Entrelace de opostos escrita por Nemui


Capítulo 4
Capítulo 4




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O próximo passo depois de perder o inimigo na fuga era continuar com as poucas pistas que tinham. Sísifo encontrou El Cid investigando o local onde a família do lenhador fora morta. Não sabia como fazer as pazes com o colega, e talvez fosse mesmo impossível.

"Oi. Imaginei que estivesse aqui. Encontrou algo?"

"Nada. Não temos pista alguma."

"Eu sinto muito se estiver chateado. Mas não acho que agi mal."

"Eu deveria imaginar que agiria assim, considerando que agradeceu aos cavalos. Mesmo assim, eu não entendo. Por que você bloqueou o caminho para as montanhas? Nós teríamos conseguido encurralá-lo lá."

"É que me pareceu muito estranho ele ter fugido para a montanha, quando o caminho mais óbvio era o aberto. Fiquei desconfiado de que houvesse algum truque."

"Entendi. De qualquer forma, é inacreditável o que ele fez… lembra uma lenda que uma amiga me contou."

"Lenda?"

"Do oriente. Ela dizia que, na mitologia oriental, a raposa teria poder de se transformar. Podia ser benevolente ou maldosa - parece que estamos lidando com o segundo tipo. Mas isso é só algo que me veio à cabeça, não ligue. Aquilo definitivamente é um humano inimigo."

Sísifo não tinha tanta certeza. A imagem da raposa lambendo a cabeça de seu filhotinho assustado certamente era um sinal. Seria ótimo se seu irmão estivesse ali para dizer-lhe o que aquilo significava. Resolveu retornar para a cidade.

"Ei… Será que posso pedir a sua ajuda?"

"Para quê?"

"Eu quero conversar com aquela menina mais uma vez, e com a mãe dela. Preciso que você distraia a mãe dela enquanto converso com a pequena."

"Como espera que eu consiga isso? A mulher queria pular no meu pescoço mais cedo."

"Não sei, dê um jeito. Preciso mesmo conversar com a garota."

"O que você faria em meu lugar?"

"Algo que você provavelmente não conseguiria."

"Por que não?"

"Porque você é duro demais, El Cid. Nós somos muito diferentes, os meus métodos são diferentes, podem não funcionar com você. Pense em um jeito seu de tentar distrair a mulher."

El Cid ficou pensativo por um momento e pegou a bagagem.

"Estou pronto."

"Ótimo! Vamos!"

Já estava entardecendo quando chegaram à casa da mulher com criança. Sísifo e El Cid ficaram olhando para a fachada por algum tempo.

"Estou curioso", disse Sísifo. "Como pretende distrair a mulher?"

"Distrair? Você só precisa de um tempo para conversar com a menina, certo?"

"Sim."

"Distrair é o que fazemos com crianças, e não adultos."

El Cid bateu na porta da casa e aguardou. A mulher atendeu, com uma cara aborrecida.

"Você de novo? Eu já disse tudo que sei…"

"Eu sei… Mas preciso conversar com a senhora."

"Sobre o quê?"

Ele segurou o pulso dela com força.

"Sobre o que quiser. Não vou deixar que vá sem terminarmos essa conversa."

"Ei! Me solta! Socorro! Socorro!"

Logo vizinhos apareceram, e Sísifo, sem querer imaginar no que aquela confusão acabaria, saiu correndo na direção do beco. Certamente segurar fisicamente a mulher na entrada de casa funcionaria, mas geraria o maior tumulto. Pulou o muro e invadiu o quintal da casal. O quarto da menina era no andar de cima, onde havia uma janela aberta. Saltou até ela e viu a pequena de costas para ele, espiando a sala pela porta do quarto. Sem fazer barulho, aproximou-se por trás e cobriu a boca dela, assustando-a. Não podia chamar a atenção da mãe naquele momento, com tantos vizinhos brigando com El Cid.

"Fique calma, sou eu, o Sísifo, ok? Agora fique tranquila, eu só vim conversar. Meu amigo está distraindo a sua mãe para que ela não interrompa a gente. Eu vou te soltar, mas por favor, não grite. Quero falar do cara que não é fantasma de novo. Você promete que não vai gritar?"

