retr(atos) escrita por Lyn Black


Capítulo 9
FRAGMENTO 9 - Safo NOTT


Notas iniciais do capítulo

A boa filha a casa retorna, não é mesmo?
Pessoal, mil desculpas pela demora, esse mês passado foi super enrolado pra mim, mas graças a linda Morgana estou de férias (AMEM) e passei hoje o dia preparando esse capítulo, que está até maior :D
Boa leitura e nos vemos nos comentários, combinado?



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FRAGMENTO 9 – Safo NOTT

(um chá a tarde é o mínimo que uma boa filha pode fazer)

 

O reflexo de seu corpo petit nas grandes portas envidraçadas causa certo nervoso na boca do seu estômago. Há um pouco de vento e o céu nublado faz uma tonalidade azul esbranquiçada recair nos arredores da mansão. Com três andares espaçosos, a construção sempre se destacou bem no horizonte mais distante das aglomerações, com seu pórtico de mármore com longas pilastras com pedras azuis lapidadas e incrustadas. A porta principal, onde Safo encontrava-se alisando a saia de pregas roxa, era acessível através de uma longa escadaria com exatos sete degraus, alinhados ao sul como se diz ser o melhor posicionamento segundo as superstições mágicas para potencializar a maturação de poções lunares.

A Nott tinha memorizado cada detalhe da fachada: o telhado de laje cinza azulada, as janelas largas e brancas, com uma variação leve em cinzas claros e escuros, as inscrições em sangue de unicórnio nos fundos da casa, uma tradição da família que lhe causara certo nojo quando tinha seus sete anos e insistira por dois meses até seu pai explicar a razão dos símbolos. Ela conseguia visualizar ainda de lá, a janela mais afastada a direita entreaberta, permitindo que a cortina cintilante azul balançasse suavemente, seu antigo quarto, um pequeno paraíso.

Safo teve seu fluxo de recordações e observações interrompido pelo girar extremamente delicado da maçaneta, por onde a figura sutilmente encurvada do mordomo-chefe da casa apareceu:

— É um prazer recebê-la novamente na casa de vossos pais, Srta. Nott. - ela repara como a sua face está bem mais enrugada desde a última vez que fez uma passagem formal na mansão que seus pais mantinham ao norte da Inglaterra e haviam resolvido por se instalar por esse inverno.

— O prazer é todo meu, Sr. Beaumont – ela sorri enquanto se desfaz, como costume, do casaco de peles, o qual ganhara no último Natal de seus tios, e entrega para o homem que já está com os braços esticados para receber as vestes. – Onde devo ir ter com os meus pais?

Beaumont olha-a por sob seus óculos de casca de tartaruga.

— O senhor vosso pai expressa profundas desculpas pelo seu atraso nessa tarde, deverá chegar dentro de uma hora devido a certos imprevistos ministeriais. – o tom polido e formal do senhor a quem ela estava acostumada a ter em sua vida por longos anos impressiona um tanto Safo, desacostumada por completo dos modos aristocráticos que prevaleciam ainda na mansão.

Ela assente com um balançar da cabeça, antes de enfiar as mãos nos fundos bolsos da sua saia que rodeia seus joelhos em seu tom arroxeado, quase tocando o coturno alto que usava.

— E mamãe?

Sr. Beaumont sorri minimamente:

— A senhorita me daria a honra de conduzi-la até a nova sala de estar da senhora Nott?

— Quantas formalidades, Beaumont, só me mostre o caminho logo, - comenta rindo um pouco, o que gera um brilho incontido nos olhos do velho. – faz tempo desde que lhe fiz minha última visita, erro meu, devo dizer.

O servo balançou a cabeça em negativa eloquente:

— Não se desculpe, por favor, Srta., - ele era um pouco mais baixo do que Safo, mas sua eloquência atingia alturas. – Devo avisá-la que a senhora sua mãe pede que a senhorita observe a nova decoração da ala de entrada e transmita suas opiniões para a equipe de reforma quando estiver indo embora. Eles estão alocados no térreo, depois posso conduzi-la até eles, se assim for o seu desejo.

Safo revirou os olhos minimamente, percebendo conseguir causar um riso discreto no mordomo que estava com a sua família desde que ela tinha por volta dos seus três aventureiros anos de idade.

