Houve um tempo em que ele havia se sentindo glorioso. Com o mundo aos seus pés e o futuro na palma de sua mão. A vida parecia perfeita para ele e era apenas isso que importava.

Mas então essa pequena fração de felicidade começou a ruir, lentamente ele se viu cada vez mais sozinho, solitário. Parecia que todos estavam destinados a abandoná-lo, ele acabou aceitando isso, que de um em um todas as pessoas ao redor tomavam um caminho diferente do seu.

Seus dias de glória haviam acabado deixando apenas a melancolia e solidão. Ele estava só e não havia mais nada que pudesse fazer para rever aquela situação. Não havia ninguém a quem recorrer, não havia mais onde se esconder, a solidão já era sua companheira inseparável.

—Mais um pouco e você conseguirá virar o novo Edgar Allan Poe. - Caitlin brincou fazendo Barry voltar a realidade, ele a ignorou como sempre. Sabia que o que estava fazendo era rude e grosseiro, mas queria apenas que ela se fosse, assim como todos os outros. Caitlin poderia começar uma vida melhor em outro lugar bem longe dele, conhecer pessoas novas e se apaixonar novamente, mas parecia que cada vez que ele tentava expulsá-la de sua vida, ela voltava, reforçando ainda mais o fato de que não sairia de perto dele.

—Você tem que ir. - ele disse sem olhar para ela, já podia prever que naquele momento ela revirava os olhos e cruzaria os braços, estaria encarando-o como se ele fosse um idiota, o que ele realmente era. - Todos já foram, por que ainda insiste em ficar?

—Porque é o meu trabalho.

—Tem lugares melhores para você trabalhar.

—Mas nenhum deles me dá tanta liberdade quanto aqui.

Estava claro que aquilo era mais um mentira dela. Caitlin era uma das cientistas mais brilhantes que ele conhecia, ela podia arranjar um emprego melhor em qualquer lugar do mundo. Mas por algum motivo que ele não entendia, ela ainda estava ali, aguentando toda a merda que ele fazia e todas as coisas idiotas que dizia. Caitlin era forte, tão forte que ele se sentia fraco quando estava perto dela.

—Por que você ainda está aqui? - indagou finalmente olhando para ela. Caitlin tinha o olhar cansado, mas ainda intenso e selvagem. Ela já havia travado muitas batalhas e vencido a grande maioria delas. - E por favor não diga que é pelo trabalho.

Caitlin caminhou até ele, o silêncio que habitava o laboratório já era um velho conhecido, nos últimos meses ele havia perdido muitas pessoas importantes, Iris havia sido a primeira a ir, depois Joe, Harry, Ralph e por fim Cisco. Todos tinham ido porque ele havia sido um idiota egocêntrico. Mas Caitlin havia ficado, apenas ela.

—Não vou te abandonar, Barry. Mesmo que sempre me dê um motivo. - ela disse, havia um pouco de mágoa em sua voz, era visível o quanto ela travava uma luta interna para saber qual era o seu limite. Barry torcia para que sua empatia perdesse, para que ela também pudesse sair da vida dele como os outros.

—Você tem que ir. - ele repetiu. - Isso não é vida para você, Cait. Você merece mais que isso.

—Ah é? E o que eu mereço?

—O mundo. Tem tanta coisa para você ver, tantos lugares para ir. Você poderia ver coisas que nunca viu antes. - insistiu, Caitlin descruzou os braços e puxou uma cadeira para sentar de frente para ele. - Tem tantos lugares no mundo. País incríveis, cidades históricas, culturas novas para você conhecer.

—Já que o mundo é tão fantástico, por que você não vem comigo? - ela sugeriu. - Estilo Oliver e Felicity. - Barry soltou um risada amarga. - Você não pode viver o resto da vida trancado aqui, você está perdendo tanta coisa por causa dessas suas ações.

—Você acha que eu não sei disso? Todos já foram, todos me abandonam.

—Não todos. Eu ainda estou aqui. - ela disse.

—Não sei porquê. Você tem que ir.

