Mais que uma escolha escrita por nanacfabreti


Capítulo 17
Páginas da vida




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—Soube que vai se casar...Como não recebi de volta a chaleira de porcos que dei de presente, naquele casamento que não aconteceu , não vou te dar outro. —Dona Julieta, a moradora mais velha de Monte Real, contava quase um século de vida, me abordou enquanto eu mostrava a aliança às minhas amigas.

  Lucia e Gabi se entreolharam e começaram a rir, depois que a senhora se afastou de nós.

—Eu avisei que ela ia perceber. —Lúcia apontou o dedo para a Gabi.

—Do que estão falando? —Preocupei-me, imaginando ter perdido alguma coisa.

—Culpada! —Gabri ergueu os braços. — Eu peguei pra mim, uma chaleirinha linda, toda cheia de porquinhos...Sabe que eu amo porcos —ela confessou. —Achei que a Dona Julieta não se lembraria...

Revirei os olhos sem acreditar naquilo, três anos depois, e eu acabava de ser cobrada por um presente que sequer vi a cor.

Olhei para Alex e ele acabava de receber um abraço da minha mãe. Sorri satisfeita, no fim ele havia mesmo a conquistado.

—Maria Cecília, se importa se passarmos a noite em Santo Valle? —Ele me abordou, enquanto eu me despedia da Carol e da pequena Michele.

 —Aconteceu alguma coisa? —perguntei, porque estava tudo certo para ficarmos na casa dos meus pais.

— Claro que aconteceu... —ele me puxou para perto — você aceitou meu pedido de casamento, tenho que avisar a minha família.

—Ah...isso significa que eles sabiam também? —reclamei a caminho do nosso carro.

—Sabiam...e confesso que hoje,  enquanto você e minha mãe conversavam, fiquei em pânico, ela é péssima em guardar segredos. —Ele piscou para mim.—Já você...Hoje sua amiga me contou que no passado, a senhorita criou uma conta no facebook, com nome falso para poder investigar a minha vida...

 Arregalei meus olhos e senti meu rosto queimando de vergonha, eu nunca tinha contado para Alex as insanidades que cometi depois que nos separamos.

—A Gabi é uma fofoqueira! —Cruzei meus braços . —Isso porque contei pra ela nem faz tanto tempo, eu achava tão ridículas minhas atitudes, que não queria nem mesmo que minha melhor amiga soubesse.

— Posso te contar um segredo? —Alex encarou-me enquanto aguardava o sinal abrir.

— Depende... se envolver outras mulheres nessa revelação, eu prefiro nem saber...

Alex jogou a cabeça para trás rindo de mim.

—Que mulheres? Na verdade, eu também procurava você nessas redes sociais, todos os dias e nada. Era tão decepcionante.

 Fiquei séria, era a primeira vez que estávamos falando sobre esse período de nossas vidas.

 —Aproveitando que estamos confessando nossos pecados...tem outra coisa que fiz e nunca contei pra você. —Respirei fundo, porque remexer naquelas lembranças me trouxe também memórias de como eu havia sofrido.

 —Pode falar Maria Cecília...eu aguento.

 — Semanas depois do casamento da Chiara, uma dessas revistas regionais fez uma bela reportagem sobre a festa, nela havia duas fotos suas —toquei sua mão que repousava no cambio do carro —,Alex, eu comprei um exemplar dessa revista e por anos eu olhei suas fotos ao menos umas três vezes por dia, como um ritual. Agarrei-me àquilo para conseguir sobreviver.

Alex franziu o cenho, ele já me conhecia bem o bastante para saber o quanto tinha sido doloroso para mim.

 —Ao menos você tinha fotos...agora imagine a mim, que tive de me alimentar apenas de lembranças e pior, não foi uma escolha minha, estar sem você.

 Não disse mais nada, pensar em como fiquei ao deixá-lo, ainda me causava sensações ruins.

— Chegamos... —ele me alertou, manobrando o carro para estacionar, em menos de dois segundos já estava do lado de fora, abrindo a porta para mim.

