Depois de chorar muito no colo de minha mãe eu acabei indo direto pra cama. Eu estava cansado, exausto e com muita dor de cabeça. Quando me deitei foi um alívio, meu corpo inteiro começou a agradecer pela minha cama macia, fiquei deitado olhando pro teto e pensando nas coisas que tinha acontecido, no Lucas, na Larissa e principalmente em mim mesmo.

Pensar em mim mesmo. Isso foi algo que eu fiz por todos esses anos, pensei apenas em mim e deixei de pensar nos outros e foi esse meu grande erro. Um erro que jamais vou conseguir me perdoar.

Desde pequeno eu fui assim. Lembro até hoje que tinha um amigo, filho de uma conhecida da minha mãe, que sempre ia brincar comigo, mas eu nunca o deixava pegar minhas coisas. Eu sempre fui egoísta, sempre pensei apenas em meu próprio nariz e isso, isso estava me arruinando.

Fico pensando. Como Lucas gostou de mim? Como ele criou sentimentos por mim? É tão confuso, eu sou uma pessoa tão ruim.

Virei de lado e abracei meu Scooby Doo de pelúcia. Tenho ele desde pequeno e ele sempre é meu companheiro em momentos triste.

Me encolhi na cama e fechei os olhos com força. Queria apenas dormir e esquecer esse dia! Amanhã seria um dia melhor. Quem sabe tudo isso não é um pesadelo?

Sim. Isso tudo será um pesadelo. E quando eu abrir meus olhos vai estar tudo bem, todos vão estar felizes e Lucas vai estar bem e sorridente como sempre foi.

Lucas... Ele é tão especial para mim. Como pude esconder isso de mim mesmo? Ele veio na minha vida como um meteoro. Destruindo tudo mas trouxe consigo muitos materiais valiosos! Quero ele na minha vida pra sempre e é por ele que estou fazendo isso. É por você Lucas.

Devo ter aberto um sorriso. Senti que queria rir. Minhas forças já estavam voltando. Minha confiança e meu desejo de viver estavam finalmente retornando pra mim.

Eu estava sentindo algo novo. Algo que eu nunca tinha sentido antes, era um sentimento estranho. Mas ele era tão bom e me fazia bem! Eu já tinha sentido isso antes com o Lucas. Sempre que estava na presença dele eu sentia, sentia dentro de mim alto especial, algo que me deixasse bobo e sorrindo sem motivo.

Peguei meu celular que estava jogado no chão ao lado da minha cama. Abri meu Facebook e entrei no perfil de Lucas, eu precisava ver uma coisa. Fui em suas fotos e lá estava, uma foto minha com ele. A gente estava abraçado, sorrindo.

A gente estava feliz... Nesse dia ele estava tão radiante que eu adorava o ver sorrindo. Contei todo tipo de piada só pra o ver sorrir. Essa foto foi dia antes da gente brigar.

Fiquei olhando aquela foto e me veio uma sensação tão boa. Minha barriga formigou. Eu comecei a chorar, mas não era de tristeza, era de um sentimento bobo e diferente dentro de mim que me fez emocionar ao olhar pra essa foto.

Aquilo só me fez perceber ainda mais o grande amigo que eu estava perdendo. Me fez perceber o quanto eu fui idiota por me deixar levar pelo preconceito. Sabe? Não é sempre que achamos pessoas dessa forma! Eu tive sorte. Tive sorte de Lucas ter uma grande paciência e não ter apenas me ignorado pra sempre!

Eu precisava ver ele! Precisava ver Lucas novamente, mas não naquele lugar. Não quero o ver deitado em uma maca. Quero o ver em outro lugar, então talvez irá valer a pena esperar, acho que em menos de uma semana ele vai ter alta.

Virei pro outro lado da cama, eu estava sorrindo muito. Tinha tantas ideias na minha cabeça. E tudo está começando a se encaixar e eu estou começando a me libertar. Estou me sentindo um pequeno pássaro preso em uma gaiola que logo irá ver o céu.

***

Se passaram apenas quatro dias e fiquei sabendo que Lucas recebeu alta ontem! Finalmente, eu não aguentava mais esperar.

