Sede de Poder escrita por Mermaid Queen


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Embora ainda esteja precisando de ajustes, espero que gostem ♥ lets que bora



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/751654/chapter/1

A garota com o livro na mão se chama Katherine. Antes era Katherine Flores Brown. Ela não se incomodava com o nome quando era criança, mas começou a ser um problema quando, na sétima série, Emma Rogers falou para todo mundo que “Flores” era uma marca de fraldas para idosos, e a sala toda tirou sarro dela. Daí ela cedeu às vontades da mãe e passou a ser só Katherine Brown mesmo.

Era uma manhã ensolarada do terceiro ano do ensino médio, muito tempo depois do incidente com as fraldas, quando Rachel empurrou para baixo o livro que Katherine lia durante a aula. Apesar de nunca deixá-la ler em paz durante as aulas, Rachel não rira dela por casa da história das fraldas, e elas viraram amigas desde então.

Katherine levantou os olhos das páginas e ergueu as sobrancelhas para Rachel, desafiando-a a fazer de novo. Foi o aviso que Rachel precisava para não fazer.

Rachel era uma das poucas pessoas da escola que Katherine acreditava mesmo que podia ter um futuro brilhante. Tipo, ela era com certeza a aluna mais dedicada da turma, estava envolvida em várias atividades extracurriculares e às vezes até usava um daqueles suéteres sem manga com estampa xadrez. Também não dava pra ficar usando suéter de manga na Flórida. De qualquer forma, Rachel era do tipo que acabaria em uma universidade de destaque, e Katherine adorava alimentar esse sonho da amiga.

No entanto, Katherine não tinha nenhum plano muito grandioso para a faculdade, provavelmente porque a mãe controlaria aquilo também, então não fazia muita diferença para ela copiar ou não a lousa da aula de álgebra. Mas Rachel não compartilhava desses planos e tentava compensar a falta de incentivo.

— Você deveria prestar atenção nessa aula, K. E deveria participar de alguns clubes comigo também. Isso vai tudo para o seu histórico. – disse, assim que o sinal soou.

Katherine guardou para si o suspiro porque sabia que isso chatearia a amiga.

— Eu tentei participar dos clubes – falou ela. – Mas não é minha culpa se os clubes não gostaram de mim. Eu voltaria ao clube de debates se pudesse.

Rachel balançou a cabeça e se levantou da cadeira.

— Você brigou com todos eles e conseguiu ser expulsa do clube em dez minutos. É por isso que gostou tanto de lá.

Katherine começou a rir e se levantou também.

— Sou muito boa em debater – disse sorrindo. – Tenho biologia agora. E você?

Rachel pensou um pouco para que pudesse se lembrar.

— Espanhol.

Katherine sorriu, desanimada.

— Eu queria poder trocar de lugar com você.

— E eu queria falar espanhol como você – replicou Rachel, igualmente desanimada.

Trocaram olhares tristes de quem queria estar lá fora, aproveitando o lindo dia, e seguiram em direções opostas pelo corredor.

Katherine ia e voltava da escola todos os dias com o irmão, porque ele tinha um carro.

David e Katherine não conversavam muito. Na escola, nunca. No carro, às vezes. Em casa, um número razoável de vezes. Eles até poderiam ser mais próximos, Katherine pensava, mas talvez não fosse possível. David não era compatível com a vida em sociedade.

Ela franziu a testa na direção dele. Alguma coisa estava esquisita enquanto ele dirigia. Ficava olhando para ela, depois rapidamente para a rua, como se estivesse tentando analisá-la.

— Que foi? – perguntou ela, encarando-o.

Ele deu de ombros e não respondeu, fugindo do olhar dela. Tentou agir naturalmente, mesmo que Katherine pudesse notar os ombros tensos e os movimentos exagerados.

— O que você fez, David? – ela repetiu, agora com mais veemência.

David arregalou os olhos, como se não esperasse ser colocado contra a parede. Engoliu em seco e apertou o volante com mais força, olhando fixo para a rua.

— Não aconteceu nada, K – disse ele devagar. – Por que você está perguntando?

