Presença na Escuridão escrita por Angel Black


Capítulo 1
Capítulo 1




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Meg ficou petrificada ao sair do carro. Ryan havia falado que a mansão Carter era imensa, mas não imaginava como. Era um pequeno castelo que parecia ter saído daqueles filmes de terror, de Drácula ou Frankenstein.

— E então? – perguntou Ryan, ao seu lado, olhando animado para ela.

— A casa é espetacular. – falou ela, tirando do carro a pequena mala.

— É perfeita. – emendou Ryan. – Já fizemos todas as tomadas do exterior. Há um jardim nos fundos que é lindo, mas está todo abandonado. E dentro, o pessoal técnico já instalou todas as câmeras e as escutas, é perfeito.  Vai ser o melhor episódio da temporada!!! A mansão do Duque Carter... huahuahuahua!!!! – Ryan sorriu imitando aquelas risadas maquiavélicas. – Acha que o chefe vai gostar?

— Vai sim... quando é que ele chega. – perguntou Meg cruzando uma pequena trilha de cascalhos para bater na porta da frente da casa. Bateu três vezes. Tinha uma compulsão. Sempre que ia a um lugar novo, precisava bater em alguma madeira durante três vezes, só então poderia entrar.

— Esse seu TOC um dia vai te matar – disse Ryan, abrindo a porta com um molho de chaves.

— Estamos sozinhos? – perguntou Meg, disfarçando.

— Não... acho que o Greg e a Cindy já estão aí.

— Greg e Cindy? – perguntou Meg.

Meg era a roteirista de um reality show que perseguia casas e lugares mal assombrados. Foi um estouro no início, mas depois a receita começou a cansar para os telespectadores e o chefe havia despedido quase toda a equipe e recontratado outras pessoas para as mais diversas tarefas. Imaginou quando seria a sua vez.

— São novos. Greg é cinegrafista e a Cindy é a operadora do som e dos computadores... essas coisas tecnológicas.

— Sei.

Quando a porta se abriu, Meg ficou boquiaberta. O lobby de entrada dava lugar a uma imponente sala de visitas. Os moveis estavam velhos, é claro, mas havia uma grande área em que provavelmente os técnicos haviam instalado uma mesa com diversos computadores, algumas luminárias que emitia fortes luzes e outros aparatos que Meg não conhecia. Havia uma garota atrás de um dos monitores e Meg imaginou que poderia ser Cindy.

— Olá! – disse Meg, estendendo a mão para cumprimenta-la.

— Você é a roteirista? – perguntou Cindy, sem sair da frente do monitor, ignorando sua mão completamente. Sem graça, Meg enfiou a mão na jaqueta jeans. 

— É... sou a roteirista, sim – disse Meg, meio desanimada. Não foi pra isso que Meg havia estudado tanto. Ela queria ser uma roteirista de teatro. Fez Mestrado em Dramaturgia e especializou-se em Shakespeare. Quando percebeu que morreria de fome antes que conseguisse emplacar algum roteiro, resolveu aceitar a ajuda de seu amigo Ryan e passou a trabalhar para a TV, escrevendo roteiros de Talk shows. Quando surgiu a oportunidade para escrever o roteiro de um reality show sobre casas e lugares assombrados, Meg não teve outra alternativa a não ser aceitar.

— Tá... então... só não mexa nas minhas coisas! – falou Cindy, pouco simpática.

— Ok... – disse Meg, sorrindo para Ryan que passou por trás de Cindy e fez uma careta que só Meg viu.

Ryan era produtor. Era seu melhor amigo. Os dois dividiam o aluguel de um apartamento. Na verdade, Ryan pagava quase o dobro de Meg. Ele vivia com um ator que quase nunca estava em casa. Meg não gostava muito do namorado de Ryan, mas sabia que talvez tivesse que arrumar outro lugar para ficar se o namoro ficasse mais sério.

— Oi, eu sou o Greg!!!

Meg virou-se. Vindo de um dos corredores, o cinegrafista se aproximava com a câmera na mão. Ele foi bem simpático, diferente de Cindy.

— Cara, essa mansão me dá arrepios! – falou ele, olhando em volta. – Vim agora do banheiro. O banheiro é quase maior do que o meu apartamento. O problema é que quando estava saindo, quando olhei pro corredor da cozinha... sei lá, cara, achei que tinha vista uma coisa...

— Você está vendo coisas!!! – falou Ryan, debochado – A não ser que já esteja doidão. O último cinegrafista adorava fumar uns cigarros esquisitos.

— Oh, cara. Juro que não tô mentindo. – defendeu-se Greg, ofendido.  

— Seria legal pegar umas tomadas mais assustadoras, não é? Quem sabe uma porta batendo, uma cadeira se mexendo...? – falou Ryan,  com olhares sonhadores para o casarão.

