Virando do avesso escrita por calivillas


Capítulo 22
Mundo pequeno




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Algumas semanas depois, naquele fim de tarde, após ter pego um enorme engarrafamento, Júlia, apressada, entrou em um prédio, em uma elegante área residencial da cidade, esperou, impaciente, pelo elevador, pois muito atrasada para o encontro marcado com seu novo cliente, no apartamento dele. Rafael já estava lá, aguardando ansioso, pois esse seria um trabalho importante, que poderia abrir novos horizontes para a empresa deles, visto que esse cliente era uma pessoa muito bem relacionada e conhecida, por isso o sócio dela parecia bem aborrecido e já havia ligado reclamado da sua demora.

Ela ficou ainda mais irritada, quando a porta do elevador interrompeu o seu movimento de fechar, primeiro para entrar um grupo de garotos barulhentos, depois para duas velhinhas de andar lento e, agora, para a entrada de um homem de terno e gravata, que sem prestar atenção no grupo que já ocupava o lugar, continuou lendo algo na tela do seu celular. Ela ficou encurralada contra a parede no fundo do elevador, que parou repetidamente, para desembarcar os demais passageiros. Até que, finalmente, só restavam ela e o homem de terno, e em um rápido relance, para o painel viu que seu andar seria o próximo. Ansiosa, encarou as costas do homem, foi quando notou algo de familiar nele, não era o cabelo castanho e bem cortado, não conseguia ver seu rosto, mas havia alguma coisa na sua postura e sua atitude, primeiro acho que estava ficando maluca, porém, ela se encheu de coragem, e chamou, com o coração aos pulos:

— Mauro! – A voz saiu baixa, quase um sussurro, mesmo assim o homem se voltou para ela, olhando-a com surpresa.

Mauro estava diferente, mantinha um leve tom bronzeado, mas os cabelos castanhos haviam crescido, exibindo um corte moderno e bem feito, o rosto liso, sem indícios da barba por fazer, que costumava usar antes, usava um terno bem cortado e de aspecto caro, completava a imagem do perfeito executivo, tão diferente do homem que Júlia conhecera antes.

— Júlia! – A surpresa se transformou no sorriso, que ela tantas vezes relembrou, com certa nostalgia.

Por muito tempo, havia pensando em Mauro, conformada que seria quase impossível vê-lo, novamente, e, nesse instante, ele estava bem ali na frente dela, como um verdadeiro milagre do destino.

— Mundo pequeno! – ela disse e sorriu, sem conseguia afastar seus olhos dos dele.

— Sim, um mundo maravilhosamente pequeno!

— Quanto tempo faz? Uns três meses?

— Na verdade, quatro meses. O que você está fazendo aqui, Júlia?

— Visitando as obras de reforma de um novo cliente, que mora aqui. E você, o que faz aqui?

— Eu moro aqui, nesse prédio. O destino pode ser muito engraçado, acho que estou fadado a ser vizinho dos seus clientes – Ele continuava a sorrir, sem tirar os olhos dela.

— Você está muito bem, Mauro. Vejo que você voltou a sua vida real, aos seus negócios.

— É, eu voltei a minha vida real, pouco depois que você foi embora, não via mais sentindo eu continuar por lá. Nunca mais voltei.

— Imagino.

— E você, como vai a vida de casada?

— Não vai, porque eu continuo solteira. Cancelamos o casamento. Acabou tudo entre mim e Leandro.

— Cancelaram! – O sorriso de Mauro aumentou, no mesmo tempo que o elevador parou no andar de Júlia, ela fez menção de sair.

— Eu fico aqui. Foi um prazer vê-lo novamente, Mauro. 

Ela deu um passo vacilante para frente, não querendo sair, mas ele interrompeu a passagem dela.

— Nada disso, Júlia. Não vou deixar você desaparecer assim, outra vez.

Júlia o olhou espantada, ergueu as sobrancelhas em interrogação, a mão dela segurava a porta do elevador para que continuasse aberta, mas que teimosamente tentava fechar.

— Como assim? – Júlia quis saber, fitando para ele, largando a porta, que se fechou, imediatamente, e o elevador começou a subir outra vez.

— Júlia, quando eu soube que você foi embora com seu noivo e não deixou nenhum recado para mim, não se despediu, entendi que você tinha feito a sua escolha de continuar com o casamento e esquecer de tudo que aconteceu entre nós dois, só me restava respeitar sua decisão. Então, não tentei encontrá-la.

— Eu sei que não foi muito legal da minha parte, ir embora daquela maneira, sem me despedir de você. Mas como você disse, eu tinha tomado uma resolução de continuar minha vida de onde parei, não podia olhar para trás, porque...  Mas, eu estive lá algumas semanas depois, voltei para falar com você e me despedir, não se conformava com a maneira como nós nos separamos e não o encontrei mais.

— Esteve?

 Ela assentiu a com a cabeça.

— Quando não encontrei você, achei que nunca mais nos veríamos de novo.

Nesse instante, o elevador parou e a porta se abriu.

— Meu andar – Mauro que segurou a porta para mantê-la aberta – Por que você queria me ver de novo, Júlia?

— Eu já disse para me despedir. Mauro, eu realmente preciso ir até a obra, estão me esperando – Ela apertou o botão do andar do cliente.

Mas, Mauro continuava a segurar a porta para mantê-la aberta.