A voz dele estava aguda. E ele estava chamando-a por aquele apelido, como se quisesse amaciá-la. David nunca se importava com a opinião dela sobre nada.

— David – insistiu ela, séria. – Você nunca me chama de K. O que você fez?

— Katherine, deixa de ser implicante, droga! – David disse de repente, aumentando o tom de voz. Bateu no volante com irritação.

— O que você está escondendo? – Katherine manteve a voz baixa e a calma para deixá-lo nervoso.

David suspirou e desistiu da carranca. Olhou para ela como quem pede piedade, fazendo cara de cachorro abandonado.

— Você promete que não vai ficar brava?

David não ligava mesmo para o que ela pensava. Tipo, ele nunca ligava mesmo. Ela assentiu devagar, sem evitar a testa franzida, com toda a intenção do mundo de ficar brava.

— Então, lembra aquela festa que eu fui com o Matt? Que foi depois do jogo, e nós fomos para a casa da Hope, e depois comprar bebida, mas teve aquele problema com o carro, daí a gente precisou…

— Fala logo, David – ela o interrompeu, revirando os olhos.

— Então, eu estou saindo com Emma Rogers.

Você o quê?

Katherine gritou tão alto que David se assustou e brecou o carro. Katherine levou um tranco do cinto de segurança e olhou para ele, doida.

— David! – berrou ela. – Você não conseguiu segurar o pau dentro da calça nenhuma vez na sua vida?  Ela é a pessoa que eu mais odeio no mundo. E a pessoa que mais me odeia no mundo!

— Para de gritar, Katherine! – gritou ele de volta, andando com o carro mais uma vez. – O mundo não gira em torno de você! E a mamãe sempre fala sobre não odiar as pessoas.

David estava dirigindo de um jeito meio maluco e costurando os carros enquanto eles gritavam. Katherine nem se importou com os trancos.

— É, David, parece que ele gira em torno de você!

Em seguida, chegaram. David jogou o carro na calçada e ambos saíram batendo as portas e gritando.

Ellen abriu a porta de casa. Ellen era a mãe deles. Os dois filhos eram uma mistura perfeita dela e do pai, o que não devia agradá-la muito. Os três cabelos castanhos ondulados e as maçãs do rosto altas, e os narizes se lembravam um pouco também. Mas David e Katherine tinham a pele marrom clara, meio oliva, que puxaram do pai.

Ellen se assustou com a gritaria deles, e parecia bem irritada quando chegou à rua, provavelmente havia sido interrompida. Estava meio suada e ainda com roupa de ginástica de cor rosa berrante.

Katherine estava gesticulando e apontou o dedo na cara de David. David cometeu o erro de segurar a mão dela e abaixá-la, e então Katherine o empurrou. Quando começaram a se empurrar, Ellen foi apartá-los.

— O que está acontecendo? – perguntou ela, assustada, afastando Katherine para trás. – O que você fez?

Katherine revirou os olhos. É claro que a culpa era dela. David, o modelo perfeito de comportamento jamais teria feito algo.

— A Katherine surtou! Como sempre! – berrou David, como se estivesse realmente sendo prejudicado por algo. – Está cheia de ódio.

Jack saiu pela porta e cruzou os braços, observando a cena. Katherine revirou os olhos para ele, porque provocações de Jack eram tudo que ela não precisava naquele momento.

— Entrem logo, os dois – gritou Ellen, vendo que Katherine não a responderia. — Não vão ficar aqui na rua dando um show para os paparazzi. E eu acabei de gravar stories falando sobre ódio.

Ellen soou realmente decepcionada quando falou a última parte. Katherine então entrou em casa batendo os pés e arrastando a mochila. Quando passou por Jack, falou baixinho:

— Todo mundo sabe que ela paga os paparazzi.

Jack arregalou os olhos e colocou um dedo na frente dos lábios, claramente se divertindo com a situação.

— O que está acontecendo, David? – perguntou Ellen, olhando de David para a porta e então para Jack.

David deu de ombros.