— É claro, Renée, não se preocupe, não me esquecerei. – a garota na casa dos 20 anos jogou os cabelos para um lado, mexendo neles sem preocupação de bagunça-los. – E largue de me chamar de senhorita fora da vista de mamãe.

— Como desejar, senhorita Safo, – o divertimento acalmava os nervos da mulher. – agora melhor nos apressarmos ou a Sra. Nott ficará ainda mais impaciente.

O caminho conduzido por Beaumont foi silencioso, só os passos pesados dela ecoando ao baterem com agilidade no piso de madeira escura, enquanto ele praticamente deslizava por entre as escadas e curvas que fazia, as quais impressionavam levemente Safo antes certa de que encontraria a mãe na costumeira sala de chá no primeiro andar.

A filha única dos Nott reparou, é verdade, como as antigas pinturas, que coloriam a área destinada a visitas e reuniões sociais, haviam sido mantidas, embora em outra disposição com um papel de parede creme com detalhes ouro substituindo as paredes corais. Ela sabia estar se aproximando da sala reservada ao chá da tarde que fora convocada urgentemente na mesma manhã em uma carta que misturava drama, ponderação e um tom discreto de ameaça subentendido na assinatura e na caligrafia.

O mordomo estagnou em frente a uma das portas fechadas, em uma estrutura clássica e principesca bem divergente do gosto da menina. Ela preferiria mil vezes tomar um café no escritório do pai no último andar, mas pelo visto ela não teria muito espaço de fala naquele tópico. Ele bateu levemente na porta com sua mão enluvada, antes dela ser destrancada. Ele abriu-a, com um gesto elegante com o braço, indicando para a garota que deveria entrar. Safo crispou os lábios e sorrindo de canto para Beaumont enquanto ele se retirava e fechava a porta novamente, sentiu um incômodo nos olhos diante de tanta luz.

O piano de cauda branca tocava uma melodia sozinho, enquanto Elvira Nott parecia compenetrada em tocar o violino com habilidade e destreza, de costas para a porta e voltada para a janela escancarada, com as cortinas esvoaçantes. Quase como se houvesse se esquecido do encontro, afirmação refutável uma vez que o chá parecia já estar encaminhado na mesinha de centro, esta rodeada por sofás de estofado rosa claro e violeta.

— Bom te ver também, mãe. – ela comentou causando uma interrupção súbita, embora prevista, da música que a mulher mais velha conduzia.

Elvira pousou o instrumento em cima do próprio piano, permitindo uma visão de perfil de seu rosto. Safo notou a pele mais escura que a dela com algumas rugas aparecendo embaixo dos olhos, os lábios esticados e num rose pintados em harmonia com os crespos cabelos pretos presos num meio-rabo por uma presilha brilhante. A Nott podia não usar os vestidos da moda como Astória Malfoy costumava fazer, mas seu conjunto de calças brim creme e casaco de cashmere desenhado para seu corpo por um estilista particular causavam uma impressão e tanto.

A mulher sorriu para a filha com os lábios somente, encaminhando-se com passadas largas até a porta, e a embraçando com um pouco mais de força do que a simples educação indicaria. Safo escutou o sussurro baixo “Minha menina” o qual escapou dos lábios da outra, antes de elas se separarem.

— Venha se sentar, Safo, não faz bem ficar plantada na frente da porta como uma intrusa. – ela gesticulava com as mãos, seus olhos ao mesmo tempo dando relances às roupas da filha, tão diferentes do que ela usava quando estava sobre a tutela legal da família. – Inovou o guarda-roupa?

Safo sorriu até levemente sem-graça diante do olhar flagrante.

— Ah, não é nada demais, preciso de roupas mais práticas do que vestidos e saias longas.

De fato, embora houvesse até escolhido aquela saia para amansar a mãe diante do seu estridente vestuário, era visível que não fora suficiente. A blusa de social preta de botões de seda sem mangas que colora embaixo da saia, pelo visto, também não causará a melhor impressão.

— De fato, suponho que esses sapatos militares ajudem muito. - o tom de deboche só seria perceptível para aqueles que conhecessem a diretora da empresa de finanças mais poderosa do mundo mágico do Reino Unido.

— São coturnos, mãe. - Safo manteve a expressão leve no rosto. – Então, por que queria tanto me ver?

