Entre os sons e as palavras escrita por RMartins


Capítulo 1
Como nos conhecemos?




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Eu quero me perder em meio aos grandes contos de heróis e de romances absurdos que todos sabemos que não dariam certo. Aqueles que desejam grandiosidade em tudo, esse é o meu tipo de pessoas, mas infelizmente, encontro poucos assim.

O sentimento de tédio e vazio existencial são os principais estados que me perseguem. Não deixo eles transparecerem, escondo-os devidamente com um belo sorriso. Ninguém é obrigado a conviver com um olhar de tédio constante.

A última pessoa que tive um contato que realmente me tirou desses estados, infelizmente não consegui fazer o mesmo. Ou seja, me apaixonei sozinho. Acredito que essa deve ser a forma mais triste de se estar com uma pessoa. Acho que por isso ela me deixou.

Essa nova falha amorosa havia me retirado a vontade de tentar coisas assim. Estar apaixonado era algo muito complicado para mim. Infelizmente, nunca consegui não ser intenso.

Entretanto, em uma segunda-feira, estava em um café-shop que frequento e uma coisa bem interessante ocorreu. Enquanto eu tentava escrever meu novo livro (sim, sou escritor) uma garota de cabelos azuis entrou no local. Ela era linda, olhos grandes daquele que você vê a sinceridade, seus cabelos além de azuis eram encaracolados e sua pele era morena. Porém, o que mais me chamou atenção não era sua aparência ou seu tênis All-star azul levemente sujo (como um All-star deve ser), e sim, o fato dela carregar o livro “O rei de amarelo”. Ninguém cem por cento normal leria isso.

Ela se sentou no balcão e pediu por um café. Era cedo, as pessoas estavam começando a acordar, por isso, o café-shop estava vazio.

E bem, às vezes, somente não fazer nada pode dar certo. Acredito que ela deve ter se incomodado por eu olhar demais e falou de onde estava sentada:

― É bem Creepy observar tanto uma pessoa sem nem ao menos explicar o porquê.

― Bem, desculpa se à incomodei, só fiquei curioso com o livro que carrega. Poucas pessoas o conhecem e acredito que por isso acabei ficando interessado.

Ela não me deu uma resposta imediata, acho que estava esperando uma cantada ou somente um pedido de desculpa. Após perceber que suas expectativas foram quebradas ela me deu um dos mais lindos sorrisos que já vi, pegou o seu café, e me respondeu:

― Realmente, apenas pessoas estranhas conhecem O rei de amarelo.

Então, pagou e saiu do local. De forma rápida e repentina, assim como havia entrado.

Da mesma forma que eu a surpreendi, a resposta dela me gerou uma surpresa. Para ser sincero, achei que somente seria ignorado. Mas não, além de um belo sorriso, ainda fez uma piadinha com minha cara. Não poderia apenas a ver saindo.

Levantei da minha mesa deixando o meu notebook e fui na direção que ela saiu. Mas acabei demorando, ela já havia sumido entre o complexo sistema de ruas da cidade. Me odiei por alguns segundos por ter sido lento e perdido o que seria a única oportunidade de conhecer uma provável pessoa interessante, mas rapidamente, voltei a mim e fui escrever, a dead line estava bem próxima.

Os dias decorrem de forma muito chata.

Acordo cedo e vou para o mesmo café-shop todos os dias, onde tomo meu café da manhã e escrevo por uma hora. Depois, volto para casa, guardo meu computador e coloco minha roupa de academia e vou fazer meus exercícios. Novamente retorno para casa e, após um banho, vou até a casa do meu pai para almoçar com ele, como tenho feito desde a morte da minha mãe. Conversamos sobre um pouco de tudo e volto para casa quando começa a entardecer. Já em casa, trabalho em meu livro até o horário de dormir. Apesar de detestar rotinas, pode-se ver que estou preso em uma.

Quando criança gostava de observar o cotidiano da minha casa. Nunca entendi muito bem como era ser adulto e porque eles são tão apressados. Creio que por meus pais nunca terem tempo de me criticar por essas manias, acabei crescendo assim ― Observador e questionador ― não sei dizer se isso é bom ou ruim, mas, isso me tornou escritor.

Continuei o meu dia-a-dia como se nunca tivesse visto a moça de cabelos azuis. Tudo ocorria exatamente como o esperado, o que era chato. Terminei o livro uns três dias antes da dead line, assim como sabia que ocorreria. Enviei por e-mail para a minha editora numa quarta. Recebi na segunda a resposta dela com algumas críticas e apontamentos para mudanças no texto, novamente, nada diferente do habitual.