— Katherine pirou quando eu disse para ela que comecei a sair com uma garota. Ela ficou maluca!

— Que garota, David? – insistiu Ellen.

— Emma Rogers – resmungou ele, desviando o olhar.

Ellen abriu a boca para responder, mas Jack a interrompeu:

— Você o quê?


Katherine chegou ao seu quarto e se jogou na cama. Esticou o braço para tatear o celular. Pensou em ligar para Rachel e contar que David acabara estragar o dia dela, mas resolveu não fazê-lo. Rachel perguntaria detalhes que ela não queria e não sabia dar. Não era uma fofoca que valia a pena naquele momento.

Tirou os sapatos e soltou o cabelo. Ela mantinha os cabelos presos em um rabo de cavalo praticamente o tempo todo, primeiro porque odiava o cabelo, e segundo porque eles caíam no rosto dela quando ela lia. E também porque Ellen a mataria se ela raspasse a cabeça, e a faria usar uma peruca para o resto da vida.

Ouviu a voz abafada de David pela porta e revirou os olhos, querendo socá-lo. Falava com Ellen no corredor, em frente ao quarto dela. Katherine nem se deu ao trabalho de ligar a televisão, porque já sabia o que viria a seguir.

Depois de um silêncio, Ellen abriu a porta do quarto dela sem cerimônias. Katherine a interrompeu antes que ela pudesse falar.

— Eu sei – resmungou. – Vou só colocar roupa e comer alguma coisa.

— Você está atrasada – disse Ellen, entredentes, mas com a expressão satisfeita. Saiu e fechou a porta atrás de si.

Katherine se arrastou pela cama e abriu a gaveta onde ficavam as roupas de academia. Ellen tinha umas milhares de roupas, porque sempre ganhava dos patrocinadores e das lojas que a pagavam para usar qualquer peça que as promovesse.

Pelo menos, a mãe a deixava ficar com as menos chamativas. Aquele conjuntinho rosa berrante de Ellen provavelmente seria trocado por um azul elétrico para ir à academia à noite, e um excêntrico verde-limão para fazer propaganda de barrinha de cereal no dia seguinte.

Ellen ficara famosa no Youtube com vídeos de exercícios e dieta, e agora era praticamente uma musa fitness de 40 e poucos anos, mãe de dois filhos e um deles ainda por cima se destacava por causa do campeonato de futebol estadual. Um dos fortes dela era a propaganda da família perfeita, que o público-alvo adorava.

Para o desagrado da mãe, Katherine não possuía um Instagram, mas a conta de David era um absoluto sucesso. Se já não bastassem as meninas da escola toda atrás dele, havia meninas do país todo em suas redes sociais. E, pelo ego dele, provavelmente não bastavam.

Katherine deu de ombros e chegou à cozinha irritada por ser arrastada à academia, mas mais irritada ainda por causa de Emma Rogers. Bom, podia não ser tão ruim. David estar saindo com alguém não significava nada. Ela não precisaria conviver com Emma. E ela não poderia humilhar Katherine dentro da própria casa, poderia?

É, até que poderia.

Abriu a geladeira e olhou lá dentro com desânimo. Estava cheia do novo iogurte superproteico que chegara de presente para Ellen, e a mãe andava bebendo aquilo como se fosse água.

— Você quer?

Katherine se assustou e olhou para trás. Era Jack Irving, parado a uns dois metros dela, encostado na bancada.

— Você me assustou, Jack.

E então ela viu que ele estava comendo pudim de chocolate, e arregalou os olhos.

— Isso é contrabando – disse Katherine, muito séria. – A pena para pudim de chocolate são horas intermináveis de esteira e uma vida toda de tofu.

A ditadura fitness era levada muito a sério dentro daquela casa, mas tinha seus rebeldes. Katherine se sentia lutando contra o regime totalitário quando bebia refrigerante escondida na casa de Rachel, principalmente se fosse com açúcar.

— Eu gosto do perigo – respondeu ele, igualmente sério, mas olhou em volta para ver se Ellen estava por perto. – E então, você quer?

