Quando eu disse a Will que “é sempre bom ter reforços caso algo aconteça”, eu não esperava que um reforço fosse ser realmente necessário. Eu e Kevin ficamos esperando no carro enquanto William ia chamar a irmã. A garota – Stacy - veio correndo falar com Kevin sobre o fato dele ser um Guardião. O que ela tem de empolgação sobre o mundo mágico, seu irmão tem de desentendimento e quase desistência em tentar compreender. A menininha tinha uns 13 anos, mas aparentava ser um pouco mais jovem. Ela usava os cabelos loiros presos em um rabo de cavalo, deixando apenas uma franja cair sobre sua cara. Seus olhos eram verde-mel e ela tinha várias sardas em seu rosto. Eu tenho a leve impressão de que, o que ela tem de fofa, tem de travessa. Mas prefiro esperar o dia passar antes de dar o veredito final.

Pouco tempo se passou até Will aparecer com outra garota - Natasha. A menina era bem bonita. Deveria ser tão alta quanto Sky. Sua pele era morena e ela tinha longos cabelos pretos cacheados. Seus olhos eram escuros, mas tinham um brilho único. Ela se aproximou com um sorriso e nos cumprimentou. Tudo ia bem. Kevin estava quase entrando no carro para ir buscar a namorada e nós quatro nos afastamos lentamente do carro. De repente, um raio veio a toda velocidade por trás de nós, e Kevin avançou em nossa defesa. Eu acabei gritando em desespero: “Kevin, não!”, ao vê-lo sem a máscara. Na hora eu nem tinha percebido como só havia piorado a situação. Depois disso, Will e Kevin ativaram os trajes. Thea e Paloma surgiram do nada e eu tive que levar Natasha e Stacy pra longe. Nos escondemos atrás de uma casa na esquina, tentando evitar o conflito:

— Perai - a loirinha logo perguntou - Quem são aquelas três?

— Resumo: as três são do mal, Kevin e Will do bem. - Respondi.

Ela assentiu e continuo a olhar a batalha admirada.

Eu precisava pensar. Will e Elize estavam no telhado, Will com notável dificuldade em acerta-la.  A pergunta era: por quê? Ele já tinha maior controle sobre suas habilidades agora. Podia lutar melhor, mas ainda assim, ele parecia não conseguir se manter no controle da situação. Olhei mais fixamente. Elize se aproximou ao máximo, e Will tacou-lhe um raio. Mas este não a afetou, em vez disso, um brilho se iluminou ao redor da garota: um campo de forca, conclui. E este só poderia estar sendo sustentado por Paloma. Nós realmente temos que começar a trazer Jason nessas lutas.

 A garota lançou Will longe, no telhado do vizinho, que era a casa na qual estávamos escondidos (na parte de trás, claro). Eu precisava tirar as duas dali e ajudar Will ao mesmo tempo. Se eu conseguisse distrair a Feiticeira do Sul, daria uma chance para Will e Kevin atacarem:

— Certo, é o seguinte, eu preciso ir até aquela garota ali - disse apontando para a Feiticeira - Vocês duas precisam sair daqui.

— Ahh, mas eu queria ver a luta... - Stacy protestou.

— O nome é Jack, né? - a morena me perguntou - Pelo que entendi, a garota contra quem Will está lutando está imune a seus poderes. E essa força está sendo fornecida por aquela menina - ela apontou para Paloma.

— Como soube? - perguntei surpreso com sua capacidade de dedução.

— Você precisa parar a tal garota, mas você não tem poderes. Nós também não. Significa que estamos em pé de igualdade, e eu quero ajudar. - Ela disse firmemente.

— Olha, eu treinei combate toda a minha vida. “Pé de igualdade” não é a melhor definição. - Devolvi.

— Eu tenho uma amizade com Will equivalente a uma vida. E eu não desisto de lutar por meus amigos. Nunca! - Ela respondeu decidida.

Com um forte suspiro me virei para ela:

— Eu não vou conseguir te convencer do contrário, né? - Ela apenas fez que não com a cabeça - Você tem alguma habilidade especial?

— Tenho uma ótima mira. Eu estava no time de arco e flecha da escola.

— E você? - Perguntei a Stacy.

— Ah, eu não quero lutar. Só quero ver o resto do povo apanhando - A garota respondeu.

— Certo. Eu distraio e você ataca por trás. - Disse a Natasha.

Tirei a jaqueta, onde eu sempre carrego duas espadas nas costa e entreguei uma a Natasha. A garota assentiu e deu a volta na casa, preparando-se para pegar Paloma de surpresa:

— Eu posso ganhar uma arma também? - a irmã de Will perguntou.

— Pode cuidar dessa pra mim enquanto isso. Quando eu pedir, a jogue para mim, ok? - lhe disse.

