A Aurora de Castelobruxo - A Harry Potter Story escrita por ThaylonP


Capítulo 7
As Marcas




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O despertar para o início das aulas foi frenético. Na Torre de Anhangá, após subir cinco dezenas de escadas circulares, os alojamentos pequenos apareceram, assim como o aposento onde os alunos passariam boa parte do tempo livre: a sala comunal. A garota apenas dormiu, sem reparar em nada daquilo, parecendo ser acordada segundos depois com a manhã do dia seguinte, com Inara a sacudindo, sisuda.

— Me pediram para te acordar, princesinha - disse a menina, com um tom de desprezo.

Aurora nem a questionou, saltando da cama, pisando no chão frio coberto por um tapete vermelho.

— 5 minutos! - ouviu uma voz feminina gritar.

Aquela, era a inspetora do alojamento feminino de Anhangá, Maria. Diferente de Kevin, a adolescente se empostava como adulta, gritando ordens aos quatro cantos dos quartos e estufando o peito para impor respeito. Ela terminava de se ensaboar quando ouviu a voz, acelerando o ritmo para não chegar atrasada no primeiro dia.
Estava no quarto de número três, dos cinco que haviam na torre. As paredes de pedra antiga lembravam castelos de filmes medievais que a loura via com o pai. Composto por seis beliches, onde as duplas de alunas organizavam-se para manter as camas limpas e bem-arrumadas. Se não o fizessem, teriam que ouvir a menina mexicana berrar em suas caras e perderiam pontos da Casa.

— Ei, garota, não é banho de rio! Pode se apressar aí! - protestou Inara, socando a porta do banheiro com rapidez.

— Vai ficar me seguindo mesmo? - Aurora questionou, saindo com uma toalha enrolada no corpo e o cabelo encharcado.

— Vou! Vai que alguma outra estátua se curva a você! Eu tenho que estar lá para ver - respondeu, cruzando os braços enquanto a loira se trocava.

— Tá, mas… privacidade, por favor! - disse, como quem diz algo óbvio.

A menina balançou a cabeça, mexendo a franja. Não havia mais pinturas sobre seus olhos, mas havia curiosidade. Queria extrair aquele algo de especial em Aurora, ainda não descoberto de fato, contudo muito aparente. Resolveu dar um espaço à menina, mesmo não entendendo o motivo da vergonha do corpo desnudo.
A novata não demorou muito tempo. Vestiu seu uniforme e pôs-se do lado de fora do quarto, ainda em tempo para a primeira refeição do dia. Pensou em questionar o olhar desconfiado que Inara lhe concedia, mas preferiu não dizer nada, afinal mesmo sendo estranha, era sua única companhia em Anhangá, pelo menos, no dormitório feminino.
Depois de um enorme banquete que a bruxa ainda não acostumara-se, os horários foram entregues a todos. Teria aulas das 8 h às 18 h.
A rotina começou com os alunos subindo as escadas próximas ao salão de confraternização, na torre oeste de Castelobruxo, seguindo Kevin que ajeitava seus óculos quase a cada degrau. Pela lista de horários, Aurora viu que a primeira aula seria de Teoria da Magia. Adentraram a sala com os alunos conversando em alto tom sobre assuntos variados, sentando-se às carteiras grandes de madeira antiga. Cada pessoa colocava os livros à mesa, enquanto um homem alto com cabelos bagunçados e óculos redondos observava a turma. Carregava um livro enorme e diversos pergaminhos às costas e numa bolsa em mãos.

— Bom dia, meus caros, sou o professor Ricardo Sampaio, de Teoria da Magia – apresentou-se o homem, com amor ao cargo.

O curioso é que a menina pensava que a matéria seria chata e maçante, porém o professor arrancou esse pensamento quando o giz riscou o quadro com palavras e ele apresentou a matéria. Vários dos alunos pareciam desinteressados, entretanto o homem falava com paixão para aqueles que queriam ouvir.

— Ei, Aurora – aproximou-se Nino, após o término da aula. - Como está?

A menina indígena cerrou os olhos. Um movimento em falso e socaria o nariz do sujeito. A aula continha apenas alunos calouros de Anhangá, porém fora avisado que algumas turmas dividiriam algumas matérias. A loura desejava que Matheus estivesse na próxima.

— A princípio, estou bem. Mesmo com minha guarda-costas não me deixando sozinha um mísero segundo… - pigarreou.

O menino esperava que ela retribuísse a pergunta, entretanto, quando o questionamento não veio, ele prosseguiu, encarando Inara com desdém.

