo todo! - Enrique falou divertido e Jweek olhou curiosa para o outro garoto, esse muito bonitinho com seus olhos puxados e ar de inocência.

—Oi, Aidan! Em que confusão você se meteu?

—Oi, senhora Jweek! Sou um grande fã do seu trabalho, mas, err... Não estou exatamente em uma confusão, é só um exercício da escola, eu... Eu estudo em Mahoutokoro e eles... Ah, oi, senhor Dussel! Que prazer em revê-lo, como vai? - Aidan havia pedido para sua outra versão sair de cena, porque não queria tanta gente sabendo da merda que havia aprontado. Heitor Dussel o olhou com suspeita do outro lado da tela.

—Hataya, o que aconteceu dessa vez?

—O irmão dele foi expulso de Mahoutokoro! - Enrique falou solícito, Aidan arregalou os olhos e Jweek olhou horrorizada, só Heitor que continuou do mesmo jeito.

—Na verdade foi um mal entendido já resolvido, senhor, eu liguei realmente porque, hã, eu estou com uma dúvida em um exercício e Enrique achou que o senhor poderia ajudar, mas eu não quero incomodar, não tem importância alguma, eu acho melhor eu desligar...

—Ah, carinha, não está incomodando nada! Eu e o espertão aqui estávamos apenas planejando uma viagem juntos, estávamos só de bobeira, não incomodou nada. - Jweek falou simpática, mas Heitor parecia não concordar.

—Pergunte.

—Hãã... Ok, se... Se, hipoteticamente falando, uma pessoa volta no tempo só querendo voltar uma coisa, mas acaba voltando tudo e criando duas versões de si, o que... Como a gente desfaz isso? - Aidan tentou perguntar da forma mais genérica possível, para não se entregar. Heitor o encarou com seriedade.

—Mahoutokoro está ensinando essas coisas? - Questionou com suspeita e Aidan fez um sim assustado com a cabeça. —Bem... Isso significa que o indivíduo criou um paradoxo temporal, duas linhas do tempo sobrepostas na realidade.

—Certo...

—É muito simples, mas exige um certo nível de conhecimento temporal para saber dessas coisas: no caso, o indivíduo criou uma segunda realidade que só é possível graças a sua presença como viajante.  - Heitor deu de ombros, como se fosse algo muito simples mesmo.

—Eu não entendi. - Aidan falou, mas a expressão de Jweek e de Enrique demonstrava que ele não era o único.

—Quer dizer que o que quer que a pessoa mudou, é essencial para a nova realidade existir, o sujeito que iniciou o processo não pode desaparecer simplesmente, porque significaria dizer que ele nunca voltou no tempo, então aquela realidade não poderia existir: é um paradoxo.

—Oh, uau, que merda fodida!

—Olha a língua, Enrique! - Heitor falou irritado para o caçula e depois voltou a focar no outro adolescente. —Entendeu agora?

—Mais ou menos. - Aidan estava repassando o que Dark Aidan estava lhe sinalizando atrás do celular, mas ele mesmo não havia entendido nada. Heitor respirou fundo, procurando as palavras certas.

—Imagine vários caminhos se entrelaçando, várias estradas, imaginou? Certo, agora imagine que alguém resolveu voltar o percurso até uma das muitas bifurcações existentes, para seguir o outro caminho, consegue ver? Então, nesse seu paradoxo temporal, o outro caminho só pode existir se a pessoa retornar para segui-lo.

—Okay, acho que estou entendendo... Mas se a pessoa só escolheu outro caminho, por que há duas versões dela? - Aidan perguntou confuso e o corvinal sorriu para a pergunta, estavam chegando a algum lugar agora.

—Porque para esse novo caminho existir, é preciso que aquela versão anterior continue existindo também,  de certa forma, para que continue enviando um indivíduo que retorne à bifurcação e escolha a nova linha. Se houve a duplicação é porque essa nova linha não é um caminho natural, é o que chamamos de “linha dependente”.  - Heitor concluiu com calma.

—Ok, mas... Digamos que o cara que começou tudo morra... - Aidan olhou para Dark Aidan por cima da tela, para ter certeza que ele estava acompanhando o raciocínio. —O que aconteceria?

—Que bizarro, cara! - Enrique falou impressionado, mas calou a boca, porque até pelo telefone Heitor era assustador.

—A realidade se tornaria insustentável, então, ou voltaria para o que era antes da viagem do tempo ou o tempo em si entraria em colapso, não dá para dizer ao certo, isso são só hipóteses. - O corvinal falou displicente, mas aquilo na verdade era uma informação de ouro. —Mais alguma dúvida?

—E como essa... Como resolver esse problema, você sabe, duas versões, na mesma dimensão... - Aidan falou com o coração se enchendo de esperança, porque finalmente estavam prestes a ouvir a solução de seus problemas, uma que não envolvia morte!