 Desci sem entender nada, estávamos parados em frente a um grande salão, a fachada de vidro estava coberta com papel pardo, de modo que impedia qualquer um de saber o que tinha ali dentro. Do outro lado da rua ficava a praça da igreja de Santo Valle, e como já era tarde, quase dez horas da noite, não havia movimentação nenhuma ali.

 —Se me disser que preparou um casamento surpresa naquela igreja — apontei com o dedo —, eu juro que vou ser uma noiva em fuga...

 Alex riu, enfiou a mão dentro do bolso da calça e tirou um chaveiro de lá, depois, caminhou até o salão e sem cerimonias destrancou a fechadura.

 —Vem Maria Cecília. — Ele parou na frente da porta aberta e me convidou a entrar.

 As luzes estavam acesas e o lugar parecia ser maior do que quando visto de fora. O piso de madeira rustica era novo, assim como as paredes claras que ainda exalavam cheiro de tinta fresca; três lances de escada levavam a um sobre piso.

—Que lugar é esse? —questionei ainda perdida. Minha voz ecoou pelo ambiente vazio.

 —Essas são as futuras instalações da Florista de Santo Valle. —Alex parou em minha frente e fixou os olhos em mim.

 Inclinei a cabeça e depois olhei por todo o entorno, caminhei até os degraus e passei a analisar o segundo espaço. Sobre uma mesa de madeira, dois galhos de orquídeas brancas, uma peça de fita e tesoura. Reconheci tudo, imediatamente.

—Eu disse que tinha feito aquele arranjo...acha que não aprendi nada quando ajudei você? —Alex já estava atrás de mim.

—Meus pais não me disseram nada... —continuei, notando que aquele era mesmo um dia de grandes surpresas.

 —Na verdade, como foi ideia minha, eu mesmo quis contar a novidade pra você, afinal, essa loja é sua...

 —Como assim, minha? —Meu coração disparou.

 Alex deu dois passos, encurtando a nossa distância, segurou meu rosto com as duas mãos e sorriu.

— Você deixou tudo de lado pra me acompanhar, embarcou comigo nessa vida nômade, ficou todo esse tempo afastada da sua família, dos seus amigos e do seu lar... sei o quanto foi difícil pra você e essa é minha forma de retribuir.

 Olhei para cima tentando, inutilmente, não chorar.

—Está me dizendo que vamos ficar aqui em definitivo?

 Alex balançou a cabeça de modo afirmativo.

— Monte Real é aqui do lado, e Santo Valle tem uma importância tão grande pra mim, que mesmo tendo conhecido tantas outras cidades...Maria Cecília, foi aqui que encontrei você...

 Eu sempre soube que Alex era surpreendente, mas naquele dia em especial ele havia se superado, agarrada em seu corpo enquanto tentava recuperar-me daquele monte de novidades, tudo o que passava pela minha cabeça era o quanto eu o amava. Fechei meus olhos por um instante e quando os abri, a mesinha com as flores me jogaram de volta ao passado, quase oito anos atrás.

  A imagem daquele rapaz de boné vermelho, sorrindo enquanto me via devorar um prato de doces, me levou a um lugar nunca antes visitado por mim. Antes do nosso primeiro beijo. Entendi tantas coisas em uma fração de segundos e comecei a considerar que talvez, existisse mesmo essa coisa de amor à primeira vista.

—Eu te amo Alex... —falei com urgência, com vontade de gritar aos quatro cantos do mundo.—Obrigada por ter me ajudado a levar aquelas caixas de velas, por ter passado aquela tarde montando arranjos comigo, e por ter me convencido a fugir  naquela noite com você...mas o principal, obrigada por não ter desistido de mim, mesmo quando eu pedia o contrário.

 Alex respirou fundo e me olhou, do mesmo jeito que fez naquele dia, como se um beijo meu, fosse tudo o que ele mais quisesse na vida.

 Sem nada dizer, até porque, certamente ele também devia estar visitando alguma parte do nosso passado, Alex segurou-me pela cintura e me colocou sobre a mesa, livrou-se do meu vestido rapidamente e eu também, dei um jeito de despi-lo enquanto flashes da nossa primeira noite juntos se mesclavam ao que estávamos vivendo naquele instante.