— Caso queira, posso tirá-la daqui…

Inara a encarou, desafiando-o.

— Ah não! - respondeu - Melhor que companhia nenhuma! - surgiu outro assunto. — E no dormitório de vocês, como vão as coisas?

— É… nada muito, educado, eu diria – afirmou, contorcendo o rosto. - Colaram um calouro no teto.

— Nossa!

— Por que fizeram isso? - questionou a outra menina, com certo estranhamento.

— É um ritual de passagem, sabe? - rebateu ele.

Inara calou, deixando o comportamento estranho passar. Antonino prosseguiu comentando sobre o dormitório e mais algumas peripécias. Como alguns veteranos que recolheram um dos calouros e o fizeram dormir na privada; ou o feitiço de cheiro de fezes, todas as vezes que um dos alunos saía do banho. Enquanto Aurora achava divertido, Inara olhava confusa e por vezes, horrorizada.
O grupo dirigiu-se até a sala na torre central, onde aconteceriam as duas aulas seguintes, em horários diferentes. Primeiro, História da Magia, que era dada numa sala menor, que havia além das carteiras ao centro, montanhas de livros ao redor. Um homem ríspido e sério encarava a turma com uma certa fúria. Nem parecia querer lecionar.

— Muito bem, sou o professor Thomás Aquino, e…– um grupo de alunos ainda prosseguia conversando. O sujeito, sacou seu cajado, e conjurou um feitiço. - Silentibus!

Depois, ninguém mais conseguiu falar uma palavra durante toda a aula. O cabo daquele cajado era de uma madeira escurecida e na ponta, havia um elemento curioso; Uma espécie de arco de metal, semelhante a um pescoço de serpente, que se expandia numa cabeça que mordia o cabo de volta. O homem tinha cabelos brancos longos empurrados para trás e uma expressão raivosa de olhos escuros. Sua manta verde escura era fantasticamente ornamentada e, pelo jeito que se vestia, parecia ter gastado um bom tempo selecionando-a. Desde a camisa branca abaixo do colete cruzado até seus sapatos bem polidos, a figura era perfeita.
A matéria em si parecia interessante, porém a forma como ele dizia tudo como se agredisse os alunos, era distrativa demais. A aula durou cerca de uma hora. Após terminar, ninguém se atreveu a questionar o professor em nada, mesmo depois da magia ter sido liberada.

— Isso é legal? Acho um absurdo fazer magia para nos aquietar! - protestou Nino, descendo a escadaria do castelo até a próxima sala.

— Ele é bem intolerante… mas não precisava fazer aquilo, mesmo sendo muito legal!

— Está gostando mesmo dos feitiços, não é? - perguntou, contemplativo.

— É a parte mais legal, até agora - rebateu.

— É realmente uma parte incrível – ele pigarreou. - Meus feitiços são, modéstia à parte, muito bons.

Aurora observou com cuidado, porém Inara interferiu com um riso que discordava.

— Deve ser tão impecável quanto seu cabelo… - comentou em um cochicho.

Aurora quase explodiu de tanto rir. O inesperado da piada quase a derrubou escada abaixo. Antonino corou muito, tornando-se vermelho como um tomate.

— É… é… há-há… - comentou, se forçando a rir.

Chegando na outra sala, perceberam que era bem diferente de qualquer outra. Antonino gelou. As paredes escuras retratavam um ambiente que se assemelhava a um laboratório de bruxos. Havia algumas estantes com livros, troféus e quadros na parede mostrando uma mulher jovem; estantes de materiais de poções, cálices, compartimentos de vidro, tubos de ensaios e outras coisas. No centro da sala, havia um enorme caldeirão borbulhando, sem carteira alguma para os alunos sentarem-se.

— Bem-vindos – disse uma mulher detrás do imenso caldeirão. — Sou Morgana Stradivarius, para encurtar, professora de Poções e Bebidas Mágicas – apresentou-se, de uma forma que parecia cantar cada frase.

Os estudantes se aproximaram, pois a moça com os cabelos laqueados para cima, cativava-os. Vestia mais um dos vestidos extravagantes, porém azul-noite, representando a Casa de Jaci. Num poleiro, ao fundo, uma gralha parecia sussurrar ofensas sem nexo.

— Adelaide! - repreendeu a mulher, sem perder a compostura. - Não liguem para essa gralha velha. Venham, mais perto – disse, com um sorriso de orelha a orelha.