Elvira observou-a pelo canto dos olhos enquanto a filha sentava no sofá arroxeado, sem responder. Ela mesma se acomodou no rosado, inclinando-se para alcançar a chaleira e encher uma xícara com a água quente, antes de pegar o sache de chá verde:

— Continua bebendo esse ou...

— Verde está ótimo, mamãe. Sem açúcar, uma pitada de leite, como sempre.

A Nott mais velha sorriu consigo mesma, os dentes aparecendo por entre seu meio sorriso. Após derramar um fio de leite, pegou uma das colheres já dispostas no aparato de chá, e entregou para Safo.

— Não acredita que eu simplesmente desejo te ver após seis meses me contentando com seus telegramas?

Safo bebericou do copo fazendo um barulho que sempre gerara longas reclamações sobre comportamento à mesa quando era mais nova.

— Sete meses e meio, na verdade. – arqueou uma sobrancelha ao notar que desconcertara Elvira.

— Ainda pior. – agora ela preparava sua própria bebida.

— Não foi o que sua carta urgente fez parecer. – comentou dando os ombros.

— Seu pai planejava estar aqui, mas como Beaumont deve ter lhe explicado, ele ficou preso no escritório com uma reunião que surgiu pelo almoço. Parece que os Weasley teimam em voltar às nossas portas, hum. – o tom de quem havia atingido o alvo certo sempre causara arrepios em Safo, mas agora só um pequeno silvo de irritação perpassou pela sua espinha.

— É uma família grande, - deixou sua voz morrer no ar, complementando após a ausência de resposta de sua mãe. – não sabia que papai fazia negócios com eles.

Elvira Nott riu descrente.

— Pois está certíssima, minha filha, ele não faz. Porém, por alguma razão pertencente somente a nossa Morgana, tanto Bill quanto Percy Weasley pareciam convencidos que o nosso Theo poderia ajudar a descobri o paradeiro da filha de Bill, a da confusão do hotel francês, sabe quem é?

Safo manteve o semblante inexpressivo, uma mão escorregando para o bolso de sua saia e alcançando a varinha, quase um hábito nervoso.

— Primeira página do Profeta Diário, Paris é a única assinante do jornal no apartamento, mas eu cheguei a ler a notícia.

O nariz levemente torcido da mãe logo se transformou em frases feitas:

— Não devo supor que conheço a família dessa tal Paris, ou posso ousar a isso, Safo?

 A garota deu de ombros, tomando mais um gole do chá:

— Ela é do centro de Londres, os pais são políticos trouxas, mas acho que não se dá muito bem com a família.

— Certo... Você deve imaginar o desconcerto de seu pai ao se deparar justamente com Percy! – Safo notou como para um imprevisto no almoço, sua mãe já sabia de tantos detalhes – Depois que você desmanchou o noivado com Lucy, a relação dos dois nunca foi mais a mesma. – o tom lamentoso de sua mãe guardava pouca verdade, já que Safo tinha certeza que ela fora quem mais comemorara após o término, certa de que ainda havia chance de um casamento “mais próprio”.

— Como se ele mesmo não tivesse agradecido a Merlin por não ter que sustentar aqueles almoços semanais por mais tempo.

Elvira cruzou as pernas e seu tom de voz se alterou levemente.

— Não ouse falar que nós dois não colaboramos para aquela relação louca.

Um vinco apareceu entre as sobrancelhas delineadas de Safo.

— Minha relação com Lucy era muito saudável, obrigada pelo apoio, mãe. – o final irônico e ácido não foi contido em nenhum nível.

Elvira bufou e levantou-se, observando pela janela os pássaros que pareciam voar em visão de uma tempestade.

— Não nego que a menina é bem inteligente, gostava de conversar com ela. O pai é, ao menos, menos neurótico do que Bill e Fleur Weasley, já que pelo visto os Weasley têm uma coleção de filhos desaparecidos.

Agora, Safo estava confusa.

— Do que você está falando?

Até mesmo a mãe pareceu chocada diante da suposta ignorância da filha, virando-se completamente contra a janela.

— Todos estavam falando disso há poucos meses, por Merlin, Safo, a menina largou a posição muito boa por sinal que tinha com Dino Thomas e sumiu do mapa.

— Acho que escutei algo do tipo, mas ninguém liga muito para essas fofocas no Instituto de Artes.

Outra cara de desaprovação de Elvira.

