Nature vs Nurture escrita por baechuyeba


Capítulo 1
Capítulo 1




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Yongsun andava pela rua à procura do carro. Ela não poderia voltar para o centro de treinamento agora, já que Wheein ainda estava no bar, mas ela não aguentava mais aquele ambiente e suas emoções conflitantes, então resolveu esperar no carro.

Ela estava realmente feliz por Wheein, obviamente. Seu coração estava cheio de orgulho e ansiedade por ver a amiga fazer o rito de passagem, mas ela não podia negar que também estava com um pouco de inveja. Era quatro anos mais velha que Wheein: isso significava quatro anos a mais de treinamento, e ainda assim sua amiga se “formou” antes dela. Yongsun sabia que não era tão boa quanto Wheein (ou qualquer outra caçadora formada) no arco e flecha, mas sabia que era melhor que quase todas na adaga. O único problema era que isso não importava para a general. O principal era o arco e flecha, a adaga era apenas uma segunda opção, então todos deveriam dominar a arqueria em primeiro lugar.

Wheein era ótima, realmente. Por isso se formou tão cedo. Ela já havia ajudado Yongsun tanto quanto podia, e Yongsun não era ruim , ela só ainda não era boa o bastante para se formar. E isso a frustrava profundamente.

Ver Wheein fazer o rito de passagem, vê-la construir seu próprio arco e sua primeira flecha e depois dispará-la… foi incrível. Não podia assistir à cerimônia da tatuagem, mas havia visto o formato de lua no pulso da amiga depois e havia amado. Era a primeira amiga próxima que se formava, então ela sentia que era ainda mais especial, mas o sentimento de inveja estava presente durante toda a cerimônia. Ela não conseguia aceitar que o fato de ela ser ótima na adaga, uma das melhores das últimas gerações de caçadoras, não valia o bastante para ela se formar.

Por isso, ela não aguentava mais ficar no bar e ouvir todo mundo congratulando Wheein. Ela ficou lá por bastante tempo para demonstrar apoio à amiga, mas nem álcool podia tomar para ajudar, já que era a motorista da vez. Então simplesmente não aguentou. Falou para Wheein que estava cansada e iria esperá-la no carro, mas fez questão de dizer para ela aproveitar o quanto quisesse. Era o dia mais importante da vida dela, Yongsun não atrapalharia.

Logo que ela avistou o carro prata na esquina, ela apressou o passo, querendo o quentinho de um ambiente fechado. Porém, um som baixo vindo do beco ao lado do bar a fez parar. Ela provavelmente deveria ter ignorado, dado que é um bar e um gemido não deveria ser algo alarmante. Mas ela sabia, de algum jeito, que aquele gemido não era um bom gemido. Era um gemido de dor.

Voltando alguns passos até o beco, tentando ser silenciosa, ela levou sua mão direita à adaga escondida dentro do casaco. Obviamente, não dava para ficar carregando um arco e uma aljava de flechas enquanto não estavam no campo de treinamento, então todas as caçadoras levavam adagas escondidas em suas roupas caso encontrassem alguma empusa por acaso. Claro que isso normalmente não acontecia, quase nunca na verdade, mas a general não permitiria um despreparo caso acontecesse.

Parando logo antes do beco, observou do canto da parede, mantendo a maior parte do seu corpo escondida. A uns cinco metros da entrada do beco, numa parte escura mas que ainda era possível enxergar, Yongsun viu duas garotas se agarrando. Ou quase isso: a garota que estava com as costas contra a parede não parecia estar fazendo muita coisa. Seus braços caíam, flácidos, nos lados de seu corpo. A outra garota tinha seu rosto enterrado no pescoço da menor, enquanto mantinha suas mãos segurando a cintura da outra e, aparentemente, sustentando-a. O cabelo cinza comprido da mais alta caía como uma cortina, impedindo Yongsun de ver o que ela estava fazendo. Pelo olhar de dor da outra garota, porém, Yongsun conseguia perceber que não era algo muito gentil. Não parecia brusco, mas também não parecia agradável.

Sua mão direita agarrou o cabo da adaga, mas não tirou de dentro do casaco. Não tinha certeza se era uma empusa, apesar de acreditar que sim. Ainda assim, ela nunca havia encontrado uma delas, muito menos sozinha. Não sabia se o certo a fazer agora era procurar as outras trainees no bar, se deveria ligar para a general ou se deveria agir antes de deixar a empusa fugir. Deu um passo silencioso à frente, tanto em direção ao bar quanto em direção à empusa, decidindo que não iria deixá-la fugir mas que iria chamar as outras se conseguisse.

Não teve tempo de ir até o bar. Poucos segundos depois de ela dar o primeiro passo, a garota de cabelo cinza levantou seu rosto para longe do pescoço da outra e passou a parte de trás de uma das mãos nos lábios. Yongsun viu, hipnotizada, um traço de sangue que descia lentamente de uma mordida no pescoço branco da garota contra a parede. Sua mão apertou ainda mais o cabo da adaga mas ela a manteve escondida, torcendo para surpreender a empusa.