— Vai dar um beijinho na sua mãe, Nino – gritou um dos estudantes.

O garoto de cabelos perfeitamente penteados permaneceu boquiaberto. Não parecia crer no que via. A instrutora ignorou a piada e solicitou a todos que olhassem para o caldeirão. Dentro, um líquido esverdeado transitava para roxo enquanto se movia.

— Ensinarei sobre Poção de Cheiro. Alguém sabe algo sobre? – perguntou, olhando os rostos curiosos.

Inara cruzou os braços como quem sabe de algo porém não revela. Alguém estava prestes a responder, porém a porta da classe foi aberta devagar.

— Perdão pelo atraso, professora Morgana – falou uma voz feminina, indicando a entrada para alguns alunos atrasados.

Com ornamentos azuis, os estudantes adentraram o lugar, que encheu-se mais, beirando o aperto. A pouca luz do líquido borbulhante do caldeirão, fracassava em iluminar a todos.

— Não há problemas. Quanto mais melhor! - respondeu Morgana.

A menina, loura, também de ornamentos azuis, retirou-se com um cumprimento educado. Do meio da turma apertada, Matheus despontou, procurando por Aurora sussurrando seu nome. Quando seus olhos se encontraram, foi em sua direção, empurrando a parede de discentes à sua frente. Por último, virou-se para trás a tempo de acenar para a adolescente que se retirava.

— Ah, você está aí! - sussurrou Aurora, vendo o amigo acenar para a porta. - Quem era? Sua inspetora?

— Sim… é a Letícia. Lembra dela? - perguntou ele, desviando sua atenção para a aula vez ou outra.

— Não… eu deveria? - perguntou.

— Lembra na Avenida? Ela estava lá! - disse ele, coçando a parte de trás da cabeça.

— Quê? Ela? Mas como… - a voz de Aurora por pouco não chamou a atenção de Morgana.

— Sim, sim, calma… - respondeu ele, rindo baixo.

Aurora teve certa indignação pelo fato da menina que era complô de um valentão, ser uma inspetora. Até ele conseguiu perceber isso.

— Então, mas ela pediu desculpas… disse que estava arrependida – explicou.

— Eu não caio nessa - respondeu ela.

Depois, ficaram em silêncio por um tempo enquanto Morgana falava sobre a estrutura da receita da poção. Aurora encontrou um novo assunto, novamente desviando a atenção.

— E aí? Como foi a primeira noite fora de casa?

— Ah… foi tranquilo! Pensei que ia ser… tipo, muito complicado, mas nem… e até a Letícia foi legal comigo! - sussurrou, contendo a animação.

Sra. Stradivarius explicava que alguns componentes reagem de maneira diferente em conjunto com certos ingredientes.

— Espero que não seja falsidade da parte dela - resmungou, fazendo uma anotação.

— Ah… por causa do negócio da Avenida 25? Ela pediu perdão, eu disse – falou, remexendo em suas coisas, procurando pergaminho e pena.

Aurora sacava tudo de sua bolsa. O compartimento era excelente, pois ela não tinha que carregar peso algum. Diferente dela, Matheus levava pergaminhos, mochila e livros de turma para turma.

— Você não cansa de carregar tanta coisa? - disse ela, ajudando-o a recolher os livros do chão.

— Tenho que carregar – respondeu, puxando a bolsa de pano, quase rasgando com o peso. - Letícia me ensinou a fazer um feitiço para deixar mais leve, mas eu esqueci.

— Conversaram bastante… uau! Nem parece que ela te queria ver morto! - comentou ela, mais ríspida.

— É coisa de inspetor com calouro. Nada demais – respondeu, sacando um pergaminho depois de muito trabalho.

— O máximo que meu inspetor fez foi mostrar o caminho e ajeitar os óculos! - rebateu, imitando o gesto de Kevin e a expressão de sabe-tudo.

Matheus gargalhou, quase sendo pego por Morgana. Mal prestava atenção, e queria prosseguir a conversa.

— Estilos diferentes, né? Fazer o quê… - disse, desta vez com um sussurro quase inaudível. - E com eles? - apontou a dupla à frente da loura. - Foi ruim?

— Água e Óleo? Nada! Tranquilo! - respondeu, sarcástica.

— Podem parar aí atrás? - reclamou Nino, virando-se aos dois. - Ela descontará em mim! Por favor! - suplicou.

