Sophia escrita por znestria


Capítulo 29
Distância




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Quando Sophia acordou no próximo dia, por um momento era como se fosse mais uma manhã qualquer. Alguns raios de sol sorrateiros se esquivavam pelas frestas das cortinas, criando uma iluminação calorosa e convidativa e aquecendo o dormitório. Ela conseguia ouvir alguns passos preguiçosos percorrendo o carpete de outros andares. Conseguia até ouvir alguma menina assobiando uma música animada em um dos banheiros. 

Mas, assim que abriu os olhos, ela se lembrou de tudo, e seu peito afundou. 

Enquanto se arrumavam para o café, Sophia e Georgie mal trocaram uma sílaba uma com a outra. Sophia ficou até muito grata por Nancy e Elena, que conversavam alegremente sobre alguma encomenda que fizeram, pois ajudaram ela a se distrair por um tempo. 

Encontraram Sean e Rogério na Sala Comunal e saíram juntos para o Salão. Enquanto caminhavam, ninguém se abordou a discussão da noite anterior, e conversaram sobre as aulas e os exames que estavam chegando. Era claro que ninguém estava realmente envolto no assunto, mas era muito melhor focar nesse tipo de problema. 

Ao chegarem ao Salão, Sophia escaneou as mesas de um canto para o outro, seu coração sacudindo em seu peito, à procura de Viktor, mas não encontrou o garoto em lugar algum. Sentou-se à mesa da Corvinal e começou a comer, sem se importar com o que colocava na boca; já havia se desligado da conversa dos amigos e estava só observando a porta. 

Ficou mais de uma hora esperando, e não havia nenhum sinal de Viktor. Sean e Georgie saíram para a aula de Transfiguração, que estava quase começando, mas Rogério ficou para fazer companhia à amiga. Quando faltavam dois minutos para o sinal bater, Sophia finalmente desistiu e saiu em direção à escadaria. 

A aula de McGonagall foi um grande borrão. Sophia nem mesmo tentou se concentrar no que a professora dizia, sua mente estava a mil em preocupação. Por que Viktor não aparecera durante o café da manhã? Certamente ele viria a seu encontro, mesmo que fosse só para falar que estava bem. Então, se ele não aparecera… Não, ela não conseguia nem pensar na possibilidade. Talvez Viktor tivesse ido tomar café bem cedo. Talvez ele quisesse dormir por mais tempo para descansar. Afinal, o café em Hogwarts era bem cedo… Sim, fazia mais sentido. 

Durante o resto da manhã, Sophia contava os minutos para dar o horário do almoço. Ela dissera ao relógio mágico que a avisasse quando faltassem trinta, vinte, quinze, dez, cinco minutos para o sinal bater. Ela percebeu que os amigos estavam um pouco incomodados com os alarmes constantes, mas também não disseram nada. 

Assim que foram liberados, Sophia saiu correndo pelos corredores e chegou ao Salão em tempo recorde. Bem a tempo de encontrar com Viktor saindo.

Viktor, entretanto, estava muito acompanhado. Dois alunos de Durmstrang, que ela mal vira durante o ano todo, andavam de cada lado do garoto. Assim que avistaram Sophia, apertaram o passo em direção à saída do castelo, um deles inclusive fazendo uma cara feia. Sophia só conseguiu, de relance, encontrar seu olhar com Viktor, e seus olhos demonstravam anseio e tristeza. 

Por um tempo, ficou parada, no meio da entrada do Salão, assistindo ao pequeno grupo se afastar. Mal conseguia processar o que tinha acabado de acontecer. Foi só quando seus amigos finalmente a encontraram que ela conseguiu entender:

“Eu… Eu acho que Viktor e eu não poderemos mais nos ver.” 

Os três protestaram, mas Sophia explicou o óbvio: depois do incidente da noite anterior, em que ela havia posto a vida do garoto em risco, era claro que Karkaroff não permitira mais que os dois continuassem juntos. O diretor estrangeiro havia deixado seus sentimentos bem claros desde o início, e, agora, que suspeitava de traição por parte de Hogwarts, tomaria ação para intervir. 

“Mas ele não pode fazer isso!” exclamou Georgie. “Um diretor não pode proibir um aluno de se relacionar a outro!” 

“Ele nem precisa, não é mesmo”, resmungou Sean. “É só colocar seus capangas atrás de Viktor.” 

“Mas ele não pode!” ela repetiu.

