o que acontece às 11 da noite escrita por RFS


Capítulo 2
Il


Notas iniciais do capítulo

o quê? hã? HÃ??
finalmente a coisa que acontece às 11 da noite aconteceu
tem L/A e L/B quem gosta bate palma



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II — Visitação

''Se acordo / Parece um erro. / Sinto que não sei. / Nada quero nem tenho nem recordo.'' Pessoa, Fernando.

1995, 7 da noite

Como faz parte do costume de recepção para L e Watari, a primeira refeição feita no dia que eles chegassem deveria ser mais requintada, assim como aqueles presentes nela. Roger fazia questão dos sucessores terem pelo menos duas roupas apresentáveis para essas e outras ocasiões que pediam por isso.

Por essa razão, A vestia um traje azul marinho comportado, enfeitado modestamente com umas poucas pérolas falsas e um laço branco em volta do pescoço. B encontrava-se com roupas sem furos ou rasgos e que não eram semelhantes às de L. Um blazer qualquer escuro e uma calça social, mais um cinto de fivela reluzente que ele nem precisava usar.

Isso fazia ele sentir que estava usando uma dura, desconfortável casca. Não o pertencia, não era nem como L nem como ele, e o espelho protestava diante da visão. Era sufocante. Suas mãos coçaram para retirar aqueles tecidos de si como que para retirar uma pesada armadura ou uma pele morta.

O reflexo dele deu a permissão para tal e foi o que ele fez.

Beyond entra pleno e leve na sala com os pés descalços, assim como L, que também não se submete aos costumes da casa e roupas desconfortáveis. Eles se encaram, cientes de que fazem uma pequena rebelião.

— A roupa não servia mais em mim — B justificou-se para os mais velhos, sorrindo despreocupado e cínico.

Enquanto escusava-se e ouvia a reclamação do diretor, pela visão periférica viu L o encarando. Ambos sabem que a roupa nunca serviu.

O JANTAR

A antiga mesa de madeira é ornamentada com um pano cor de vinho com bordados discretos a cobrindo, sobre ela há pratos de porcelana e prataria para cinco, além da indispensável comida. Carne assada ao molho madeira com legumes, que é o magnífico prato principal, purê de batatas e yorkishire pudding para acompanhar. A sobremesa jazia impecável e rubra como em um sonho: pudim de frutas vermelhas, alvo de olhares ansiosos.

O jantar seguiu-se tranquilo na medida do possível, nada realmente fora do esperado aconteceu: B brincou com L por debaixo da mesa num segredo que A sabia, mas apenas tentava ignorar enquanto falava sobre suas partes favoritas da matéria de etiqueta internacional, a qual só ele estudava. B, além de continuar com o péssimo hábito de roubar comida do prato alheio, também comentava sobre aulas e as coisas que aconteciam fora delas, ao mesmo tempo que as pontas de seus pés encontrava seu caminho para as de L, os olhos escuros fixos no outro, esperando uma reação. Entretanto, recebeu apenas meio olhares e o detetive se afastando.

Tudo que L fazia era fugir dele, até mesmo se sentou de frente para o primeiro sucessor, ficando na diagonal do outro. Sempre que o assunto remetia a quem não queria, fazia como que não escutasse e mudava o tópico, chegou inclusive a elogiar as vestes de A, com as quais não se importava. Porém teve estima pelo laço e como envolvia perfeitamente o pescoço pálido.

Ele avistou as pontas do adereço, perfeitas, sem fiapos ou defeitos muito visíveis. Quando percebeu, se viu almejando puxar delicada e lentamente uma das pontas para desfazer o laço e libertar o pescoço de A. Logo depois, se perguntou se B ajudou o outro a colocá-lo, e afastou uma possível inveja junto com suas divagações.

9 da noite

Ainda vestindo o traje formal, A retirou apenas os sapatos, o que contribuiu para preservar o silêncio do corredor. Este que contava apenas com ele, L e quadros. Alguns deles seguiam o observador independente de onde fosse. Naquele momento observavam um detetive e seu sucessor nos extremos opostos, porém caminhando para se encontrarem, os olhos fixos um no outro e os pés pesando mais a cada passo que davam.

E se encontraram. Pararem perfeitamente de frente pro outro, um braço media a segura distância entre eles. L se depara com o bendito laço branco ainda primoroso.

— Olá de novo, L — iniciou o pacifista, cordial como sempre. — Gostou do jantar dessa vez? Achei magnífico, queria que tivesse algo assim toda semana…

— Penso que é uma extravagância, mas vale a pena pela melhor parte.

— Que é a sobremesa, eu imagino… — supôs, segurando um pequeno riso.

— Precisamente! O pudim estava no ponto exato e as frutas vermelhas incrivelmente frescas… É bom que seja verão — L admitiu, apesar de não ser sua estação favorita. — Mas chega de conversas frívolas, tenho que ir para a biblioteca.

Ele fez menção de sair, porém teve o avanço de um decidido passo alheio o parando.