—Por favor não. - Caitlin pediu pegando as mãos dele e apertando-as com força. - Tive muitas oportunidades de ir, de sair e nunca mais voltar. Mas decidi ficar porque sei que essa sua defesa não é necessária. Barry, sei que tudo o que aconteceu foi horrível e desesperador. Mas você não pode continuar tirando as pessoas de sua vida porque tem medo de perdê-las, todo mundo corre risco quando se vive uma vida assim, porém é uma questão de escolha. Eu escolhi ficar porque sei que você ainda é o mesmo cara que eu conhecia, doce, gentil e atencioso. O mesmo Barry por quem eu me apaixonei e por quem eu ainda sou apaixonada.

—Eu faço mal a você, Cait. Você deveria sair de perto de mim. - ele disse e então se afastou dela acelerando para fora da sala. Quanto mais longe ficava dela, melhor seria.

○○○

Caitlin manteve todo o peso do corpo em seus pés enquanto puxava Barry em direção a maca, às vezes era bom ter mais alguém para ajudá-la em momentos como aqueles, mas Barry não deixaria mais ninguém entrar em sua vida, ele havia se trancado para o mundo real, vivia em sua pequena cúpula de dor e sofrimento, remoendo seus erros e se desgastando emocionalmente. Ela queria bater nele e abraçá-lo ao mesmo tempo, Barry não merecia aquilo, mas havia escolhido viver assim.

—Você tem que fazer um esforço, por favor. - pediu ao velocista semi inconsciente. O sangue que saía do buraco no traje dele pingava no chão em gotas medianas. Caitlin tentou ignorar o pensamento ruim que passeou em sua mente naquele momento.

Barry forçou o corpo para frente e meio sem jeito deitou na maca. Caitlin olhou para a ferida no abdômen dele, deveria ter pelo menos dez centímetros e era profunda, tentou estancar o sangue com as toalhas que tinha por perto e rapidamente pegou seu kit para começar o procedimento.

—Desculpa. - Barry murmurou enquanto ela tentava limpar o sangue.

—Não foi sua culpa ser atingindo pela adaga. - disse se movendo rapidamente pela sala em busca do que precisava.

—Eu sou um idiota, Cait. Tudo o que faço é magoar as pessoas ao meu redor. Você deveria ir.

Caitlin parou com uma tesoura na mão esquerda e a toalha suja de sangue na direita, olhou para o velocista moribundo deitado na maca sangrando, milhares de respostas para aquilo surgiram em sua mente, repostas baixas e sujas, mas  a única coisa que ela conseguiu fazer foi rir.

—Cala a boca. - mandou entre uma risada e outra. - Você já estaria morto se eu não estivesse aqui.

—Não sei como ainda me suporta? - ele indagou também rindo baixinho, mas parando e fazendo uma careta de dor.

—Porque eu te amo, simples assim. Não vou sair do seu pé tão cedo, Barry. Então desista de me mandar embora. Agora cale a boca e não se mexa, ainda tenho muito trabalho a fazer.

Barry seguiu aquela ordem e não falou mais nada até ela finalmente terminar. Quando Caitlin acabou de limpar a ferida o velocista já estava inconsciente em um sono profundo, ela balançou a cabeça se livrando da luvas e puxou a cadeira para perto da maca, o cobriu com uma manta grossa e se sentou ao seu lado. Cruzou os braços sobre a maca e deitou a cabeça sobre eles fechando seus olhos, estava tão cansada de tentar se manter forte que se esgotou fisicamente.

Sabia que Barry não havia feito por mal tirando todos de sua vida, mas ela também sabia que não conseguiria viver somente para ele, sentia falta de Cisco que havia se mudado temporariamente para terra-19, sentia falta de seu senso de humor e suas piadas inadequadas. Sabia que Barry também sentia falta dele, mas não daria o braço a torcer e pediria desculpas, havia muita coisa entre eles, sentimentos e emoções que eles teriam colocar para fora se quisessem se resolver de uma vez por todas.

