Ponto Final escrita por Lize Parili


Capítulo 1
Último dia de aula




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Era verão, a tarde estava quente e os corredores da escola já estavam vazios. Os alunos estavam reunidos no pátio, fazendo o tradicional arremesso de cadernos, afinal, eles tinham concluído o Ensino Fundamental. No ano seguinte eles seriam calouros do Ensino Médio. Para os professores e funcionários que viam aquela bagunça, aquilo nada significava, mas para aqueles jovens era como dar um passo para o mais longe possível do "ser criança" e se aproximar um pouco mais do "ser um jovem quase adulto". Apenas um jovem casal ainda permanecia num dos corredores. 

— Eu sei que nós dois nos damos bem, Ken, mas não temos nada a ver um com o outro. — disse, Lynn, ao seu colega de turma.

Apesar de terem a mesma idade, 15 anos, com seus 1.60 metro de altura, roupas que ainda eram escolhidas pela mãe e feição mais infantil que os garotos da sua idade, Ken parecia ter uns 13 anos.

— Nós nem gostamos das mesmas coisas.

— M-Mas eu pensei que agora que o Viktor se formou e está indo para a Universidade na Inglaterra você pudesse me dar uma chance. — o coração do garoto batia forte por aquela menina de 1.60 m, cabelos longos e castanhos, quase no mesmo tom que seus olhos, magra e de busto nem médio nem pequeno, na medida certa para seu biotipo. — E-Eu te amo tanto que faria qualquer coisa para te fazer feliz.

No 5ème - 7º ano do EF - Ken perseguiu tanto a Lynn que ela se cansou e passou a evitá-lo como o diabo evitava a cruz, até porque, ela era apaixonada pelo filho do chefe do seu pai, Viktor, 4 anos mais velho e capitão do time de Voleibol do colégio particular que ficava a poucas quadras da escola pública que ela estudava. Lynn não queria que ninguém fizesse suposições sobre Ken e ela, com medo de que isso atrapalhasse suas chances com o atleta.

Apesar de, na época, ter 13 anos, Ken era imaturo e infantil demais, e por isso não percebia o quão chato e grudento era. Mas o tempo passou e ele mudou. Apesar de ainda amar a colega de turma deixou de persegui-la, fazendo-a saber dos seus sentimentos através de pequenos gestos, como se preocupar quando ela parecia triste ou preocupada com algo ou quando se machucava no treino de Educação Física, e lembrar dela em momentos especiais, como Natal e aniversário. Ele sempre enviava um pequeno cartão mostrando que se importava; cartões estes que ela jogava fora sem ler.

Ken só parou de demonstrar totalmente seus sentimentos quando Lynn começou a sair com o Viktor, no último inverno. Para o jovem rapaz o último semestre do Collège foi longo e triste. Mas ele nunca perdeu as esperanças, pois via que Viktor não parecia apaixonado. Ele esperou e quando o romance do casal acabou, decidiu se arriscar.

— Olha, Ken. O fato de ele estar indo embora não muda o fato de eu não gostar de você deste jeito. Nós dois nem somos "tão amigos". Somos apenas colegas de classe que se dão bem. — desdenhou sutilmente, magoando-o,— Além do mais, olhe para você. — medindo-o de cima a baixo. — Não que eu esteja me desfazendo, não é isso, mas... você não é o meu tipo. Eu gosto de garotos altos, atléticos...

— Como o Viktor. — interrompeu-a, comparando-se ao atleta, com o coração descompassado, mais lento que o normal, tamanha sua tristeza.

— Sim. Como o Viktor.

— Mas ele nem quis te namorar sério. Só te enrolou durante este semestre todo. — comentou, lembrando das vezes que a garota foi atrás do affair na frente da outra escola e nem mesmo sua mão ele segurava, deixando-a muitas vezes no "vácuo" até de um simples beijo, pois mesmo um simples selinho só quando ele queria e ainda assim, longe do colégio e dos amigos dele.

— Ele não queria compromisso sério com ninguém, Ken! Ele estava voltado ao time e aos estudos por conta da Universidade. — admitir para os outros que o garoto por quem era apaixonada, super popular entre as garotas da cidade, considerado o melhor capitão da liga de Voleibol estudantil, só a via como uma amiga e que ele curtia ficar de vez em quando, mas sem nenhum tipo de apego, estava totalmente fora de cogitação. Doía saber que foi só curtição e ela não ia demonstrar que estava por baixo para ninguém.

— Eu nunca te trataria como ele te tratou. Eu nunca esconderia de ninguém que você "é" minha namorada.