Katherine não era muito próxima de Jack e não era muito fã dele para falar a verdade. Mas procurava ser indiferente. Ele era vice diretor de uma escola particular da cidade, onde também era professor de Educação Física. E conhecera Ellen em uma academia em que ele dava aulas, havia alguns anos. Muito romântico.

Ellen se irritava com Jack frequentemente porque queria que Katherine e David estudassem na escola em que ele trabalhava, mas ele dizia que havia uma certa política de vagas, escolha de candidatos e fila de espera. E aí ela amaldiçoava Roberto, o pai deles, porque tinha certeza de que a escola não os aceitava por serem meio mexicanos.

Katherine não dava a mínima. A escola dela era um inferno, parecia um zoológico e algumas pessoas eram más com ela, mas pelo menos ela tinha Rachel. Estava bom.

— Katherine? – disse Jack, chamando a atenção dela. – Então? Quer ou não?

Ela olhou em volta novamente e pegou uma colher. Deu tempo de comer umas duas colheradas antes de ouvir os passos de Ellen descendo as escadas, então se livraram das evidências. Ainda tiveram tempo adicional porque ela estava gravando stories, falando com o celular em tom animado sobre como emoções estressantes como o ódio podiam te fazer engordar.

— Valeu, Jack – falou Katherine.

— Ainda está com raiva do seu irmão? – perguntou ele, baixando a voz para não atrapalhar Ellen e os vídeos.

— Eu quero matar aquele desgraçado. É como se a tia Claire fizesse uma thread de exposed da minha mãe no Twitter. Ou como se você e a minha mãe se divorciassem e você fosse namorar com aquela Lindsay Star

— Ela ia me matar mesmo – concordou Jack, pensativo.

— Por que vocês estão falando o nome daquela…

Katherine admirou os três palavrões seguidos que Ellen proferira, reconhecendo que alguma coisa ela tinha em comum com a mãe. Lindsay Star era uma outra blogueira famosa da área de beleza e vida saudável, e ela e Ellen já haviam tido algumas brigas e indiretas no Twitter.

— É só o último post que ela fez – disfarçou Jack, olhando para Katherine em busca de apoio.

— É, muito brega – concordou Katherine.

Ellen assentiu, já desinteressada na conversa.

— Vamos logo então.

Katherine cumprimentou Jack e seguiu Ellen para a garagem.

Jack acenou com a cabeça de volta.

O despertador tocou e Katherine acordou com um sobressalto. Rachel a presenteara com aquele despertador em um de seus aniversários. Era antiquado, mas Rachel não confiava nos despertadores dos celulares, e Katherine acabara se afeiçoando ao presente.

Levantou-se da cama suando. Katherine gostava de dormir coberta com aquele edredom estampado com pandas, mas era agosto e fazia muito calor. Ela lançou um olhar torto para os pandas, quase que os culpando pela ideia ruim, e foi até o banheiro para que pudesse tomar um banho rápido.

Após o banho, parou em frente ao espelho e fez duas tranças no cabelo ainda molhado, uma de cada lado da cabeça, porque vira uma mulher com aquele penteado na academia na noite anterior e gostara da alternativa ao rabo de cavalo. Estranhou as tranças no começo, estreitou os olhos para o reflexo e se perguntou se aquilo chamaria atenção demais. Então deu de ombros para si mesma.

Katherine Brown não chamava atenção.

No começo, quando Ellen explodiu na internet, as pessoas se aproximavam de Katherine na escola por interesse. Emma até deu um tempo de encher o saco dela nessa época, e Katherine foi a algumas festas e arrumou um namorado. E quando pensava nisso, ela desejava nunca ter deixado de ser uma anônima.

Com calafrios por causa da lembrança, saiu do banheiro, vestiu suas roupas e desceu as escadas. A mochila estava no chão, no pé do sofá, na exata posição em que fora arremessada na tarde anterior. Katherine passou por ela e lançou um rápido olhar para lembrar-se de que estava ali.