Mas foi ela que foi surpreendida. A empusa, com seus cabelos cinzas caindo pelos ombros, se afastou da menor e a olhou nos olhos. Disse algumas palavras em voz baixa, que Yongsun não podia inteiramente ouvir mas que achava que havia soado como um pedido de desculpas, e depois a garota menor andou para longe, em direção à Yongsun e, depois, foi para o bar.

Yongsun observou, sem acreditar, a garota ir embora. Ela não estava correndo, então seria fácil para a empusa tomá-la de volta. Até se ela estivesse correndo seria fácil para a empusa impedi-la de fugir. Mas é esse o ponto: ela não estava fugindo. A empusa estava deixando-a ir.

Yongsun retornou o olhar para a garota de cabelos cinzas. Ela agora a encarava, com aqueles olhos escuros que eram apenas mentirosos. Yongsun sabia, como toda caçadora havia aprendido, que empusai tinham uma forma natural: as suas íris eram de um vermelho vivo e seus cabelos, apesar de variarem no tom, eram sempre entre laranja e vermelho, com chamas os envolvendo. Contudo, Hécate, sua criadora, queria que elas fossem capaz de seduzir homens e torná-los escravos. Assim, ela lhes deu a habilidade de esconder essas características incomuns, tornando seus olhos e cabelos de qualquer cor que desejassem, e apagando as chamas.

Era algo que era ensinado para Yongsun, e para todas as gerações de caçadoras, desde pequenas: empusai foram criadas a fim de subjugar os homens. Eram demônios, criaturas que foram feitas para seduzir e, além de tudo, matavam para lhes tomarem o sangue e, assim, ficarem vivas por meio de vidas inocentes. Apolo, numa tentativa de proteger os homens, havia criado as caçadoras: apenas mulheres, para que pudessem resistir aos encantos das empusai, que eram mais comumente do sexo feminino. Sendo Apolo o deus do sol, as empusai se sentiam mais fracas quando estavam sob o seu símbolo, enquanto as caçadoras ficavam mais fortes.

Todas as informações regularmente repetidas nos treinamentos invadiram a mente de Yongsun, enquanto ela olhava aqueles olhos castanhos e apertava o cabo da sua adaga. Lembrava-se de todos os movimentos ensinados, todos os modos de atingir partes importantes para enfraquecer as empusai e, depois, dar o golpe fatal no coração. Porém, enquanto todos os seus anos de treinamento passavam como um filme em sua mente, uma pergunta permanecia ao fundo: por que ela não havia matado aquela garota?

Enquanto isso, Byul estava intrigada. Inicialmente, ela havia achado que era apenas uma garota qualquer observando-as, mas, agora que estava de frente para ela, conseguia ver a tatuagem em forma de sol no seu pulso esquerdo. Ela sabia que deveria fugir, afinal, aquela garota era uma caçadora , mas não conseguia se mover. A outra mão da garota estava enterrada em seu casaco, provavelmente pegando alguma arma, então Byul não conseguia ver se havia a segunda tatuagem, a de lua, que garantiria que a garota à sua frente era uma caçadora formada.

Byul não sabia o que fazer. Nunca havia encontrado uma caçadora antes, normalmente ela era discreta demais para perceberem que ela estava se alimentando dos moradores da região. Agora, estava com medo de como sairia dali: ou não sairia, ou teria que deixar a caçadora no mínimo inconsciente. E teria que pegar Hyejin e ir embora imediatamente. Não poderiam ficar nessa cidade, nem mesmo nesse estado. Hora de mais uma mudança.

Porém, a caçadora não estava se movendo. Estavam se encarando há provavelmente um minuto sem ninguém mover um músculo. Isso a fez imaginar que a caçadora não havia se formado ainda. Caso contrário, provavelmente Byul já estaria morta com uma adaga em seu coração.

Sua mão tremia ligeiramente, com medo do que teria que fazer para sair dali viva, mas também um pouco por causa da recente alimentação. Seu corpo estava cheio de energia e isso lhe dava uma vantagem para lutar, ainda mais com uma caçadora novata. Isso lhe deu confiança o bastante para dar um passo à frente, mesmo achando arriscado.

Isso lhe rendeu uma reação da caçadora: com uma agilidade que Byul achava que só empusai tinham, a garota retirou uma adaga do casaco e a segurou com força, colocando-a à frente do seu corpo, numa espécie de alerta para manter Byul afastada. Como havia imaginado, não havia uma tatuagem no pulso direito da garota. Byul quase suspirou aliviada, mas conseguiu se controlar.

Mais alguns segundos se olhando. Yongsun não sabia o que fazer. Ela não queria atacar, não estava confiante o bastante para achar que não morreria com o pescoço estraçalhado. Mas também não iria deixar a empusa fugir. Secretamente, Yongsun só torcia para alguma outra trainee sair do bar e vir em direção ao beco.