“Bom, mas ele fez”, respondeu Sophia desanimada. “Se seu diretor te ordenar algo, não é bem como se você tivesse a opção de desobedecer.” 

Assim, durante os dias que seguiram, Viktor estava sempre acompanhado de pelo menos dois alunos de Durmstrang para onde quer que fosse. O coração de Sophia acelerava toda vez que o via, mas era em vão, pois nunca conseguia nem mesmo se aproximar dele. Tentara ir à biblioteca, aos jardins, a qualquer lugar em que ele poderia estar sozinho, mas Karkaroff se assegurara de que seus alunos fossem eficazes em seguir Viktor.

Foi a pior semana que ela tivera em muito tempo. Os exames de final de ano estavam a somente algumas poucas semanas de distância, mas Sophia não prestava atenção em uma aula sequer. Além disso, não conseguira nenhuma resposta de Dumbledore sobre o desfecho do incidente com Crouch. O diretor apenas dissera que não se preocupasse, que tudo estava sendo resolvido pelos professores e pelo Ministério. E, é claro, Snape fez questão de lhe dar detenção todas as terças e quintas até o fim do mês. 

As melhores tentativas dos amigos para animá-la não tinham êxito. Recorreram, então, aos gêmeos Weasley, mas mesmo a dupla não conseguiu manter um sorriso no rosto de Sophia por mais de dois segundos. 

Em uma tarde de quarta-feira, Sophia encontrava-se na biblioteca, com suas costas doendo da detenção do dia anterior. Snape estava fazendo a garota limpar e organizar todos os seus armários de estoque, e ela ficara surpresa com a quantidade de frascos que alguém poderia ter em sua vida. Todo o trabalho manual a forçara a ficar horas curvada, tentando alcançar cantos apertados dos armários, e agora mal conseguia esticar seus braços para alcançar um livro. 

Cedeu e usou o Feitiço Convocatório para apanhá-lo. Sentou-se em um banco e começou a folhear o livro em busca de soluções para dores musculares. Sabia que poderia encontrar as informações que procurava mais rapidamente com sua pasta de pesquisa, mas a verdade é que queria se distrair pelo maior tempo possível. 

“Tarde!” uma voz cumprimentou a seu lado, fazendo Sophia pular de susto. Virou-se e encarou Jorge Weasley, que tinha um sorriso divertido no rosto.

“Oi, Jorge”, ela respondeu, “o que foi?” 

“Me encontre no corredor do sétimo andar em cinco minutos.” 

Sophia franziu a testa. “O quê?” 

Mas o garoto já disparara para fora. 

Sophia, sem entender, ficou imóvel em seu lugar. Jorge não havia lhe dado muita escolha, então só levantou os ombros e saiu em direção ao sétimo andar. Não fazia a menor ideia do que ele poderia estar tramando, mas pouco se importava também. 

Quando chegou ao corredor, viu uma figura alta muito familiar do outro lado, e seu coração parou. Sophia saiu correndo e se jogou nos braços de Viktor. 

Pelo que pareceu muito tempo, os dois só se envolveram nos braços um do outro sem falar nada, só apreciando a presença e proximidade. Quando finalmente se separaram, Sophia não conseguia conter o sorriso, que se alargava de orelha a orelha.

“Oi”, ela disse.

“Oi”, ele respondeu, rindo. 

“O que você está fazendo aqui? E sozinho?” 

Viktor sacudiu a cabeça. “Poliakoff e Gotsev comeram alguns doces estrragados e começaram a vomitar um monte. Foram para a ala hospitalar. Daí um dos gêmeos Weasley apareceu e me disse para fir aqui.” 

Sophia fez uma careta. “Não eram pastilhas laranjas, eram?” 

“Eram!” 

Ela riu. “São a mais nova invenção dos Weasley. Pastilhas de vômito ou algo assim.” 

Viktor soltou uma risada. “Son brrilhantes.” 

“Quanto tempo será que temos? Não tenho certeza se a Madame Pomfrey vai conseguir curá-los rapidamente.” 

“Imagino que non muito. Se demorarem, Karkaroff prrovavelmente vai mandar alguém atrás de mim.”

