Hanté escrita por Lady Led


Capítulo 1
fantasmas.


Notas iniciais do capítulo

"você está apaixonada por um fantasma."



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Hanté: do francês, assombrada.

X

Você foi o pior que eu já fiz comigo mesma, e

mesmo assim, eu não consigo parar de te amar.

X

Karen segurou o copo de café de isopor entre os seus dedos magros enquanto caminhava pelas ruas esburacadas de Nova York, tentando desviar da quantidade perigosa de turistas que atingiram Hell’s Kitchen por nenhuma outra razão além da onda de assassinatos que havia acontecido nos últimos meses na cidade. Os saltos altos de seus calçados clicavam no chão ao mesmo ritmo que seus passos rápidos, que tentavam em vão correr contra o relógio. Ela estava atrasada para o trabalho.

A mulher loira percebeu que desde que sua vida tinha virado um inferno entre caçar homens que faziam justiça com as próprias mãos, seus ciclos de sono e horários tinham virado uma sequência de horas descompostas pelo dia, como se as vinte e quatro horas normais não existe-se em sua realidade, ou naquele universo.

Karen passou o cabelo pela orelha, sentindo os fios oleosos sobre a mão que estava com os dedos dormentes de tanto segurar o café no copo de qualidade duvidosa. Fazia tempo desde que ela tinha lavados os fios. A vitrine da loja reluziu sobre o sol nascendo no horizonte, e as duas peças brilharam em direção a ela.

Era quase uma ofensa para o coração de Karen que duas coisas assim estivessem juntas em um par de correntes como se fosse uma bijuteria qualquer. Seu coração se sentiu ofendido em encontrar nos seus desejos a vontade de entrar na loja e comprar pela bagatela mais alta que tivesse o desenho de crânio prateado e as dogtags do exército, como se gritasse o nome dele para ela.

Ela era uma mulher crescida, que tinha colocado seus olhos em coisas horríveis, e em mais sangue do que diversas gerações da família dela já viram juntas, e mesmo assim todos os seus órgãos se sentiram ofendidos e quebrados e retorcidos por terem visto um par incomum que lembrava tanto a Frank.

Seus pés deram a volta, o copo de café tinha ido para o lixo público quase cheio, e seus cabelos batendo no seu rosto com o vento que correu diretamente em sua direção.

Olá, eu quero aquele par que está na vitrine.” Ela disse com a voz correndo assim que chegou até a atendente de cabelos curtos vermelhos, e óculos de grau pesados. A moça mais jovem que Karen olhou para a vitrine de onde estava, e cruzou os olhos com os delas, fazendo a pergunta mental de o porque uma mulher de cabelos loiros, saia lápis e camisa social se interessaria por um par de objetos tão grosseiros. “O crânio e a dogtag, por favor.” E ela sacudiu uma quantidade razoável de dinheiro.

Sem cartões, Kare, mantenha-se sem rastros. Ela escutou a voz de Frank em sua cabeça, como se ele estivesse bem ali do seu lado, despejando conselhos de guerra para mais um soldado que estava treinando.

O metal da corrente tocou nas mãos dela quando a moça veio lhe entregar a junção das peças. Karen sentiu o peso das dogtags e o brilho do desenho plano de crânio, como se fosse a própria pintura da roupa de Frank. Ela envolveu os dedos finos no fecho, e passou pela sua cabeça, fechando-os atrás.

A corrente menor ficou quase como uma gargantilha em sua garganta, sendo coberta pela camisa azul clara, deixando o desenho sem rastro algum por suas roupas. Mas a corrente maior, reproduzindo fielmente as identificações do exército ficou saltada sobre os seus seios, quase como se fosse uma ofensa aquela coisa presta, e de hastes negras ao redor da prateada estava ali, pendurada entre as suas roupas bonitas e sociais.

Ficou bonito em você.” A vendedora lhe diz, mas é o som da voz de Frank que Karen escuta.

X

Frank não existe mais.

Sobre a pele, os órgãos e um coração bombeando sangue e raiva, existe apenas Justiceiro e sua sede de vingança implacável que se alimenta cada vez mais de taças e taças de ódio e autopiedade.

Justiceiro cospe um punhado de sangue que estava em sua boca, e segura novamente a arma grande em seus dedos quebrados e rachados de tantas e tantas lutas. O ar tinha se transformado em algo quente e pegajoso, parecendo estar estável no ar, como se nada mais se movesse naquela camada de calor.

A jaqueta estava pastosa nas costas de Frank, escorrendo junto com seu suor e seu sangue. Ele limpou os olhos com a mão livre, gemendo um pouco de dor quando seus dedos encontraram um ponto sensível ainda tentando ser curado.

Frank?” Ele então escutou, a voz dela. Karen Page, a loira que tinha se importando com mais que algumas balas e um tique nervoso em seus dedos agitados. “O que está fazendo aqui?”

Justiceiro se virou para ela, a arma ainda em mão, mas abaixada para o concreto. As buzinas na noite de Nova York estavam machucando seus ouvidos mesmo do telhado alto onde eles estavam.

Escutei algumas coisas por ai, como por exemplo, que as pessoas acham que eu me tornei um fantasma.” Ele tentou sorrir para ela, com seu maxilar rangendo sobre os dentes quebrados de um soco que ele levará naquela noite. Fazia dias desde que Frank entrará sob o chuveiro, ou sob uma coberta quente e uma cama macia.

Talvez seja verdade, Frank, talvez você tenha se tornado um fantasma.” Karen cruzou os braços sobre os seios, e o tintilar de suas correntes chegou até o Justiceiro. O vislumbre das duas peças fez o pulso que Frank acreditava estar estável para o resto de sua vida saltar sobre a pele. “Você está morto para mim, lembra, Frank?”

Você precisa consultar alguém, Karen, falando por ai com fantasmas.” Ele cruzou a linha que faltava para os dois. Frank pegou um punhado de cabelo de Karen, enrolando os fios lisos e platinados em seus dedos sujos e cheio de sangue.

O colar pegou Frank em cheio quando ele desviou o olhar. As duas peças que ele achou que estivesse fantasiando sobre estavam bem ali, sobre a pele branca e cremosa de Karen. Duas peças que faziam ele se lembram de duas identidades. Do soldado Frank. Do Justiceiro.

Seu coração estava esmagando suas costelas.

Belo acessório, querida.” Ele riu sobre a dor em seu maxilar, e Karen se avermelhou.

Talvez eu precise mesmo de ajuda.” E Frank rodou mais um punhado de cabelo em seus dedos, manchando a pureza de Karen com seus dedos sujos e pecaminosos.

X

Karen sentia o metal sobre o seu peito balançando de um lado para o outro enquanto caminhava pelas mesmas calçadas de Nova York de todos os dias.

Mas em vez de parar em uma vitrine, os seus olhos correram para uma pixação no lado paralelo da rua.

Você acredita em fantasmas?” Ela leu em voz alta.

Sua mão voou para o colar em desenho de crânio, e pela primeira vez naquela semana, Karen soltou um suspiro de satisfação.

Frank era um fantasma.

Mas ela não tinha medo de ser assombrada.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado, XOXO.
Led.



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