Meg sorriu, mas não comentou nada. Ela já estivera em muitas casas mal assombradas com a equipe de produção e sabia que não havia esse negócio de assombração e fantasmas. Eles simplesmente não existiam. Na maioria dos casos, eram apenas canos velhos, madeiras soltas e sistema de calefação antigos. E é claro, uma boa dose de imaginação. As pessoas gostavam de criar contos fantásticos. Isso as fazia acreditar que havia uma vida após a morte. Para Meg, não havia mais nada além do nada, vazio e escuridão.

David Felch chegou uma hora depois. Ele não era somente o apresentador do programa, mas também um dos produtores e o diretor-geral do programa, o que provavelmente economizava alguns salários. Ele entrou efusivamente na casa, trazendo consigo uma velha senhora e uma bela mulher que as vezes era vista nas festas paquerando o Felch.

— Pessoal... essa é a dona Eliete – falou David, apontando para a velha senhora – Como vocês sabem ela é a caseira da mansão. Eu queria que ela permanecesse na casa hoje a noite, mas ela se recusa. Então... vamos gravar logo a cena com ela. Depois, exploramos juntos a mansão, ok... Greg, está preparado... quero fazer uma tomada lá fora com a Eliete....

Quando Greg, Eliete e David saíram, Meg ficou cara a cara com a morena que David trouxera consigo.

— Você deve ser a Meg? – perguntou ela, estendendo a mão, mas Meg viu que a morena tinha um olhar estranho para ela, como se quisesse intimidá-la. – David sempre me fala de você. Ele gosta dos textos que você escreve.

— Obrigada! E você é...? – perguntou Meg, embora já soubesse o nome daquela garota. Ela era a filha de um deputado, era socialite e fazia festas pesadas, onde rolava de tudo.

— Lana... Lana Porter..

— Prazer... – disse Meg, sem dar muita bola.

— É todo meu.

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— Certo... certo!!! – Alguns minutos depois, David entrou novamente na casa parecendo muito animado. A dona Eliete não voltara com ele. – Vamos fazer uma tomada comigo fechando a porta, ok, Greg?

David pegou o microfone, deu um rápida lida no roteiro que Meg elaborara e retornou o olhar para a Camera.

— São 18 horas. Para muitos, uma hora comum. Para dona Eliete, esse horário é um aviso. Ninguém deve pisar na Mansão Carter quando a escuridão enfim tomar o lugar. – David fechou a porta e retornou o olhar para a Câmera. – Essa é a última chance para mim e minha produção para sairmos desse lugar e evitarmos as grotescas horas de terror que poderemos passar... se houvessem... ASSOMBRAÇÕES.... corta... muito bom.... muito bom...

Assombrações era o título do programa e David gostava de evidenciá-lo em cada episódio, o que parecia estúpido a Meg que era obrigada a escrever o roteiro dessa forma.

— Então, pessoal... – falou David. Temos até as seis horas da manhã para conseguirmos todas as tomadas... Então... trabalhando...

— Até as seis? – perguntou Ryan... geralmente ficamos dois ou três dias em cada casa.

— É que os descendentes da família Carter não querem que fiquemos aqui mais tempo. Já foi um saco conseguir a permissão para hoje, então, não adianta reclamar. Vamos esperar que haja alguma coisa interessante acontecendo hoje. Qualquer coisa, a gente dá um jeito. Produz algum fenômeno.

Meg sorriu com o canto do lábio. Grande programa, pensou, mas não disse uma só palavra. Bom ou ruim, era esse programa que pagava o aluguel.

— Lana, amor... eu preparei um quarto lá em cima... você pode ir até lá dormir. A noite vai ser longa pra nós. Meg... acho que você já pode ir também. Se eu precisar de você, eu te chamo. – falou David, com um olhar estranho para ela.

— Tudo bem. – falou Meg, meio sem jeito. Não conseguia interpretar direito aqueles olhares de David e sabia que Lana não gostara também. – Em qual andar ficam os quartos...

A escadaria principal dava acesso a três andares e a casa parecia grande o suficiente para qualquer um se perder.

— No primeiro. Você pode ficar no quarto ao lado do de Lana. – respondeu David. – Eu estive a tarde aqui. Há outros quartos, mas estão muito empoeirados. A Eliete mal limpa essa casa, mas pedi que ela preparasse alguns quartos para nós...ah... quero dizer... para todos da equipe

— Ok... obrigada! – respondeu Meg, ainda sem jeito.

Lana e Meg subiram a escada em silêncio.  Pararam no primeiro andar e tomaram um corredor. Um dos quartos estava com a luz acesa. Quando Lana abriu a porta que fez um ranger estranho, viu que havia uma mala sobre a cama.

— Meu quarto deve ser aqui... até amanhã, Meg...

Meg continuou sozinha pelo corredor escuro e abriu a próxima porta. Era um quarto bem parecido com o de Lana. Havia lençóis limpos na cama e, apesar de um cheiro de mofo, até que o aposento era bem confortável. Tirou da mala um shorts e uma camiseta de malha que gostava de usar para dormir e foi até o banheiro. Antes de acender a luz do toilette, franziu as sombrancelhas. Havia um enorme espelho e, ao invés de ter somente a sua silhueta, havia uma sombra, como se estivesse ao lado de Meg e fosse muito maior, da altura de Ryan, por exemplo. Meg era uma garota racional, por isso imaginava que aquela sombra poderia ser somente uma ilusão de ótica causada pelo próprio espelho.

