A Garota de Vestido Azul escrita por Karina A de Souza


Capítulo 8
Escamas Escarlates


Notas iniciais do capítulo

Olá.
Bem, eu espero que ninguém se sinta ofendido com esse capítulo. Não tive intenção de ofender a igreja católica, apenas fazer uma crítica ao período citado ali.



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—Bem, eu achava que seria pior. -Joanne comentou, andando entre Jack e o Doutor. -Não parece tão ruim.

—Às vezes você pode acabar se surpreendendo. -O Doutor disse.

Estavam na Idade Média. Não tinha sido uma escolha. Pousaram por acaso ali, e já que tinham chegado, por que não ficar e explorar um pouco? Joanne foi a única a trocar de roupa, pegando um vestido comum do século 15. Ela achava divertido se vestir de acordo com as épocas onde estavam, era como uma festa à fantasia eterna.

—Parece normal, pra mim. -Jo disse. -Há algo especial? Dragões? Batalhas por poder? Aliens caindo dos céus?

—Por que eles estariam caindo?-O Doutor perguntou. Joanne deu de ombros.

—Não sei, diga você, alien. -Jack riu.

—Adoro essa garota. -Comentou. -Espera, o que está acontecendo ali?

—Parece que chegamos bem na caça às bruxas. -O Doutor murmurou.

Uma mulher estava sendo amarrada em um pilar de madeira, enquanto gritava coisas incompreensíveis. Um homem, que devia ser um padre, tentava falar mais alto que ela, sem conseguir.

—O que essa mulher fez?-O Doutor perguntou, assim que se aproximaram.

—Ela é acusada de bruxaria. E há provas...

—Ridículo. -Jo interrompeu. -Todo mundo sabe que isso é apenas a Igreja disseminando seu preconceito e seu ódio contra aqueles que pensam diferente. E é claro, as “bruxas” são apenas mulheres comuns, que sabem sobre remédios naturais e coisas assim.

—Como ousa falar contra a Igreja?

—Ousando. Será que estou dizendo alguma mentira? Eu sou católica, mas não fecho os olhos para os horrores cometidos por vocês.

—Eu amo essa garota. -Jack declarou, sem ser ouvido.

—Basta!-O padre gritou. -O diabo fala por essa herege! Está presa!

—Você não vai me prender. -A garota avisou, recuando. -Eu estou apenas dizendo a verdade e sabe disso! Vocês estão matando pessoas inocentes!-Dois homens se aproximaram, agarrando Joanne e a arrastando dali. Jack e o Doutor se prepararam para intervir, as espadas foram apontadas contra eles.

—Você não pode prendê-la!-O Doutor disse. -Ela é só uma menina inocente!

—Ah, sim. Como todas as outras. -O padre disse. -Ela será julgada e condenada.

—Joanne não cometeu nenhum crime.

—De acordo com as leis de quem? Se não quiser ser condenado à fogueira também, eu sugiro que não tente ir contra nós, senhor.

—Ah, é exatamente o que eu vou fazer. -Murmurou.

***

Assim que os homens sumiram no corredor, Joanne se jogou contra as grades, tentando abri-las. No fundo, ela sabia que era inútil, mas tinha que tentar.

—Não acredito que vim para a Idade Média apenas para ser condenada por heresia e morrer queimada.

—Então foi isso o que você fez?-Uma voz feminina perguntou. Joanne virou na direção da voz, encontrando sua vizinha de cela. Era uma garota magra, ruiva e toda suja. -Fui acusada de bruxaria, como a maioria.

—Você não parece uma bruxa.

—Eu não sou. Apenas curei uma menina doente com ervas que crescem na floresta, e uma vizinha me acusou para a Inquisição. Sou Abigail.

—Joanne. -Olhou em volta. Estava escuro nas outras celas, sem velas acessas.

—Só há três de nós. Mas a garota no fim do corredor está no escuro há dias.

 

—Sabe se tem algum jeito de sair daqui?

—Claro. É só esperar por um milagre.

***

—A culpa é minha. -O Doutor disse. -Eu sabia que Joanne não se controla diante de injustiças e mesmo assim a deixei solta numa das piores épocas vivias pela humanidade.

—Não se culpe. Culpe esses cretinos. -Cruzou os braços. -Nós vamos tirá-la dessa.

—Em quanto tempo? Dias? Semanas? Sabe o que acontece com quem é pego pela Inquisição, não sabe? Joanne não vai resistir à isso.

