Canção Vintage (Crânio & Magrí - Os Karas) escrita por Lieh


Capítulo 20
Os Caça-Fantasmas: Uma Pequena Aventura dos Karas


Notas iniciais do capítulo

Esta história foi um mini conto especial que fiz para o Wattpad essa semana, mas que estou repostando aqui também, pois faz parte do canon da fic. A história é entre A Droga da Amizade e a A Droga da Obediência.

Música: Let's Dance - David Bowie



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A hora do intervalo no Colégio Elite era o momento perfeito para os alunos colocarem a conversa dia, reclamarem de algumas matérias e professores e fofocarem da vida alheia.

Quase todos os estudantes se encontravam no pátio. Quase, exceto quatro alunos brilhantes que se esconderam no forro do vestiário do banheiro masculino para uma reunião de emergência máxima, pois afinal de contas, eles eram um grupo super secreto, que sabiam lidar com qualquer tipo de problema na escola, como por exemplo...

— Fantasmas? Você está falando sério, Miguel?

O líder que atendia pelo nome de Miguel olhou feio para a cara do amigo Crânio. Eles jamais convocaria uma reunião de emergência máxima por bobagens.

— Eu estou falando sério. Quero dizer, os alunos estão dizendo que é um fantasma — ele revirou os olhos — Mas deve ser só um engraçadinho pregando uma peça para assustar os seguranças do colégio à noite. É melhor nós acabarmos com essa brincadeira antes que alguém se machuque.

Magrí, a única menina daquele grupo peculiar, franziu a testa:

— Também creio que seja um aluno, mas... Qual é a possibilidade de ser um fantasma de verdade? Dizem por aí que o Elite é mal assombrado...

— Magrí tem razão... — Calú massageou o pescoço — Porque quando eu era criança, eu estava num...

Miguel levantou a mão direita pedindo para o amigo deixar a história para depois.

— Eu prefiro trabalhar na hipótese de que seja uma pessoa de carne e osso — disse — Acho que assim é mais fácil.

A gaita de Crânio parou de soar e seus amigos olharam para ele. O garoto os encarou um a um pensativo. Por fim, disse:

— Também prefiro pensar que se trata só de uma brincadeira de algum engraçadinho.

— Mas você não pode negar que fantasmas não existem, Crânio — Magrí rebateu — Claro, eu não sou de acreditar em todas as histórias de fantasmas, mas que eles existem, isso é verdade. Então eu prefiro pensar que possa ser os dois.

— A maioria cria essas lendas de fantasmas só para assustar trouxas — disse ele.

Calú fechou a cara.

— Eu não sou trouxa e eu também já vi um fantasma, quando eu estava...

— Ok, chega de discussão! — Miguel se sobrepôs — Fantasma ou não, não importa agora. O importante é bolarmos um plano para descobrir quem ou que está andando nos corredores da escola durante à noite.

Calú não se conformava:

— Mas se for um fantasma de verdade? Quais chances nós temos contra um ser sem corpo?

E Magrí concordava com ele:

— A gente tem que levar em consideração isso, Miguel!

Miguel se segurou para não bater a própria cabeça na parede. Crânio por sua vez, revirou os olhos e se dirigiu a Magrí e Calú:

— Ok, digamos que seja uma fantasma de verdade. Como vocês dois pretendem pegá-lo?

— É simples, oras — Calú riu — É só aspirá-lo com alguma coisa ou dar um choque nele! Vou levar minha raquete de matar mosquito, ela é elétrica!

Antes que Crânio ou Miguel rebatessem, Magrí desferiu animadamente:

— Eu posso usar o meu secador de cabelo!

Crânio estava com uma expressão como se alguém tivesse dito a ele que seu boletim só tinha zero.

— Como vocês...

Miguel acenou para o amigo para deixar para lá, que era melhor não discutir para não dar briga. Quando falou, usou o seu melhor tom de persuasão:

— Ok! Já temos um plano caso seja um fantasma — o canto da boca do garoto tremeu como se quisesse rir — Mas, se for um aluno, seria bom fazermos uma armadilha para pegá-lo quando chegar a hora...

— Primeiro vamos ter certeza que é uma pessoa — Magrí sugeriu — Depois pensamos na armadilha.

Miguel encerrou o assunto.

— Certo. Vamos nos encontrar no portão dos fundos da escola às 21h. Sem atrasos.