Mas havia algo a mais: Yongsun não conseguia esquecer o fato de que a empusa havia deixado sua presa ir embora. E que a presa era uma mulher. Sempre fora ensinada que empusai foram criadas para seduzir homens , então era estranho ver algo tão diferente do esperado.

Pensou que poderia ganhar tempo lhe perguntando sobre a mulher. Apenas um pouco de tempo, até alguma trainee, talvez até Wheein, sair do bar. Claro, essa era a justificativa oficial, mas, na verdade, Yongsun só estava morrendo de curiosidade.

“Por que você seduziu uma mulher?”, disse, antes de perder a coragem. Sua voz estava forte e confiante, muito diferente de como se sentia.

A mulher à sua frente primeiro pareceu surpresa, provavelmente por Yongsun ter falado ao invés de atacado, e depois abriu um sorriso pequeno. Yongsun viu aquele sorriso e achou estranho como ele era bonito. Logo ignorou o pensamento, afinal, aquela criatura foi feita para seduzir. Era esperado que fosse bonita.

“O que você quer dizer?” foi a resposta. Byul sabia o que Yongsun queria dizer, mas ela achou divertida a pergunta. Provavelmente seria ainda mais divertido vê-la tentar se explicar.

Yongsun sentiu suas sobrancelhas se juntarem automaticamente. “Bem, a sua… espécie foi criada para seduzir homens. Por que você estava com uma mulher então?”, ela disse, como se fosse algo simples.

“Então eu só posso tomar sangue de homens?”, Byul disse, rindo baixinho ao final. Era claro para ela que não havia sentido nenhum naquilo. Se as caçadoras ainda pensavam que as empusai só seduziam homens, elas estavam muito desinformadas.

Yongsun enrijeceu com a resposta. Primeiro, ela se sentiu ridícula fazendo uma pergunta daquelas. Apesar de o objetivo original da criação das empusai ser seduzir homens e torná-los escravos, deveria ser óbvio que, depois de milhares de anos, isso ainda não precisava ser necessariamente verdade. E por que não ter empusai seduzindo mulheres? O foco ali não deveria ser o sexo da vítima, e sim o fato de ela ser uma vítima. Segundo, ela havia falado sobre beber sangue como se fosse algo corriqueiro e comum. Bem, para ela deveria ser.

A mão de Yongsun agarrou ainda mais forte o cabo de sua adaga, se é que isso era possível. Ela melhorou sua pose, preparando-se para um ataque da criatura que a encarava. Ela também tinha que se forçar a pensar na mulher à sua frente como uma criatura , um demônio , e não como uma das mulheres mais lindas que ela já havia visto.

“Por que você a deixou ir?”, Yongsun disse, em um tom mais grosso e direto. Viu o sorriso que antes estava nos lábios de Byul diminuir até se apagar. Ela havia sentido o desprezo na voz de Yongsun.

Byul suspirou. Era outra pergunta que mostrava o nível de desinformação das caçadoras. Ficava óbvio porque ainda era perseguida: elas não sabiam, ou não se importavam, que havia empusai que não matavam. “Eu não mato. Muitas empusai hoje em dia não matam. Só nos alimentamos porque é o único jeito de sobrevivermos”, disse, encarando Yongsun. Ela torcia para que isso valesse de algo, para que conseguisse mostrar a uma trainee de que nem todas as empusai são os monstros que lhes é ensinado que são.

O olhar de choque no rosto da caçadora era tão explícito para Byul que ela teve que segurar o riso. Yongsun tentou disfarçar a expressão, mas era difícil. Nunca lhe passou pela cabeça que havia empusai que não matassem. Quando Byul deixou sua vítima ir embora, Yongsun havia pensado se não era, talvez, só uma animação pela caçada. Deixá-la ir, depois a atacar de novo e, enfim, matá-la. Era estranho descobrir que os seres que caçava por matavam inocentes não necessariamente matavam.

Yongsun não respondeu. Ainda tentava processar a nova informação.

“Então? Eu posso ir embora ou você vai tentar me matar com isso aí?”, Byul falou, apontando com o queixo para a adaga ainda erguida na frente do corpo da menor. Estava com medo de estar incitando uma luta, mas realmente não aguentava mais o suspense.

Byul observou atentamente a outra garota. O seu cabelo castanho fazia uma pequena sombra sobre o seu rosto, mas Byul conseguiu ver uma batalha interna acontecendo. Depois de alguns demorados segundos, ela viu a mão com a adaga abaixar, indo em direção ao casaco e depois saindo vazia. O sorriso de alívio que Byul deu em resposta foi a última comunicação entre elas. Com uma rapidez característica da sua espécie, Byul atravessou o resto do beco e saiu dele, passando perto da outra garota e torcendo para ela não mudar de ideia e decidir atacá-la.

Antes de poder se afastar muito, Byul conseguiu ouvir Yongsun soltando um suspiro de alívio que combinava com o seu.


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Notas finais do capítulo

aceito comentários hehe



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