A partir daí, os dois não conversaram. Não consideravam participar de um enterro do amigo. Ouviram cerca de mais 45 minutos com a mulher falando sobre como as poções de cheiro poderiam ser utilizadas para atrair ou distrair criaturas, gerar repulsa, gerar atração, causar confusão, tudo isso apenas com os odores diferentes. Um fato que Aurora achou curioso, é que um bruxo tentou ensinar aos putos sobre as maravilhas desse tipo de poção, porém os que não tinham magia, encontravam dificuldade para causar as sensações, por isso criavam apenas colônias e perfumes cheirosos sem efeito mágico algum.
O almoço começou pontualmente após o anúncio feito pela Sra. Dourado. Matheus abocanhava uma porção de purê de batata enquanto ainda discutia com Aurora sobre a estátua ajoelhada ao fundo. Ela, constrangida, mudava o assunto o quanto podia, porém Antonino e Inara a encurralavam com perguntas que a mesma não podia responder.

— Uma espécie de comando, então? - perguntou Nino, comendo como um lorde em seu prato quase vazio.

— Não! Ela não pode ter comando a estátua! Ficou louco? - Inara retrucou.

Aurora não sabia se ficava agradecida pelo fato dos amigos se interessarem em descobrir o mistério ou assustada com a resposta que provavelmente seria pior que o próprio vexame. Ela enrolava a Minestra em seu garfo continuamente, mas jamais levava o macarrão a boca pois sua atenção estava em desviar o rumo da conversa.

— Deveríamos focar nas aulas, por falar nisso, qual é nossa próxima Nino?

— Ah… a próxima… - ele recebeu a informação e a digeriu mais rápido que o alimento em seu prato. - temos Magizoologia e depois Herbologia. 

— Magizoologia! - exclamou Matheus, levantando a cabeça do prato.

— Mais asneiras… - Inara revirou os olhos.

— Asneiras? O que tem a ver? - Nino perguntou, intrigado.

— História da Magia. Tudo falso. Nada daquilo aconteceu daquele jeito! - retrucou a índia.

A loura assoprou o talher e o abocanhou. Terminou a mastigação e observou a crítica com cautela, indagando logo em seguida:

— As histórias do seu povo são diferentes?

— Claro! - respondeu, como se fosse óbvio. Porém, não se estendeu mais no assunto.

Matheus já havia terminado sua refeição, pois seu prato já estava limpo. Ele olhou dentro da mochila de livros, sacando um papel com o horário.

— A última aula é de Defesa Contra as Artes das Trevas — seguiu Nino.

— Que matéria é essa?

— O quê? Achou estranho também, Aurora? - Matheus perguntou, vendo a lista novamente.

— Sim… parece coisa de treino para guerra! - Aurora fez uma pausa dramática. — Gostei.

— Agora você está me assustando… - rebateu Matheus.

Nino riu do moleque apavorado. Olhou para a loura com uma expressão que mostrava que o próprio teria a coragem que faltava ao gorducho.

— É só um nome. 

— Sobre o que é, então, sabichão? - exigiu o gorducho.

— É realmente o que o nome diz: Uma aula de feitiços para defesa contra as artes das trevas. Dividiremos “feitiços” em três áreas – disse, tentando simplificar ainda mais. - Transfiguração, que se trata de transfigurar elementos como objetos e animais em outros – disse, separando uma caixinha imaginária. - DCADT – prosseguiu, citando a sigla que os alunos utilizavam –, que são feitiços de defesa. E, por fim, a própria matéria de Feitiços, que engloba coisas que estão fora das duas citadas anteriormente – concluiu, tomando um certo fôlego. - Entenderam?

Todos assentiram. A explicação foi, de fato, muito acertada. Com uma mãe professora, devia ser muito mais fácil. Matheus até arrependeu-se de ter sugerido que ele não saberia.

— Acho que tenho minha aula favorita! - comentou Aurora, empolgada, porém contendo-se logo em seguida.

Depois do comentário, o grupo ainda teve tempo de conversar alguns minutos antes de ouvirem o sinal para as próximas aulas da tarde. Segundo Antonino, não havia possibilidade de ter as aulas de Magizoologia em alguma sala, por isso, dirigiram-se até um pequeno riacho floresta a dentro. Os quatro, seguidos de alunos de Jaci e de Anhangá, todos novatos, não sabendo o que encontrariam. Não havia sinal de professor algum, mesmo ao longe.
Os alunos se aproximaram de uma série de pedras que criava uma pequena cascata de água. O som continuava, mas não havia sinal de instrutor nenhum. Olhando em volta, Aurora não viu ninguém além das três dezenas de alunos preparados para a aula. O riacho seguia até cair em uma pequena cascata. Na beirada das pedras do minúsculo precipício, estudantes mais corajosos olhavam para baixo e brincavam de ameaçar saltar dali.

