Nossos Pequenos Segredos escrita por deadlikeme


Capítulo 1
Capítulo 1




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Minha avó morava conosco desde que meu pai e minha mãe se separaram, quando eu tinha seis anos. Éramos eu, minha mãe, meu irmão mais novo, Charlie e meu irmão mais velho, Tyler. Charlie era o pior, chamava a atenção por onde passava e gritava aos quatro cantos o quanto era feliz na vida para que todos ouvissem. Tyler tocava sua guitarra no quarto e jogava futebol americano na escola, ele era apenas dois anos mais velho que eu, mas nunca nos demos tão bem, brigas de irmãos na minha casa era comum. Meu pai quase nunca nos visitava e apenas mandava a pensão para mim e meus irmãos. Na verdade, eu nunca fiquei sabendo a verdadeira razão por eles terem se separado, mas me lembro das tantas brigas, e desde então associei o nascimento do meu irmão - Charlie, com as brigas entre eles e a separação. Talvez tenha sido injusta com ele, mas era o que pensava e o que cresci pensando. Minha avó era a pessoa que "segurou as pontas" em minha casa depois de que meu pai se foi, ela foi a pessoa que nos salvou de alguma forma. Minha avó sempre me falava "Tenha fé e tudo mudará", mas não estava mudando. Nada estava mudando, e sim piorando.

Tudo começou quando eu tinha quinze anos, e meu irmão dez. Charlie é uma das pessoas mais fortes que conheci. Com uma fé invejável e grande imaginação para mudar o mundo. No meio de agosto, descobrimos em um exame de rotina, que Charlie tinha leucemia. Lembro que estava em casa com minha avó e minha mãe tinha ido ao médico com Charlie. Lembro que estava sentada na cadeira velha de balanço da minha avó na varanda, quando o carro da minha mãe parou, Charlie entrou correndo com um bichinho de pelúcia na mão feliz como sempre, e minha mãe saiu do carro pálida. Ela não parecia bem. Ela não parecia nada bem. Ela passou por mim sem me olhar e bateu a porta quando entrou em casa.

— Mamãe está te chamando.

Tyler aparecera na porta alguns segundos depois, então eu sabia que o assunto era sério.

— Susan, fique com Charlie lá em cima, e não o deixe descer por enquanto.

Ela estava sentada com os braços apoiados na mesa da cozinha. Ela mexia as mãos de uma forma nervosa e minha avó passava a mão em seu braço, como forma de acalmá-la. Tyler não tinha o sorriso para me provocar no rosto, minha avó estava com o semblante sério e minha mãe ainda não expressava reação. Eu subi as escadas quando ouvia eles começarem a falar. Minha mãe começava a soluçar e eu não ouvia mais nada.

— O que está acontecendo?

Charlie tinha batido a porta do quarto atrás de si e chegava pulando com um de seus carrinhos na mão.

— Não sei.

Dei de ombros quando ele se sentou quieto no último degrau da escada ao lado dos meus pés.

— O doutor falou que eu estou doente.

Eu tentava ouvir o que mamãe dizia, mas prestei atenção quando Charlie falou essa frase.

— A é? 

Sentei ao seu lado olhando para ele com os seus olhos azuis assim como os de Tyler e da minha mãe.

— Aham. - Charlie falava mexendo em seu boneco sem olhar para mim. - Ele me disse que estou doente e preciso de todos os chocolates do mundo.

Levantei as sobrancelhas.

— Chocolate, Charlie?

E ele levantou rindo e correndo de volta ao quarto. Desci os degraus da escada e parei vendo meu irmão passar por mim e bater a porta da frente de casa. Minha avó ainda continuava sentada segurando nas mãos de minha mãe. Elas falavam alguma coisa quando entrei, e pararam ao me perceber ali na porta. 

— Mas tudo ficará bem no fim.

Minha avó ainda dizia.

— Shiu. - Elas olhavam para mim depois que minha mãe pediu para que ela parasse de falar. - Quer alguma coisa querida?

— Só chocolate, mãe.

Ela se levantou pegando duas barras de Sneaker de cima da geladeira e me dando rapidamente. Fechei a porta da cozinha e fiquei esperando um pouco, mas elas não tinham começado a falar novamente. A casa estava vazia.

— Tyler? 

Abri a porta da frente da casa e Tyler estava sentado nos degraus da varanda. Ele tinha 16 anos na época. Ele não se moveu um centímetro ao ouvir minha voz. Sentei do seu lado e abri uma barra de chocolate dando outra a ele. Tyler estava com os olhos vermelhos. Ele pegou o chocolate da minha mão e o abriu lentamente. Respirou fundo mordendo um pedaço de seu chocolate. Nós olhamos para frente sem dizer nada por um longo tempo.

— Você já sabe?

Tyler perguntou por fim.

—Do que?

Tyler revirou os olhos.

— Você é um pouco lenta viu Susan!

Dei de ombros e mordi mais um pedaço do meu chocolate. Ficamos em silêncio novamente. Apenas um carro passou pela rua, o vento batia na copa das árvores fazendo as folhas se balançarem e criarem uma grande orquestra. Mas Tyler quebrou o silêncio novamente.

— O Charlie está doente.

— Ele me falou.

Tyler balançou a cabeça negativamente.

— Não estou falando de estar com uma gripe, Susan. Eu to falando...eu to falando que ele está com câncer.

A voz de Tyler saiu trêmula. Eu não tive o que falar. Tyler continuava me olhando. Eu engoli em seco e a porta atrás de nós bateu. Passos se aproximaram e logo vimos o menininho de cabelos castanhos e tigelinha, se sentando ao nosso lado.

— Que foi? Por que vocês estão quietos?

Não respondemos quando sua voz aguda nos fez perceber que já estava ali.

— Isso é chocolate? Eu quero.

Charlie era o único falando ainda.

— Fica com o meu.

O entreguei minha barra de chocolate pela metade e entrei de volta em casa caminhando para a cozinha.

— Por que não me contou?

Minha avó se virou do fogão para a porta na hora que entrei e minha mãe levantou a cabeça.

— Contei o que, Suzi?

Seus olhos azuis estavam irritados e seu nariz vermelho.

— Você sabe o que!

Eu estava sendo ríspida, e ainda me achava certa do que fazia;

— Suzana.

Ela tentou me acalmar.

— Não, mãe! Apenas me fale. Por que falou pro Tyler e não para mim? Por que?

— Ele é mais velho, querida.

Minha avó tentou defendê-la.

— Ele é dois anos mais velho que eu! Vocês acham que eu não entendo? Vocês acham que eu não entendo que meu irmão vai morrer?

Eu esbravejei olhando para minha mãe com os olhos em lágrimas, mas sem saber o que tinha dito e sem saber também que Charlie estava atrás de mim nos observando. Ele correu. E desde então minha mãe e eu não conversávamos direito mais. E eu sabia que tinha sido minha culpa.


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