O diário de Noriaki escrita por Hiero


Capítulo 1
Eu chamo isso de Emerald Splash


Notas iniciais do capítulo

Olá!

Devo dizer que me dói o coração ter de escrever sobre o Kakyoin assim, dessa maneira tão triste. Ele merecia muito mais. :(

Peço perdão se pesei a mão no terceiro relato. Não dava pra fazer tom infantil nisso, sabem?



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Este texto foi fornecido à Fundação Speedwagon por Midori Kakyoin (1949-), mãe do autor, e posteriormente publicado junto a diversos outros arquivos da instituição.

A escrita original foi plenamente preservada, salvo correções gramaticais menores. (N.E.)

***

15 de julho de 1980 

Teve uma vez que mamãe quis me dar de presente um caderninho, que, no caso, é você, para eu escrever nele. Ela chamou de "diário". E disse que eu devia dar um nome pro caderninho, porque ela contou de uma menina chamada Anne, que, igual a mim, não tinha nenhum amigo e escrevia no "diário" dela, que ela chamava de Kitty. Mamãe me falou assim mesmo: "Mei-chan, se você não quer falar com ninguém na escola, pelo menos escreve em algum lugar". (Ela me chama de Mei-chan. É de Tenmei. Eu prefiro Noriaki, dá pra ler dos dois jeitos* e todo mundo me chama de Noriaki mesmo, mas ela fala que esse aí não é o nome que ela deu.) E daí ela me deu você, e eu estou escrevendo agora. 

Isso não aconteceu hoje, não, foi ontem. Ela falou que queria que desse um nome pra você e eu não tinha pensado em nenhum, daí decidi que não ia escrever até achar um nome. Mas hoje, mamãe me levou até um lugar que me deu uma ideia. 

Ela acredita que umas cartinhas com desenhos engraçados, que se chamam tarô, podem ler o futuro, e eu não sei por quê, mas ela queria ler o meu futuro. Eu ri porque pareceu muito bobo ver essas coisas em cartas, mas ela me deu um tapa. Eu não chorei. Ela me bate mais se eu chorar.  

Depois disso ela me colocou no carro e foi dirigindo até uma cabana, que parecia uma cabana de bruxa. A gente entrou lá e eu fiquei com muito medo. Tinha lá uma mulher, ela era muito velha e parecia também uma bruxa, e eu fiquei com mais medo ainda; mamãe falou pra ela que queria ver meu futuro nas cartas.  

Eu só lembro que fiquei com tanta vontade de chorar que meu amigo ficou preocupado comigo e apareceu, e eu abracei ele. Daí que mamãe me deu outro tapa. Falou que me viu abraçando o ar e que não aguentava mais meu amigo imaginário, e essa parte eu não entendi, porque meu amigo existe! Eu vejo ele, ele me vê! Só que a mulher muito velha pareceu que ficou feliz com o meu amigo ali.  

Eu também fiquei feliz, porque era a primeira vez que alguém via meu amigo. Daí a bruxa falou que meu amigo era um "estende", não sei como escreve isso, uma manifestação da alma (não sei o que isso é, mas foi o que ela falou), e que além de ler o futuro, também ia dar um nome pro meu amigo.  

A bruxa tirou uma cartinha daquele bolo dela e na cartinha tava escrito Hierophant. Falou que era uma carta das pessoas espertas, mas que são muito sozinhas, e isso se parece muito comigo, né?  

Chamei meu amigo, mas não mostrei para mamãe que chamei ele, e a moça falou que ele ia se chamar Hierophant. Como ele é todo verde, parece um alienígena, ela botou um "Green" no nome, que é verde em inglês.  

Eu gostei muito desse nome Hierophant, acho que vou acabar chamando você assim também. 

Noriaki 

**** 

16 de julho de 1980 

Hierophant: 

Ontem eu te falei do meu amigo, que tem o mesmo nome que você mas tem um Green no nome, mas eu só falei que ele existe. Não falei direito dele. Acho que vou ter de contar como que eu conheci ele, né? 

Então, teve uma vez, acho que eu tinha uns três anos (agora eu tenho oito, logo, logo eu vou fazer nove, em agosto), e nessa vez eu fiquei doente. Eu nem sei por quê, mas eu lembro que eu fiquei bem mal, e mamãe ficou tão preocupada que me levou pro hospital. Acho que devia ter sido sério.  

Daí eu tomei um remédio e fiquei bem, só que ainda me deixaram lá por uma noite pra ver se nada acontecia, porque eu tinha ficado bem muito rápido. Eu dormi, e quando eu acordei eu vi meu amigo pela primeira vez.  

Eu não sabia o que era o meu amigo nem como ele estava ali, mas eu não fiquei com medo. Não sei por que não, mas... não fiquei. Eu cutuquei a minha mãe, que tava do meu lado, e falei "olha, mãe, tem um bicho verde na minha cama!", e ela quis medir a minha febre. Não entendi. Mas esse foi mesmo o primeiro dia que eu vi o Hierophant Green (ainda não me acostumei com esse nome, mas achei legal). 