 O mesmo topete endurecido de spray, os trajes de festa, a maneira com que desejávamos um ao outro como se nossas vidas dependessem daquela entrega e foi como retroceder o tempo. Alex conseguiu me fazer voltar na noite do casamento da sua irmã, o dia mais importante de toda a minha vida.

 Estávamos deitados no chão sobre as nossas roupas e, se o ar condicionado não estivesse ligado, talvez tivéssemos congelado, já que fazia uma madrugada muito fria.

 —Se meus avós fossem vivos, eu iria agora mesmo agradecê-los... —falei baixinho, depois beijei sua mão.

 —Que conversa é essa Maria Cecília?

 — Se a floricultura não tivesse começado por eles...Alex, de que outra maneira eu o conheceria? —indaguei preocupada.

 Ele ficou em silêncio.

 —É...acho que se eles estivessem vivos eu iria junto com você agradecê-los... —Ele riu nas minhas costas. — Mas já que estamos falando em gratidão, lembre-me de agradecer a Chiara, Na verdade, preciso me redimir com ela. Se imaginasse o quanto a praguejei quando ela veio com aquela história de padrinho...

 Entrelacei meus dedos nos seus e me aconcheguei em seu corpo.

—O bom é que hoje, diferente daquela noite, eu não tenho que me preocupar no que vou dizer aos meus pais quando o dia clarear, e o melhor, eu não vou ter que ir embora e te deixar...

 — É Maria Cecília...como eu senti vontade de tirar você do carro da sua amiga naquele dia... —Ele correu os lábios por minha nuca.

 —Devia ter me tirado...eu não iria resistir.

 Alex voltou a ficar quieto por alguns instantes e eu também, estava pensando exatamente naquilo, em como seria se eu tivesse feito tudo diferente.

 —Sabe que pra mim, o melhor de tudo, é saber que você não vai me deixar daqui à alguns dias.

 Virei-me de frente para ele e encontrei seus olhos verdes brilhando de encontro aos meus.

 —Não vou...não vou deixar você nunca mais... —Me afoguei em seus lábios, outra vez.

                                        ****************************

—Em Vegas? Nem pensem nisso! —Chiara resmungou quando Alex e eu comentamos nossos planos. —Eu sonho com o casamento de vocês para que minha filha seja daminha...Não abro mão disso.

 Olhei para Alex e ele deu de ombros.

—Chiara... — comecei.

—Nem vem...devem isso a mim, se não fosse  o meu casamento, hoje vocês nem se conheceriam.

 Ela tinha razão, e mesmo que não tivesse, Chiara era muito persuasiva.

Seis meses depois do pedido oficial, no dia 27 de novembro de 2015 , em uma cerimonia pequena , apenas os mais íntimos foram convidados, Alex e eu nos casamos. Na beira da piscina da casa aonde nos conhecemos; com orquídeas e peônias decorando o lugar, sem contar as inúmeras lembranças que bombardeavam a nós dois por todos os momentos.

 Um casamento emocionante, lágrimas pareciam ser item obrigatório. Alex e eu sabíamos o caminho cheio de curvas e desvios que percorremos para finalmente estarmos ali.

 Quando eu disse sim, Alex deu um soco no ar, não consegui deixar de sorrir, constatando que algumas coisas nunca mudam, já outras, como amor que eu sempre senti por ele... Bem....esse conseguia se multiplicar, dia após dia, de forma constante e infinita.

 

                   *********Sobre Marcus e Valentina********

 

Eu me mudaria para a casa do meu namorado em três semanas e a viagem para um resort no nordeste, em Jericoacoara, com mais duas das minhas melhores amigas, era um tipo de despedida de solteira. Oito dias , tudo incluso e em troca, o Guilherme também faria uma viagem com os amigos, lugares opostos, ele tinha escolhido o sul do país e eu nem quis saber o por quê.

 Não éramos o tipo de casal liberal, mas honestamente, eu não esperava fidelidade da parte dele e isso não chegava a me incomodar, afinal, se ele realmente pulasse a cerca, não seria a primeira vez.