***

 Quatro vultos silenciosos adentraram pelos fundos do Colégio Elite. Já era noite alta e as únicas pessoas à vista eram os seguranças que faziam ronda noturna. Para a sorte dos Karas, eles conseguiram passar sem serem notados, e em instantes já andavam nos corredores dos alunos do oitavo ano.

Os quatro sacaram lanternas das mochilas que carregavam. Olhavam a todo tempo procurando sinal do aluno-fantasma.

— Acho que não tem nada aqui, gente — Magrí sussurrou.

— Vamos subir — disse Miguel — Sem fazer barulho nas escadas.

Os outros três acenaram. Antes, porém, que pegassem as escadas para o segundo piso da escola, um vulto passou correndo perto deles como um jato. O líder dos Karas desandou a correr atrás do vulto.

— Pega! Não deixem ele fugir!

Os outros três saíram correndo junto com ele com as lanternas nas mãos. Correram até a saída de emergência. Saíram novamente do colégio, chegando ao estacionamento vazio, mas sem sucesso.

— Para onde ele foi? — Crânio franziu a testa.

— Acho que ele pode ter voado... — Magrí murmurou para ele de forma muito séria.

O garoto piscou olhando para ela.

— Eu acho que você anda vendo filmes demais, Magrí.

A menina fechou a cara, ficando um pouco vermelha.

— Por que você só concorda com o Miguel dessa vez? Em outras vezes, você sempre me dava mais créditos pelas minhas suspeitas...

O rapazinho corou sem saber o que responder. Ele ainda não havia engolido direito aquela ideia de capturar fantasmas com secadores de cabelo e raquete elétrica de matar mosquitos. Já havia pensando em todos os pormenores de como aquilo era impossível de executar. Porém lá no fundo, era dolorido para ele não poder estar do lado dela desta vez.

— Vamos voltar. Nosso “fantasma” pode ter pegado a outra entrada.

— Ou voado para a janela — Calú disse — Não é, Magrí?

— Exatamente!

Os outros dois se limitaram a ficar quietos, seguindo o caminho de volta para o corredor da escola de onde tinham saído. Subiram as escadas para o segundo piso e já iam averiguar em uma das salas, quando...

— Ali! Lá vai ele!

Calú dessa vez foi o que viu primeiro, e já foi sacando a raquete elétrica como se fosse um cowboy, mas Miguel gritou pedindo para ele esperar antes de machucar alguém, correndo atrás dele.

Magrí e Crânio, que tinham ficado para trás, tentaram seguir os dois amigos até o segundo andar, porém os perderam de vista.

— Para onde eles foram?

— Não faço ideia, Magrí — Crânio iluminou o corredor deserto com a lanterna — Talvez eles entraram em uma das salas.

Os dois Karas, tentando ao máximo não fazer barulho — pois já era uma sorte grande nenhum segurança ter entrado na escola ainda — olharam as salas de aula vazias procurando Miguel e Calú. Passados alguns minutos, Crânio suspirou:

— Isso tudo é uma perca de tempo. Deveríamos bolar um plano, como Miguel havia dito na reunião.

Magrí mordeu o lábio.

— Eu não consegui vê-lo direito, nem chegar perto o suficiente...

— Agora temos certeza de que se trata de uma pessoa, certo? Eu vi os pés pela luz da lanterna. Era um pivete.

A menina cruzou os braços ao encarar ao amigo.

— Ainda não podemos descartar a outra hipótese, Crânio! Por que você está tão relutante em levá-la em consideração?

O garoto massageou os têmporas e falou o mais suavemente possível.

— Olha Magrí, não me leve a mal. Mas essa sua ideia e do Calú me parece bem absurda.

Antes que ela fizesse objeções, Crânio tentou explicar:

— Consideremos que seja um fantasma de verdade: ele não vai aparecer como nos filmes, é possível dele assumir a forma que quiser, e muito provável que esteja preso a este lugar por algum motivo qualquer. Fantasmas não são nada mais, nada menos, do que almas presas. Vocês pretendem “capturar” um alma penada com secador de cabelo e uma raquete elétrica?!

Magrí sorriu.

— Ah então você admite que fantasmas existem? Pois é exatamente isto que eu ia dizer!

— Err bem... — O garoto percebeu que foi pego em contradição — Não acredito que seja o nosso caso...

— Veremos, então. Mas para quem não estava me levando a sério — ela provocou — Você está muito bem informado do assunto.