—Você já deteve o fim do mundo. Já parou os Daleks. Já venceu os Sontaran. Dessa vez são apenas humanos, Doutor.

—E você sabe que os humanos podem ser tão cruéis quanto qualquer coisa que já enfrentamos lá fora. Joanne é minha responsabilidade. Eu prometi levá-la para casa em segurança no fim. É uma promessa que pretendo cumprir.

***

—Você tem família?-Joanne perguntou, sentando perto das barras, Abigail suspirou.

—Dois irmãos mais velhos e uma irmãzinha.

—Sente falta deles?

—O tempo todo. E você? A escutei chamando por um Doutor essa noite. Está doente?

—Não. O Doutor é um amigo. Vim com ele e com Jack. Somos apenas três amigos viajando... Ou éramos.

—E sua família?

—Estão... Muito, muito longe. Não achei que podia sentir tanta saudade deles.

—Aqui tudo fica mais forte: a saudade, o medo, a dor... Você vai perceber. -Dois ratos enormes passaram ao lado de Joanne, fazendo-a gritar. -Vá se acostumando, são seus companheiros de cela.

—Há quanto tempo você está aqui?

—Eu já perdi a conta. -No fim do corredor, a garota da cela escura começou a gritar. -E lá vamos nós...

—O que está acontecendo? Por que ela está gritando?

—Está chegando na fase final.

—Fase final de que?

—Da peste... Ou seja lá o que aquilo é. Aqui embaixo não era tão vazio. Havia várias de nós. Mas elas foram infectadas. Como a garota no fim do corredor. Eu já vi, bem de perto. É como se fosse... Escamas vermelhas na pele... Vão tomando o corpo todo... Dói... Queima. E no fim... As garotas se tornaram monstros. É o que está acontecendo com ela. É que vai acontecer com a gente.

—Não, não vai. O Doutor vai nos salvar. Ele sempre salva. Então você pode voltar pra sua família. -Abigail tentou sorrir.

—Você fala como se ele fosse especial.

—E ele é. Ele é o homem mais especial do Universo. Acredite em mim. Ele vai nos salvar.

***

Era difícil dormir no chão duro, ouvindo o som de ratos e baratas passando perto de sua cabeça. Jo quase não dormia. Abigail, já acostumada, sim.

Em algum momento, no meio da noite, haviam tirado a garota do fim do corredor. Não havia som algum vindo da cela dela agora. Jo esperava que ela estivesse bem.

Na manhã seguinte, no terceiro dia de prisão, um homem velho e pequeno trouxe algo que supostamente devia ser comida, mas que era apenas uma massa escura e mal cheirosa.

—Não tenho estômago pra isso. -Joanne murmurou.

—Está aqui há três dias. -Abigail lembrou. -Precisa comer.

—Não consigo. -Empurrou a tigela por uma abertura pequena nas grades.

—Obrigada. Algum sinal do seu Doutor?

—Parece que não. Você não acredita que ele virá, não é?

—Desde que estou aqui ouço garotas falando que serão resgatas até por príncipes e lordes. Nada disso aconteceu.

—Mas o Doutor virá. Eu sei que sim. Ele salva pessoas. E planetas. Mundo e raças inteiras.

—Certo.

Joanne suspirou. Era óbvio que Abigail não acreditava nela. Isso não impediria o Doutor. Ele ia aparecer, salvá-las e resolver tudo.

Distraída com esses pensamentos, demorou um pouco para notar o homem que tinha enfrentado na praça da cidade.

A garota ficou de pé, se preparando para qualquer coisa.

—Ouse entrar nessa cela e eu acabo com você. -Avisou. -Não vou ser como a Natalie Portman naquele filme terrível. Juro que vou destroçá-lo se tentar encostar em mim. -Abigail, na cela ao lado, só conseguia se perguntar se Joanne era louca.

—Ouça as coisas que você diz, mulher. A sua fogueira a espera. Só precisa escolher se vai se arrepender ou não de seus pecados.

—Eu não vou para fogueira nenhuma. O Doutor está lá em cima, com certeza fazendo planos pra me salvar e ele vai acabar com você. E se não o fizer, eu faço. Ele costuma ser contra violência. Eu também, mas em alguns casos... -Deu de ombros.

—As suas ameaças não vão livrá-la do fogo eterno, bruxa.

—E você acredita que é um santo, matando pessoas inocentes, não é? Vou te dizer uma coisa: você não é!

—Pode continuar alimentando esperanças de que seus amigos virão salvá-la, se quiser. Eles saíram da cidade.