A menina afirmou com a cabeça, e Sísifo soltou-a, sorrindo.

"Obrigado. Olha, eu prometo que não vou contar nada pra sua mãe. Mas precisava saber de uma coisa. Além do homem que pulava o muro, além do seu pai, você via mais alguém ou algo? Pode ser qualquer coisa, qualquer coisa mesmo…"

"Não! Eu não via nada…"

"Por favor…"

"Moço, eu falei a verdade… Na noite em que o outro homem morreu, eu não consegui ver do quarto… Ouvi a discussão, eu sei que eles brigaram… acho que meu pai se defendeu… Eu estou falando a verdade…"

A garota já soluçava, começando um escandaloso choro. Sísifo rapidamente acalmou-a.

"Ei… Acalme-se… Eu acredito em você… Está tudo bem."

"Não, moço… Não acredite em mim, moço…"

"Por que não?"

"Não é verdade… Eu não posso falar… eu não posso falar… Eu não quero ficar sem o meu pai!"

"Está tudo bem, não precisa falar se não quiser. Eu só quero entender a verdade… o que realmente aconteceu aqui."

"Mas se eu falar a verdade, o meu pai vai embora! Eu não quero! Você vai prender o meu pai e vai levar ele pra cadeia!"

"Tudo bem, se acalme. Respire devagar..."

A menina, abraçada a ele, parecia desabafar todo o sofrimento reprimido de um longo período. Sísifo não sabia se teria de impedir o pai dela, acabando por separá-la, mas sabia que o faria se ele provasse ser culpado de algum crime.

"Olhe… Eu posso ver que está sofrendo muito. Eu entendo se não quiser falar, por medo do que possa acontecer no futuro, e você tem muita razão em ter medo. Mas talvez esta seja a chance perfeita de dar um fim à sua tristeza e ao seu medo. As coisas também podem dando certo. O futuro é assim: é sempre uma aposta. Portanto se acalme e pense bem. Se quiser me contar o que é tão difícil de falar, prometo que tentarei dar um final feliz para esta história. Só não sei se conseguirei."

"Não… Eu não quero perder o meu novo pai…"

"Seu… novo pai?"

A menina continuou chorando por mais um tempo, e Sísifo só rezava para que ela resolvesse contar, pois a briga no lado de fora da mulher e dos vizinhos contra El Cid estava piorando.

"Poderia me falar mais sobre o seu novo pai? Ele é gentil com você?"

"Ele é bonzinho… Ele brinca comigo… Me leva pra passear… Me mostra um monte de coisas… Ele é muito mais legal do que o meu pai de antes…"

"Como era o seu pai anterior?"

"Ele não ligava pra mim… Só me colocava de castigo… Ele era ruim…"

"E como foi que o seu pai antigo mudou para o novo pai? Pode me falar?"

"Eu estou com medo! Não quero que o meu novo pai vá embora! Eu amo muito ele!"

"Eu entendo… Desculpe. Não precisa falar se quiser. Vamos falar sobre algo diferente?"

"Sobre o quê…?"

"Sobre… Ah, sim. Hoje eu andei pela floresta sabe? Eu encontrei algo tão legal! Uma toca cheia de filhotes de raposa! Eu nem sabia que havia raposas por aqui!"

"... Vá embora daqui!"

"Hein?"

"Vá embora! Eu… Eu não quero perder meu novo pai! Eu não quero… Por favor, vá embora…"

"Ah… Desculpe se eu disse algo que te chateou. Eu vou embora agora, está bem? Me desculpe."

"Por favor… Não machuca o meu pai… Ele é muito bonzinho."

"Está bem. Eu não sou alguém mau. Não machuco quem é bom."

"Por favor…"

Sísifo saiu pela janela, deixando a garota em paz. Não imaginava que a menção da raposa traria uma reação tão violenta, e ainda com relação a um 'novo pai', mas deixaria para pensar naquilo depois. Correu em volta do quarteirão e viu El Cid segurando a mão da desesperada mulher e não deixando ninguém chegar perto dele. Rapidamente segurou-o pelo braço e puxou-o embora.