Quando chegou à cozinha, notou que David ainda não descera. Ellen colocara uma jarra de café fresco sobre a mesa e havia algumas panquecas proteicas e claras mexidas. Jamais a gema. Artigo 13 do código de leis da ditadura fitness.

Katherine se serviu de um copo de café e se sentou à mesa. Jack chegou e se sentou com ela, mas não conversaram.

— Kate?

Ela ergueu os olhos para a mãe e tomou um gole de café.

— Você pode, por favor, usar uma camiseta que não esconda seus joelhos?

Katherine olhou para sua mãe, e então para Jack, e para sua mãe de novo.

— Sério? – perguntou ela, com pouco interesse. Não iria trocar a blusa só porque sua mãe a achava grande demais. E nem chegava realmente aos joelhos.

— As mangas chegam ao seu cotovelo, Katherine! – Ellen insistiu.

Katherine respirou fundo e se serviu de uma panqueca. Elas não chegavam no cotovelo de verdade. De repente, David chegou à cozinha correndo e trombou na mesa. O copo com café virou.

David!— ela gritou, olhando para a mancha enorme e quente de café em sua barriga. Puxou o pano da camisa para longe da pele para que não se queimasse mais. Olhou para o irmão com raiva e socou a mesa com força, espirrando um pouco de café na cara de Jack.

Jack piscou e não disse nada.

— Bom dia para você também, Katherine! – David berrou, batendo as duas mãos na mesa. Todas as coisas que estavam sobre ela tremeram pela segunda vez.

Katherine bufou e continuou brigando.

— Você derrubou café quente em mim e ainda vai nos atrasar – falou. Em seguida virou-se para Ellen. – Vou trocar a camiseta agora!

Ela subiu as escadas com os punhos cerrados e puxou a gaveta com força. Passou os olhos pelas roupas e uma camiseta velha com Led Zeppelin estampado chamou sua atenção. Pegou-a e fingiu não perceber a mancha no ombro. Foi até o banheiro e, depois de jogar a camiseta anterior no box para lavá-la mais tarde, passou uma toalha molhada na barriga para limpar o café.

Vestiu a camiseta limpa e desceu as escadas. Saiu correndo pela porta da frente e se esqueceu da mochila. Lembrou-se e voltou correndo. Pegou a mochila e parou.

Não vira o carro lá fora.

— Mãe? – chamou. Sem resposta.

— Ele já foi.

Assustada, olhou para trás e viu Jack parado na porta da cozinha. Ela poderia fazer um comentário sobre a quantidade de vezes que ele a assustava, mas Katherine só conseguia pensar em uma coisa:

David a deixara em casa.

O idiota de seu irmão tomara a atitude mais infantil possível.

— Você pode me levar? – perguntou ela, esperançosa.

— Jack e eu vamos inaugurar uma loja de suplementos na avenida da praia e já estamos atrasados – anunciou Ellen, chegando na cozinha com outro conjunto espalhafatoso, dessa vez em tons metálicos. – Você vai ter que ir de ônibus.

— Fala sério! – disse Katherine, indignada. – Ele fez isso e você não fala nada?

— Vou dar uma palavrinha com o seu irmão mais tarde, mas você bateu na mesa e gritou com ele. Ele deve ter ficado irritado – concluiu Ellen, encolhendo os ombros e encerrando o assunto.

Katherine balançou a cabeça, incrédula, e saiu em disparada pela rua e, dessa vez, com a mochila nas costas. Chegou ao ponto após cinco minutos correndo. Sentou-se no banco e olhou em volta ofegando.

O ponto de ônibus estava vazio. O ônibus também a abandonara.

Ela tentou controlar a respiração. Led Zeppelin a estava sufocando. Sem outra opção além de proferir todos os palavrões que conhecia, Katherine se viu correndo em direção à escola.

Chegou à maravilhosa Albert Einstein High School com o rosto vermelho, sem sentir as pernas e com vontade de vomitar, mas chegou correndo. Pelo menos para isso a ditadura fitness servia.

Viu os portões fechados e pulou a cerca baixa que dava para o estacionamento dos professores. Sabia que haveria uma porta lá, e, naquele horário, nenhum professor.