Ela abriu um enorme sorriso:

— Quer dizer que eu vou poder ver a luta?

Apenas fiz que sim com a cabeça e sai de trás da casa, correndo em direção a Paloma. Vi Kevin e Thea atrás do carro. O garoto tinha acabado de levar uma onda de sombras e ter sido lançado longe. Segui correndo:

— Paloma! – chamei.

A garota se virou calmamente:

— Quem me chama? - Ela disse com o sorriso de sempre.

No mesmo tempo em que ela se virou, o teto da casa em que Will estava quebrou. Will foi lançado para cima por um raio, mas se recuperou rapidamente e se levantou. Ele e Elize retornaram para o topo telhado, onde o Guardião tentava mantê-la afastada lançando vários raios em sua direção.

— Como eles te acharam? - Perguntei.

— Você veio desarmado até aqui para me perguntar isso? - Ela disse criando um campo de força nas mãos e o lançando em mim.

Fui lançado até a parede da casa, de onde avistei Natasha se aproximando por trás:

— Eles foram até a Argentina me buscar - ela veio caminhando até mim - Agora, uma pergunta que não quer calar. Quem é você?

— Eu...? - Disse enquanto Natasha chegava por trás, se aproximando silenciosamente da feiticeira - O nome é Jack. Mas pode me chamar de “o cara que que acabou com seus planos”.

Ao dizer isso, a garota se virou confusa. Natasha lançou a espada na direção de Paloma, acertando-lhe a mão. A feiticeira urrou em dor enquanto se ajoelhava no chão:

— Stacy, agora! – Gritei.

A menina jogou a espada pelo chão. Eu a recolhi e a finquei na roupa de Paloma, prendendo-a ao solo:

— Agora temos que sair daqui - disse às duas, que vieram correndo até mim.

Nós três saímos de cena, indo em direção ao carro. A esse ponto, o feitiço ao redor de Thea já havia se anulado e Kevin a lançou longe. Os dois se afastaram do carro. Eu me abaixei e recolhi a chave que Kevin havia deixado cair mais cedo. Stacy pulou no banco traseiro e eu no do motorista. Natasha entrava apressadamente no do passageiro, quando escutei Paloma gritar:

— Isso não vai acabar assim! - Com a mão que estava livre, a garota lançou outra bola feita de campo de forca em nossa direção.

A magia ia acertar Natasha em cheio, mas a garota colocou as mãos na frente do rosto em defesa, enquanto gritava em pavor. Daí, a coisa mais bizarra que poderia ter acontecido, aconteceu. O carro voou no ar, literalmente. As rodas pararam de tocar o chao, o veiculo deu uma volta por cima da cabeca da garota e parou com o teto virado para Paloma, na frente de Natasha, protegendo-a do ataque:

— Jack? - Stacy gritou em desespero ao ver a magia de Paloma acertar o carro e nos lançar para trás.

O automóvel rolou no chão pelo menos três vezes e parou de cabeça para baixo. Os vidros se quebraram por completo, cortando a mim e a Stacy.  Os airbags foram acionados, o que me deixou com menos espaço para me locomover. A menina tossiu fortemente enquanto eu soltava o cinto e saia pela janela do carro. Virei para trás e vi lágrimas em seus olhos, e uma expressão de pânico em seu rosto. Dei a volta no veículo rapidamente, tentando alcançar a porta de trás e tirar a menina lá de dentro:

— Stacy, me dá a mão - eu disse tentando alcançá-la pela janela quebrada.

A garota virou sua cabeça para mim lentamente. Seus olhos estavam completamente brancos. Sua expressão era séria, diferentemente do pavor que havia em seu rosto segundos atrás:

— Stacy? - perguntei preocupado.

Ela balançou a cabeça em negação:

— Eu consigo ver - a menina disse.

— Stacy, me dá a mão. Eu vou te tirar daqui. - Voltei a repetir.

— Não há escapatória - ela tornou a dizer - Eu vejo com clareza agora.

— Vê o que?

— Eu vejo a escuridão e eu vejo a morte. Eu vejo arrependimento e desespero no abismo do inferno. Não há escapatória, estão todos condenados. O fim do mundo está próximo, pronto, todos seremos testados.

 Ao dizer isso, a menina soltou um alto e agudo grito. Tapei meus ouvido por impulso. O grito penetrava minhas orelhas como se fosse a voz de almas penadas. Quando finalmente parou de gritar, os olhos da menina voltaram a ficar verdes e ela caiu para frente inconsciente.

Apressei-me em tirar-lhe o cinto e puxa-la pelo braço para fora do carro. Apoiei sua cabeça no chão enquanto tentava acorda-la:

— Stacy? Você está bem? Stacy!