Sophia franziu a testa. Precisavam ir para um lugar deserto ou, pelo menos, mais escondido. Então se lembrou. Naquele mesmo corredor, alguns meses atrás, tinha se escondido de Viktor em uma salinha com Rogério! O problema é que nunca mais conseguira encontrar a entrada…

Como se a sala tivesse lido seus pensamentos, uma portinha imediatamente se materializou à sua esquerda. Sophia arregalou os olhos, perplexa. Mesmo após seis anos em Hogwarts, a escola continuava a surpreendê-la. 

“Vamos”, disse Sophia, puxando Viktor para dentro antes que a porta desaparecesse. Não fazia ideia de como a sala funcionava, mas aparentemente ela só aparecia de vez em quando. 

Entraram e se sentaram no sofá em frente à lareira. 

“Que sala que é essa?” perguntou Viktor.

“Não faço a menor ideia.” 

Sophia pegou a mão de Viktor e o encarou séria. O garoto entendeu e assumiu uma expressão austera.

“Como você está?” ela perguntou. 

Ele assentiu. “Bem. Fui estuporado, então não tive nenhuma sequela.”  

Sophia engoliu em seco. “Ok. E como você se sente?” 

“Ecstou melhor agora”, ele beijou sua mão. “Com focê.” 

Os dois se aproximaram e se beijaram. Ao se afastarem, ficaram de olhos fechados, tentando aproveitar ao máximo aquele momento, pois sabiam que não teriam outro igual por um tempo. 

“Essas duas últimas semanas foram as piores do ano”, ele murmurou. 

“Sim”, Sophia sussurrou. “Sim, foram.” 

Antes que se desse conta, seus olhos já estavam marejados. 

“Ei, ecstá tudo pem”, Viktor disse, ao perceber. “Karkaroff vai desencanar em algumas semanas… E depois poderemos ficar juntos quanto tempo quisermos. Se quiser, pode até ir à Bulgária assim que entrar de férias.” 

Viktor havia dito a última frase de um jeito brincalhão, provavelmente para animá-la, mas o que aconteceu foi o contrário - Sophia endireitou-se, tensa, e levantou o olhar preocupada. 

“Então…”, ela começou, perdida. “Então é isso? Não vamos nos falar até acabar o ano letivo?” 

Viktor juntou as sobrancelhas. “Eu non quero isso, mas… O que focê sugere? Non podemos mudar a cabeça de Karkaroff.” 

“Eu não sei, eu só…”, ela balbuciou. “Eu não sei. Mas essas últimas duas semanas foram horríveis. Não queria que o ano acabasse assim.”

“Eu também não”, ele disse baixinho. “Mas non sei como conseguiríamos contornar Karkaroff. De qualquer jeito, mal íamos conseguir nos ver agora, focê com os exames e eu com a última tarefa do Torneio.” 

Ficaram um tempo em silêncio, com as cabeças baixas. Se ela já estava nervosa antes, com as poucas semanas que restavam em Hogwarts, não sabia nem expressar como se sentia agora, sabendo que não poderia mais ver Viktor. A rotina que ela conhecia, encontrando-o todos os dias, passando tempo nos jardins, voando de vassoura, até mesmo estudando na biblioteca… Ela não teria mais nada daquilo de volta. 

“Bom”, ela levantou o olhar, com um sorriso pequeno. “Pelo menos podemos passar o verão juntos. Imagino que eu possa ir para a Bulgária depois de passar um tempinho com meus pais.” 

Viktor abriu um sorriso e apertou sua mão.

“Por quanto tempo eu poderia ficar lá?” Sophia perguntou.

Ele franziu a testa, pensativo. “Hã, deixe-me ver… Na verdade, pode ficar por quanto tempo quiser. Estarei me formando no final deste ano, então estarei trrabalhando normalmente. No time de quadribol, digo.”

“Ah”, ela fez. Até tinha se esquecido de que este seria o último ano de Viktor na escola. “Que legal”, finalmente disse, com a voz um pouco mais fraca. “Está ansioso?” 

“Ah, sim!” ele respondeu. “Mal vejo a hora de poder jogar todos os dias. Até demais, eu diria - 8 horas voando todos os dias até chegam a cansar um pouco.”

O sorriso de Sophia vacilou por um segundo. “Espera”, ela começou, “você já vai voltar ao time no momento em que se formar?” 

“Sim. Acho que vou ter umas duas semanas para descansar, mas tenho que voltar logo, porque a temporrada já está pra começar.”

“Então… Se eu for para a Bulgária, você vai ter tempo para ficarmos juntos?” 

