O que acontece depois de agora? escrita por Mariah Gonçalves


Capítulo 2
Capítulo 2 - Parte I


Notas iniciais do capítulo

A história acontece no Brasil mesmo, caso não percebam.
Boa leitura!



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Regina, um mês antes

                Estaciono meu carro na mesma vaga de sempre, olho em volta em busca de rostos conhecidos e como de praxe não reconheço ninguém. Me estico e pego um maço de Marlboro mentolado de dois sabores embaixo dos documentos do carro no porta luvas e saio do veículo. Trancando-o, encaro o letreiro meio apagado escrito “Bar do Seu Benedito” e contorno a parte frontal me encostando na lateral da estrutura antiga, é aí que percebo um sinal de maior movimento no bar de beira de estrada, umas oito ou dez motos de modelos chamativos e bem cuidados estavam paradas em fileira ao lado da "pousada" do seu Benedito.

                Acendo meu cigarro e sinto a fumaça encher meus pulmões com maior densidade do que o ar gelado da quase noite, escuto a música antiga de um meio-rock chegar fraca e abafada aos meus ouvidos enquanto o ar quente do cigarro passeia pelo meu peito. Continuo nesse transe até escutar a porta que estava em menos de dois metros de mim se abrir e libertar o som da voz da Pitty. Abro meus olhos num susto e vejo seu Benedito saindo da porta e indo rumo ao banheiro, que ficava do lado de fora do estabelecimento. Trago o terceiro quarto do meu cigarro enquanto espero ele sair e dar de cara comigo.

                Uai Regininha, me evitando agora mocinha custosa? escuto a voz de sotaque do interior mineiro acentuada e falhada, porém firme e calma do senhor nos seus setenta e poucos se aproximando e apago o ponto aceso entre meus dedos

                Você sabe que eu nunca faria isso meu bem, respondo num meio sorriso e cumprimento-o num abraço apertado e dois beijos no rosto

                O que cê ta aprontando aqui de fora nesse frio menina?! Isso faz bem não, vamo entrar logo antes de ocê comece a constipar, ele atenta bastante sério como se eu fosse mais uma de suas netas

                Já vou seu Benedito, sorrio e vejo que ele continua me esperando, o que houve com o meu sertanejo? escuto novamente a música aumentar no tom quando o velho abre a porta

                Cê sabe como é ne fia, o público pede e a gente dá, tendeu? seu tom era cansado, mas não desanimado, nunca desanimado

              Entendi, respondo ao entrar e ver várias pessoas trajando uma jaqueta preta em volta de mesas com garrafas de whisky Red Label e copos cheios de gelo meio-derretido

                Mas preocupa não sô, eles só vão ficar uma semaninha por aqui e eu até faço um descontin se ocê prometer vim me ver por esses dia ainda, o tom de preocupação em relação à minha presença me diverte

                É claro que virei, não precisa nem de desconto, meu marido está viajando esta semana então poderei ficar até mais tarde, vejo o rosto do velhinho se acender num sorriso e me sento no balcão de costas para o palco parado e escuro e os motoqueiros de gosto sulista

                A Betinha vai te atender porque a Dona Cida ta me chamando lá no fundo pra ligar o registro do chuveiro, cê sabe como é essas casa antiga né menina?! Tem que apelar pro braço tem hora, ele levanta o braço mostrando seu “bíceps” e eu dou uma risada enquanto ele sai andando pela porta do fundo do balcão

                O que cê vai querer hoje tia? O de sempre ou vai variar um tiquin? escuto a voz alegre da menina nos seus quatorze anos

                Hoje vou variar um pouco, já que os hospedes estão com o meu whisky na mesa

                Eu até podia pegar lá pr’ocê, mas meu sonho é te ver variar pelo menos uma vezinha, meu vô disse que seu sangue ainda vai virar puro Red Label se continuar assim, ela pronuncia o nome errado e corre até a prateleira, pode ser tequila? Tem dessa aqui ó

                 Aceno com a cabeça enquanto ela tenta ler com dificuldade o nome na embalagem, é Espolón querida, já está de férias?

               Finalmente tia, eu já não aguentava mais ter que ir na cidade, dou uma risada ao ver a cara de espanto dela ao lembrar quem eu era, assim, não que seja ruim a cidade da senhora viu? Ela é boa demais, mas é que na cidade não tem o vovô e a vovó e nem o Risada, meu cachorrinho que ganhei no Natal do ano passado, daí prefiro ficar aqui, solto uma gargalhada

          Calma, tudo bem Beatriz, até eu fujo de lá tem hora, a cidade consegue ser bastante estressante, vejo ela liberar a tensão do rosto e sorrir enquanto serve um xote e deixa a garrafa do meu lado

        Ai que bom, vou deixar a garrafa aqui e ocê mesma se serve ne? seu olhar quase implora e percebo a expressão cansada encarando a mesa animada atrás de mim

          Eles estão te dando trabalho?

          A senhora tem nem noção, mas ta de boa, vovô ta cansado e eu tenho que ajudar. ela deixa um pote de sal e três limões ao lado da garrafa e sai em direção aos motoqueiros quando um homem barbudo assovia, arrancando um suspiro meu enquanto tocava “Blues do Velcro – Velhas Virgens” pela segunda vez em vinte minutos

         Depois de umas cinco doses viradas, a música começa a ficar boa enquanto eu tento tirar uma foto decente pela vigésima vez, que cabelo horroroso... olha esse braço, credo, lamento um tanto alto e viro mais um xote. De repente uma pessoa chega bruscamente do meu lado procurando por alguém para atender enquanto batia com a mão na mesa assoviando.

                Não tem ninguém aqui não?! escuto uma voz feminina firme murmurando atrás de mim

         Ela só foi ao banheiro, respondo me virando e deparando com uma loira de linhas faciais marcadas e olhos verdes já avermelhados pelo álcool e cigarro

                Porra, preciso da senha do wifi, dou de ombros, animada ein?  vira-se para mim

            Acho que hoje eu to, sorrio de lado sem dar moral e ela chega mais perto, me fazendo afastar meu corpo para evitar proximidade

                Já que é só hoje, bora jogar um truco ali com o pessoal, a proposta sai quase inocente, quase

                Truco? levanto a sobrancelha desconfiada

                Com essa carinha aí, certeza que joga, me arranca um sorriso, vamo lá, a não ser que já esteja chapada o suficiente para não jogar, desafia

                Nunca estou chapada o suficiente para não jogar truco, me levanto do banquinho, com quem eu jogo?

                Pode escolher, ela aponta para a mesa e os homens todos me encaravam rindo, pode apostar nesses fracassados ou ganhar comigo, ela diz isso num tom bastante alto e a mesa faz barulho, os homens imitavam uivos de lobos e colocavam a língua pra fora como se fossem cachorros com sede e um dos barbudos grita

                Parece que a lobinha já arrumou uma presa, isso causa um maior alvoroço ao passo que um menino nos seus dezessete anos joga a toalha verde na mesa e o baralho em cima, acompanhado de tentos

                Eu tenho certeza que uns 3 xotes atrás eu não faria isso, mas já não eram mais três xotes atrás e eu encarei a loira com um sorriso traiçoeiro, sabe sinal de mão?

                Eu sei tudo que você quiser, querida, ela coloca um cigarro no meio dos dentes num sorriso cafajeste e vai andando num gingado firme até a mesa com dois lugares vagos, preparados para perder de novo amadores?! 


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Notas finais do capítulo

Me digam o que acharam e o que esperam para os próximos capítulos e história em si.
Obrigada, logo tem mais.



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