 Namorávamos há quatro anos e em uma de nossas brigas, ou melhor, em um dos nossos rompimentos, como ele preferia dizer, o Guilherme acabou dormindo com a vizinha dele. O pior é que ela me conhecia, meio que acompanhou a nossa história e mesmo assim, bastou ele estar dando sopa que lá foi ela, ao ataque!

De qualquer forma, eu não colocava a culpa só na garota, até porque, era ele quem me devia respeito...

 Eu fiquei magoada é claro, mas acabei perdoando, afinal, eu sempre amei muito o Guilherme.

Ele apareceu na minha vida, em um momento bom, eu já estava no último ano da faculdade de direito quando ele veio transferido de outra cidade, por fim, acabamos nos apaixonando e a ideia de morarmos juntos foi acontecendo de forma natural.

Ás vezes me batia um pânico, e pensar que em pouco tempo eu estaria dividindo minha vida e minhas intimidades com alguém, acabava me assustando. Por mais que não fosse um casamento com juramento e tudo mais, estaríamos sim, assumindo um compromisso, mas ao menos eu tinha aproveitado.

 Curti bastante minha liberdade e antes do Gui, eu tive mais cinco outros namoricos.

 A Marcela, uma das minhas amigas achava pouco, ele sempre dizia que eu tinha que conhecer mais homens antes de me amarrar a um. Eu não concordava, claro que não era do tipo que achava que uma mulher tem de se casar virgem, mas  seis experiências me parecia um bom número, e o Gui, tinha sido de todos, o melhor, isso até  eu conhecer o Marcus...

As coisas aconteceram de um jeito louco. Na terceira noite naquele resort e eu fiquei sozinha, a Marcela e a Karina, conheceram uns gringos já no primeiro dia da nossa estadia ali. Era um grupo de alemães e eles enlouqueceram quando viram um trio de brasileiras soltas na área.

Sim, se eu quisesse teria um alemão para mim também, só que eu não estava lá com a intenção de pegar alguém, mesmo que a recíproca não fosse verdadeira.

 No segundo dia eu já não via mais a cara das minhas amigas, elas passavam o tempo todo com os gringos à tira colo.

 Era noite e eu estava na área das piscinas, uma banda tocava Marisa Monte e a voz da vocalista era agradável.  Sentada em uma das espreguiçadeiras, eu bebia meu terceiro drink, alguma coisa feita com frutas nativas da região. O clima, a música e aquele monte de pessoas bonitas reunidas no mesmo lugar, era algo próximo do paraíso.

  Sorri com esse pensamento e então tive a sensação de estar sendo observada. De soslaio, olhei para o meu lado direito e realmente, havia um rapaz em pé, a alguns metros de distância de mim. Tinha a pele morena, era alto; a bermuda e a camisa eram claras. As pernas dele me chamaram a atenção, eram grossas, tentadoramente grossas.

Ele realmente estava me olhando e como me flagrou analisando-o, decidi sair dali, antes que ele interpretasse aquilo como uma deixa.

Aproveitei que o garçom trazia mais uma rodada daquela bebida, peguei uma taça e me levantei já preparada para ir embora. Foi nesse momento que senti um toque em meu ombro, e, antes mesmo de me virar, eu já sabia que se tratava do “senhor coxas grossas.”

 Fechei meus olhos antes de me virar para encará-lo, e quando o fiz, deparei-me com aquele homem lindo, mais alto do que parecia de longe e com um sorriso estampado no rosto, daqueles que faz qualquer mulher perder o juízo.

  —Brasileira? —ele indagou-me com covinhas nas bochechas.

 Até pensei em fingir não ser, colocar em prática meu “verbo to be”, mas se ele falasse inglês, eu passaria vergonha.

 —Brasileira —limitei-me a dizer, devolvendo um sorriso.

  —Oi, eu não quero atrapalhar você, mas, vi que está tomando esse drink e como ele é feito com frutas que eu sequer já tenha ouvido falar...queria saber se é mesmo bom.

 “Nossa! Que péssima abordagem... ou esse cara é mesmo um tosco ou ficou muito tempo fora da ativa...” — Pensei.

 —Estava me observando, se eu não tivesse gostando não teria repetido. Nunca faço nada que não me agrade —respondi com uma rispidez desnecessária.