“Sim!” Viktor exclamou. “Quero dizer… Não vai ser tanto tempo quanto gostarria, mas vamos ter tempo mais para o final da tarde. Ou à noite.” 

“Certo”, murmurou Sophia. “Certo.” 

“Eu sei que não é ideal.” 

“É claro! Não, Viktor, não é culpa sua. É só que… Então eu vou para a Bulgária, nós passamos um tempo juntos e… E daí o quê?” 

Viktor ficou sério. “O que focê quer dizer?” 

Sophia engoliu em seco. Estava na hora de encarar a verdade que ela vinha evitando desde o começo. “E daí eu volto para Hogwarts, e você fica na Bulgária.” 

Viktor desviou o olhar. “Não precisamos pensar nisso agora.” 

“Sim, precisamos! Olha, eu não quis nem pensar sobre o que faríamos depois que o Torneio acabasse, mas, depois de tudo que aconteceu nessas últimas semanas, mesmo o pouco tempo que tínhamos já não é mais nosso.” 

“Nós daremos um jeito”, ele retrucou. 

“Como?” Sophia suplicou. “Nós nunca vamos conseguir nos ver. Eu só posso sair de Hogwarts duas vezes por ano, e por muito pouco tempo. E você não vai conseguir ficar vindo para a Escócia.” 

Ele levantou os ombros. “Nós famos descobrindo no caminho.” 

Sophia soltou uma risada nervosa. “Isso não é uma resposta, Viktor!” 

“Eu posso visitar focê em Hogsmeade, ou focê pode viajar como fizemos em Edimburgo. Existem meios de fazer isso funcionar!” Viktor a encarou. “Focê disse aquela noite que me ama. E eu disse que te amo. Isso é suficiente.” 

Ela balançou a cabeça. “O amor sozinho não é suficiente para sustentar uma relação.” 

Viktor ajeitou a postura, se afastando. “Não. Prrecisa de empenho também.” 

Sophia o encarou, por alguns segundos, em silêncio, e então ele concluiu: “De ambas as partes.” 

Ela respirou fundo. Haviam chegado ao momento que ela mais queria evitar, à conversa que ela não conseguia nem imaginar. E antecipação nenhuma no mundo teria conseguido prepará-la para aquela situação. 

“Você acha que eu não quero que isso funcione? Eu disse que te amo porque eu quero estar com você.” A voz de Sophia falhou, então ela deu uma pigarreada e continuou. “Mas isso que você está propondo… Isso não é estar juntos. Viktor, imagine! Todos os dias vão ser como esses últimos dias foram. E… Eu não sei se consigo aguentar isso.” 

“E o que isso quer dizer? Focê não quer nem tentar?” 

A última frase soou mais como uma acusação do que uma pergunta.

“Não foi o que eu disse.” 

“Foi o que pareceu.” 

Sophia não sabia o que responder. Os dois ficaram se encarando pelo que pareceu um bom tempo. Sua visão já estava bem embaçada com lágrimas que ela não queria deixar cair, mas Sophia podia ver que Viktor estava magoado, e isso quebrava seu coração. Sabia que ele estava esperando uma resposta, mas ela não conseguia encontrar palavras. Para ser honesta, não sabia nem o que pensava. 

Ele se levantou. “Entendi.” 

Sophia piscou, as lágrimas finalmente caindo. “Viktor!” chamou, mas ele já estava saindo pela porta. Ela se levantou e correu atrás dele em direção ao corredor. 

“Viktor!” chamou novamente, mas ele já estava quase virando à esquina. 

Quando alcançou o final do corredor, o garoto não estava mais à vista. Disparou por uma escada, na esperança de encontrá-lo; seu coração batia tão rápido em seu peito que ela sentia que mal conseguia respirar. No entanto, não parecia encontrar o garoto em qualquer lugar.

Quando finalmente chegou ao primeiro andar, em frente à escadaria principal, ela o avistou. Mas ele não estava mais sozinho. Seus dois guarda-costas o acompanhavam, com peles pálidas mas expressões nada contentes. 

Viktor a avistou. Por um segundo, um segundo que pareceu durar uma eternidade para Sophia, os dois olharam nos olhos um do outro. Sophia percebeu que não sabia mais o que Viktor estava sentindo quando olhava para ela: era como se estivesse no começo do ano, quando não o conhecia e achava que ele a odiava. Sua expressão era uma incógnita. Então ele desviou o olhar e saiu do castelo.


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