"Desculpem, pessoal, ele está com problemas! Desculpem, eu prometo que vou cuidar melhor dele!"

"Eu não sou louco", protestou o colega.

"Esta é a melhor maneira de justificar essa loucura que fez. Vamos embora!"

Saíram correndo e despistaram os moradores que os seguiram até certa distância. Sísifo não conseguia parar de pensar no sofrimento da criança com relação ao pai. O pai dela mudara, e isso tinha a ver com alguma raposa. Finalmente estava começando a entender.

"E então, Sísifo? O que descobriu?"

"Hein?"

"A conversa. Espero realmente que tenha conseguido algo para a missão."

"Ah, sim… Só que ainda não tenho certeza da minha ideia. A menina falou que tinha um pai que era rude com ela, e um novo pai que era gentil e que ela não queria perder. E… quando falei que vi uma toca com filhotes de raposa, ela repetiu que não queria perder o novo pai e me mandou ir embora."

"O que isso significa?"

"Eu acho… que o homem que nos atacou é na verdade o novo pai dela, e que ela já deve tê-lo visto se transformando numa raposa."

"Isso faz sentido."

"Mas ainda acho essa história estranha… O que você sugere que façamos agora?"

"Vamos voltar a procurar esse homem. Ele é nosso inimigo, não podemos esperar que ele ataque."

"Eu concordo que precisamos encontrá-lo… Mas não sei se ele precisa ser nosso inimigo."

"O que quer dizer?"

"Se ele está sendo tão bom para uma criança, por que seria alguém que devamos chamar de inimigo?"

"Porque ele tentou nos matar hoje."

"Sim, mas…"

"Você está pensando demais, Sísifo. De qualquer forma, como já anoiteceu, vamos dar o dia por encerrado. Ainda não temos sequer onde dormir."

"Ah, eu conheço uma estalagem mais em conta, não muito longe daqui. Isso não é problema. Mas, sim, acho que está bom por hoje."

A verdade era que Sísifo estava cansado daquela missão com El Cid. Com certeza era bem mais fácil trabalhar com Hasgard, que normalmente concordava com suas decisões, mas precisava ter paciência com o colega, se quisesse se tornar um cavaleiro melhor.

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Sísifo relaxou na cama após um banho. El Cid apareceu logo em seguida para dormir. Sentia o corpo um pouco pesado, mas não mais que do que a mente. Qual era o segredo daquela raposa ou homem? Não entendia o que havia acontecido entre aquele ser misterioso e o tal do lenhador. Ainda precisava de mais informações, mas onde obtê-las? Talvez levasse mais tempo naquela missão do que imaginara…

Quando se deitou, El Cid puxou assunto:

"Ei, Sísifo. Qual é seu sonho?"

"Hum?"

"Meu sonho é me tornar Excalibur. Treino duro para me tornar uma espada que possa cortar qualquer barreira. E você?"

"Ah… Meu sonho… No começo eu achava que meu sonho era ser como o meu irmão… Mas depois eu percebi que não era bem isso que eu devia desejar. Hoje eu só quero o bem daqueles que estão à minha volta, El Cid. Quero ser forte com meus companheiros. Quero proteger o futuro de todos com todos. Enquanto eu puder fazer isso, estarei bem."

"Se isso é verdade, o seu sonho já não se realizou?"

"Bem, ainda existe um futuro diante de todos. Enquanto houver um futuro, continuarei a lutar pelos meus amigos. Eu realmente espero que você consiga realizar o seu sonho, El Cid, e falo sério quando digo que quero ajudar. Em alguns anos, teremos a Guerra Santa… Gostaria muito de que meus amigos pudessem ter um futuro depois dela… para poder realizar seus próprios sonhos. Acho que esse sonho vai ser mais difícil de realizar."

"Quando você se refere a todos que estão à sua volta, está falando também da natureza, como aquelas raposas. E está falando também de seus inimigos?"