Abriu a porta devagar e espiou. Um corredor vazio e nenhuma secretária na sala da secretaria, que ficava ao lado da porta. Katherine fechou a porta atrás de si e correu pelo corredor. No fim dele, olhou para os lados à procura de inspetores. Não viu nenhum e continuou até chegar à porta de sua sala, sentindo-se a mestra da destreza.

Bateu na porta e a abriu.

Era aula de História e o professor gostava muito dela. Sem entender a cena, ele acenou com a cabeça, autorizando-a a entrar, e ela fechou a porta atrás de si.

Andou até a primeira cadeira vazia que encontrou, no fundo, e baixou um pouco a cabeça ao se sentar. Estava envergonhada por ter chegado extremamente atrasada, ofegante e descabelada e ainda sentir os olhos da sala toda sobre si.

O sinal para o fim da primeira aula bateu pouquíssimo tempo depois de Katherine ter chegado. Ela foi até o professor e pediu desculpas pelo atraso, mas, pela cara dele e a cara de Katherine, ele devia ter entendido que havia algo de errado e deixou passar sem problemas.

Ela se levantou e saiu da sala tentando se lembrar da próxima aula. Provavelmente Inglês. Enquanto ela andava pelo corredor, viu David indo na direção contrária. Passou olhando para ele sem dizer nada e mostrou o dedo do meio quando ele deu um sorrisinho.


Katherine e Rachel se sentaram em uma mesa para almoçar. Havia mais dois meninos na mesa, do clube de RPG, mas eles apenas cumprimentaram as duas e se sentaram na outra ponta.

Sem pensar muito e ainda com raiva de David, Katherine falou:

— David está saindo com Emma.

Rachel arregalou os olhos e balançou a cabeça, incrédula, que fez com que seu cabelo loiro e curto balançasse.

— Não pode ser, K! – exclamou ela, cobrindo a boca em seguida por ter falado muito alto. Os meninos na mesa olharam para ela rapidamente. – Eu pensei mesmo ter visto os dois juntos no estacionamento, mas não achei que ele fosse capaz dessa ousadia.

Katherine balançou a cabeça e olhou para a sua bandeja para esconder a vontade de rir depois da escolha de palavras de Rachel. Diante do silêncio de Katherine, Rachel continuou:

— Não sei se isso vai longe, pelo menos. Você já viu um dos dois tendo um relacionamento fiel e duradouro com alguém?

— É, tem razão – respondeu Katherine, pensativa. – Quem consegue manter algo sério com Emma ou com David? Ela estava com Austin, tipo, semana passada.

Rachel concordou, olhando em volta à procura de Austin. Era um dos meninos mais populares da escola, junto com David. Apesar de participarem do mesmo grupo dos atletas populares, eles não eram amigos. E se tornariam, em breve, inimigos, assim que chegasse aos ouvidos de Austin que sua namorada ou ex-namorada ou algo do tipo já estava ficando com outra pessoa. E do jeito que estavam se olhando torto na mesa do almoço, já devia ter chegado.

— Se eles forem brigar depois da aula, você me dá uma carona?

Rachel riu e bateu de leve no ombro de Katherine.

— Eu te dou uma carona com ou sem briga. E adorei seu novo penteado.


Katherine sabia que, ao chegar em casa, o saco plástico com biscoitos que ela escondera atrás do micro-ondas estaria vazio e Jack estaria com a camisa cheia de migalhas.

Ela olhava pela janela do carro de Rachel, de luto pelos biscoitos contrabandeados, enquanto voltavam para casa.

— E aí, você quer entrar? – perguntou Katherine, indicando a casa com a cabeça. – Podemos assistir um episódio de Nova Creta.

Rachel assentiu com a cabeça.

— É, parece uma boa. Estou participando do sorteio da sua mãe. Se ela estiver em casa, vou tentar convencê-la a me ajudar. Tenho certeza absoluta de que fui a pessoa que mais comentou no post.

Ela estacionou o carro e as duas desceram. Passaram pelo carro conversível de David sem reparar na bolsa que estava no banco do carona.