 Ele não esperava, tanto que ficou sem ação, me encarando como se eu tivesse acabado de dar um soco em seu estômago.

—Me desculpe, eu não... —Ele virou-me as costas.

Senti-me péssima, até porque, ele não estava com cara de predador e nem tinha me faltado com o respeito.

—Eu é que tenho que pedir desculpas...não sei o que deu em mim. —Coloquei-me em sua frente me sentindo um verme. —Toma, prova minha bebida, quem sabe assim eu me sinto melhor.

 Ele parecia não estar entendendo nada, mesmo assim, pegou a taça da minha mão e bebeu um gole.

—É bom... —Ele me ofereceu a taça de volta.

—Pode ficar, eu acho que já exagerei...Só isso para explicar meu mal jeito.

—O que acha de nos sentarmos? —Ele apontou na direção das espreguiçadeiras.

 Eu não tive coragem de negar, ele era mesmo um cara gentil. Sentamo-nos lado a lado, mas virados de forma que ficamos de frente para o outro, os joelhos dele quase tocavam os meus.

Ele terminou de beber aquela taça e quando o garçom passou pegou mais duas, devolvendo então, uma para mim. Nesse pouco tempo fiquei analisando-o, dava para notar uma tristeza em seu olhar e eu sabia que aquilo envolvia mulher. Talvez tivesse sido abandonado no altar.

—Está sozinha aqui? —ele perguntou entre um gole e outro.

—Na verdade estou com duas amigas...Só não sei onde elas estão. E você?

—Sozinho. —Ele tomou um longo gole. —Na verdade, essa viagem era para ser minha lua de mel...Isso se minha noiva não tivesse me abandonado no altar.

 Eu, que acaba de virar a bebida em minha boca quase me afoguei. Eu tinha acabado de pensar aquilo e o cara vai e fala! Não podia ser verdade, do contrário, ou eu era algum tipo de sensitiva, ou aquele cara lia pensamentos e sério, nenhuma das duas opções eram legais.

—Você só pode estar brincando—Demonstrei meu ceticismo.

—Na verdade eu não fui abandonado no altar. —Ele sorriu com amargor. —Ela me avisou que não teria casamento, alguns dias antes da cerimônia.

—Que vadia! —Deixei escapar. —A não ser que...ela descobriu alguma traição?

Ele riu e balançou a cabeça.

—Não! Eu nunca a trairia e ela, a Lia, não é nenhuma vadia. Ela só se deu conta de que não faria a coisa certa se casando comigo, quando estava apaixonada por outro.

 Meu queixo caiu. Não bastasse toda aquela história sórdida e ele ainda defendia a garota...Eu mesma já tinha colocado meu feminismo de lado e estava lá, querendo apedrejar a tal da Lia.

 —No meu mundo os homens não agiriam desse jeito...

 —Foi melhor assim, como ela mesma disse, pior seria no futuro, ela jogar anos de frustração sobre mim e me culpar por seu fracasso pessoal... —Ele parecia mesmo resignado.

—Meu Deus, como vocês são evoluídos...De onde você vem, todos são assim?

—Sou de Monte Real, uma cidade de menos de quatro mil habitantes, então imagina como as coisas estão por lá...O meu “ não” casamento, foi primeira página do jornal da cidade.

—Que merda! —Levei minhas mãos ao rosto, aquela história estava cada vez pior.

 Ele riu, pela primeira vez um riso real.

—E você, qual é a sua história?

Eu não podia dizer que estava lá porque era minha despedida de solteira, eu jamais diria que estava prestes a juntar os trapos. Aquele não era um bom assunto para conversar com ele.

—Sou advogada, se precisar...

—Sou... — ele começou e eu levantei a mão pra interrompê-lo.

—Deixa eu adivinhar...Você deve ser veterinário, daqueles que usa uma voz fofa, para  conversar com cachorros e gatinhos...

—Quase! Sou pediatra. —Ele deu de ombros, e eu desejei por um instante ter dez anos.

—Uau! —limitei-me a dizer, e esse “uau”, era cheio de más intenções. —Então devo chamá-lo de doutor...?