"Por que não? Imagino que eles também tenham sentimentos e motivos fortes para estarem onde estão. Mas um campo de batalha é um campo de batalha, e eu tenho que lutar contra meus inimigos. Afinal, eles querem destruir o direito dos outros. Mas… realmente, eu me sinto mal se tiver que matar um inimigo."

"Quantos inimigos você matou até hoje?"

"Bem, alguns, que eu fui obrigado. Mas sempre evito."

"Você tem um coração mole demais. Essa é a sua fraqueza."

"Pode ser… Mas El Cid… Eu realmente acredito que é possível ser forte com os amigos. Isso não é uma fraqueza. Afinal de contas, quando sabemos que um amigo está em perigo, nós nos tornamos mais valentes para ajudá-lo. Eu não acho que isso seja tão ruim quanto diz. Seria muito legal se você um dia entendesse o que quero dizer… Porque talvez isso possa ter a ver com seu caminho de se tornar uma espada capaz de cortar tudo."

"De que jeito?"

"Eu te disse… Não é vergonha alguma receber a ajuda de um amigo… Afinal, se você não tivesse ficado lá na frente, distraindo aquela mulher, eu não teria conseguido conversar com a menina. Pense nisso. Se bastasse apenas um cara, não precisaríamos de oitenta e oito guerreiros no Santuário! E também… Eu não seria tão bom quanto hoje se não tivesse tido o apoio de muitos… Até da serva que me poupa tempo cozinhando minhas refeições e dos animais que morreram para me alimentar. Então, pensar que sua força vem apenas de você é uma fantasia que criou para si mesmo, El Cid. Afinal, tenho certeza de que conheceu pessoas que o ajudaram a chegar até aqui…"

El Cid não respondeu. Sísifo supôs que o colega estivesse refletindo sobre suas palavras. Satisfeito, ajeitou-se melhor na cama.

"Bem, é melhor dormirmos. Boa noite."

"...Boa noite."

Aquilo definitivamente não fora um eco. Sísifo não demorou para adormecer, acabando por sonhar com seu irmão. Ele estava conversando com um cervo, falando sobre a natureza e como os animais deviam ser curvar diante do desejo dela… Mas esqueceu sua fala em menos de um segundo, ao despertar-se assustado com um toque na mão. Olhou em volta e não encontrou nada. Fora impressão? El Cid também acabou despertando.

"O que foi, Sísifo?"

"Não… Eu senti que algo tocou em mim... "

"Deve ter sido um mosquito. Já matei três."

"Pode ser…"

"Volte a dormir."

Desconfiado, Sísifo olhou em volta mais uma vez e voltou a deitar-se. Foi quando sentiu um cheiro estranho. Levantou o cobertor e surpreendeu-se com o que viu: era um filhote de raposa, possivelmente o inimigo que os atacara de dia. Sísifo pensou em acordar El Cid, mas tinha a impressão de que o colega acabaria recorrendo à violência. Escondeu o animal com a toalha e, mantendo-o oculto aos olhos de El Cid, dirigiu-se para a saída do quarto. Este o fitou, e Sísifo explicou, antes de sair.

"Preciso tomar um ar. Volte a dormir."

Esperava que o companheiro não tivesse percebido. Não tinha a intenção de trair, mas precisava dar uma chance àquela estranha criatura. Carregou a raposa para fora da estalagem e colocou-a sobre uma cadeira na varanda de um bar próximo. Ela segurava na boca a pedra que possuía uma grande quantidade de cosmos.

"Será que sua mãe e seus irmãozinhos não estão preocupados por deixá-lo vir até aqui? Ou então a sua nova filha humana?"

A raposa fechou os olhos e logo os reabriu, tristes.

"Como sabe que sou uma raposa e não um humano?", disse, com voz de um menino.

"Nenhuma raposa erra na hora de reconhecer o próprio filho. É um nariz muito sensível."

"E como sabe que sou o novo pai da menina?"

"Ela sabe que você é uma raposa, e ficou apavorada quando falei de raposas para ela. Mas isso é tudo o que sei. Não entendo por que você nos atacou, não entendo muitas coisas que aconteceram por aqui."