Esses últimos dias foram libertadores pra mim. Larissa se quer apareceu ou disse alguma palavra pra mim. E o mesmo vale pra ameaça dela, nada foi divulgado até agora.

Até as coisas na escola começaram a andar de forma mais agradável. Sendo o último ano do meu ensino médio todos estão mais calmos, os professores já não passam tanta matéria, afinal está chegando dezembro e quando chega dezembro não existe um aluno na sala. Nem acredito que estou acabando meu ano, nem acredito que ano que vem não terei que me preocupar com escola!

Na ETEC as coisas estão boas, mas não tão boas! Elas estariam melhor se Lucas estivesse indo. Mas agora que ele está bem tenho certeza que ele voltará para finalizar esse Semestre!

Assim que me arrumei fui direto pra cozinha onde com toda certeza minha mãe estaria fazendo o famoso almoço de domingo. Meu pai está trabalhando, mas hoje ele irá vir pra casa. Mais um motivo pra eu ficar feliz, faz tempo que eu não tenho um boa conversa com ele.

Na verdade ele apareceu na quinta aqui. Ele veio por que minha mãe o contou que eu tinha chorado e quebrado no soco um espelho. Ele conversou comigo por vários minutos, foi muito bom esse momento. Momento que é bem raro de se ter e eu o aproveitei da melhor maneira possível.

— Mãe! Preciso ir na casa de um amigo meu.

— Mas o almoço tá quase pronto, Rafael.

— Desculpa, mãe! Mas eu preciso ir. É muito importante e eu venho esperando isso a quatro dias já. Na verdade eu acho que espero isso desde o momento que eu o vi!

Minha mãe parou de fazer o que estava fazendo, limpou as mãos no avental e me olhou. Já estava esperando uma enorme bronca.

— E está esperando o que? Vá e faça o que seu coração manda.

Sorri pra ela. Parece que ela sabia o que eu estava sentindo. Era mágico! Conexão de mãe e filho é tão incrível, não tem nem como eu definir isso.

Coloquei meu fone de ouvido e dei play na musica: Halo, da Beyoncé. Eu sentia que aquela música tinha um significado grande pra mim. Acho que talvez a letra tenha um significado pra mim nesse momento. Posso estar falando besteira, mas enquanto corria e escutava essa música todos os pelos do meu braço se arrepiava. Eu só pensava no que eu iria falar.

Consegui ver de longe a casa de Lucas. O levaria pra um lugar especial, o levaria para a praça perto da casa dele. Sim! O levaria pra famosa praça dos beijos. Lá é muito bonito e será perfeito para a ocasião.

A praça é cheio de árvores, uma mais linda que a outra. Porém tem uma que é a mais linda e especial de todas, o Ipê branco. Aquela árvore sem dúvida é a mais linda e toma a beleza de todas as outras. Ela é grande e majestosa. Suas flores da cor branca são seu destaque principal. O chão toda é coberto por essas flores que vão caindo. Ficar em baixo daquela árvore é a coisas mais prazerosa do mundo.

Cheguei na frente do portão de Lucas e toquei o interfone. Demorou alguns segundos e escuto sua voz pelo interfone.

— Quem é?

— Lucas? Sou eu.

— O que você quer?  - Senti um tom muito áspero.

— Preciso te ver. Vem aqui fora, quero te levar em um lugar.

— Te esperei todos esses dias no hospital!

— Eu sei! Mas me doía te ver naquele lugar. Decidi esperar pra te ver.

— Eu precisava de você, Rafael.

— Eu sei! Eu piso na bola, sempre fiz isso. Mas, por favor! Venha aqui fora, você não vai se arrepender, eu juro.

Escutei que ele desligou o interfone. Fiquei nervoso e meu coração não parava de bater. Estava com medo de que ele não viesse. Mas esse medo foi embora quando o portão se abriu e lá estava ele.

Ele ainda estava com o olhar triste, seu braço ainda estava com curativos. Seu cabelo estava toda bagunçados e estava usando uma roupa bem simples, mas mesmo assim ele continuava tão lindo.

