Xanadu escrita por magalud


Capítulo 19
Capítulo 19




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Capítulo 19 - Rezando por uma luz


Harry demorou uns meses para tocar no assunto. Mas quando tocou, a reação foi explosiva.


- Mas Draco...


- Não, não e não! Você não vai nem mencionar isso. Severus vai concordar comigo.


- Você viu como eles estão? Droga, Draco, eles estão um trapo. Eles estão tentando de tudo, e nada funciona. Eu preciso fazer isso.


- Eu o proíbo, entendeu? Eu proíbo você! - O louro ex-Malfoy segurou sua barriga volumosa. - Não basta eu estar para parir, tendo que torcer para nosso filho nascer de dia, porque o parteiro vira urubu de noite, e você ainda quer me deixar aqui sozinho para ir numa corrida louca atrás do impossível, uma que pode ameaçar tudo que nós temos aqui?


- Draco, querido, não se altere. O bebê...


- Devia ter pensado nisso quando veio com sugestões absurdas!


- Mas se der certo, tudo isso acaba. E seu parteiro não vai mais virar urubu! Nunca mais!


- Prefiro me arriscar a ficar 12 horas em trabalho de parto, esperando o Sol nascer para Severus voltar à forma humana! - Draco jogou os braços para cima, o rosto esfogueado. - Esse assunto está encerrado, Potinho! Não quero mais ouvir falar disso! Nunca mais!


Ele saiu, segurando a imensa barriga, e Harry suspirou. Draco tinha seus ataques hormonais e ficava intratável, uma das piores características Malfoy. Apesar de Draco ter abandonado seu sobrenome e ter dado a Damien apenas o sobrenome Potter, ele não podia trair seus genes. De qualquer modo, Harry sentia que precisava ajudar.


Porque Sirius e Severus precisariam de toda a ajuda que pudessem conseguir.


o0o o0o o0o o0o o0o o0o


Não foi falta de tentar. Severus mergulhou na leitura de todos os títulos que podia colocar a mão. O quarto onde Severus dormia sozinho, anos atrás, tinha se transformado num escritório/biblioteca. O local tinha livros empilhados por todo o lado. Era uma mescla de Transmorgrificação, Transfiguração e Artes das Trevas.


Por instinto, Severus tinha começado com poções. Depois de voar a noite inteira, ele passava os dias inteiros de pé, mexendo caldeirões. Vários caldeirões ao mesmo tempo, diga-se de passagem.


Ele tentou isolar-se num quarto escuro e hermético, para que a luz do Sol não entrasse ali e ele pudesse deter a transformação. Foi uma boa idéia, mas equivocada. A maldição era ativada pelo nascer e pôr do Sol, não pela sua luz.


Por corujas, eles encomendaram novos livros. Tentaram encantamentos e feitiços. Respeitaram fases da Lua e alinhamento de planetas, como os livros diziam. Sirius e Severus se revezam nas experiências, trocando bilhetes furiosamente sobre as tentativas e seus resultados.


Aos poucos, eles montaram o quarto da transformação. E, enquanto isso, eles tentaram outras opções.


Uma das primeiras coisas com as quais Sirius tentou lidar foi com a fênix. Ele lhe deu um nome, tentou aproximar-se do bicho. Ele queria nomear a fênix Nyx, nome de uma deusa grega da noite. Severus preferiu Nilyx, uma forma masculina. Mas essa era a menor das complicações com a ave.


O problema era que, como não era animago, Severus (em sua forma animal) não retinha seus pensamentos humanos. Ele era puramente animal e um animal bem assustado, porque não entendia sua transformação. Sirius ficou todo bicado, lanhado, arranhado e cortado pela fúria de Nilyx.


Severus teorizou que Nilyx se assustava com a transformação, portanto, se ele não a presenciasse, talvez ficasse mais calmo. Então, Severus tomou uma forte poção para dormir no pôr-do-sol, e estava inconsciente quando a noite chegou e a transformação trouxe Nilyx. A ave estava tão agitada quanto sempre quando acordou. Mas estava grogue, o que resultou em desastre ao tentar voar, desgovernado. Sirius quis se aproximar, mas aí mesmo que a ave se assustou. Enfim, novo fracasso.


Sirius não viu alternativa. Ele teria que tentar domar o animal.


Com a concordância de Severus, Sirius fez extensos preparativos para domesticar uma ave adulta. Aquela região era famosa por falcões treinados para caça, e ele tentou aplicar algumas das técnicas locais, que remontavam aos tempos dos ancestrais do imperador Genghis Khan.


Se Nilyx o reconhecesse, mesmo que fosse como um amigo ou treinador, ele teria chance. Mas, a exemplo de Severus, Nilyx também era um animal desconfiadíssimo, muito pouco inclinado a confiar.


Durante meses, Sirius montou um imenso viveiro de aves só para Nilyx, do lado de fora da casa. Severus entrava na gaiola com Snuffles, e quando o Sol se punha, Sirius permanecia trancado com Nilyx. Nas primeiras semanas, o bicho ficava supernervoso e estressado, voando por toda a gaiola, procurando uma saída, procurando fugir de Sirius. O animago, porém, ao invés de tentar se aproximar dele, ignorava o animal. Ficava ali a noite inteira, tão preso quanto o bicho, com uma garrafa de água e conjurando comida, lendo livros, tentando encantamentos. Aos poucos, Nilyx foi se acostumando à sua presença ali.