Uma mão segurou na rocha em que eles estavam e se ergueu para cima.

Os alunos, sobressaltados, tremeram diante do membro escamoso, semelhante ao de crocodilo. Alguns até arriscaram sacar os cajados. Mais uma mão surgiu à vista. Aurora engoliu em seco por ver o humanoide reptiliano. Um calafrio percorreu sua espinha.
A figura levantou-se, assustadora. Repleta de panos cobertos de musgos, de coloração alaranjada, bege e verde, levantou-se para ficar bípede. Em uma das mãos, um cajado do tamanho de uma vassoura, mas que se estendia como um T na parte de cima, ornado com penduricalhos, cordões e colares de pedras. A criatura réptil cobria sua cabeça com uma folha, tal qual um chapéu bruxo. A cauda arrastava lentamente no chão.

— Boa tarde, pessoal, como vão? - perguntou.

Todos se confundiram. Ninguém entendeu absolutamente nada. Nino finalmente encontrou sua cartela de matérias e leu em voz alta:

— Ah, professora Negrini! - desviou os olhos do papel e saltou para cumprimentá-la. - É um prazer. Sua pele está ótima — disse, com um sorriso amistoso.

— Ah, obrigado Nino, é muito gentil da sua parte — rebateu ela, sorrindo com a bocarra horripilante. — Só um bocadinho de lama para ficar desse jeito.

Aurora assustou-se ainda mais ao ouvir a conversa da criatura; a fala era sibilada e parecia que todas as palavras eram sussurradas. Ela tremia por completo de tanto nervosismo. Até se afastou um pouco, porém conteve-se, não queria julgá-la pela aparência.
Alguns alunos ainda arfavam pesado, porém quando a professora anunciou que daria início às aulas, todos paralisaram. Antonino moveu-se para o lado, aproximando-se de Aurora e o resto do grupo. Inara, entretanto, relaxada, observava o resto da turma com estranheza.

— Tudo bem, tudo bem – disse a criatura que atendia pelo sobrenome de Negrini. - Olá! Sou Julia Negrini, professora de Magizoologia de Castelobruxo - apresentou-se. — Sei que parece estranho, mas quem melhor para dar uma aula sobre criaturas que uma criatura? - argumentou.

Todos seguraram um riso. Ainda não sabiam se podiam ou não rir da indagação da professora.

— Minha curiosidade está me matando… - sussurrou ela para Matheus.

— Como acha que eu estou? - retrucou, de olhos esbugalhados.

— É só uma runacroco… - disse Inara, em alto e bom tom, sem controlar a voz.

— Exatamente, minha cara – respondeu a professora.

Por algum motivo, Inara devolveu um sorriso a ela.

— Professora, se me permite perguntar… - começou Aurora, receosa. - O que é uma ou um runacroco?

— É claro que pode perguntar, querida. Veja bem, não achava que minha primeira aula seria sobre mim mesma, mas tudo bem – disse a mulher, com uma voz que lembrava uma idosa carinhosa. - Um runacroco ou uma runacroco no meu caso, é como chamamos bruxos e bruxas que não conseguiram tomar sua forma animaga por completo, falhando em algumas das várias etapas. E, por consequência, ficamos assim para sempre. Runacroco é uma das variações; uma forma de crocodilo – disse ela, sem pesar algum, apesar de relatar uma maldição.

Aos olhos vidrados dos estudantes, a aula estava interessantíssima.

— Então… a senhora é humana? - balbuciou a loura com um pouco mais firmeza na fala.

— É… tecnicamente sou uma Runa, mas pode se dizer que sim. Não sou uma criatura propriamente dita… ou será que sou…– ela disse, pondo a mão no queixo. Logo em seguida, pulo e urrou como uma fera, mas sua voz saiu comum e o susto se deu apenas pelo movimento brusco. - É… não mesmo…

Todos riram e aplaudiram a pequena performance da mulher crocodilo. O susto foi pouco e os sorrisos estavam largos nas faces dos estudantes.

— Que legal… - confessou Aurora, misturada a risada do grupo e dos aplausos. O interesse na matéria cresceu um bocado.

— Ok… tudo bem, agora vamos à aula de verdade… hoje, falaremos de vermífugos! - disse animada.