— Ah, sim, essa escola de artes, ainda continua com essa ideia?

— É minha faculdade, mãe, achava que depois de quatro anos você tinha entendido.

— Caso a razão lhe faça uma visita, Leonardo ainda está completamente disposto a conduzi-la pela empresa no primeiro ano e ser seu tutor. Eu obviamente te guiaria nos primeiros anos, mas você não estaria sozinha.

O filho de Daphne Greengrass, e primo em primeiro grau dos Malfoy, era afilhado de sua mãe e praticamente fora feito herdeiro provisório dos negócios quando Safo mostrara que a última coisa que faria seria assumir os negócios da família aos dezoito anos.

— Você sabe que ele só está esperando você oficializar a papelada para começar a te envenenar lentamente com arsênico e assumir seu lugar como presidente.

Ela sorriu displicente.

— Então ele terá de esperar ainda uns bons até minhas esperanças quanto a você acabarem. Você sabe que poderia manter as artes como um hobby, e ainda garantir renda e poder até a sua velhice.

— Não teremos essa discussão de novo.

A Nott mais velha pareceu achar conveniente deixar o assunto de lado no momento para trazê-lo novamente em outra situação. Safo sabia, e sua mãe também tinha total ciência, que era apenas uma questão de tempo até ela finalizar a graduação em artes visuais e finalmente se dar “por vencida”.

Quando acabara Hogwarts havia sido introduzida a uma preparação para entrar em um curso superior exclusivo de administração e economia trouxa-bruxas, mas ela simplesmente precisava de uma juventude normal com pessoas de verdade e fazendo algo que ela gostasse. Contrariando a vontade dos pais, Safo acabara com uma vaga no Instituto Público de Artes Visuais Bruxas dividindo um apartamento médio com outros quatro alunos, de quem Elvira e Theodore preferiam nem ouvir muito, quase ignorando o ato de rebeldia da herdeira. Entretanto, eventualmente, seu pai admitiu os seus anseios, e conseguiu convencer a esposa de que seria um bom acréscimo para Safo.

E, devemos concordar que Safo conseguiu um envolvimento político em organizações que seus pais passariam direto sem bater um olho, mas se antes ela tinha uma tendência a liderar, agora seu espírito de comando era posto em prática de formas arriscadas, embora eficientes.

— O que me impressionou, - a mãe retomara a postura calma e analítica – foi como Bill parecia resoluto no seu envolvimento com a invasão e sumiço da sua filha. Achava que nós duas concordávamos que um Weasley é suficiente para uma vida inteira, Safo.

Nott coçou a nuca fugindo dos olhos castanhos da matriarca da família. Ela e Theodore, seu pai, haviam concluído ser melhor omitir os processos em que Safo se envolvera no mês anterior com o grupo do evento de moda de Dominique. Ela tivera que recorrer ao pai já que fora, como tinha previsto, reconhecida, mas o próprio organizador do evento tinha sido quem passara as informações cruciais para o seu grupo, um dos doadores “anônimos”. O único favor que pedira era ser apagada dos registros, o que Theo fizera sem pestanejar.

O pai até pareceu interessado no que ela estava se envolvendo, impressionado com o esquema que a filha elaborara, mas quase conspirando ao não exigir mais informações. Tinha seus meios, caso quisesse mesmo saber. A única exigência era não envolver o nome da família nas suas “desventuras políticas”, o que já fazia ao ser reconhecida entre todos somente pelo primeiro nome.

— Engraçado, - respondeu, checando se sua respiração continuava ritmada – não falo com Dominique faz um bom tempo.

Elvira pegou a varinha e fez um feitiço para horário.

— Espero que você consiga repetir isso com toda essa certeza em, no máximo, cinco minutos. Seu pai acaba de aparatar no jardim com três Weasleys a tiracolo, um exagero que dependemos de você para não se repetir, está claro, Safo?

Ela engoliu em seco, se levantando rapidamente e quase derrubando a xícara ao fixar seus olhos nos três pontos se movimentando através das vidraças. Seu pai já desaparatara novamente. Ela teria que lidar com aquela grande incoveniência sozinha. 

 

 


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Notas finais do capítulo

Que tal? Ansiosos para o que vai acontecer? Não deixem de me contar nada nessa caixinha abaixo, e até o próximo!



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