Depois que o bicho se acostumou a ele, Sirius forçou-o, com comida e água, a se aproximar fisicamente. De novo, Nilyx ficou nervoso. Demorou semanas até ele aprender a entender Sirius como uma não-ameaça.


Harry estava abismado. Ele jamais chamaria seu padrinho de uma pessoa paciente, Severus tampouco. Mas ambos estavam ali, tentando. Semanas a fio, meses. Anos.


Para sorte de todos, Severus foi capaz de fazer o parto de Draco, embora Harry estivesse de sobreaviso para uma emergência. O ex-Malfoy tinha entrado em trabalho de parto perto do amanhecer, e Derek nascera às 3 da tarde, forte e com um belo par de pulmões. O afilhado emocionou Severus, e Sirius também se sentiu muito orgulhoso.


Eventualmente, os meses se transformaram em anos, e Sirius e Severus continuavam separados. O momento da transformação era o mais sofrido. Por alguns segundos, eles viam seus rostos humanos - por segundos, segundos em que um virava bicho e o outro deixava de ser bicho, segundos tão rápidos que não dava tempo para eles se falarem, se tocarem, se reconhecerem.


Eles tinham ficado extremamente esperançosos quando Severus consultou os astros e calculou que um eclipse do Sol se aproximava. Seria um eclipse total. A luz do Sol seria obscurecida pela sombra da Lua, e o dia se transformaria em noite. Era uma ocasião para se verem, ao menos. O fenômeno duraria quase quatro horas. Eles poderiam ao menos se tocar.


Com sorte, a maldição se quebraria quando a luz do Sol fosse apagada, quando a noite invadisse o dia. As condições seriam quebradas, certo? E tudo poderia ter fim.


No dia marcado, os dois se trancaram no quarto da transformação e olharam o céu, homem e cão. A emoção cresceu quando o Sol começou a desaparecer, como que "devorado" pela sombra da Lua. Snuffles sentiu imediatamente, ganindo e deitando no chão, como fazia quando a transformação começava.


Severus sentiu os olhos se encherem de água ao notar o focinho se retraindo, os pêlos se recolhendo... O problema é que ele começou a sentir, ao mesmo tempo, os ossos se realinhando no seu corpo. E não acreditou. Como podia ser possível?


Ele foi ao chão, as pernas encurtando, as garras da ave mudando suas mãos e pés, penas nos seus braços e pernas. A dor, como sempre, era estarrecedora, mas desta vez havia outra dor: a emocional. A de se ver transformado quando o Sol ainda estava no céu, a de saber que ainda estava amaldiçoado.


Pior do que isso, Severus olhou para o lado e viu. Viu o rosto de Sirius, numa expressão de dor, a transformação na metade do caminho. O Sol continuava a experimentar o fenômeno, mas a metamorfose não continuara. Ela parou no meio.


Durante horas, Severus nada pôde fazer a não ser ficar deitado no chão, parado, transformado apenas pela metade, olhando para Sirius. Sirius também nada mais fez do que isso: qualquer movimento era acompanhado de dor inenarrável. Os dois conseguiram apenas ficar olhando, um para o outro, em silêncio, como algo inacessível. Em silêncio, ambos choraram, sem sequer conseguir esticar suas garras e patas para tocar o outro, para confortar-se.


Quando o Sol voltou a brilhar plenamente, Sirius voltou a ser Snuffles e Severus retornou à forma humana. Assim que se viu novamente um humano, com suas mãos e pés, ele saiu do quarto e voltou para o escritório onde eles tinham os estudos.


Severus quebrou tudo que podia. Em sua fúria, ele derrubou livros, esmagou utensílios, virou mesas, até que, quando viu que nada mais tinha para quebrar, ele urrou para o Universo, amaldiçoando a sua impotência, fazendo todas as janelas do local se espatifarem.


Durante mais de 40 anos, Severus jamais tivera um ataque de cólera dessa magnitude.


Ele jamais tinha amado dessa maneira.


De todas as perdas de sua vida (e eram tantas), essa era a única que ele não conseguia processar. Severus não se conformava.


Era a sua chance de ser feliz. Sirius também sofria, com uma vida abortada. Doze anos em Azkaban por um crime que não cometera, e ainda por cima morto par ao mundo, incapaz de ser reconhecido como um ser humano livre e vivo.


Ambos ficaram muito deprimidos depois do eclipse. Contudo, nenhum queria demonstrar na frente do outro.


Num momento de desespero, Sirius deixou um longo bilhete em que basicamente autorizava Severus a consolar sua solidão com Snuffles. Argumentando que, apesar de não ser adepto dessa prática, no fundo o cão era ele, só que em outra forma, e com sorte ele teria algum tipo de lembrança, e poderia senti-lo de novo. A formidável língua ferina do ex-Mestre de Poções respondeu, com outro longo bilhete, recheado de palavras nada brandas, que ele não era adepto da zooerastia ou bestialismo, e que, por mais que Snuffles fosse Sirius, era Sirius que ele amava, portanto tudo aquilo era uma conversa estapafúrdia que jamais deveria ser repetida sob qualquer circunstância. Da mesma forma, Severus esperava que Sirius não tentasse abusar de Nilyx sob qualquer aspecto. Essa troca de bilhetes jamais chegou a Harry.


Mas não era nada fácil. A angústia, a solidão, o sofrimento...


Até quando eles iriam agüentar?


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