Crânio corou furiosamente e pigarreou, murmurando que tinha lido o máximo que conseguiu sobre fantasmas naquelas últimas horas, pois era ignorante do assunto. Magrí sorria ainda mais para o amigo, e pensou como ele ficava fofo quando sem graça.

Calú e Miguel tinham saído de novo do prédio da escola e foram parar na entrada do pátio.

— Não acredito que perdemos ele de novo! Eu quase o alcancei dessa vez!

Miguel ofegava.

— Acho melhor irmos para o plano B. Não adianta nada corrermos pela escola inteira como baratas tontas.

Calú desligou a raquete elétrica amuado.

— Este fantasma é muito mais esperto do que aquele que eu vi quando eu era criança na fazenda do meu avô!

Miguel levantou uma sobrancelha:

— Você tem certeza que não era alguém pregando uma peça?

— Era sim um fantasma, Miguel, eu tenho certeza! —Calú passou a mão pelos belos cabelos — Meu avô dizia que a fazenda era assombrada pelos antigos donos, e ele também já viu o fantasma da antiga patroa zanzando pelo jardim. Quando eu contei a ele que tinha visto um homem flutuando nos corredores da casa, ele riu e disse que era um velho conhecido. Acredite em mim.

O líder dos Karas sorriu amarelo tentando levar o amigo a sério, mas estava sendo muito difícil, pois o achava muito supersticioso.

De fato, Calú era mesmo supersticioso, principalmente quando estava prestes a subir ao palco. Ele se recusava a entrar em cena se alguém não desejasse merda para ele ou se calçasse as meias primeiro pelo pé esquerdo (“dá azar demais!” dizia). Ou ainda no dia que ele apareceu numa reunião dos Karas muito aflito por ter quebrado sem querer o espelho do banheiro. Passar por debaixo de escada? Cruzar com um gato preto? Nem pensar para o garoto.

Miguel desistiu por um tempo de dar mais razão ao amigo, e tentar provar a ele que aquilo tudo era crendice que as pessoas inventavam. Esperava, porém, que aquela fosse uma oportunidade.

— Vamos procurar Crânio e Magrí para executarmos nosso plano — disse — Não podemos abusar da sorte de não termos sido vistos pela segurança.

“Precisamos inventar um código de comunicação dos Karas o mais rápido possível”, pensou Miguel.

Os dois voltaram para o prédio na mesma hora que Crânio e Magrí desceram para o térreo. Miguel dirigiu-se a garota.

— Magrí, você sabe se tem alguma rede nos equipamentos esportivos da escola?

— Humm... Acho que tem uma rede velha sobrando lá no quartinho. Quer que eu vá buscar?

— Por favor, e não demore.

A garota acenou e foi correndo em direção ao ginásio. Crânio franziu a testa.

— Qual é o seu plano, Miguel?

O garoto encarou os dois amigos.

— Bem, temos que segurar o moleque de alguma forma da próxima vez que ele aparecer — olhou para Calú — Ou o tal fantasma.

— Dá para deixar a rede no chão, mas nós seguramos as pontas — Crânio sugeriu.

— Exato, pensei a mesma coisa — Miguel coçou a queixo — Podemos nos esconder nas portas das salas de aula e esperar ele aparecer, daí jogamos a rede nele. É perfeito.

Em instantes, Magrí voltou com uma rede enorme nos braços e ficou a par dos planos dos meninos. Ainda estava desconfiada sobre a natureza do tal fantasma, mas não disse nada. Rapidamente, eles armaram a arapuca no corredor onde o fantasma apareceu.

Esperaram... E esperaram...

Até que um vulto apareceu no corredor. Miguel acenou rapidamente e os garotos puxaram e jogaram a rede em cima do fantasma. Magrí acendeu as luzes do corredor e já estava com o secador de cabelos nas mãos como se fosse uma arma.

Miguel, Calú e Crânio cercaram o “fantasma”, que parecia estar usando um lençol de cama. Em instantes, por debaixo do lençol apareceu uma carinha vermelha, com um sorriso banguelo.

Chumbinho! Que diabos você pensa que está fazendo?

— HA! Enganei vocês direitinho, né Miguel? Até convenci a Magrí-magricela e o Calú que eu era um fantasma de verdade! Ha Ha Ha!

“E confirmei minhas suspeitas de que vocês são mesmo organizados. Agora preciso saber se vocês têm códigos secretos”, pensou o garotinho.

Magrí ficou vermelha e puxou a orelha do garoto que se encolheu.

— Você me paga por isso, seu pivete!

