Os Deuses da Mitologia escrita por kagomechan


Capítulo 3
SADIE - Consolo entregue por coturnos


Notas iniciais do capítulo

capítulo novo com Sadie como narradora. Ela não queria narrar gente.. foi mal. ela tá meio bad ainda. mas era vez dela, fazer o q?

cap editado em: 23/05/2018



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SADIE

Realmente não sou boa com palavras em momentos como esse. E acho que podem me perdoar quanto a isso. Claro que briguei como tal Ninazu depois que Walt/Anúbis desmaiaram. Tinha que ter uma opção melhor! Sim, era bom que ao menos uma opção possível me fazia ainda poder ter Anúbis, mas queria que Walt ficasse vivo também. Sou egoísta por querer os dois?

Eu soluçava e as lágrimas já pingavam do meu rosto há algum tempo quando Anúbis se levantou do chão em sua forma de chacal. Até então eu não havia notado isso, apenas continuei chorando sobre o corpo de Walt.

— Sadie... – disse Carter levemente dando uma fungada (provavelmente chorando também) e então botando a mão em meu ombro.

Não sei quanto tempo fiquei ali, ignorando tudo que acontecia ao meu redor. Apenas queria chorar até me acabar. Não sei se posso descrever a sensação de ver alguém que nos importamos morrendo. É simplesmente a pior de todas.

Em certo ponto, notei que provavelmente Walt não gostaria de me ver daquele jeito. Foi difícil e envolveu vários soluços, mas consegui respirar fundo para me afastar do corpo dele e apenas ficar ali ao lado, sentada, olhando, enquanto as lágrimas ainda escorriam pelo meu rosto. Tinha a leve sensação de que tanto meu irmão, quanto Anúbis me olhavam preocupados embora estivessem eles mesmos também em sua forma de luto. Respirei fundo novamente e poucos segundos depois senti o focinho de Anúbis em minha bochecha. Meio estranho isso, afinal ele estava na forma de chacal. Fazia um bom tempo que eu não a via.

— V-Voc-cê e-está b... D-de v-volta a-ao n-normal? – perguntei entre soluços.

Ele acenou com a cabeça enquanto me olhava com aqueles olhos da cor de chocolate com uma expressão preocupada. Pergunto-me agora se ele conseguia falar daquela forma, mas me pareceu que naquele momento ele tentava silenciosamente pensar em algo para dizer meio que provavelmente sabendo que perguntar “Você está bem?” seria algo estúpido. Naquela hora, a única coisa que consegui fazer foi abraçar ele forte.

A partir de então, tudo ficou meio confuso de se lembrar. Tenho a leve memória que Ninazu, Anúbis e Carter conversaram depois de uns segundos, mas eu não lembro bem o que falaram. Quando voltei a dar por mim de novo, Anúbis estava em sua forma humana que eu tanto conhecia. Ele se ajoelhou ao meu lado e passou a mão delicadamente em minha bochecha limpando a trilha que uma lágrima formara. Acho que ele falou algo, mas não me lembro. Anúbis me pegou no colo carinhosamente e eu o abracei com força. Creio que alguém deve ter aberto um portal, pois um apareceu em nossa frente e então estávamos em nossa casa do Brooklyn.

Desde então, tenho estado no meu quarto. Não sei exatamente quantos dias se passaram. Talvez deva contar pelas vezes que Carter tentou me dar algo para comer? Não que eu tenha tentado tocar na comida alguma vez. Acho que eu posso dizer que o único avanço que tive foi que cansei do silêncio que reinava naquela casa e principalmente naquele quarto e acabei botando toda a minha playlist da Adele para tocar no aleatório. Naquele momento, eu fitava o vazio da parede de meu quarto ao som de “When we were Young”. A música já estava no fim quando eu ouvi passos no corredor, o barulho dos coturnos era bem característico uma vez que eu mesma os usava com frequência. Assim, sabia quem era. Anúbis. Ele já havia vindo algumas vezes tentando falar comigo, mas nunca respondi a batida na porta e ele tão pouco tinha tentado simplesmente entrar no meu quarto (o que imagino que seria algo bem simples considerando que ele pode aparecer praticamente onde quiser... claro... desde que tenha os tais pré-requisitos de lugar de morte ou luto. Mas acho que tem outros lugares mais... divinos... ou mágicos... que também permitem isso). Poucos segundos depois, ouvi a batida na porta de meu quarto.

Mordi meu lábio perguntando-me se dessa vez mudaria a minha resposta (ou a falta dela).

— Pode entrar – respondi de forma monótona e então eu o ouvi abrindo a porta aparentemente de forma cautelosa. Afinal, foi a primeira vez que deixei ele entrar. Eu estava de costas para porta, mas meus ouvidos seguiram seus passos pelo meu quarto e o barulho e movimento da cama mexendo quando ele se sentou ao meu lado.

— Ahm... – disse Anúbis provavelmente pensando no que pensar – Carter disse que você ainda está comendo bem pouco.