— Você fala como se um dia isso fosse acontecer. Para de sonhar e se enxerga, Ken! Eu posso não ser a Miss França, mas sou muita areia para o seu caminhãozinho! — desdenhou novamente. — E quer saber do que mais, essa conversa já deu! — aborrecendo-se com o rapaz, pois ele havia cutucado uma ferida ao esfregar na cara dela, mesmo que sem ter a intenção de magoá-la, que o Viktor não a amava. — Eu não gosto de você e não quero te namorar, então, por favor, não insista mais. — dispensando-o grosseiramente.

— V-Você poderia pelo menos me dar um beijo? — pediu, sem um pingo de orgulho próprio, levando outro não, acompanhado das costas da garota, que foi embora sem nem mesmo olhar para o farrapo de garoto que ficou para trás.

Ken nunca imaginou que o amor pudesse doer tanto. A vida real não era como nos livros que ele estava acostumado a ler, tampouco como nos filmes de fantasia que ele tanto gostava; ele não era um guerreiro medieval e muito menos Lynn uma elfa. Ele sabia que ela sofria pelo astro do vôlei escolar e até que tinha certo ressentimento dele pela época em que ficava no pé dela como um chiclete barato, mas nada daquilo dava a ela o direito de ser cruel com ele.

— C-Custe o que custar, eu vou te arrancar do meu coração, Lynn! — foi a promessa que o jovem nerd proferiu a si mesmo enquanto enxugava as lágrimas que não paravam de lavar sua face e molhar seus óculos de grau elevado, cujas lentes grossas e pesadas fizeram a armação criar uma marca no seu nariz bem feito, que só não era notado pelo design grosseiro dos óculos que ofuscavam o brilho e a cor de um par de tristes olhos verdes como duas safiras.

Durante todo o caminho da escola para casa o rapaz chorou e ao ser recebido pela mãe não conseguiu esconder sua tristeza. Ela nem perguntou como havia sido o último dia de aula. Ela sabia do seu amor pela colega de escola; ela o incentivou a se declarar; ela o consolou, com um duplo aperto no coração, pois o esposo, Tenente do exército francês, especialista em veículos terrestres, já havia enviado os documentos do filho para a escola militar secundária do exército.

Embora a carreira militar não fosse imposta aos membros daquela família, estudar em escolas militares era inevitável. O pai do rapaz, Giles e seus 2 tios, filhos de um oficial da Aeronáutica, foram Crianças da Tropa e alunos de escolas militares desde o 6ème[1], chegando à faculdade militar. De todos os jovens daquela família, apenas Ken e uma prima não cursaram o Collège na escola militar. Porém, como a escola militar para eles era mais que uma ótima formação, era praticamente uma tradição, não tinha como escapar do Lyceé militar.

Para os homens daquela família de militares, a escola militar era o local perfeito para transformar garotos em homens. E Ken era o mais frágil dos garotos daquela família, resultado dos mimos por ser o caçulinha entre todos os primos. E como ele não tinha a menor vontade de seguir a carreira militar, o pai é que acabou decidindo para que escola ele iria.

***

— Então nós temos um acordo. Você ficará 1 ano no colégio militar. Se você se sair bem, voltamos a conversar sobre o assunto e poderá escolher se deseja continuar lá ou voltar para a escola civil, claro, desde que seja uma escola que lhe ofereça uma boa formação. — prometeu o homem de calça militar camuflada e regata verde oliva ao seu unigênito enquanto amarrava o cadarço do seu coturno. — Mas se o resultado for o contrário, você ficará na escola militar até se formar!

Aquele garoto franzino de cabelo arrumadinho com gel, terno azul e gravata borboleta presa a gola da camisa social branca, respirou fundo enquanto deglutia sua própria saliva, pensando se conseguiria se superar durante o próximo ano letivo, pois o colégio militar era um mistério para ele, que o pouco que conhecia era pelas histórias contadas por seu pai, tios e avô, todos militares e ex-alunos de escolas militares, e por seus primos mais velhos, e estes adoravam colocar medo em qualquer um que tinha apreço por sua integridade física.

— Arruma essa gravata, Kentin! Não é porque o seu par da formatura é a sua prima que você vai aparecer na festa todo desleixado. — o Tenente, como todo militar, era um homem asseado. Era praticamente impossível encontrar um amassadinho que fosse nas suas fardas ou nas suas roupas civis, salvo quando estava fazendo a manutenção dos veículos militares, sua paixão.

 

 

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Notas finais do capítulo

[1] Os jovens podem iniciar na escola militar a partir do 6º ano, cursando o Ensino Fundamental 2 e o Médio, e se for do interesse, podem estudar em alguma faculdade militar e seguir carreira, como oficiais.



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