Daí, na escola, eu ficava mostrando ele pra um monte de gente, mas todo mundo só me falava que eu tava maluco, que eu era mentiroso, e ficavam rindo de mim. E teve uma outra vez (vou ter de contar essa história, algum dia) que me bateram muito, conseguiram quebrar meu braço, e eu chorava mas só me batiam mais. Eu lembro que ficavam me falando "vai tomar seu remedinho" e coisas assim. 

E a partir desse dia, eu decidi que nunca mais ia falar com ninguém, até achar alguém que pudesse ver o meu amigo, porque quem não podia ver ele só me chamava de mentiroso. E eu até hoje não falo com ninguém. Todo mundo na escola tem um monte de amigos, até escrevem os nomes deles no caderno, mas eu fico sozinho. Ninguém tem um amigo igual ao meu, e ainda me batem e me chamam de maluco se eu mostrar o Hierophant Green. 

Teve uma vez que chamaram mamãe pra escola, e eu fiquei na porta da sala dos professores escutando a conversa. Eram eles falando de como eu não tinha amigos. E ela falava "eu sou mãe do Tenmei, mas não sei o que é essa postura dele", e foi aí que eu percebi que ela nunca ia entender.  

Ela não tinha um amigo, um "estande", como a bruxa da cabana falou. Ela nunca foi chamada de mentirosa, ela sempre teve amigos. Mamãe tem o papai, papai tem a mamãe, e eu não tenho ninguém. 

Será que vai ser pra sempre assim?  

Noriaki 

*** 

18 de julho de 1980 

Hierophant: 

Desculpa se a escrita de hoje parecer muito séria pra mim, mas eu tô triste e com raiva. Hoje vieram me encher o saco de novo. 

Na hora do recreio na escola, eu fico longe do resto das pessoas, porque quero conversar com o Hierophant Green sem ninguém me chamar de maluco. Eu fico atrás de uma árvore, falando baixinho. O Hierophant não me responde, mas eu entendo o que ele quer falar mesmo assim. E a gente fica lá, conversando, como dois bons amigos.  

Só que hoje as coisas não foram assim. Hoje um grupo de três meninos da minha idade veio atrás de mim. Esse pessoal foi o mesmo de quem eu falei no último dia em que escrevi pra você, os que quebraram meu braço. Dessa vez, eles passaram perto da árvore onde eu estava e me ouviram falando baixinho. 

 O mais alto falou "olha lá, a aberração tá falando sozinha de novo!". Eu na hora parei de conversar e me encostei ainda mais na árvore, olhando para os três com medo, e falei baixinho. "O que... vocês querem... de mim?" 

"Tadinho do Noriaki, acho que a gente não devia ser tão cruel", falou um outro, fazendo uma voz irritante. "Naaaah. Acho que esse doente mental ainda não aprendeu que não precisa ficar mostrando pra todo mundo que ele é um doente mental. 'Falando com seu amigo?' Você nem tem amigos! Ninguém te quer por perto!"  E ele me deu um tapa. Eu não falei nada.

"Aí, Hideo", o terceiro disse, "eu vou adivinhar o que ele vai dizer agora. Ele vai fazer essa vozinha de choro e falar 'eu é que me afasto de vocês!'. Eu já vou responder. Ô idiota, ninguém suporta a sua demência. Você nem precisa se afastar, todo mundo já faz isso naturalmente." 

O primeiro que falou olhou pra mim. 

"Ah, acho que ele vai chorar! Tadinho! Por que que você não chama esse seu amiguinho imaginário pra te ajudar?!" E, então, ele jogou uma pedra na minha cabeça, e eu soltei um "ah!". Era uma pedra não muito grande, mas fez um estrago e eu consegui sentir sangue descendo pela minha testa. Eu acho que já tinha começado a chorar, de dor e de tristeza mesmo.  

 "Por quê?", eu disse baixinho. Eu ouvi os outros meninos rindo de mim. E, daí, aconteceu uma coisa.  

O Hierophant Green tá comigo faz uns seis anos, só sendo meu amigo, só me fazendo companhia, mas ele nunca tinha me protegido assim. 

Ele me abraçou com os bracinhos estranhos dele... e eu vi o que aconteceu. Saiu das mãos dele um líquido com um monte de pedras preciosas verdes (acho que o nome é esmeralda, mas não tenho certeza), e essas pedras foram parar na cabeça dos três meninos.  

 Eles saíram correndo e gritando que eu era um monstro, e eu fiquei pra trás, mas eu não fiquei tão feliz com a situação. Óbvio que ver meu grande amigo me defendendo foi muito bom, mas eu não conseguia ficar feliz. A dor do machucado da pedra e deles me chamando de demente era muito grande. E eu fiquei ali por algum tempo parado, e o Hierophant não me largava por nada.  