—É mentira. Jack e o Doutor nunca me deixariam para trás.

—Acho que eles perceberam o quão errada você é. Eles se foram. Você está sozinha.

—Mentira! Você está mentindo! Eles não se foram!-O homem deu de ombros.

—Como eu disse, alimente suas esperanças se quiser. Mas no fim, vai se decepcionar. -Se afastou, indo para a escadaria no começo do corredor.

—Você está mentindo!-Jo agarrou as grades. -Eles não me deixaram!

—Sinto muito. -Abigail disse.

—Mas não é verdade!-Olhou para a garota. -Ele mentiu. Eles não iam me deixar aqui. Não iam. Eles virão. Eles vão nos salvar.

***

Joanne acordou de seu sono perturbado com gritos. Era Abigail. Tinha alguma coisa errada.
Se levantou, indo para as grades e viu. Sua vizinha de cela estava totalmente mudada. Escamas escarlates pelo corpo todo. Uma língua negra e bifurcada. Olhos que mais pareciam fendas. Era como se ela estivesse se transformando num dragão.

—Abigail?-Chamou, hesitante. -Você pode me entender?-A outra garota se jogou contra as grades, fazendo Joanne recuar, assustada. -Abigail?

A fera abriu a boca, uma luz laranja brilhou em sua garganta. Uma bola de fogo.

Joanne se jogou pra fora do caminho segundos antes de ser atingida, então começou a gritar.

Pouco depois, homens com espadas surgiram da escadaria, e entraram na cela de Abigail.

Eles lutaram com a fera, alguns saíram queimados, mas conseguiram dominá-la e arrastá-la para longe do alcance visual de Jo.

—O que vão fazer com ela?-Gritou, mas não havia ninguém para ouvi-la. -Doutor... Onde você está?

Ainda assustada, tentou dormir, mas mal havia fechado os olhos quando seu braço começou a arder. Se sentou, observando. Onde antes era pele, agora haviam escamas, iguais as que Abigail tinha.

***

—Achei que seria mais difícil. -Jack disse, passando pelo guarda que tinha acabado de derrubar. -Por que a segurança diminuiu de repente?

—Eu não sei, mas fique atento. -Abriu a grande porta com a chave de fenda sônica, encarando a escuridão onde a escadaria mergulhava. -Joanne deve estar lá em baixo.

—Eu odeio porões.

—Fique aqui. Mais guardas ou padres podem aparecer. Eu vou encontrar Joanne e então vamos voltar para a TARDIS.

—Tudo bem. Boa sorte.

O Senhor do Tempo desceu lentamente, tentando não fazer muito barulho. Passou por celas e mais celas, todas vazias. Na metade do corredor, viu uma garota encolhida contra a parede. Ele não conseguia ver o rosto dela, mas sabia que era Joanne, e que estava chorando.

—Está tudo bem. -Avisou, abrindo a porta da cela. -Vou te tirar daqui agora.

—Não! Não se aproxime!

—Sou eu, o Doutor. -Começou a entrar na cela.

—Não!-Ele parou onde estava. -Você tem que sair daqui. Não pode fazer mais nada.

—Eu sei que está com medo, mas... -Ela se levantou e mostrou o braço direito.

—Eu vi o que acontece no fim. Abigail estava infectada e virou um monstro. Vai acontecer comigo. -Ele estava preocupado demais para perguntar quem era Abigail. Apenas supôs que era outra prisioneira.

—Nós podemos cuidar disso.

—Não. Você pode se infectar... E Jack também. Não posso deixar que isso aconteça.

—E não vai acontecer. Nós vamos cuidar disso. Apenas confie em mim. -Estendeu a mão. Jo estendeu a sua, mas de repente começou a gritar, segurando o braço. -Joanne!

***

A TARDIS se materializou bem na sala de espera do hospital e Jack saiu carregando Joanne, com o Doutor os seguindo.

As enfermeiras se apressaram para trazer uma maca flutuante, onde Jo foi colocada. As escamas tinham crescido, tomando boa parte de seu antebraço.

—É algum tipo de vírus. -O Doutor informou, seguindo a maca. -Parece que as escamas estão vindo de dentro. E ela está entrando em choque.

—Nós vamos cuidar disso. -Uma das enfermeiras prometeu, impedindo-o de continuar seguindo em frente. -Por favor, retorne para a sala de espera.

Contrariado, mas sabendo que era o único jeito, voltou para o local indicado pela enfermeira, encontrando Jack encostado na TARDIS.