 —Marcus Demetri. E você...

—Velentina Assis. —Estendi a minha mão oferecendo um cumprimento, mas na verdade, queria mesmo era sentir sua pele na minha.

 Aquele cara precisava de ajuda e eu estava disposta a isso...Mal sabia eu, a enrascada em que estava me metendo.

—O que acha de dar uma volta pelo resort? —Ele propôs-me de forma tímida.

—Me responde uma coisa antes. —Fixei os olhos nele. — Não  se aproximou de mim porque me pareço com sua ex, ou algo assim?

 Marcus riu deliberadamente.

—Não! Na verdade vocês são muito diferentes, em todos os aspectos.

 Respirei aliviada.

—Isso é bom...Agora vem, vamos aproveitar tudo o que esse lugar tem para oferecer.

Marcus segurou minha mão e eu o puxei para a direção de onde a banda tocava. Ali, alguns casais dançavam ao som de “beija eu”.

—Dança essa comigo? Eu amo essa música —Dei um gritinho, animada por conta do álcool.

 —Eu não sou bom nisso mas... —Ele segurou-me pela cintura e acompanhou os movimentos do meu corpo.

 Marcus era mesmo um gato, olhos castanhos misteriosos , ombros largos e um ar inocente de rapaz de cidade pequena; e tinha  um agravante, ele estava com o coração partido, aquilo o tornava tão atraente...

 —Qual o nome dessa música? —ele sussurrou em meu ouvido.

—Beija eu... —respondi de forma sexy, esperando que ele entendesse meu recado.

 Ele fechos os olhos e inclinou-se na minha direção, com os lábios semiabertos. Senti-me como uma adolescente  nos bailinhos do colégio, nervosa como se fosse beijar pela primeira vez.

 E que beijo foi aquele...?Língua, saliva e ritmo. Tudo na medida certa, sem contar  seu jeito respeitador. Se fosse outro rapaz, eu estaria lutando com vários pares de mãos bobas enquanto Marcus, não tirava as suas das minhas costas. Ele era muito fofo, não tive como não rir.

—Qual é o nome da sua cidade mesmo? —Perguntei entregue ao seu abraço.

—Monte Real, interior de São Paulo.

 —Preciso me lembrar de ir até lá, qualquer dia desses. — Tive de dizer antes de sairmos dali.

  Marcus segurava minha mão e nós andávamos na areia da praia. Era noite de lua cheia e a claridade prateada do astro, deixava tudo  mais interessante. Eu tentava não pensar, mas era estranho imaginar que se ele tivesse se casado, como deveria, seria outra garota que estaria ali com ele. Já eu, provavelmente, acabaria sentada em uma daquelas espreguiçadeiras, enchendo a cara e praguejando minhas amigas por estarem transando naquele paraíso e eu não.

 Seria loucura estar feliz por as coisas não terem sido daquela forma? Se fosse, então quando voltasse para casa teria de procurar a Mila, uma amiga da minha mãe que era psicóloga.

—Olha que lindo... —Ele apontou para o lado da praia em que ficavam os bangalôs. —Eu tinha alugado um deles.

—Mentira! — Levei as mãos à boca. Aquilo era de longe a coisa mais romântica daquele resort. — Você cancelou o aluguel?

Marcus franziu a testa e balançou a cabeça.

—Não, eu não tive tempo de cancelar nada. —Ele cruzou os braços contra o peito.

—Acharia muito estranho me levar até lá?

Ele baixou a cabeça por alguns instantes, como se estivesse decidindo. Senti meu rosto queimar de vergonha. Sim, eu descobri que tinha isso também.

—Na verdade eu estava louco pra te convidar, só tive medo do que você poderia pensar.

 Acabamos rindo e Marcus agarrou-me pela cintura fazendo nossos corpos ficarem praticamente grudados um ao outro, dessa vez fui eu quem tomou iniciativa de beijá-lo.

Assim que entramos no bangalô, entendi o porquê, de ser um dos destinos preferidos dos casais apaixonados. Tudo ali transcendia romance; a rusticidade, a luz baixa e amarelada, as velas acesas e a cama preparada, eram um convite.