Fui até a enfermaria e me fizeram um curativo na cabeça, mas eu não consegui falar de como aconteceu na hora. Pensei que, se eu falasse, só iam voltar, mas depois de ver que eles tinham medo de mim agora, resolvi falar mesmo. É ver se não vão me matar, né?  

Mamãe me perguntou o que aconteceu, e eu não consegui contar a verdade. Quando eu contei, lá quando quebraram meu braço, ela pareceu que ficou muito triste. Mesmo com ela gritando comigo porque eu tenho um amigo que ela não vê, eu não quero dar mais motivos pra ela ficar triste. Eu odeio mentir, mas eu só disse que tropecei e machuquei a cabeça.

Eu tô cansado agora, e ainda meio triste. Acho que, por hoje, eu paro por aqui.  

Noriaki 

***

Um pulo no tempo: 10 de outubro de 1988 

— Meu lorde, tenho permissão para dirigir-lhe a palavra? 

— Concedida. Diga, Enya. 

— Primeiramente, como vão seus planos quanto a recrutar a arcana maior? 

— ...Lentos. Eu encontrei o Mago em um bazar da região, mas ele fugiu. Muhammad Avdol. Veio a mim a informação de que ele é amigo do Joestar e que ambos encontraram o Louco, um cachorro, nas ruas de Nova York, o que indica que eu não conseguiria ter todos os vinte e um ao meu lado. Uma lástima, de fato, mas eu acredito que ainda teria a vantagem numérica. Amantes, Enforcado, Imperador, Sacerdotisa... todos já estão em minhas mãos. 

“A Estrela ainda é um mistério, talvez ninguém nem a tenha reclamado. Poderia ser outro Joestar, quando o neto de Joseph despertar a maldição. Mas, de fato, eu consegui recrutar a Carruagem. Enya, por favor, me lembre de não deixá-lo encontrar seu filho. Não sei se a semente de carne conseguiria firmar na cabeça teimosa dele que os dois servem apenas a mim.” 

— Afirmativo, meu lorde. Mas, de fato, eu venho trazer-lhe uma informação.  

— Compartilhe. 

— Recentemente, tive um lapso de memória que pode lhe ser útil. Eu conheci o Hierofante.  

“Alguns anos atrás, quando estabeleci negócio em Sendai, eu tive uma cliente recorrente. Midori Kakyoin. Uma médica, mãe de uma criança, incrivelmente apegada ao tarô. Mas não é ela quem importa — dados os fatos, é improvável que ela seja usuária de Stand. Certo dia, ela trouxe o filho à minha tenda. A criança tremia tanto de medo que consegui ver seu Stand, tentando protegê-la, demonstrando um afeto peculiar a seu mestre. Eu usei minhas cartas para lhe dar um nome. 

“A carta do Hierofante foi a que surgiu. Como o senhor deve saber, representa a tradição, a liderança, a estratégia. Nunca duvidei das cartas, mas naquele. momento, entregar tal responsabilidade a uma criança me pareceu... bizarro. Perdão pela divagação. Enfim, eu aceitei a reclamação da carta e nomeei ao Stand Hierophant Green.” 

— Grandioso, Enya. Você sabe onde ele está agora? 

— Eu ainda vi a mãe por mais alguns anos antes de deixar o Japão, então acredito que ainda morem ali. O nome da criança era Noriaki Kakyoin. Como você pretende atraí-lo, meu lorde? 

— Preciso ter informações a respeito do modo de vida do rapaz. O método apropriado aparecerá. 

Este é um testemunho de um mercenário que trabalhou para DIO Brando, que foi diversas vezes apontado o principal suspeito de ter assassinado Noriaki no Cairo. O ex-subordinado desejou permanecer anônimo.


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Notas finais do capítulo

* Segundo o próprio Araki, o plano era que o primeiro nome do Kakyoin fosse Tenmei, mas o editor leu o kanji errado e acabou ficando Noriaki. Na entrevista do JoJonium que tem o Kakyoin na capa, o Araki fala "é como se ele quisesse que os amigos dele chamassem ele por um nome, mas os pais dele chamam pelo outro", e eu decidi incluir isso.

Er isto. Que tal?

A cena do Emerald Splash foi inspirada nessa tirinha: http://ladynorthstar.tumblr.com/post/120316833066/thank-you-before-he-could-begin-to-understand

Eu tenho uma headcanon de que a Enyaba, a véia que tem o Justice, tenha sido quem batizou o stand do Kakyoin, daí eu resolvi incluir ela como personagem aqui. [UPDATE 27/10/2018] E também fiz esse retcon.

E caso você tenha achado estranho o nosso protagonista tendo aula em 18 de julho: no Japão, as férias de verão (inverno pra nós) começam no final de julho e terminam no final de agosto ^_^



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