— Onde quer me levar?

— Confia em mim? – Respondi sorrindo.

— Não sei. Da última vez que confiei em você...

— Por favor. Só uma chance?

— Tudo bem...

Esperei ele fechar o portão e comecei o levar. A praça era bem perto então não teríamos que andar muito. Foi um silêncio enorme até lá. Eu estava tão nervoso, meu coração não parava de bater forte. Mas eu mantive a calma.

Quando chegamos na praça eu o levei até o Ipê de flores brancas, ficamos de baixo dele.

— Que árvore bonita... – Lucas disse olhando pra cima.

— Sim. Eu acho ela a mais bonita de toda a praça.

Lucas soltou um pequeno sorriso e olhou pra mim.

— Então? Você tem algo pra me dizer?

— Eu tenho... Na verdade muitas coisas pra te dizer.

Suspirei fundo. Nunca estive tão nervoso e tenso quanto agora. Mas eu sou forte e vou conseguir falar tudo.

— Eu queria primeiro de tudo te pedir desculpas. Mas essas desculpas são do fundo do meu coração! Nesses últimos dias eu parei e refleti tudo o que eu fiz pra você, todos os momentos que eu te humilhei e te fiz mal. Eu percebi que fiz tudo aquilo por conta do enorme preconceito e medo de ser taxado de gay! Mas... eu vi que isso não é uma coisa ruim! Eu vi que isso não é algo que eu teria que temer e que eu estava apenas perdendo uma pessoa maravilhosa e perfeita como você. Eu te julguei muito por que na minha cabeça você era o culpado por tudo, mas não era! O único culpado era eu mesmo. Eu mesmo estava me machucando e me ferindo por dentro e foi isso que me fez te machucar.

Nesse momento eu senti que eu já estava chorando. Vi que Lucas estava com os olhos cheios de lágrimas também.

— Sabe... você é muito especial pra mim, Lucas! Eu não sei explicar o que eu sinto por você, mas desde quando começamos a conversar eu venho me apaixonando mais por você. Você me encantou, me cativou e deixava meus dias cada vez mais felizes. Ninguém nunca tinha me deixado desse jeito, talvez isso me deixou assustado. Talvez isso me fez ficar meio recluso e com medo. Você é tão perfeito que isso me dá medo, pois você nem mesmo parece que existe. Eu parei e pensei como eu fui tolo de me distanciar de você. Devo ter pago todos meus pecados com Larissa mas eu preciso saber de você, preciso saber se você me perdoa.

Lucas estava chorando de soluçar. Ele limpava o olho com as mãos mas as lágrimas eram mais rápido que isso. Ele tomou um grande fôlego e olhou diretamente pra mim.

— Sabe por que eu nunca desisti de você? – Ele disse olhando pra mim. – Por que você também foi a pessoa mais especial que eu conheci. Foi a pessoa que mais me deu carinho. Eu nunca desisti de você por que eu te amo...

Eu fiquei sem reação.

— E eu te perdôo! Sempre vou te perdoar independente do que aconteça.

— Lucas...

Eu me aproximei. Ele encostou no tronco da árvore e colocou uma de suas mãos em meu rosto. Me aproximei ainda mais até nossos corpos estarem colados. Coloquei minha mão no rosto dele limpando suas lágrimas. Nossos rostos estavam tão próximos. Eu sentia a respiração dele na minha, sentia todo o calor dele em mim.

Ele fazia movimentos leve com a mão em meu rosto, eu me sentia tão bem, tão feliz. Sua outra mão foi em minha cintura onde ele me mantinha perto o suficiente dele. Não resisti e acabei colocando uma de minhas mãos em sua cintura também. Estávamos ligados.

Fechei meus olhos e o beijei. Foi um beijo profundo. Eu sentia todos os sentimentos dele. Aquele sentimento era tão bom que eu não resisti e acabei por chorar.

Senti uma flor cair em nós dois, bem no meio de nós. Mas senti acima de tudo o sentimento mais poderoso que existe na terra.

O amor. Eu senti o amor.