Katherine empurrou a porta que estava entreaberta, entrou e jogou a mochila em um canto da parede. Quando olhou para o lado, David e Emma estavam no sofá. Estavam vestidos, mas David estava em cima dela.

No sofá.

— Não – disse ela, congelada no lugar e fazendo careta. – David. Essa é a coisa mais repulsiva que eu já…

Os dois se assustaram com o barulho que Katherine e Rachel fizeram e se afastaram, mas não pareciam envergonhados. Só irritados.

Rachel imitou barulho de vômito e Emma olhou para ela com as sobrancelhas erguidas.

— Essa cena nojenta vai ficar impressa nas minhas pálpebras para sempre – disse Katherine, balançando a cabeça. – Eu ia deitar nesse sofá mais tarde. Não acredito.

David estava com cara de quem se divertia. Ele não dava a mínima mesmo para o que os outros pensavam, principalmente Katherine.

— O que você e a sua namorada querem? – disse Emma. Apesar da provocação, as bochechas dela estavam um pouco vermelhas.

Katherine até queria sair e deixá-los em paz para sempre, mas não conseguia ficar quieta. Especialmente sabendo que Emma com certeza estava lá porque tinha interesse na fama de Ellen.

— Espero que você não tenha trazido aquela bolsa vermelha. Minha mãe vai morrer de vergonha se chegar em casa e vir uma namorada de David usando bolsa falsa.

Quando viu que o rosto de Emma ficou da mesma cor que o cabelo ruivo, Katherine puxou Rachel em direção à cozinha.

— Acho que minha mãe tem uma garrafa aberta daquela água gaseificada alcoólica – sussurrou, ignorando a cena anterior. – É de baixa caloria, mas até que é gostoso. Ela nem vai perceber.

Como sempre, Jack estava lá.

— Você está com migalhas na camisa, Jack – acusou ela, frustrada pelo plano do roubo da garrafa ter ido por água abaixo.

Jack deu de ombros, admitindo o crime, mas olhou para a camisa e bateu as migalhas. Ele sempre comia as comidas que ela escondia, e mudava de canal quando ela estava assistindo televisão, e o pior, tirava fotos dela distraída para postar nos stories. Era a pegadinha padrão dele, e Katherine sempre caía.

— Oi, Jack – cumprimentou Rachel.

— Oi, Rachel, tudo bem? Como estão os seus pais?

Enquanto eles conversavam, Katherine procurava algo na geladeira.

— Sua mãe trouxe um doce que imita chocolate – disse ele, indicando a primeira prateleira com a cabeça. – Não é que nem chocolate, mas dá para enganar se você estiver distraído enquanto come.

Katherine inclinou a cabeça, pensando.

— É, parece melhor que aquele sorvete vegano – respondeu ela, dando-se por vencida.

Pegou o doce fitness, serviu-o em três canecas e deu uma delas a Jack, que pareceu surpreso com a simpatia. Deu a outra a Rachel.

— Qual será que é o problema dessa garota comigo? – perguntou Rachel, olhando para a porta fechada da cozinha como se pudesse ver os dois. – Ela sempre tenta me provocar fazendo piada sobre eu ser lésbica. Tipo, eu sei que eu sou lésbica. Por que ela acha tão engraçado falar que nós somos namoradas?

Aquilo quase fazia a garganta de Katherine se fechar de tanto ódio.

— Ela não consegue ter nenhuma amiga mulher – respondeu, apertando a caneca com força. – Deve achar que todo mundo é competidora dela.

— Eu defenderia você da sua mãe se você batesse nela – disse Jack. – Só sugerindo.

Katherine pensou antes de responder.

— É, parece uma boa – falou, ainda pensativa. – Quer apostar dinheiro? Você tem cara de viciado em apostas.

Na verdade, Jack parecia um surfista de 40 anos. Ele tinha esse ar saudável, por ser forte e bronzeado, e deixava o cabelo loiro crescer um pouco. O único tipo de viciado que ele poderia parecer era um rato de academia, e isso ele era mesmo. Todos eles.