— Sem apetite. – respondi meio seca.

Ele suspirou e demorou uns segundos antes de passar os dedos delicadamente pelo meu cabelo tirando algumas mexas que caiam sobre meu rosto. Arrepiei-me ao sentir seus dedos. Mesmo dentre a minha tristeza, pude lembrar como eu gostava daquele lindo deus do papel higiênico. Eu me sentei e, ainda sem o olhar muito, o abracei deitando a cabeça em seu ombro. Anúbis nada disse apenas me abraçou de volta e afagou minha cabeça e então deu um leve beijo em seu topo. Ficamos daquele jeito por algum tempo enquanto a música de Adele enchia o quarto. Eu apertei o abraço e ele correspondeu o aperto. Não parecia que palavras precisavam ser ditas, todas elas pareciam estar expressas naquele abraço.

— Seja forte Sadie. Eu sei que você é. – disse ele passando a mão gentilmente em minha cabeça. Podiam ser palavras simples, mas elas me fizeram abrir o primeiro sorriso que eu abria desde que Walt morreu. Foi um sorriso simples, pequeno, talvez ainda bastante recheado de tristeza, mas foi um sorriso. Assim, eu levantei a cabeça e o olhei nos olhos. Achei que ele merecia poder ver o sorriso que conseguiu botar no meu rosto.

— Obrigada – eu respondi passando a mão nos olhos que já pareciam se encher de lágrimas.

O deus segurou gentilmente meu rosto com suas mãos pálidas enquanto meu celular agora tocava “All I Ask”, originalmente da Adele, mas essa estava na versão em espanhol que achei por acaso no Youtube que era cantada por um tal de Kerly Karla & La Banda. Seria um momento bem romântico se não fosse o fato de estar recheado de luto. De forma lenta, ele beijou-me nos lábios e foi bom poder sentir mais ainda do calor dele. Não tinha como eu dizer que estava 100% melhor, mas com certeza eu estava melhorando um pouco graças à presença dele ali. Depois de nos separar do beijo, ele ficou me olhando com uma expressão que eu passei a conhecer bem.

— O que foi? – eu perguntei. Aquela expressão que estava no rosto do deus era a de que ele tinha algo para me falar, algo que talvez eu não gostasse, e por isso ele pensava no melhor jeito de falar.

Ele abaixou a cabeça e o olhar suspirando um pouco e então voltando a sustentar o meu olhar enquanto segurava cada uma de minhas mãos com as suas como se para me dar forças.

— Ontem à noite... – começou Anúbis – o... O ka de Walt chegou ao Salão do Julgamento.

Senti um frio percorrer minha espinha. Quão estúpida eu era. Nem tinha considerado o fato de que provavelmente o ka (ou a alma) dele iria para o Salão do Julgamento onde Anúbis iria... Ai meus deuses... onde Anúbis iria o julgar e então a alma dele iria para o Sekhet-Aaru. O mais próximo possível do que seria um “paraíso”. Caso contrário, a pessoa iria virar café da manhã para Ammit.

— Por favor, não me diz que Ammit o devorou! – eu pedi em desespero me agarrando a blusa dele do Iron Maiden.

— N-Não... Eu... Ainda não o julguei. – Ele disse e eu pude me acalmar mais.

— Não?

— Não. Na verdade, foi por isso que vim. Ele quer te ver. Claro, caso seja do seu interesse. Não precisa se forçar a ir se não quiser, ele disse que entenderia.

— Nada disso! Eu estou indo! – respondi apertando talvez forte demais no braço direito dele.

Tudo o que ele fez então foi dar uma pequena mexida no braço esquerdo e então no meio do meu quarto surgiu um portal. Eu me levantei meio trêmula, mas decidida. Anúbis esperou para ver o que eu faria e quando eu entrei no portal, ele me seguiu.

Num piscar de olhos, eu estava no Salão do Julgamento. Ele não havia mudado muito desde da ultima vez em que eu estivera ali. Acho que isso seria o normal a se esperar uma vez que todos os deuses egípcios tinham se mandado do mundo humano. Olhei para onde meu pai (que estava dividindo o corpo com Osíris) costumava ficar com minha mãe e meu coração se apertou por não os ver mais ali e, ao invés disso, ver Walt. Era obvio que não era exatamente ele, era apenas seu ka, praticamente um fantasma e a sua imagem levemente transparente provava isso. Apesar de seus olhos tristes, minha primeira reação foi correr para abraçá-lo enquanto eu sentia meus olhos se encherem de novo de lágrimas, mas parei quando estava a poucos passos dele.

— Hey Sadie – ele disse. Olhei-o e fui esticando a mão levemente para seu rosto em busca de confirmar uma pergunta que havia surgido em minha mente quando eu havia corrido em sua direção. Quando minha mão o atravessou como se ele não fosse nada mais do que ar frio, meu coração se apertou e não pude mais conter as lágrimas. Eu nem se quer podia toca-lo!