Ligou as luzes e a sombra desapareceu.

Tirou a jacketa e depois desabotoou a camisete, tirando-a em seguida. Quando levou a mão para desabotoar a saia, cujo botão ficava às costas, Meg parou e não pode evitar que suas mãos tremessem. Olhou no espelho, onde pode ver suas costas nuas. A saia desabotoou-se sozinha, mas estava fechada há um minuto atrás. Meg sorriu, pensando que estava imaginando coisas. Levou a mão até o zíper, mas parou novamente e olhou no espelho, arregalada, segurando a respiração.

O zíper descia lentamente, sozinho, como se alguém o estivesse abrindo.

Virou-se assustada. Sentiu a saia caindo de seu corpo, amontoando-se ao redor dos seus pés.

— Que diabos? – falou Meg, não queria admitir que estava assustada, mas estava. Pensou um pouco, imaginando o que poderia ter acontecido. Não havia fantasmas, isso era certo. O que acontecia era que Meg havia engordado alguns quilos no último mês. Ela sempre fora muito magra e estava fazendo academia. Provavelmente, a saia se abrira sozinha porque estava muito apertada, era isso... pensou ela, balançando a cabeça.

— Já estou ficando louca.  – disse ela, para si olhando no espelho e vestiu o shorts e a camisa.

Quando saiu do banheiro, encostou a porta e correu para cama. Não porque estivesse com sono, mas porque estava muito frio.

Havia apenas um lençol para se cobrir e isso era realmente muito pouco. Esfregou as mãos e enfiou-as embaixo do travesseiro. Se não conseguisse suportar o frio, teria que vestir a jaqueta jeans que trouxera.

Ficou pensando um momento em sua vida e o que a trouxera até ali, naquela mansão ‘assombrada’. Ryan era um bom amigo. Estudaram juntos no Ensino Médio e desde então não se largaram, mas sabia que ela era um peso para ele. Ele se transformou num produtor de sucesso. Quando o show “Assombrações” terminasse, ele iria produzir outras coisas. O problema era que Meg não teria a mesma sorte. Ela não soube criar uma carreira de sucesso. Sabia que tinha problemas pessoais demais que a impediam de ter uma vida normal, mas agora era a chance fazer algo por si mesma.

Queria poder escrever para o teatro de novo. Queria poder ter a inspiração que tinha antes, quando era apenas uma adolescente, escrevendo peças na escola, mas tudo havia mudado. Meg sentiu suas pálpebras pesadas e sem que pudesse aguentar o sono, rendeu-se a ele.

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Teve um sonho, estava com sua família novamente. Na frente do carro, o pai e a mãe cantarolavam um canção. Ela estava no meio, entre os gêmeos Mara e Maurício. Sua família estava reunida novamente. Ela estava sorrindo. O vento batia em seus cabelos e ela pensava que logo iriam chegar a praia onde iria passar o melhor verão de suas vidas.  Era a praia onde Jonah também passava as férias. Jonah era o garoto mais popular da escola. Ele disse uma vez no ouvido de Meg que queria ficar com ela. Quem sabe o grande dia estava para chegar. Meg era feliz.

Era.

Então viu de repente o caminhão entrar na outra pista. Seu pai tentou desviar, mas o veículo estava veloz demais. Sentiu um impulso para frente quando aconteceu a colisão. Viu Mara ser jogada para frente com violência. Ela atingiu a cabeça do pai que também já havia colidido contra o caminhão. O carro continuava a ser imprensado no caminhão. Gritou ao ver a mãe sendo esmagada. Ela havia estendido a mão para ela. Foi num piscar de olhos e havia perdido os três. Quando pararam, olhou para Maurício ao seu lado. Ele sangrava. Meg também sangrava, mas ambos estavam vivos.

— Maurício... maurício... – gritou ela, para o irmão mais novo. Ele tinha sete... apenas sete. Então olhou pela janela: outro carro se aproximava.

— AHHHHHH!!!! – Meg gritou com todas as forças do seu pulmão e sentou-se na cama. E levou algum tempo para controlar a própria respiração.

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A porta se abriu.

David foi o primeiro a entrar e depois Greg com a câmera e aquela luz forte sobre ela, seguido por Ryan.

— O que aconteceu? – perguntou David, com o microfone na mão.

— Nada... só tive.... er... só... só tive um pesadelo. – disse ela sem graça

— Que tipo de pesadelo, Srta. Burns – David só chamava Meg de Srta Burns quando queria incluir ela na gravação.

— Não sei... não lembro! – mentiu Meg, aborrecida. Não gostava de aparecer naquele show estúpido. Abaixou a cabeça para evitar olhar para David e se assustou. Por cima do lençol que usava, havia agora um cobertor macio.


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