— Por quê, Júlia? Por que não podia se despedir de mim naquele momento, por que voltou?

— Por favor, Mauro.

— É só falar, que eu deixo você seguir o seu caminho.

Júlia deu um longo suspiro.

— Porque não sabia se poderia manter minha decisão de me casar, se eu visse você outra vez. Depois, que tudo acabou quis contar isso para você.

Ele expirou com força.

— Venha, Júlia, vamos até minha casa. Precisamos conversar.

O telefone de Júlia tocou, a imagem de Rafael apareceu no visor.

— Preciso atender – ela falou, angustiada.

— Atenda, mas, por favor, diga a ele que surgiu um imprevisto que você vai demorar um pouco mais.

— Eu não posso. Não está certo fazer isso com Rafael outra vez.

— Por favor, Júlia, diga! Nós precisamos conversar, nem se for para dizer adeus.

Rafael não gostou muito, mas respondeu que iria resolver tudo com o cliente.

— Vamos até minha casa, Júlia – Ele a convidou, mantendo a porta do elevador aberta para ela sair, que ainda refletiu alguns segundos, porém acabou aceitando a proposta.

O apartamento de Mauro não lembrava em nada a sua casa rural, era prático, minimalista e clean, em tons de preto e aço, quebrando por uma ou outra peça de decoração marcante, de cores fortes.

— Surpresa? – Mauro perguntou ao ver a expressão dela, tirando seu paletó colocando sobre uma cadeira e afrouxando o nó da gravata.

— Um pouco. Isso aqui é tão diferente da sua outra casa.

— Eu gosto mais da outra.

— Eu também.

— Digamos que lá seja a representação da minha alma e esse apartamento é o meu exterior de homem de negócios. Mas, por favor, sente-se, Júlia. Bebe alguma coisa? Acho que tenho uma cachacinha aqui.

— Não, obrigada – ela respondeu, sorrindo.

— Vinho?

— Não, Mauro. Só água.

Mauro abriu a porta de um bonito móvel, que escondia um pequeno frigobar e retirou uma garrafinha e serviu a água em um copo, entregando a Júlia, que bebeu um gole, feliz, por aliviar a sua garganta seca.

— Então, por que acabou com seu casamento? – Mauro perguntou, sem rodeios, sentando na frente dela, apoiando os cotovelos no joelho para encará-la mais de perto. Júlia se engasgou em resposta, começou a tossir, ele não tirava os olhos dela, esperando, até ela conseguir respirar, normalmente

— Eu tentei, mas não dava mais – Júlia tomou mais um gole de água. – Não depois de tudo que aconteceu comigo. Parecia que algo havia se quebrado e meu amor por Leandro fluiu e se perdeu no vazio, não havia sobrado mais nada.

— Deve ter sido difícil enfrentar todo mundo, dizer que não queria mais se casar.

— Foi bem difícil – Júlia se lembrou do choro da sua mãe, as reclamações do pai por todo dinheiro gasto, da briga com Leandro e os intermináveis telefonemas até ele se dar por vencido, todas aquelas explicações para a família, tinha sido muito cansativo. – Mas, eu não podia começar uma vida nova, sentindo-me daquele jeito.

— Então, você está sozinha agora?

— Estou.

— Quer dizer que eu posso ter uma chance com você?

Júlia deu um longo suspiro.

— Acho que não, Mauro. Aconteceram tantas coisas na minha vida nesses últimos tempos. Não estou pronta para um novo relacionamento nesse momento. Por enquanto, quero ficar um pouco sozinha.

A decepção fez o rosto de Mauro desabar, não sabia o que falar, mas Júlia se levantou e entregou o copo vazio para ele.

— Tenho que ir agora. Estão me esperando lá embaixo.

— Eu lamento muito por nós dois. Acho que poderíamos dar certo. Mesmo assim foi um prazer revê-la. Até a próxima, Júlia.

— Para mim, também, foi ótimo rever você. Até a próxima, Mauro – Júlia caminhou até a porta, ele a abriu para deixá-la sair, ela caminhou em direção ao elevador.

Mauro fechou a porta lentamente, depois que ela desapareceu no atrás da porta do elevador, colocou o copo vazio sobre o balcão da cozinha, cruzou os braços e se apoiou no batente da porta, pensando como o destino podia ser tão irônico, armando aquele encontro entre os dois, para um simples adeus. Já havia passando alguns minutos, quando ouviu a campainha tocar, ele não estava esperando por ninguém, mesmo assim abriu a porta sem olhar pelo visor. Ficou surpreso, quando encontrou Júlia parada bem na sua frente, com uma expressão aflita, contorcendo as mãos, mas antes dele perguntar algo, ela começou a falar, rapidamente.

— Mauro, eu não posso ir embora, sem antes contar que não me casei porque não parava de pensar em você! – Ela confessou, sem respirar, sem desviar o olhar, atropelando as palavras. – Já estava convencida que nunca mais eu iria vê-lo, novamente. Então, de repente você está aqui bem diante de mim, fiquei com medo, porque eu não sei se o que sinto é amor, mas, simplesmente, não quero mais me separar de você, outra vez. Então, o que você tem a dizer sobre isso?

Em resposta, Mauro apenas sorriu, puxando-a contra si, e suas bocas se encontraram em um longo e intenso beijo.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado.



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