—É lindo! —elogiei boquiaberta.

—É mesmo. —Marcus também estava inebriado, afinal, também era sua primeira no lugar.

 Fiquei parada olhando para ele, imaginando que ele devia estar pensando nela, na tal Lia. Senti uma pontada de algo parecido com ciúmes, coisa que eu deixara de sentir pelo Gui, há tempos.

—Se quiser podemos sair daqui. Podemos voltar...

—É ruim pra você, saber que eu tinha outros planos para esse lugar?

—Não —falei, porque não era mesmo. — Fico pensando em você, em como está se sentindo.

Marcus começou a caminhar na minha direção, devagar, como se estudasse cada passo. Depois, segurou o meu queixo com uma das mãos, enquanto a outra corria por meus ombros. Cuidadosamente me virou de costas para ele e deslizou a alça da minha blusa.

Suas mãos afastaram meus cabelos, deixando minha nuca livre para receber seus beijos. Um arrepio percorreu todo o meu corpo e minhas pernas amoleceram, tamanho o prazer que aqueles beijos estavam me proporcionando.

Fechei meus olhos, senti meu coração disparar como há tempos eu na sentia.Com cuidado e calma ele desceu o zíper da minha blusa e eu não relutei. Sabia que ele me desejava, sentia isso em seu corpo.

Levantei meus braços deixando claro que eu queria que ele me livrasse de uma vez daquela roupa. Ele entendeu e em um minuto minha blusa repousava no chão perto da cama. Ele fez o mesmo com minha saia, e depois foi minha vez.

Tirei sua camiseta rapidamente, eu estava louca para ver o que tinha por baixo daquele tecido fino, e como eu já imaginava, seu abdômen era desenhado, não como os dos rapazes que vivem nas academias; era natural, o tipo de homem que é másculo e ponto final.

Meu desejo crescia, não como o de Marcus que era visível a olhos nus, mas eu estava louca, pronta para ser dele  e tudo o que eu queria era que aquele olhar que ele me lançava, fosse mesmo para mim.

—Você é linda Valentina, eu estou completamente encantado—ele sussurrou, antes de me carregar até a cama.

 Respirei fundo, ninguém nunca tinha me olhado daquela forma, nem mesmo o Guilherme. Sim, eu lembrava que tinha um namorado, só que decidi que isso, seria um problema para depois.

 Suas mãos percorriam todo o meu corpo, sua boca também. Aquele homem era o máximo, tudo o que ele fazia era bom, Marcus não tinha pressa, aproveitava cada contato. Ele sabia como fazer uma mulher se sentir especial.

Se no começo eu tinha receio de que ele podia estar pensando em sua ex, logo eu soube que não. Ele estava ali comigo, por mim.

Marcus sussurrava meu nome, elogiava meu corpo e descrevia os detalhes que eram meus. Ele deixava claro o quanto tudo aquilo estava bom , eu sentia que era verdadeiro.

Quando finalmente fomos um do outro, foi como sair do chão, caminhar nas nuvens, eu então entendi o significado desses e de todos os outros termos que as pessoas usavam para definir o ápice de uma relação.

Meu corpo repousava cansado encostado no seu, seus dedos passeavam por minhas costas e eu estava tão relaxada que não conseguia dizer nada.

—Vai achar estranho, e pode não acreditar, mas o que acabou de acontecer aqui foi perfeito, não podia ter sido de outro jeito. Tinha que ter sido com você, Valentina —Marcus falou baixinho.

 Sorri involuntariamente, estava feliz.

—Olha que eu acredito... —Apontei o dedo para ele.

—É sério...Eu não tenho porque mentir.

 Pois é, ele não precisava mesmo mentir e tanto foi verdade, que acabamos repetindo tudo de novo, não só naquela noite, mas em todos os dias que vieram depois. Marcus e eu não nos desgrudamos mais, éramos mesmo como um casal em lua de mel.

 Contei para minhas amigas em um dos raros momentos em que consegui falar com elas. Recebi total apoio de ambas. “ O que acontece em Jeri, fica em Jeri” , foi o que me disseram.