A aula se seguiu com aquela explicação sobre as pequenas larvas que constituíam tantos cajados daquela turma e do Brasil inteiro. Ela até conseguiu mostrar vários deles e como eles se organizavam como caramujos, vivendo embaixo da terra ou em ambientes escuros e repletos de musgo. Aurora anotou tudo que podia, fazendo algumas intervenções com perguntas sobre a quantidade de criaturas mais existentes no Brasil e sobre os vermífugos-de-ouro, progenitores do cajado da Sra. Dourado. A pergunta esquentou a aula bastante e todos saíram satisfeitos, dirigindo-se para a próxima: Herbologia.

— Essa foi a melhor aula! Sem querer ofender, Nino…

— Não… eu também achei! - concordou o garoto.

Caminhando até o lugar indicado por Nino, deram-se de frente com uma longa estufa, repleta de plantas próximas ao teto e no chão. No centro do local, uma mesa com inúmeras folhas grandes, com uma aparência desfiada. Todos se acomodaram,  enquanto uma mulher negra de cabelos curtos e cacheados com as mãos na cintura, aguardava.

— Boa tarde. Sou a professora Joana Dourado e ensinarei Herbologia aqui.

A mulher parecia jovem demais, segurava uma planta em uma das mãos e sua camiseta não tinha mangas, revelando algumas tatuagens nos braços. O sobrenome foi mais surpreendente. Era relacionada com a diretora?

— Trabalharemos com Costela-de-Adão.

Aurora olhou para a mesa e viu que o formato dos rasgos na folha se assemelhava a uma costela, realmente.

— Tem alguma coisa a ver com a Eva? - indagou Matheus.

Apenas Aurora riu daquilo, tendo uma crise, porém ninguém entendeu a piada na turma. Cultura puta não era a principal característica do pessoal ali. A aula foi interessante, apesar da voz serena e tranquila da professora ser um pouco cansativa. Porém, ela pôde contar um pouco da vida dela, inclusive que lecionava em Castelobruxo junto da irmã. Quando Matheus perguntou a matéria, a expectativa de Aurora para a aula terminar foi grande:

— Defesa Contra as Artes das Trevas, sr. Barbosa – disse ela, simpática.

A menina contou os segundos. E quando foram dispensados, tomou a frente carregando o grupo consigo. Estava eufórica, arfante.

— Calma, Aurora, meu Deus - falou Matheus, sendo quase arrastado pela garota.

— Matheus, vamos ter aulas de feitiços! Não dá pra ter calma! - falou durante o caminho, através de uma risada ansiosa.

— É, mas talvez hoje seja apenas aula teórica - disse Nino, dando de ombros.

— Não importa! Eu tenho várias dúvidas sobre o assunto!

— Calma, calma… já chegamos. Viu? Nem tem ninguém— comentou Matheus apontando para o espaço vazio com algumas pedras.

Estavam em frente ao Castelo, com o sol se pondo por trás da escola, e nenhum sinal de professor, novamente. Algumas estacas prendiam bandeiras das cores das Casas, balançando sozinhas com o vento fraco que passava. Havia também, tochas de cerimônia, apagadas e sem combustível. Os demais se amontoaram no espaço vazio, encarando a falta de professor com certo alívio, pois achavam que seriam liberados da aula.

— Antes que pergunte, Aurora, não é outra professora réptil…– confirmou Nino.

Inara bufou de desaprovação tanto para o menino quanto para a cena.

— Ainda bem! Adorei a sra. Negrini, mas não quero conhecer os parentes distantes dela.

— Tá ficando de noite... me contaram que as Caiporas gostam de atazanar de noite - choramingou Matheus, trincando os dentes.

Alguns alunos compartilhavam do medo em conjunto com o gorducho.
Na primeira luz da lua no céu, uma mulher aparatou na frente dos alunos criando um turbilhão negro, assustando a todos. Matheus sentiu o coração parar por um segundo, e demorou até parar de tremer com o susto. Ela era linda, de pele chocolate e cultivava longos cabelos enrolados em tranças magníficas. Aurora admirou-a tal qual havia feito com a Sra. Dourado. Nos braços, usava braceletes e nas orelhas, brincos de argola que reluziam. Apesar da extravagância, havia uma sutileza nos detalhes das vestimentas, assim como seu sorriso perfeito marcado por uma arcada dentária excepcionalmente bem tratada. O vestido, escuro, com diversos pigmentos que se assemelhavam a estrelas. Todos estavam boquiabertos, inclusive Inara, que até o momento não esbanjara reação nenhuma aos professores.