— Vinte dólares, mas eu tenho que estar presente – disse ele com um sorriso maldoso. – Trinta se for lá na rua.

Katherine assentiu sorrindo como se estivesse aceitando.

— Vocês dois são muito esquisitos – disse Rachel, enfiando uma colher do doce de chocolate de mentira na boca. – Tipo, eu bateria de graça. Mas tenho medo dela me processar e arruinar minha faculdade.

— Eu admiro esse comportamento — aprovou Jack. — Futuro primeiro, violência depois.

Katherine ergueu um dedo no ar.

— Mas ainda podemos nos vingar por ela ser homofó…

Antes que ela terminasse de falar, Jack tirou uma foto dela. Mostrou para as duas, achando graça da cara de Katherine com a boca meio aberta, e escreveu “Kate tem um plano diabólico” antes de postar.

— Realmente um gênio das redes sociais – comentou Katherine, com ironia.

— E Ellen vai te matar quando ver que você mencionou o diabo – concluiu Rachel, e as duas começaram a ir.

Mas então Katherine voltou ao plano “diabólico”, e saiu da cozinha com empolgação, mas entrou na casa com um ar bem sério. Passou pelos dois sem encará-los – e dessa vez, pelo menos, estavam sentados. Sentou-se no outro sofá e ligou a televisão.

— Katherine – David rosnou entredentes. – Sai daqui.

Ela olhou para os dois com um sorriso e ignorou a carranca de David e os olhos arregalados de Emma, que não estava entendendo. Devia achar que Katherine tinha ficado louca de vez.

— Não posso sair agora – disse Katherine, encolhendo os ombros e indicando a televisão com a cabeça. – Está começando Muse. Eu nunca perco Muse.

— Qual é o seu problema, Katherine? – Emma falou, indignada.

Katherine a ignorou e continuou assistindo à televisão.

— Rachel, Jack! – gritou, chamando-os. – Está começando Muse!

Emma bufou e olhou para David esperando uma reação dele. Rachel e Jack surgiram no corredor com sorrisos de expectativa, e David balançou a cabeça para os dois, indignado.

— Vocês também? Vamos para outro lugar – ele falou, por fim, para Emma. – Katherine não vai largar o osso.

Katherine suspirou, sorrindo.

— Obrigada por reconhecer, David. Mas se vocês puderem, por favor, decidir isso em silêncio, eu agradeceria porque não estou conseguindo ouvir a televisão.

— Katherine, esse canal está em espanhol – Emma disse, revirando os olhos.

— Vá fazer esse tipo de conclusão lá fora, chica.

David passou a mão pelo cabelo em um gesto de frustração extrema e se levantou do sofá. Ficou ainda mais nervoso quando viu que Jack e Rachel estavam rindo atrás dele, e então saiu com Emma para a rua.

Quando ouviu o barulho do motor, Katherine se curvou, como se agradecesse ao público por assistir ao espetáculo.

Jack bateu palmas e Rachel se apoiou no sofá para rir.

— Isso vai ter consequências para a nossa vida social – disse Katherine, avaliando os danos. – Mas valeu a pena.

— Esse é o tipo de coisa que você deveria filmar – Rachel disse para Jack.

Antes que Jack pudesse responder, a porta da frente se abriu e Ellen entrou com algumas sacolas na mão.

— Por que David estava tão bravo? – perguntou ela, olhando para Katherine, querendo franzir a testa. Ela não conseguia realmente franzir a testa por causa do botox, mas pelo jeito como as sobrancelhas se movimentavam, dava pra ver que ela queria.

Katherine deu de ombros.

— Sei lá, mãe, ele está sempre com essa cara de quem vai socar uma parede.

— Oi, senhora Brown – Rachel cumprimentou.

Ellen se limitou a responder com um aceno de cabeça, então Katherine imaginou que Rachel perdera a coragem de falar sobre o sorteio.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

espero que seja bom kkkkkkk um início meio imaturo pq afinal eles sao adolescentes e tem problemas de adolescentes !111!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Sede de Poder" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.