Depois que fui embora escrita por deadlikeme


Capítulo 5
Capítulo 5




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Sentei-me desconfortavelmente na poltrona à frente de Afonso. Segurava minhas mãos sobre meu colo e sentia o nervosismo me atingir enquanto mexia meus polegares incessantemente.

— Ah...me desculpe pela porta, eu... 

Comentei tentando desculpar-me por ter batido a porta em sua cara. Afonso apenas negou com a cabeça com um leve sorriso.

— Tudo bem.

E ficamos em silêncio novamente. 

— E seu avô?

Perguntei de supetão.

— Já o levei ao hotel onde está hospedado. Então decidi voltar para te entregar o celular.

Sua voz ecoava pela sala silenciosa.

— Hum...obrigada. Foi gentileza sua.

Olhei para os lados sem saber o que fazer com ele ali em minha frente. Afonso me encarava. Eu sentia seus olhos sobre mim. Senti meu rosto corar enquanto eu abria e fechava a boca planejando dizer algo, sem saber o que.

— Quer beber alguma coisa?

De repente essa pergunta saiu da minha boca.

— Seria ótimo.

Afonso respondeu ainda sério. Levantei-me caminhando para a cozinha. Afonso fez o mesmo me seguindo.

— Tem vinho?

Ele perguntou parado atrás de mim enquanto eu caçava as xícaras no armário.

— Tem café. E você deveria parar de beber.

Respondi ainda sem olhá-lo. O ouvi rindo.

— Sim senhora.

Ele respondeu enquanto puxava uma cadeira na pequena mesa de canto de apenas dois lugares que eu tinha em minha cozinha. Dei a ele uma xícara cheia de café enquanto também segurava a minha xícara quente na mão, sentindo o maravilhoso cheiro que saía dela. Afonso de repente riu baixo.

— O que há?

Perguntei pra ele assustada pelo motivo de seu riso. Ele balançou a cabeça negativamente ainda sorrindo.

— Nada, garotinha.

Levantei o dedo indicador apontando para ele.

— Já conversamos sobre esse tal de "garotinha"!

O repreendi.

— Tudo bem, senhorita. Melhorou?

Ele perguntou debochado enquanto eu concordava sorrindo e encarando seus olhos azuis que não desviavam nem um minuto dos meus.

— E então... - Ele começou tirando meus devaneios - como começou a trabalhar aqui em Nova York?

Encolhi os ombros dando uma golada no café.

— Me inscrevi no processo seletivo do novo curso online do MoMA que estava tendo, completei o curso e então no final eles pediram para enviarmos nosso portfólio, e foi o que fiz. Então eles gostaram.

Respondi rápida e simples. Afonso sorriu.

— E como é ser neto de Sebastião Fontes?

Perguntei intrigada. Me segurei durante a noite inteira para fazer essa pergunta a ele. Afonso riu.

— Nada de especial. 

Arregalei meus olhos com sua resposta. Ele estava cabisbaixo, olhando para a xícara em cima da mesa enquanto desenhava círculos com a ponta do dedo na madeira.

— Nada de especial? - Perguntei incrédula. - E você é filho de quem? Do Fernando Fontes? O Cineasta?

Eu conhecia a biografia de Sebastião Fontes e sabia que ele tinha dois filhos, Fernando Fontes, cineasta e Marcos Fontes, da qual não se tinha muitas notícias. Afonso me olhou arqueando as sobrancelhas.

— Você conhece bem minha família, não é?!

Ele perguntou já afirmando. Eu sorri tímida.

— É que eu sou grande fã do trabalho de seu avô.

Respondi sem jeito.

— Mas sou filho do Fernando, - ele respondeu olhando para baixo - o cineasta.

Senti um tom de deboche em suas palavras enquanto falava sobre seu pai. Mordi o canto da boca.

— Você é arquiteto né?

Perguntei ansiosa pela sua resposta.

— Sim.

— Sua avó também é, não é?

Afonso levantou o olhar em minha direção mais uma vez, estava surpreso.

— Você sabe mesmo. 

Balancei a cabeça em concordância. Parabéns Clara, agora ele vai achar que você é uma perseguidora ou fã histérica do avô dele. Senti uma certa vergonha e decidi calar-me, já havia passado dos limites.

— E sobre mim?

Ele perguntou, me fazendo interromper meus pensamentos punitivos.

— O que tem?

— O que sabe sobre mim?

Ele parecia se divertir com esse momento.

— Ah, eu não sabia que Sebastião tinha netos.

Encolhi meus ombros.

— Tem três. - Ele olhou para a xícara novamente, depois deu uma longa golada. - Mas não quero falar sobre a minha família, pode ser?

Ele perguntou, me encarando sério. Aquilo parecia algo que o machucava no momento. Talvez eu o estivesse sufocando falando sobre seus avós. Claro, você estava sufocando ele!

— Pode, claro. Desculpa.

Respondi olhando para o outro lado da cozinha. Afonso sorriu em minha frente e pude perceber.

— Ei... - Ele me chamou, me fazendo voltar os olhos para os seus. - não peça desculpas.

Seu sorriso era simples, transmitia calma.

— Eu só...eu pensei que estivesse te incomodando...

Respondi com minha voz falhando inconscientemente.

— De maneira alguma você me incomodaria.

Sua mão pousou sobre a minha em cima da mesa. Meu coração acelerou. Abaixei o olhar para sua mão sobre a minha. Mordi o canto da boca. Seu toque quente e macio sobre minha pele já bastava para que eu sentisse meu nervosismo me consumir. Levantei-me da mesa puxando minha mão da dele. Peguei minha xícara e levei até a pia abrindo a torneira. Afonso aproximava-se por trás e eu me segurava para não esboçar reação, mas eu já tremia de nervoso. Senti seu perfume e logo depois suas mãos pousarem sobre minha cintura. Arrepiei-me mais ainda ao sentir seu corpo grudar ao meu enquanto ele me abraçava. Seus lábios tocaram a pele exposta do meu pescoço.