Comecei a me questionar o que faria quando o livro finalmente estivesse terminado. Pensei em pegar meu pai, alugar um carro e ir pescar. Porém, logo mudei de ideia, lembrei que odiava pescar.

Foi após quatro dias de puro e intenso trabalho de revisão que um casal de amigos achou que era a hora de intervir no meu dia-a-dia. Eles foram a minha casa sem me avisar, levando algumas peças de roupas estilosas (me conheciam e sabiam que iria usar a desculpa de não ter um par de roupas para a ocasião, malditos) e praticamente me carregaram para um bar noturno, era o happy hour do local que um deles trabalhava.

Os dois eram meus amigos desde a época desde a infância, sempre fomos o trio de estranho da vizinhança, porém, onde eu via apenas amizades, eles viram um amor entre um e outro. São o casal mais fofo que conheço.

Estava sentado interagindo com as pessoas do trabalho do meu amigo. Eram pessoas normais e divertidas e estava tudo de acordo com o que imaginei, porém, a noite virou do avesso quando uma garota de cabelos azuis entrou no bar.

Perdi o ar, ela estava ainda mais linda. Usava um vestido azul como seus cabelos. Nunca fui uma pessoa de realmente se importar com aparências e, confesso, até aquele dia nunca havia perdido ar daquela maneira.

Junto da garota estavam outras quatro. Talvez fossem do trabalho dela, talvez apenas amigas. Não me importei nem um pouco com elas, observei-a por algum tempo, ela pediu por uma cerveja artesanal, a mesma que eu havia pedido. Estava tão perdido olhando para ela que um dos meus amigos me disse:

― Cara, se está tão interessado na garota levante e tente conversar com ela.

Ele tinha razão, timidez nunca foi uma característica minha. Tinha poucos amigos, mas não por ter poucos conhecidos, e sim, porque ficava entediado com grande maioria de quem conversava.

― Você tem razão, me deseje sorte.

A vi ir ao balcão do bar, então, me levantei e fui até ela. Quando cheguei próximo a ela, proclamei:

― Ao longo da costa, quebram-se as nuvens em ondas, os sois gêmeos abaixo do lago se escondem, estendem-se as sombras em Carcosa.

Ela me viu andar em sua direção, provavelmente achou que eu seria só mais um que iria a incomoda-la durante a noite. Mas, ao ouvir que eu havia proclamado uma das canções de “O rei de amarelo”, sorriu e me respondeu:

― Estranha é a noite em que as estrelas se ascendem e luas estanhas os céus percorrem. Mas ainda mais estranha é perdida Carcosa.

Rimos juntos e ela disse:

― Outra coisa estranha é quem conhece esse livro. Você é o rapaz observador do café-shop “Condado”, certo?

― Exatamente, sou eu.

Ficamos conversando em pé por um tempo próximos ao balcão, até que ela me convidou para sentar junto a suas amigas, à medida que passava o tempo novos rapazes chegavam a mesa (acredito serem os namorados das outras garotas).  No entanto, eu somente reparei que a estanha noite ia passando quando o garçom nos avisou de que o bar estava para fechar.

Todos na mesa saíram juntos, e eu do lado dela. Ao despedir todos me deram seus contatos no Facebook e disseram que foi um prazer me conhecer. Reparei que eu e ela fomos os únicos a ficar lá.

  ― Você mora na região? Posso acompanha-la se quiser ― disse para a linda moça.

― Eu moro aqui perto, não precisa se incomodar.

― Não precisa se preocupar de forma nenhuma, eu moro aqui perto também ― não estava mentindo, realmente morava a pouco mais de três quarteirões dali.

Fomos conversando na direção oposta do meu apartamento por o que pareceu ser cinco quarteirões, somente reparei que não havia sentido tédio por uma noite toda quando chegamos na porta do prédio em que ela vivia. Reparei que iria sentir falta daquilo e acho que fiz o que fiz ao me deparar com esse sentimento. Sem mais nem menos a beijei. Quando meus lábios tocaram os dela voltei a mim e pensei: “Ideia idiota, agora ela deve achar que sou um tarado”. Mas, para minha surpresa, novamente, ela retribuiu o beijo. Após poucos minutos paramos e olhamos um para o olho do outro.

― Me desculpe, não sei porque fiz isso ― a disse com sinceridade.

― Não se preocupe, estava esperando que fizesse isso desde o bar.

Sorrimos juntos e após mais alguns beijos nos despedimos e eu fui para casa com um sorriso idiota.


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Notas finais do capítulo

Obrigado por ler e espero que tenha gostado.

Caso encontre algum erro de digitação ou mesmo de ortografia pode me avisar sem medo.

As linhas de comentários são de vocês ♥



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