 Eu por vezes pensei em falar com ele sobre meu namorado, só que eu morria de medo de estragar o que estávamos vivendo.

—Trata todas as mulheres assim? —indaguei na manhã em que Marcus levou café na cama para mim.

 Ele sentou-se do meu lado e balançou a cabeça.

 — Só as ruivas... —Ele sorriu. —Brincadeira, na verdade você é a segunda mulher em minha vida. Lia foi minha primeira namorada, tínhamos dezesseis anos e estávamos juntos desde então.

 Arregalei meus olhos, aquele cara não podia existir. Só que ele existia, estava do meu lado e a cada instante eu o desejava só para mim. Entretanto, teoricamente eu já tinha um “dono”.
Marcus sabia que faltava apenas um dia para eu ir embora, e nós já estávamos nostálgicos, ele e eu.

 —Posso te perguntar uma coisa?

—Claro...embora você já saiba tanto sobre mim. —Ele acariciou minha perna.

—Sua ex...ela chegou em você e simplesmente falou que não se casaria? —Interessei-me porque honestamente eu estava me identificando cada vez mais com ela.

 Marcus se levantou e foi até a mesinha onde estava sua carteira, ele a abriu e tirou de lá um papel dobrado. Entregou-me.

—Lia me deu essa carta. Pode ler, não vejo porque ter segredos com você.

 Respirei fundo e desdobrei aquela folha. Corri meus olhos pelo que estava escrito a próprios punhos. Caramba! A tal Lia tinha ganhado o meu respeito. Tudo o que ela havia escrito ali era forte, a garota sabia mesmo como defender uma causa, no caso ali, a felicidade dela. Eu tinha que retirar tudo o que havia pensado dela. A carta era extensa, mas ouve um trecho daquele manuscrito que me pegou:

“ Todo mundo merecesse um final feliz, e nesse caso, me casar com você pode parecer o mais certo, e é o que todos esperaram. No entanto, eu não posso ser o final feliz de alguém, se  estou dentro da história errada. Por isso deixo de presente pra você, páginas em branco, que certamente serão escritas por alguém que realmente mereça estar no livro da sua vida.”

Aquilo era tão significativo, tão certo.

—Nossa... —Devolvi a carta a ele.

—Entendeu agora? —Ele voltou o papel na carteira.

 Balancei a cabeça confirmando que sim. Depois, passei o resto do tempo pensando em cada linha do que eu tinha lido.

  Eu estava arrumando minhas malas e algo me parecia errado. Marcus não queria que eu fosse, ele ficaria lá por mais quinze dias e insistia que eu permanecesse com ele.

 Não tive coragem de contar a verdade a ele, eu preferia deixar apenas boas lembranças, e eu não pretendia me despedir dele.

 No horário combinado com o transfer, contratado para nos levar ao aeroporto, uma coisa gritou dentro de mim. Corri até o quarto de Marcus ,eu precisava falar com ele.

—Seria muita loucura, ou pretensão, eu pensar que posso escrever as suas páginas que es em branco? —perguntei assim que ele abriu a porta.

 Marcus baixou a cabeça e sorriu...

— Eu já entreguei a caneta pra você ,tive medo que não tivesse percebido, Valentina—afirmou, me puxando para dentro do quarto.

 Dias depois, o Guilherme recebeu uma cópia da carta de Lia, com algumas alterações, mas com o real desejo que ele encontrasse alguém para preencher também, as páginas em branco, que deixei para ele.


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Notas finais do capítulo

Então... Chegamos ao fim de mais uma história de amor... Com final feliz pra todos!!!
Essa foi rápida, acho que um das mais curtas que já escrevi, mas ainda assim, com todos os pormenores devidos...
Mesmo que pareça redundante, agradeço outra vez a todos os que leram.
Conheci essa plataforma esse ano e foi pra mim uma grata surpresa, aqui foi onde recebi muitos elogios e incentivos, e também fiz amigos verdadeiros...
Desejo para todos que esse fim de ano seja fantástico e que 2018 seja maravilhoso.
Volto em breve, tenho tanta coisa pronta que está difícil escolher qual será a próxima história que vou postar aqui!
Um grande beijo no coração de todos!



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