—Ela vai ficar bem?-Perguntou.

—Esse é um dos melhores hospitais de todos os tempos. Se não puderem fazer nada por ela aqui, ninguém mais pode.

—Certo. E agora, o que fazemos?

—Você fica aqui. Eu vou voltar para onde estávamos. Quero descobrir o que causou tudo isso.

—Vou com você.

—Não. Preciso que fique aqui. Joanne está num lugar estranho, não quero que ela fique com medo e sozinha.

—Então vamos esperá-la melhorar para irmos juntos.

—Preciso fazer isso agora.

—Ah, acho que entendi. -Se afastou da TARDIS, deixando-o passar. -Aqueles homens estão prestes a enfrentar a fúria de um Senhor do Tempo.

***

—O que está fazendo aqui?-O padre exigiu. -Você soltou a prisioneira, não foi?

—Fiquei me perguntando o que teria acontecido para um dragão de Hynes espalhar um vírus desse tipo na Terra, que é totalmente longe de seu planeta natal. -Colocou o enorme ovo vermelho na mesa. -Aí eu liguei os fatos. Vocês encontraram esse bebê dragão, e o mataram. A última coisa que ele fez foi liberar o vírus, como uma vingança altamente destrutiva. Uma punição merecida. Mas aí vocês não foram infectados, por que raramente iam lá embaixo. Mas as garotas prisioneiras? Elas sim. E quando o vírus as transformavam numa espécie de dragão, vocês as matavam.

—Nós não sabíamos o que era essa coisa.

—Não. Com certeza não sabiam. E mesmo assim decidiram destruir, independente do que fosse. Mataram uma criatura inocente, apenas por que não sabiam o que era. O medo é o pior inimigo da humanidade. Por causa deles, vocês fazem coisas terríveis.

—Você fala como se não fosse um de nós.

—E eu não sou. -Do lado de fora, vozes alteradas surgiram, junto com clarões e gritos.

—O que está acontecendo lá?

—A população só precisava de um empurrãozinho para se voltar contra vocês. Hoje essa cidade vai ser livre. E em breve, toda a Inquisição acaba.

—Eles precisam de nós!

—Não. -Começou a ir para a TARDIS. -Eles precisam ser livres.

***

A claridade intensa cegou Joanne por alguns momentos, até que uma enfermeira diminuiu as luzes.

—Elas ajudam na recuperação. -Contou. -Como se sente?

—Acho... Que bem. -Olhou em volta. -Onde estou?

—Num hospital. -Como Joanne não parecia satisfeita, ela continuou. -Na cidade de Nova Nova York.

—Uau. -Olhou pela janela, certamente estavam no futuro. A mulher se aproximou e tirou a faixa que cobria o antebraço de Joanne. As escamas tinham sumido deixando apenas a pele, um pouco avermelhada.

—Essa vermelhidão vai sumir em breve.

—Estou curada? Aquela coisa se foi?

—Cem por cento curada.

A enfermeira saiu e o Doutor entrou. Jo não podia deixar de notar quão sério ele estava.

—As enfermeiras tem cara de gato.

—Então você notou. -O Senhor do Tempo disse, abrindo um sorriso.

—Então é assim que o futuro é? Com gatos dominando o mundo?

—Nah. Elas são apenas enfermeiras. -Se aproximou, sentando na beirada da cama. -Você está bem?

—Estou. Oh, temos que voltar! Precisamos descobrir o que causou essa coisa em mim e...

—Está tudo resolvido. Um ovo de dragão de Hynes caiu na Terra e foi morto. Ele liberou o vírus antes de morrer.

—Espera, espera... Dragões existem?-Um pouco mais animado, o Doutor sorriu. -E dinossauros? Eles existiam mesmo?

—Existiam. E pode ser que eu acidentalmente tenha causado a extinção deles. -Joanne riu.

—Você definitivamente tem umas histórias muito loucas. Eu vou adorar ouvir essa.

—Tudo bem. Foi assim: eu estava viajando por aí, quando a TARDIS teve um pequeno problema de energia...


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Notas finais do capítulo

O "filme horrível" que Joanne referência é Sombras de Goya. Estou traumatizada com ele até hoje.
Essa Nova Nova York é após o Doutor e Rose irem lá e antes do fim do hospital.
Bem, é isso. No próximo cap. conheceremos Eldamar, o lar de todos os povos. E claro... Teremos treta :3
Até ♥



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