"Você não veio aqui para me tirar de minha família humana?"

"Não. Eu estava investigando a morte do lenhador."

"Eu pensei que tivesse vindo para contar a verdade para elas… De que eu não sou ele… Por isso ataquei… mas vocês são muito fortes… Tive medo."

"Se eu puder, evitarei pisar na felicidade dos outros, sobretudo de uma criança. Mas me diga, como consegue se transformar? É por causa dessa pedra?"

"Toda raposa de minha família consegue, mas por pouco tempo. Minha mãe disse que somos diferentes de outras raposas, que vivemos muito e podemos falar e nos transformar em humanos… Com a pedra, consigo me transformar por mais tempo."

"E como você, um filhote de raposa, acabou com essa pedra e uma família humana?"

"Foi… há quatro anos… Eu sempre fui agitado, é o que minha mãe diz. Fui brincar longe do ninho e caí num buraco. Minha perna ficou muito machucada. Antes que minha mãe viesse, o homem com cheiro de madeira chamado Basilio me ajudou. Ele me deu comida e cuidou da minha perna. Eu brincava com a filha dele e a companheira dele. Mas elas acabaram mortas por homens ruins… Depois disso, ele mudou… Ele queria fazer uma coisa terrível, quebrar uma lei natural! Ele queria quebrar a lei da própria morte!"

"De que forma?"

"Ele vinha ajudando um homem da cidade que fazia remédios… Esse homem queria fazer um remédio para fazer com que os mortos voltassem à vida… Os dois começaram a trabalhar juntos… E eu não sabia o que fazer… É errado… É contra a natureza… Então… eu roubei a pedra que o homem estava fazendo… Ele pensou que o Basilio tinha pegado… Eles brigaram…"

"Então ele matou o Basilio?"

"Não! O Basilio que matou ele! E ele queria matar a família dele também! O Basilio, que sempre foi bom pra mim… Então eu usei o poder da pedra pra mudar o rosto do homem para o do Basilio… E me transformei no homem porque fiquei com pena da família dele. Porque eu não queria ver ninguém triste. Mas… Se descobrirem a verdade… Minha mãe disse que muita gente quer matar raposas como nós! Eu fiquei com tanto medo! Tentei fugir pro rio da montanha, mas você não deixou… Corri pro ninho… Eu fui tão bobo! Então você não quis machucar os meus irmãos… Você é um humano bom, afinal…"

"E o Basilio? Para onde foi?"

"Não sei… Não sei… Eu procurei por ele. Procurei na casa dele, procurei em muitos lugares onde ele andava. Mas foi horrível…"

"Por quê?"

"Porque… Eu vi buracos na terra… e na montanha… árvores caídas… E eu acho que foi ele que fez aquilo, não sei como, mas algo me diz que foi ele! Eu tenho medo de que ele volte! Eu quero ajudar, mas não posso, e tenho tanto medo, porque sou fraco…"

"Fraco com certeza não é. Nós nem notamos sua presença à tarde, e, agora há pouco, eu também não notei quando subiu na minha cama."

"Minha mãe me ensinou a andar quietinho pra poder caçar... Mas eu tenho medo de lutar…"

"O cosmos contido na pedra é muito poderoso. Você sabe como ele o conseguiu?"

"Eu sentia um cheiro ruim… de carne ruim… no quintal do homem… À noite, o Basilio ia encontrar com ele, e eles rezavam para um deus que não conheço… Então fizeram a pedra… Não sei dizer como, porque não sou esperto…"

"Qual é o seu nome?"

"Minha mãe me chama de Aureus…"

"Muito bem, Aureus… Você se meteu em uma encrenca e tanto. Me diga, por que me procurou?"

"Quero que não me machuque… Queria explicar… Tenho muito medo de que alguma coisa aconteça com meus irmãos ou com minha família humana… Tenho medo de vocês… Por favor, não me odeiem! Eu só queria proteger a minha família!"

"Quanto a isso, não se preocupe. Não vou te fazer mal se você não me fizer nenhum mal. Nem quero causar sofrimento para suas duas famílias."