— Jack! - Kevin pulou na minha frente, lançando um raio de luz contra a magia Thea que vinha em minha direção.

Olhei ao redor, tentando compreender o que havia perdido nos últimos minutos em que tentava salvar a garota. Natasha estava jogada no chão. Paloma estava livre das espadas e ia caminhando na direção da menina. Will pulou do telhado e acertou Paloma. Elize estava ferida no teto. Possivelmente após a magia de Paloma ter sido anulada, Will empatou a luta e venceu Elize, deixando-a quase nocauteada no chão. Depois de acertar Paloma, ele pegou Natasha em seus braços e veio correndo até nós. Do meu lado esquerdo, Kevin se encontrava de pé, após ter bloqueado a magia da Guardiã das Sombras. Esta estava parada mais a frente, com o ódio de sempre em seus olhos. Ela deveria estar perdendo para Kevin e lançou seu poder em mim para ganhar tempo, já que o loiro viria até nós com o intuito de nos proteger.

— O que aconteceu? - Will chegou até nós, colocando Natasha delicadamente no chão.

— Eu é que pergunto. – Devolvi.

— Eu só vi um carro voando. Depois disso Natasha correu para frente tentando ajudar e Paloma a lançou longe - Will respondeu.

— Pessoal? Odeio ter que interromper a conversa, mas temos problemas - Kevin nos chamou.

Paloma havia se recuperado do choque de Will e tele transportado Elize para seu lado. As duas caminhavam lentamente até nós. Elize, particularmente, reunindo energia nas duas mãos e mirando um olhar assassino em Will. Thea entrou nas sombras e pulou da sombra de Elize. As três pararam lado a lado, com suas respectivas magias a seu redor:

— Algum plano? - Will perguntou desesperado.

Eu respirava pesadamente, tentando raciocinar. Mas nenhuma ideia me ocorria.

— Eu e Will cuidamos delas enquanto você leva as duas ao hospital. - Kevin cortou meus pensamentos

— Duas? - Nessa hora, Will se virou e viu sua irmã desmaiada no chão. Com um corte na testa, seu rosto sangrando e cheia de feridas no corpo. - O que aconteceu com ela?

O garoto me perguntou ainda mais preocupado do que antes.

— Will. Ela vai ficar bem. Temos que segurar essas três para que Jack as leve em segurança. - Kevin tentava acalma-lo

— E o que você espera? Que eu carregue as duas e corra para o hospital ao mesmo tempo? – perguntei - Eu não consigo.

Os outros dois se desesperaram por completo. A esperança parecia ter nos abandonado. Lembrei de quando estávamos todos juntos na casa dos inimigos. Todos os Guardiões enfileirados, dispostos a lutar até o fim. Mesmo sabendo que seria inútil. Mas naquele momento, quando tudo parecia perdido, uma Guardiã surgiu de um portal e nos salvou. Eu adoraria dizer que essa história se repetiu e que fomos salvos por um Guardião. Mas seria mentira, pois dois apareceram.

Um carro surgiu ao nosso lado. Dentro dele saíram Sky e Deuce, com suas roupas já vestidas:

— Alguém precisa de reforços? - Sky brincou jogando-me a chave do carro.

— Vocês não tem ideia do quão feliz eu estou em ver vocês! - Kevin disse aliviado.

— Nem precisa - Deuce respondeu invocando seus cipós.

Suas mãos miravam no chão abaixo das Guardiãs e de Paloma. Os cipós envolveram Elize e a Feiticeira. Mas Thea se escondeu nas sombras e escapou. A garota reapareceu na minha sombra. Eu gritei pelo susto que levei e me abaixei, deixando o caminho livre para que Kevin a acertasse com um raio de luz.

— Jack. Você e Will levem as feridas para o hospital. Nós três assumimos daqui - Deuce disse após analisar a situação.

Eu assenti e peguei Stacy em meus braços. Enquanto Will agradecia aos dois e carregava Natasha. As colocamos no banco de trás. Will entrou com elas e ajustou o cinto. Eu pulei no banco do motorista e girei a chave. Pisei fundo no acelerador e dei ré com o carro. Manobrei e consegui chegar até a rua principal. Olhei pela janela uma última vez, de onde via Deuce, Sky e Kevin seguirem lutando. Olhei para trás, e vi Will com lágrimas tentando acordar as outras duas. Sinto que Will precisa mais de mim nesse momento. “Boa sorte!”, eu pensava comigo mesmo desejando que os outros três fossem bem sucedidos nessa batalha. Girei o volante e fui o mais rápido que podia em direção ao hospital, na esperança de que Stacy e Natasha fossem ficar bem e de que Kevin, Sky e Deuce não fossem vencidos pelas forças opostas.