— E eu estava procurando você para te dar boa noite e dizer que pode me chamar, caso precise de algo.

L percebeu que era apenas uma mentira. Meia mentira, quem sabe. Portanto logo questionou:

— Onde está B? — franziu o cenho, as palavras ditas quase lentamente. Ainda que fosse uma pergunta que preferia não fazer ou não responder na maioria dos casos, tinha cuidado. — Não o vejo desde o jantar.

— Não sei. Oh, talvez ele esteja lá fora ou na cozinha...

— Espero que não seja para comer o resto do pudim escondido.

Um sorriso travesso formou-se nos lábios de A, os lábios róseos curvados sem mostrar os dentes. Diante de L, em sua visão, o laço cintilou.

— Queria te dizer apenas isso, vá para meu quarto se achar necessário. Dispensado?

— Só espere um pouco — e L rendeu-se à vontade dele.

Não havia quadros com olhos curiosos mais, nenhuma alma ou ser para presenciar o ato. Para o inglês, a realidade do corredor no momento é que nunca teve uma alma ou coração pulsante passando por ele a não ser o próprio e o de A. E o laço — o laço no pescoço, provocativo como uma brilhante maçã do Éden.

Por não haver mais testemunhas ou julgadores, levantou a mão. Muito devagar ergueu as pontas dos dedos brancos em direção a seu alvo. Percebeu que os lábios do outro agora estão entreabertos, talvez antecipando uma expressão surpresa, os olhos acompanhando, hipnotizados e interessados, o movimento e o que seria feito a partir dele.

O polegar e o indicador encontram o tecido macio e esfregam minimamente para sentir a textura do tecido com mais precisão. Ele evita olhar diretamente para A, porém sabe que ele está vendo tudo, aguardando o que virá em seguida como um expectador. L começa a puxar o acessório como queria mais cedo: lento e delicadamente. Queria que o laço derretesse com seu toque.

O laço se na garganta de A, agora apenas uma tira de tecido, contudo não menos elegante ou macia, deixou de ser uma tentação para se tornar uma conquista açucarada. A área ficou completamente exposta, desnuda. Se B estivesse ali, apontaria risonho que os retratos achariam tudo isso um escândalo.

A fita, ao redor do fim do pescoço e fazendo contato com os ombros, cuidadosamente desliza como uma cândida serpente para longe de onde pertence. Já com seu triunfo entre os dedos, segurado do estranho modo que tem, L contempla a fita; A contempla o ato.

— Eu… tenho que arrumar a cama. Boa noite, L. — o sucessor pronunciou, e a passos rápidos, saiu do recinto como uma corça assustada sem olhar nos olhos do detetive, a expressão séria.

L é deixado para ser julgado pelas obras. Não restou nada mais para se fazer além de seguir para a biblioteca. Ele envolveu a fita nos dedos do punho e não sentiu arrependimento ou vergonha, mesmo que os olhos de tinta o perfurassem com desgosto.

11 da noite

Retornando para o sótão, o inglês guardou a fita em uma gaveta do criado-mudo antes de deitar-se. Depois de tantas horas acordado finalmente descansaria um pouco.

No escuro, o armário se abre com um rangido característico, rasgando o silêncio do quarto. Dele irrompe uma sombra que respira, que apesar da saída violenta, vai para o chão calmamente e sem fazer muito barulho. E então começa a rastejar até a cama.

L sente arrepios instintivos nas pernas, entretanto não fecha seus olhos forte como fazia quando mais novo. Ele olha para a sombra até que possa ver o rosto de B nela — e a sombra vira B, que não era a sombra antes de sair do guarda-roupa, mas a sombra sempre foi ele porque, céus, o que mais seria?

Ele não queria ligar nenhuma luz porque vomitaria se visse as feições dele. Com um nó no estômago, estava apenas esperando o momento que o outro começaria a falar.

Da mesma forma que o armário abriu abruptamente, quando chega para do lado da cama de L, B inicia:

— Você quer ouvir sobre meu sonho?

Não há resposta.

O SONHO DE BEYOND BIRTHDAY

— Sonhei que estava em um lugar muito escuro ou muito embaçado, ou talvez eu só pense que seja assim porque não me lembro direito. Estava muito frio e eu não vestia nada, devia estar encolhido, mas não tremia. Até que a temperatura começou a esquentar gradualmente… Morno, morno. Abri meus olhos e vi algo ao longe se aproximando de mim, então os fechei, com medo, e ainda sentia aquilo chegando cada vez mais perto. Meus olhos formigam nas minhas órbitas e fica impossivelmente quente.

B tomou um momento para pausa e encarou o teto escuro com os lábios secos.