— E aí, meus amores… como vocês estão? - disse ela, chegando mais próximo dos alunos. — João, você cresceu! É uma pena que tenha repetido – disse a um dos estudantes.

Alguns reprovados da turma ainda cumprimentavam-na. A professora mostrava um carisma quase opressor. Aurora esperava que o professor fosse um homem, porém quando a mulher fez sua entrada triunfal, viu-se ainda mais satisfeita.

— Opa, meus reis! Vamos começar isso aqui? - anunciou, como numa festa.

Houve uma empolgação tímida. Pequenos gritos solitários de confirmação. Apesar de ser contagiante, todos pareciam cansados com a nova rotina.

— Gente, sou a professora Miranda Dourado, vou ensinar as matérias de Astronomia e de Defesa Contra as Artes das Trevas – explicou.

Na mente de Aurora, a família montava-se com calma. Mirana e Joana eram filhas da Sra. Dourado e isso parecia muito divertido. Uma família inteira ensinando e administrando uma escola de magia.

Feitiços, feitiços, feitiços.

— Acalme-se srta. Magalhães, vamos chegar nisso! - informou, como se lesse os pensamentos da criança. Ou talvez apenas a expressão admirada da garota lhe indicava isso. – Bem – começou ela e as bordas de seu vestido começaram a flutuar, como uma dança. - Sabem que Feitiços é uma área ampla, dado por três professores – disse esticando a mão e fazendo livros da mochila de Matheus irem para suas mãos. - Transfiguração, é dado por Rodinhas. E os feitiços mais gerais, vão ser dados pela aquela chata da Ruína… – Sendo assim, vou ensiná-los a se defenderem apenas. Encantamentos e azarações, principalmente. De acordo? - perguntou ela. Os estudantes assentiram. - Alguns devem saber que teremos a festa de Dia dos Mortos esse ano. Aliás, como todos os anos. Enfim, haverá uma interclasse de duelos e eu, além de juíza, selecionarei quais alunos competirão. Vai ser uma dupla de cada Casa por ano, ou seja, duas pessoas de Anhangá do primeiro ano, duas do segundo e assim por diante… - ela tomou um fôlego, caminhando até Matheus e devolvendo seus livros. - Cada dupla vai competir com uma dupla um ano acima da sua própria, ou seja, vocês do primeiro ano, competirão com alunos do segundo. Entendidos? Ótimo! - ela não esperou resposta. Apenas seguiu. - Pois bem, todos desembainhem seus cajados!

O cajado! Droga, esqueci que terei que usá-lo!

A menina encarou o fundo espesso da bolsa por alguns segundos, então, a fechou e levantou a mão pedindo uma intervenção.

— Sim, srta. Magalhães, conte-me – disse a professora, se aproximando com uma expressão que indicava que ela sabia do que se tratava.

Inara sacou seu cajado composto por duas penas de cores diferentes unidas ao cabo; Matheus, com sua madeira retorcida e remendada, também estava posto e Antonino mostrava sua ferramenta que formava um pequeno “Y” na ponta.

— Que foi, Aurora? - Matheus indagou, curioso.

Após um sorrisinho sem graça para o amigo, caminhou de encontro a professora.

— Receio que meu cajado venha a dar problemas… - falou a menina, num sussurro.

A mulher pôs sua testa contra a testa de Aurora, como um gesto afetuoso de mãe que a surpreendeu. E então, a menina sentiu-se estranhamente tranquila.

— Pode confiar – disse ela. - Vai dar tudo certo – depois, apertou o nariz da garota com o dedo indicador e sorriu.

A menina desviou o olhar para o chão e sorriu, confirmando com a cabeça, de certa forma, mais confiante.

— Espero que a senhora esteja certa…

— Eu estou! - rebateu ela, virando-se de costas para todos os alunos e erguendo as mãos.

As pedras do local começaram a se pintar com alvos, prontos para a prática de algum feitiço que a mulher ainda ensinaria. Todos estavam ansiosos agora. Matheus olhava o cajado dele com uma visão estranha, pois aquela ferramenta parecia usada e quebrada, com remendos estranhos de cobre.

— Ai, não sei não - reclamou, olhando seu instrumento.

Vai dar tudo certo.

Aurora retornou para seu posto, entre seus amigos, sacando seu cajado escuro com os detalhes avermelhados da bolsa, com um receio grande.

— Não… - Inara perdeu a fala, arfando, olhando o cajado querendo tocá-lo.