— H-Hey. – respondi fracamente enquanto as lágrimas escorriam pelo meu rosto.

— Hey Hey. Não chore. Por favor. Não gosto de te ver chorando. – ele disse tentando me alegrar. Percebi pelos movimentos que ele talvez tivesse pensado em limpar minhas lágrimas, mas lembrou-se que sua mão apenas me atravessaria. – Desculpe por ter acabado tudo assim.

— N-Não peça d-desculpas, idiota. – eu disse – O que você t-tem de culpado para pedir d-desculpas desse jeito?

Ele abriu um sorriso torto com as minhas palavras. Ai como eu sentiria falta daquele sorriso.

— Deixe-me pedir desculpas então por não ter conseguido me despedir direito antes. B-Bem... Pelo menos estou conseguindo agora né?

— E isso lá é permitido? – perguntei com uma risada fraca e chorosa.

— Não - respondeu ele com um sorriso culpado e olhando para Anúbis que estava não muito longe.

— Cliente VIP – respondeu Anúbis dando de ombros com um sorriso travesso, mas triste. É “triste” era uma palavra que acompanhava todas as ações do dia até então.

— Sadie, não sou bom com despedidas. Ainda mais tão terminais assim – disse Walt voltando minha atenção para ele. – Mas ainda assim, queria falar com você mais uma vez. Sei que foram muitos altos e baixos e nosso namoro... Bem... Estava bem longe de ser normal. Eu passei muito tempo pronto para morrer por causa da maldição então, acho que ter ganhado dois anos a mais foi até lucro. Afinal, pudemos namorar não? Não sei o que vai ser de mim daqui pra frente nem se posso falar “te vejo do outro lado” já que, se “só” eu já sou cliente VIP do senhor da morte ali, imagino que você seria uma Super Cliente VIP 5 estrelas Gold Platinum. Sei que dói quando alguém que conhecemos morre, mas queria pedir para que seja forte ok? Volte a ser a Sadie irritante e tagarela que tanto conhecemos e gostamos.

Aquelas palavras encheram meu coração e ao mesmo tempo o esmagaram. Chorei que nem um bebê (ou talvez pior) do que um.

— E também – continuou ele – não importa o que aconteça sempre se lembre de uma coisa. Eu te amo Sadie Kane.

E pronto. Aquelas últimas palavras foram à facada final para eu desmoronar.

— Você não pode ir! Não pode! – eu chorei, esperneei e bati o pé. Anúbis se aproximou tentando me acalmar, mas comecei a gritar com ele - Não pode fazer isso com ele!

— Sadie, eu não tenho escolha – respondeu Anúbis odiando tanto a situação quanto eu aparentemente – Eventualmente algo vai acontecer com o ka dele mesmo se eu não julga-lo. Seja esse algo bom ou não. As chances de acontecer algo ruim são muito grandes. Eu e Walt conversamos bastante sobre isso antes de eu ir até você para que possa dar um último adeus. É bem melhor a curto e a longo prazo para ele simplesmente fazer o julgamento logo.

— M-Mas... Mas... – eu gaguejei. Era raro eu ficar sem palavras para contra argumentar. Mas aqui estou eu. Sadie Kane, famosa por ser tagarela, sem saber o que falar.

— Está tudo bem Sadie. Vai ficar tudo bem – disse Walt com um sorriso tentando me alegrar.

Cheguei com a mão perto do rosto dele, sabia que eu não poderia o tocar, mas queria imaginar que podia. Ao menos sentia o ar frio tocando minha mão. Lentamente fiz o mesmo para “o beijar” e ele correspondeu.

— Eu também te amo Walt – disse de volta.

Depois de uns segundos, ele se virou para Anúbis que aparentemente já estava se preparando para o ritual do julgamento, pois havia trocado sua roupa de roqueiro bonitão padrão para roupas egípcias com direito a um cetro de aproximadamente 2 metros no qual ele se apoiava levemente com tristeza no olhar.

— Vai cuidar dela não é? – perguntou Walt.

— Claro que vou – respondeu Anúbis. Eu tinha mesmo os namorados mais super protetores.

— P-Posso ficar para o julgamento? – perguntei e Anúbis negou com a cabeça já abrindo um portal para eu voltar para o meu quarto.

— Desculpe-me, mas não. É algo proibido para olhos de mortais ainda vivos – respondeu Anúbis.

Eu afirmei brevemente com a cabeça e depois de um último olhar de adeus para Walt, fui andando em direção ao portal, mas antes passei ao lado de Anúbis.

— Obrigada e eu também te amo – lhe disse dando também um beijo em seus lábios.

— Também te amo Lady Kane – ele respondeu sorrindo para mim e então eu passei pelo portal dando um último olhar para trás enquanto o Salão do Julgamento desaparecia de minha vista.


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Notas finais do capítulo

comentários são bem vindos. consegui esmagar o coração?

sintam-se livres pra pedir pela aparição de alguém personagem :)