—Primeiro não chamamos isso de dimensões e sim de linhas temporais e segundo... Que problema? O próprio tecido temporal se ajustou e resolveu! O indivíduo duplicado é a solução! - Heitor sorriu com a conclusão do problema, depois olhou para a namorada impressionada ao lado. —Anne, se tivermos filhos algum dia, nós vamos colocá-los em Mahoutokoro, eles obviamente sabem o que estão fazendo por lá.

—É exatamente o que eu estava pensando... - Enrique disse sarcástico, para um Aidan com uma cara de horror congelada na tela. —Valeu, Heitor, tchau, Jw, a gente se fala mais tarde.

O sonserino desligou a segunda chamada, focando agora somente na expressão de desolamento que substituiu o horror de antes na cara de Aidan.

—Ok, Hataya, duas coisas: primeiro, Heitor não sabe de tudo e segundo... Como os Inomináveis japoneses ainda não arrebentaram a porta da sua casa para te arrastar para um calabouço? - Enrique perguntou com muita curiosidade, porque aquilo era impressionante, estavam falando em um possível colapso do tempo!

Nenhum dos Aidan tinha condições de responder aquilo, mas não foi necessário, porque eles não estavam sozinho no quarto.

—Os órgãos japoneses não fiscalizam a magia desse jeito, aqui as pessoas seguem as regras e a gente não precisa disso. - Kurai falou sério, recém desperto, se ajoelhando e sentando sobre os pés como quase todos os japoneses faziam, com leveza. —É uma questão cultural, de berço.

—Não precisam, até precisar... - Enrique falou desdenhoso para o garoto novo, com um sotaque até pouco marcado, para quem era da terra do Sol Nascente. —Mas e quanto a outra parte, o que vocês vão fazer? Vão realmente fingir que são gêmeos perdidos, sei lá... ou... Não sei, que outra opção vocês tem?

Nenhum dos três garotos disse nada, até Good Aidan falar com um lampejo de energia - talvez fosse loucura - nos olhos.

—Cara, em várias histórias aparece isso: uma pessoa se fundindo a outra! Nós temos em Dragon Ball, temos em Steven Universo, temos em Naruto com a raposa de nove caudas... - Aidan estava contando nos dedos e os outros três pareciam confusos com onde ele queria chegar.

—Você está mesmo citando desenhos animados e quadrinhos? - Kurai falou impressionado, porque Akira tinha razão, o irmão dele era meio idiota.

—Só estou mostrando que é uma possibilidade! Se o tempo ou sei lá quem quer que nós dois fiquemos aqui juntos, a gente pode dar um jeito de ficar juntos de verdade, com a vantagem de já sermos a mesma pessoa! - Aidan continuou empolgado, mas a sua versão menos otimista o encarou de cenho franzido. —Se ele nos separou, talvez haja um meio para nos juntar!

—Um meio? - Dark Aidan perguntou confuso de verdade. —Tipo algum feitiço colador de almas?

—Sim! A gente esteve procurando respostas para o que tinha acontecido com o feitiço do sonuit por 4 dias e Heitor Dussel resolveu nossa questão em 4 minutos! Se ao menos a gente soubesse onde procurar, não seria tão...

—Eu vou falar com Erick, se tem alguém que deve saber sobre isso, essa pessoa é ele. - Enrique falou de supetão e depois deu de ombros. —Mas por hora tentem ficar vivos, ok? A morte de um dos dois pode quebrar toda a nossa linha do tempo! Fiquem vivos, especialmente você que... Qual dos dois fez o feitiço? Ah sim, fique vivo. A gente se fala depois.

—Espera, Enrique! Não conta nada para os iconoclastas, ok? Nem pra Cesc! Com tudo da profecia e todas as outra coisas... Vamos manter isso entre a gente, ok? - Aidan perguntou esperançoso, sob o olhar de sua versão de outra linha e de Kurai.

—Se ele me perguntar diretamente, eu não vou mentir, mas... Vou dizer a ele que eu já estou ajudando no seu probleminha simples e ele não precisa se preocupar. - Enrique concluiu animado, porque aquilo resolvia seu problema com o segredo. Detestava guardar segredo dos outros.

—Ele provavelmente vai ficar ainda mais preocupado...

—Bobagem, então estamos combinados. Adeus, Aidans, adeus japonês igualmente perturbado, porque se não fosse, você nem estaria aqui nessa situação de merda! - Enrique deu tchauzinho com a mão e depois desligou, sem esperar resposta.

—Ok, então vamos devolver esses livros e começar uma nova pesquisa...

Bem, ninguém poderia dizer que Aidan Hataya não estava se desdobrando para aprender tudo que pudesse no Japão, não é?


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Notas finais do capítulo

Bem, mocinhas e mocinhos (tem algum aqui ainda?), desejem a vossas mamães um feliz dia este domingo, 13/05, em meu nome! Quem não estiver com a sua por perto, que se lembre dos melhores momentos com ela e para aquelas que já são mães, curtam muito o seu dia!

Bjuxxx



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