Antes que mais pessoas pudessem se pronunciar, Miranda tomou a frente, retornando após seu feitiço.

— Quero dizer que prometo que não beneficiarei minha Casa, Jaci – informou ela, cruzando os dedos, quebrando a promessa.

A turma gargalhou. A loura, apreensiva, duvidada do que a professora lhe alertara. Tentou rir, mas sua risada saiu de forma forçada. O nervosismo começava a subir-lhe a cabeça.

— Muito bem, muito bem. O primeiro feitiço que aprenderemos, é um dos feitiços mais simples que existe, porém, o mais aproveitável. Nos duelos de primeiro ano, apenas há desarmes e o efeito desse feitiço. Então... sem mais delongas, apresento: Periculum!

Ao dizer a palavra, faíscas das cores de Jaci saltaram da sua palma. O coração da garota estava prestes a saltar também, porém quando a mágica foi liberada, se acalmou, respirando fundo e recuperando a coragem pouco a pouco.

— Já fiz esse feitiço…

A menina apertou a ferramenta em sua mão e o encarou com severidade, ordenando-o a obedecê-la desta vez.

— Ah, ótimo, Aurora se ofereceu para ir primeiro! - disse, a moça gesticulando, convidativa.

Todos à volta da garota haviam dado passos para trás para não serem os primeiros, inclusive, todo o seu grupo. Toda a postura de coragem se perdeu ao notar que o restante da classe a deixara ir primeiro.

— Pode vir, querida, vou mostrar como fazer – disse ela.

Ela caminhou, receosa, até o ponto que a professora indicava e apertou o cajado com força, contendo seu nervosismo, sem sucesso.

— Acalme-se – sussurrou Miranda, ao pé do ouvido de Aurora. - Aperte o cabo com firmeza, você sabe como – começou ela. - Isso. Assim. Agora, mire no alvo e dispare suas faíscas. Vermelhas, por Anhangá, certo?

Com as dicas dadas, se afastou e deu o comando para o disparo. A pequena ergueu o cajado e mirou em um dos alvos. Fechou os olhos. Suspirou. Sentiu as pernas bambas falharem em mantê-la em pé. Apontou o cajado. Recitou o feitiço, recordando a primeira vez.

Periculum! - a voz saiu, engasgada.

Uma faísca vermelha estourou na pedra marcada pelo alvo, fazendo pedra chamuscar e pipocar os pequenos brilhos escarlates na noite.

— Muito bem! Parece que temos uma prodígio aqui! - afirmou Miranda, solicitando aplausos.

A turma aplaudiu o feitiço, enquanto a envergonhada Aurora movia-se para de volta dos demais. A professora estava prestes a chamar um próximo, Nino indagou:

— Pensei que estava quebrada. Funcionou bem, para mim.

— É…

O restante da turma foi particularmente bem. Até Matheus conseguiu conjurar a magia, porém não acertou o alvo. A professora, no meio de seus esclarecimentos sobre o feitiço e como ele era utilizado de forma simplista demais, espantou-se quando Antonino não conseguiu liberar uma faísca sequer. Mesmo com ajuda, ele era péssimo na matéria, contrariando o que havia dito antes. Depois, todos foram para suas respectivas casas e dormitórios para aproveitar a noite de descanso após o dia cheio. Aurora, deitada na cama de cima do beliche, observava Inara a olhando, incrédula. Não apenas ela, todos da turma se espantaram quando a mesma retirou o cajado de orabutã da bolsa. Entretanto, algo a consolou. Tudo parecia caminhar nos eixos. Nenhuma estátua havia se curvado. Nenhuma visão vínculo louca. Apenas uma estudante comum, que realizou o feitiço bem. Aparentemente, tudo voltava ao normal, à monotonia de ser uma pequena bruxa comum. Então, a loura dormiu, sonhou com novos feitiços, com novas criaturas e com a esperança de passar despercebida na escola a partir de agora. Porém, despertou na manhã seguinte do sonho feliz, acordada por gritos desesperados.

— Entraram no quarto!

— Ah! O que são essas coisas?

Com os olhos ainda semicerrados, Aurora olhou à volta. O chão, o teto e parte das camas estavam marcados, com um cheiro de queimado fortíssimo. Eram pegadas. Por toda a parte. Torravam o piso. O teto. Os colchões. Entretanto, um caminho de pegadas se unia, ficando mais evidente perto de um beliche, quase uma trilha de chamas.

— Aurora… está em sua direção… - tremeu uma das alunas, apontando assustada.


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