"Você… é mesmo um humano bom. E entende a natureza."

"Bem, não tão bem quanto gostaria. Mas estou feliz que tenha reunido a coragem para vir conversar comigo."

"Tenho mais um pedido para você."

"E o que é?"

"Tenho muito medo de Basilio… Mas quero ajudar… Ele cuidou da minha perna…"

"Entendi. Vou procurar por ele."

"Obrigado!"

Aureus saltou sobre ele, abanando cauda, tal como uma criança. Bem, ele era uma. Sísifo não entendia como aquela espécie de raposa vivia, mas imaginava que os filhotes demorassem anos para crescer. Acariciou o pelo do filhote, extremamente macio.

"Aureus, há quanto tempo você nasceu?"

"Huh? Acho que cinco invernos…"

"Entendi."

"Eu ainda vou demorar muito pra virar uma raposa adulta. Minha mãe disse que preciso passar por muitos e muitos invernos! Se… Se eu conseguir continuar seguro…"

"Acho que temos que resolver seus problemas, mas um de cada vez. Venha comigo."

"Para onde?"

"Ora, voltar a dormir. Depois que o sol nascer, iremos procurar o Basilio. Não se preocupe, eu vou te proteger."

"Hein?! Mas vai ser depois da minha hora de dormir de novo! Eu não consigo ficar acordado por muito tempo…"

"Ah, é… Esqueci que raposas dormem de dia. Mas faça uma forcinha para dormir agora e depois vamos procurar o Basílio."

"Está bem…"

Quando retornou para o quarto, El Cid não acordou. Deitou com cuidado na cama e voltou a dormir, embora não sentisse mais tanto sono. Aureus acomodou-se em meio ao cobertor e adormeceu junto dele, escondido da visão de El Cid.

 

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"Sísifo!"

Sísifo deteve o leve golpe de cosmos com o braço, machucando-se. Sabia que o companheiro tentaria matar Aureus assim que o visse.

"Por que fez isso? Afaste-se!"

"Ele não é nosso inimigo, El Cid! Veja, está tremendo de medo. É só um filhote."

"É um inimigo disfarçado para ganhar a nossa confiança. Não acredite nele."

"El Cid, eu já decidi confiar nele! Não vou permitir que o machuque!"

"Droga, Sísifo, ele está te enganando!"

"Se estiver me enganando, serei forte o bastante para dar a volta por cima. Mas eu quero acreditar nele! De qualquer forma, não temos outra pista senão ele, não é?"

"Tsc… Vou ficar atento o tempo todo. Tome cuidado com essa bola de pelos."

"El Cid… Ei, Aureus, não se preocupe…"

A pequena raposa tremia mais do que antes. Sem aguentar mais, Aureus saltou da cama e saiu correndo para fora do quarto.

"Me desculpem!"

El Cid acompanhou-o com os olhos.

"Ele fugiu porque eu vi a verdade."

"Não. Ele fugiu porque você o deixou apavorado. Eu vou atrás dele."

Sísifo saltou pela janela e alcançou facilmente Aureus, que se debatia enquanto chorava.

"Calma, eu não vou te machucar, Aureus! Só quero conversar com você…"

"Me desculpa! Me desculpa…"

"Está tudo bem. Sabe, talvez seja melhor você voltar para a sua toca, enquanto nós resolvemos o problema do Basilio. Foi um erro eu sugerir que fosse com a gente, quando sente tanto medo, Aureus. Eu continuo acreditando em você e farei de tudo para que Basilio volte a ser o homem que te ajudou. Portanto, não se preocupe e fique um tempo seguro, junto com sua mãe. Tudo vai dar certo."

"Sísifo…"

"Agora vá. E tome cuidado."

Aureus lambeu rapidamente o ferimento causado com El Cid, antes de saltar para a rua e sair correndo. Sísifo tinha a certeza de que o filhote dizia a verdade. Afinal, seu irmão havia lhe dito que alguns animais haviam nascido com poderes especiais por terem uma conexão mais profunda com a natureza.


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Notas finais do capítulo

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