Crânio ria da cena, enquanto Calú encarava o pequeno Chumbinho com raiva. Miguel tirou o garoto das mãos de Magrí.

— É melhor você ir para casa agora, mas vou ter que reportá-lo amanhã para a orientadora assim que você chegar, Chumbinho! Por que você fez isso?

O garoto suspirou e deu de ombros.

— Só estava me divertindo, oras!

Os Karas, por fim, arrumaram a bagunça que fizeram e escoltaram Chumbinho para fora do prédio do Colégio Elite.

Quando já estavam saindo, porém, uma coisa esquisita aconteceu. Calú parou encarando o corredor escuro atrás dele.

— Que barulho esquisito é esse?

Os outros também pararam.

— Não sou eu dessa vez, eu juro!

— Quieto, Chumbinho! — Miguel ordenou — Tem alguma coisa nos seguindo...

De fato, algo sem forma se movia no escuro se aproximando dos garotos. Num gesto automático, Magrí empunhou o secador de olhos arregalados e Calú levantou a raquete já ligada. Crânio iluminou com a lanterna o corredor.

— Não estou conseguindo ver o que é...

A coisa já estava muito próxima, chegando até onde eles estavam.

— Vamos dar o fora daqui! Agora! — gritou Miguel.

Assustados, os cinco correram o mais rápido que conseguiam. Magrí ligou o secador de cabelo e o apontou para cima, além de sua cabeça. Sentiu que pegou em alguma coisa, tanto que deu um pulo sem jeito para frente, quase trombando com Crânio. O garoto a puxou pelo punho para que corresse mais rápido. Calú acertou com a raquete na coisa estranha antes de chegar ao portão dos fundos da escola.

Os Karas, com Chumbinho, ofegavam e suavam pela aventura. O menor deles estava com o coração aos pulos e as pernas bambas, muito amedrontado, por mais que tentasse esconder dos outros. Magrí sussurrou para Crânio de forma triunfante e risonha:

— Eu e Calú estávamos certos, afinal de contas! Havia um fantasma de verdade! Enquanto você e Miguel estavam errados achando que era só um aluno!

Crânio abriu e fechou a boca indignado:

— Mas era só o Chumbinho! E nem temos provas do que era aquilo que nos seguiu!

Magrí riu e bateu as mãos com a de Calú, que também ria da cara dos outros dois amigos.

— Ha Ha! E ponto para nós, Magrí!

Miguel revirou os olhos, mas sorriu para seus amigos.

— Ok, melhor nós sairmos daqui. Rodízio de pizza agora, eu pago dessa vez. Você pode vir também, Chumbinho, se quiser. Deve estar com fome.

Os outros o fitaram como se nunca o tivessem visto na vida. Calú riu mais ainda:

— É sério mesmo? Poxa, chefinho, se eu soubesse que só bastava te dar um susto para você pagar um rodízio de pizza, eu tinha feito isso antes!

Todos riram, até mesmo Miguel e sumiram pelo quarteirão.

No dia seguinte...

— Poxa, Dudu. O Alfredo está estranho hoje, você não acha?

— É, ele parece que teve uma luta noite passada. Olha o estado das asas dele, Fred!

— Acho melhor o levarmos para o médico...

Os garotos encaravam o morcego Alfredo, encarapitado num galho de árvore, assustado demais para sair voando de novo pelo Colégio Elite...

***

Alguns anos depois, em 1995...

— Kara, eu ainda dou muitas risadas daquele dia que fomos “pegar fantasmas”! — Crânio riu enquanto bebia do conteúdo seu copo — Você e a Magrí têm uma imaginação muito esquisita!

O outro rapaz, sentado à frente do amigo riu com gosto. O barzinho onde jogavam conversa fora, depois de muito tempo sem se verem, era frequentado mais pelos alunos do MIT.

Quando parou de rir, Calú indagou pensativo:

— Mas agora, o que você vai fazer com essa história de ficar aqui nos EUA? E a Magrí?

O ex gênio dos Karas tirou uma caixinha de veludo do bolso da calça com pesar. Calú arregalou os olhos.

— Você ia...? — indagou — Mas e a pesquisa?

— Não sei se vale a pena o sacrifício, Calú — Crânio fitava a caixinha com um olhar distante.

Quando encarou de novo o amigo de infância, havia um temor nos olhos do rapazinho que deixou Calú preocupado:

— Eu vou pedir Magrí em casamento, Calú. Só não sei será fácil eu deixar os Estados Unidos e se isso custará a minha vida...


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