— Afonso...

Resmunguei enquanto ele atingia meu ponto fraco. Virei-me de frente para ele.

— Pára com isso.

Sussurrei enquanto ele me desobedecia e iniciava beijos por meu rosto até chegar em minha boca pedindo passagem. Tentei resistir. Virei o rosto e ele me encarou sério e desapontado. Coloquei uma mão sobre seu peito.

— Não.

Eu sussurrei tentando parecer firme, mantendo meus olhos nos dele.

— Mas você também quer.

Sua voz agora estava mais rouca, mais profunda, mais tocante. Não, eu não quero. Meu subconsciente mandou que eu falasse. E eu obedeci.

— Não, eu não quero.

Minha voz falhava em sua presença. 

— Quer.

Isso não era uma pergunta. Eu encarava seus olhos com medo do que viria depois. Minha garganta secou, minha boca estava entreaberta e eu já não conseguia emitir som. Neguei com a cabeça. Afonso levou uma de suas mãos pousando levemente sobre minha bochecha enquanto segurava meu rosto. Ele beijou novamente meu pescoço e traçou o caminho até meus lábios, eu virei meu rosto e seus lábios continuaram sobre meu pescoço. Seu corpo me transmitia seu calor. Seus músculos pesavam contra meu corpo pequeno e seu cheiro leve de álcool e café parecia ser bom o bastante para que eu não quisesse me afastar. Sua mão esquerda apertava com força minha cintura. Eu me negava a me deixar levar naquele momento. Ele percebeu e afastou seu rosto de meu pescoço, continuei por alguns instantes com meus olhos fechados.

— Você ainda não quer?

Ele sussurrou. Seu hálito acariciava meu rosto. Abri os olhos o encarando. Eu estava ofegante e meu medo falou mais alto. Neguei com a cabeça. Olhei para baixo. Deveria eu ter continuado isso? Tinha medo de sua reação ao ouvir minha resposta. Afonso continuou olhando-me com uma sobrancelha levantada. Mordi o canto da minha boca. Ele sorriu de lado, balançou a cabeça em negação lentamente e se afastou. Virou costas caminhando de volta para a mesa e passou a mão na nuca. Eu ainda sentia o calor de seu corpo sobre meu peito e barriga. Sentou-se em silêncio e eu voltei para a pia tentando conter meu batimento cardíaco acelerado e toda a tensão que me sufocava naquele momento. O silêncio nos rondava de uma maneira incômoda, ao menos para mim.

— Clara.

Sua voz grave surgiu falha.

— Sim?

Apoiei minhas costas na quina da pia enquanto enxugava minhas mãos no pano de prato e esperava sua fala calmamente, como se nada tivesse acontecido.

— Eu... - Ele bagunçou os cabelos e depois olhou em minha direção respirando fundo. - Eu sinto muito por isso. Eu só...

Eu ri. Por que ri? Voltei para a pia dando de ombros.

— Só pensou que eu era como qualquer uma das outras com quem costuma sair, não é?

A cozinha ficou em silêncio. Virei de novo para ver Afonso ainda me encarando.

— Eu não ia dizer isso. - Ele declarou sério. - E como sabe como são as garotas com quem costumo sair?

Ele encostou na parede e apoiou os cotovelos, um na mesa e outro no encosto da cadeira, enquanto esticava as pernas e esperava pacientemente por meu esclarecimento. Dei de ombros, colocando o pano de prato ao lado na pia.

— Não sei. Você tem cara de quem sai com aquelas mulheres elegantes, de saltos altos, cabelos extremamente lisos e arrumados, com roupas justas, talvez advogadas ou economistas, com um quilo de maquiagem no rosto e que não se reconhecem quando estão sem.

Afonso ainda me encarava com as sobrancelhas levantadas enquanto tinha o sorriso de sempre nos lábios.

— Você acha isso? - Não respondi. - Acha que sou que tipo de cara? O almofadinha que bebe nos bares com os colegas, sempre com as segundas intenções de voltar para casa acompanhado?

Queria responder que era o que parecia. Mas lembrei-me do que minha mãe dizia de nunca julgar alguém por sua aparência, apesar de minha avó - sua própria mãe - fazer isso como ninguém e eu ter herdado muito dela. E ele também parecia ofendido com aquela pequena insinuação que fiz sobre as mulheres com quem ele saía.

— Eu falei sobre as mulheres com quem você saí, não sobre você.

Declarei tentando parecer inocente.

— E que tipo de homem saí com as tais mulheres que acabou de descrever?

Ele rebateu.

— Então está admitindo como é? Lembrando que eu não falei nada, foi totalmente você.

Levantei as mãos em rendição. Afonso riu negando com a cabeça e olhando para baixo.

— Não acredito.

Ele se levantou.

— Não acredita o que?

Continuei.

— Que acha que sou assim.

Ele se encaminhava para a porta.

— Eu não acho nada. Foi você quem disse tudo isso sobre você mesmo.

Afonso virou-se rapidamente me fazendo parar muito próximo dele.

— Então como acha que sou?

— Se eu dissesse, você não iria gostar.

Arrependi-me no mesmo momento de ter dito aquilo. Parecia ofensivo, era, definitivamente, uma ofensa.

— Eu sinto muito.

Tentei corrigir-me.

— Sente muito por ter sido grossa mais uma vez? Strike 2 em uma única noite. Uou.

Minha boca abriu e fechou mais uma vez, sem respostas. Afonso riu sem graça e se afastou em direção à porta da sala, me deixando estática e culpada.


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