A figura se ergueu forte. Grandes músculos, olhar ameaçador e estatura enorme. Olhava Daniel de cima, como se ele fosse um verme qualquer. O coiote tirou o braço que envolvia Suri, fazendo-o estremecer de frio. O pequeno demorou alguns segundos para ver a ameaça que se erguia a sua frente, e automaticamente se encolheu contra a parede. Daniel se levantou conseguindo esconder bem a dor que sentia... E gargalhou.

Ele até tentou segurar o riso, mas simplesmente não conseguia conte-lo ao encarar a criatura estranha a sua frente. Não importava quantos músculos aquilo tivesse ou quanto apertasse as sobrancelhas, era incrivelmente cômico para Daniel.

―Meu Deus ― Daniel tentava falar entre os risos ― O que fizeram com você?

O homem que os encarava tentava entender o motivo da risada irritante que vinha do coiote, Suri viu o motivo assim que conseguiu ver o rosto dele. Ele não tinha pelos. Quer dizer, ele tinha um cabelo normal, castanho e sujo, mas o resto do rosto não tinha, além do focinho ser deformado num formato estranho. Suri estranhou isso, nunca tinha visto alguém como ele, mas ao contrario de Daniel, aquilo só o fez ter mais vontade de fugir.

―Calado! ― O homem empurrou Daniel contra a parede, o fazendo calar, mas sem tirar o sorriso de deboche.

―O que? Não vai me culpar por terem te tirado os pelos, né? ― Os olhos de Daniel se arregalaram numa falsa supressa ― Ou vai dizer que já nasceu assim? Que dó!

―Como ousa me zombar assim, monstro?

―Monstro? Assim você me ofende. Sou apenas um pobre trabalhador honesto que por causa de... Mal entendidos veio parar nesse lugar junto do meu protegido. ― Suri não esperava ser chamado assim, se bem que ''protegido'' soava melhor que ''escravo'', qualquer palavra soava melhor na verdade. Ele já não lembrava tão bem assim das palavras do pai, mas tinha certeza que já o ouvira falar algo a respeito de escravos... Nunca se submeter a alguém em troca de nada. Então ele começou a se questionar se estava ganhando algo obedecendo Daniel, no momento não.

Ele parou de prestar atenção na conversa do coiote e do cara estranho. Ele apenas se sentiu estranho, como se estivesse esquecendo algo importante, que deveria lembrar urgentemente. Mas nada vinha na cabeça. Tinha prometido que ia se cuidar para o pai, isso lembrava perfeitamente, mas havia prometido outra coisa. O que? O que? Sua cabeça já começava a doer.

Apenas ''acordou'' quando viu um Daniel bravo o abraçar, Suri encarou a luz amarelada que vinha da janelinha, indicando que já estava anoitecendo e Daniel o dando permissão pra dormir. Aconchegou-se, usando o maior de travesseiro e dormiu.

Sem sonhos.