○○○

Ela acordou se sentindo relaxada, se espreguiçou abrindo lentamente os olhos, então notou que não estava mais na cadeira onde havia adormecido na noite anterior, olhou para o lado dando de cara com Barry em um posição desconfortável. Revirou os olhos cutucando-o até ele despertar.

—Você sabe que não deveria ter feito isso. - disse se sentando na maca e olhando para ele. Barry tinha a barba rala em seu rosto e os olhos cansados, mas ainda assim conseguia ser um dos homens mais charmosos que ela havia conhecido.

—Quando eu acordei você estava em uma posição tão desconfortável que eu sabia que acabaria acordado com uma dor nas costas. - ele justificou passando a mão pelo rosto.

—Não estou falando apenas disso, o que você fez ontem, o jeito como se arriscou, sei que pensa que não tem mais nada a perder, Barry, mas quero que saiba que não é o único que está sofrendo ou que vai sofrer. Se algo acontecer com você, eu não vou ser capaz de lidar com isso. - ela falou sentindo o coração bombear o sangue mais rápido, estava ficando mais agitada e nervosa. - Encarando os fatos, eu sou sou a única pessoa que você tem agora. Então, por favor, não tente nada de idiota de novo, eu não suportaria perder você.

Caitlin pulou da maca saindo da sala, estava tão irritada com o comportamento infantil dele que seria a capaz de batê-lo só de raiva. Já estava quase chegando a porta quando o sentiu aproximar, Barry parou a sua frente, seu rosto parecia implorar por algo e seus olhos pareciam perdidos. Caitlin abriu a boca para falar algo, mas de repente seus lábios se chocaram contra os dele. Ela demorou alguns segundos para perceber que ele estava lhe beijando.

Barry segurava seus rosto com as mãos intensificando o ato, ele se afastou depois de alguns segundos encostando a testa contra a dela.

—Por favor não me deixa. - ele pediu em um sussurro de desespero. - Não posso perder você também.

—Você não vai me perder. - ela assegurou erguendo a mão e secando as lágrimas que escorriam pelo rosto dele. - Apenas seja o Barry por quem eu me apaixonei. Você não precisa carregar o peso do mundo em seus ombros, você não é responsável por tudo, Barry.

Ele riu fazendo ela rir.

—Eu sinto muito se fui um idiota nos últimos meses.

—Não é apenas para mim que você tem que pedir desculpas. - ela falou. Então se afastou dele o puxando pela mão em direção a maca. - Você ainda tem que descansar, a ferida ainda não está totalmente cicatrizada.

—Eu sei. - Barry deitou na maca, mas afastou o corpo para o lado e apenas com o olhar a convido para se deitar com dele. Caitlin tomou cuidado para não machucá-lo enquanto se ajeitava ao seu lado. - Tenho uma lista de pessoas com quem devo me desculpar.

—Eles ainda se preocupam com você, Barry. Assim como eu me preocupo.

—Você foi a única que ficou comigo, mesmo com as minhas inúmeras tentativas de lhe afastar.

—Tenho um pequeno problema em respeitar ordens. - ela revelou. - Eu nunca as sigo.

—Que bom. - ele afirmou passando o braço por baixo da cabeça dela, a fazendo se aconchegar ainda mais contra ele. - Obrigada mesmo por estar aqui, nunca teria conseguido me manter todo esse tempo sem você.

Caitlin sorriu acariciando o rosto dele com a ponta dos dedos. Tudo estava tão diferente de alguns minutos atrás, se sentia mais calma e leve.

—Você deveria começar com Cisco. - ela sugeriu. - Ele não é apenas seu melhor amigo, vocês eram quase como irmãos.

—Eu amo ele. Vou até lá mais tarde, vou conversar com ele e resolver tudo isso. Preciso da minha família de volta.

Caitlin sorriu da maneira determinada como ele falava aquilo, até parecia com o seu Barry Allen, aquele por quem ela foi apaixonada por anos. Fechou os olhos escondendo o rosto contra o pescoço dele, os dois precisariam de mais horas de descanso.

As coisas estavam finalmente voltando ao seu normal e isso era fantástico.