''Quando abro os olhos de novo eles ainda formigam muito. Diante de mim está um anjo feio e magérrimo como a morte, não se parece com um humano ou qualquer retratação ocidental de um anjo. Na verdade, não sei se alguma parte do mundo já retratou um anjo de forma semelhante com a que sonhei. Tem braços e dedos finíssimos, que acabam em unhas ou extremidades pontiagudas, as costelas aparecem claramente junto com as maçãs do rosto fundas, como se a fome tivesse o sugado de dentro. Ele estende os dedos em direção à minha face, suas cavidades vazias de onde seriam os próprios olhos me fitam impiedosamente antes de realizar a crueldade.’’

''O anjo penetra seus dedos afiados em minhas órbitas e arranca meus olhos. Era isso que ele queria de mim. Eu grito, contudo não há ruído. Ou talvez seja tão alto que não consigo ouvir, ou o lugar em que estou não existe som.’’

O incômodo de L cresceu em seu peito, entretanto não deixou que isso mostrasse em sua voz quando foi questionar.

— Por que você acha que ele queria seus olhos? — falou, de um jeito que tentava soar indiferente.

— Não sei, deve ter os achado charmosos — e B riu-se. L não podia ver, mas ele estava com as mãos cruzadas sobre o peito como um egípcio. — Ei, me conte um sonho seu também. Quero saber o que acontece nessa sua cabeça enquanto está inconsciente. Quando você passa doze horas tentando recuperar o sono, o que acontece com seu cérebro?

— Sinto decepcionar, mas dificilmente sonho. Já meu cérebro permanece da mesma forma que sempre, apenas descansando.

— Todo mundo sonha, L! Seria muito chato se não sonhássemos. Você deve apenas se esquecer completamente do que sonhou a um ponto que não reconhece que sequer o fez. Eu, por exemplo, sonho muitíssimo e quando acordo logo esqueço o que houve, mas sei que sonhei.

— Talvez seja isso. Bem, se não sonhássemos, validaria mais a ideia de que o sono é o irmão da morte.

— A morte tem muitos irmãos, você vê… Eu poderia escrever sobre isso. Acho que escreverei sobre amanhã. Agora não posso, tenho que te incomodar… Olhe, será que o anjo era você esse tempo todo, L?

— Acho difícil, afinal não acho seus olhos charmosos. B, vá dormir de uma vez e de preferência no seu quarto.

Houve um momento de silêncio em que L não conseguia enxergar B sorrindo, mas de alguma forma sabia que ele estava, imaginava que ele estava. Podia visualizar perfeitamente isso.

— Certo, dormirei. Boa noite, L. Não se preocupe, sonharei para você. De manhã trocamos nossos cérebros e você me mostra o que sonhou também. — E não se moveu, apenas continuou parado no chão do quarto, a mesma pose, uma vez que na concepção dele o sótão também era propriedade dele.

Derrotado, L não tentou o expulsar. Já esperava por isso. O detetive virou o corpo de lado, voltado para a parede e de costas para onde estava Beyond, enquanto este permanecia com o corpo esticado, o detetive encolheu-se na cama. Não tinha nenhuma pretensão de sonhar, contudo ficou curioso com a veracidade da história do outro. Teria realmente sonhado aquilo ou inventado? Ou sonhou e misturou com uma narrativa própria? Em qualquer um dos casos, só corrobora que B tinha uma mente desviante e criativa, ou uma inclinação a ser escritor de horror.

Enquanto devaneava, B levantou e reclinou-se sobre ele, a boca perto do ouvido e a respiração quente no pescoço fez o inglês ter outro arrepio instintivo, entretanto não ousou nem sequer se mexer.

— L, pensei em algo. Conte um sonho que teve amanhã de noite e te deixarei dormir sozinho.

Ele então virou-se para o sucessor, agora bem menos sombra e mais Beyond, e coçou os olhos cansadamente. Sentia finalmente uma pontada de satisfação emergindo, ora, era muito fácil inventar qualquer coisa e chamar de sonho. Poderia fazer isso todas as noites com B para que ele o deixasse em paz.

Também teve uma súbita mudança de opinião movida unicamente por curiosidade.

— Pois assim será. Inclusive, pode me contar outro sonho seu na próxima noite, vamos ver se consegue me surpreender.

— Eu sempre te surpreendo, você apenas finge que não. Vou te deixar fascinado.

Mesmo na escuridão da noite, agora com a proximidade, L Lawliet poderia de fato ver Beyond sorrindo para ele e pensou que o primeiro sonho que conseguia se lembrar rapidamente era um em que uma sombra fazia o mesmo para ele. A verdade era que Beyond era a sombra de um sonho que ganhava vida para assombrá-lo enquanto acordado, enquanto dormindo, enquanto no meio dessas duas coisas. Queria que ele fosse realmente apenas um fruto de sua imaginação ou de seu inconsciente, algo que o visitasse só quando dormisse. Mas estava marcado em sua mente, impossível de retirar.

Contra tudo que disse, L sonhou do lado de uma sombra que respira.


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Notas finais do capítulo

qualquer erro de coesão, coerência, ortográfico ou gramático favor me avisar pra eu realizar a correção, bjs



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