Aconteceu escrita por Alanna Drumond


Capítulo 91
Epílogo


Notas iniciais do capítulo

Narrado por Rafael Duarte.



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Quatro anos depois...

Hoje era o dia, o grande dia. Parecia estranho eu estar nervoso depois de todo esse tempo, mas eu estava uma pilha de nervos. Enquanto eu dirigia, estressado pelo caótico trânsito das 17 horas, eu me peguei refletindo em tudo o que aconteceu na minha vida. Eu poderia dizer que a minha vida foi dividida entre “antes de Ana” e “depois de Ana”, pelo simples fato de que a chegada dela mudou toda a minha vida.

Antes dela eu era amargurado, fechado, sem planos pro futuro, sem perspectivas, totalmente recluso no meu mundinho que era a Duarte. Depois dela, tudo mudou. Parecia que eu tinha redescoberto como era viver, como aproveitar as pequenas coisas da vida, os momentos mais simples e singelos. Eu mudei com sua chegada, eu mudei por ela, pra ela, e também por mim. Hoje eu sou feliz. Plenamente feliz. Não há mais nada, nada nesse mundo que eu queira. Eu já tenho tudo o que eu preciso para ser feliz cercado de pessoas que me amam, de amigos, da minha família, pessoas que se importam de verdade... por anos eu vivi a margem da sombra de meu pai, cercado por sua herança e o fardo que era ser o grande herdeiro. A minha vida inteira eu sempre quis ser só eu. E hoje eu sou.

Logo depois que Ana veio morar comigo, ela me incentivou a voltar a estudar, fazer meu PhD e me tornar professor, que é o que eu sempre quis. Mas não podia fazer isso imediatamente, não sem colocar alguém no comando da Duarte. Havia um tempo que eu preparava Daniel para assumir meu lugar como presidente da empresa e, graças aos incentivos de Ana, eu o treinei com mais afinco e ele assumiu tudo com muita responsabilidade e empenho. A Duarte não poderia estar melhor. Como minha incentivadora, Ana também não poderia estar melhor, se formou com honras, fez uma pós-graduação e abriu o próprio escritório. A pequenos passos, ela ia crescendo cada vez mais e o como o visionário e investidor que eu era, eu sabia que ela ia fazer muito sucesso.

Alice e Dan resolveram morar juntos e logo ela engravidou. Apesar de apavorado, Daniel estava feliz por ser pai. Era a melhor coisa do mundo. Depois de todas as perdas que tive, dos filhos que não vingaram, Ana me presenteou com uma menina há três anos. Manuela... Fisicamente era parecida comigo, mas tinha a personalidade forte e decidida da mãe. Ela era com toda a certeza do mundo a melhor parte de mim. Eu mudei por Ana, pra Ana... Mas com Manuela eu renasci.

Lembro do momento em que Ana me contou que estava grávida. Eu não sabia o que sentir, mas naquele momento eu soube que seria diferente. Não me senti assim em nenhuma das vezes que Sabrina me contou que estava grávida. Foi uma emoção, um medo, uma certeza diferente. Eu tinha acabado de voltar da minha ultima viagem como presidente da Duarte. Quando eu cheguei Ana estava sentada na cama abraçada a um travesseiro, o meu travesseiro.

— Precisamos conversar – ela disse.
— Que voz séria! Aconteceu alguma coisa? – ela assentiu com os olhos marejados – por favor me diz que não colocou fogo na cozinha. – ela abriu um sorriso de lado e brincou.
— Os bombeiros foram rápidos, não tivemos muitos prejuízos.
— Me conta... o que aconteceu? – ela abriu a gaveta do criado mudo e de lá tirou um envelope e me entregou.
— Logo que você viajou eu passei mal e Alice me levou ao médico – eu abri o envelope e lá estava um exame de gravidez. “Positivo” era o que dizia embaixo. – eu sei que você não queria ter filhos agora, eu não planejei isso... eu não sei como... quer dizer, eu sei... mas é que... foi um acidente. Eu juro que foi... – a essa altura ela já estava chorando e eu não conseguia fazer nada a não ser encarar Ana com a palavra “Positivo” rodando na minha cabeça. – fala alguma coisa... Por favor.
— Você tá de quanto tempo? – ela parou e me olhou como se não tivesse entendido a pergunta.
— 10 semanas. – ela abriu a gaveta de novo e de lá puxou um ultrassom – tá muito pequenininho ainda... – eu olhei aquelas imagens que pra muitas pessoas não passam de um borrão e eu nem me dei conta de que uma lágrima escorreu pelo meu rosto, mas eu mesmo limpei rapidamente sem que Ana percebesse. Ela já estava abalada o suficiente.
— Estávamos em Portugal. – fiz as contas mentalmente – De férias... aquele dia na Ilha da Madeira, quando fizemos amor na praia, lembra? Tenho certeza de que foi nesse dia – Ana corou, eu adorava quando ela corava. .
— Mas eu não entendo. Eu tomo anticoncepcional...
— Nada nunca é garantido.
— Como se sente em relação a isso?
— Isso? Isso é maravilhoso, Ana. Mas tá errada sobre uma coisa: eu estou pronto para ser pai.

Mas na verdade não estava. Eu só tive noção do que ser pai significava quando estava dentro da sala de parto e cortei o cordão umbilical que unia minha filha e o amor da minha vida. Carregar aquele pedacinho de gente, tão pequena, tão dependente, tão frágil e tão única, tão especial, tão transformadora... Ali, não nasceu só uma menina, nasceu um pai. Nasceu uma família.

Estacionei em frente à escola e vi Manuela caminhar até mim de mãos dadas com a professora. O cabelo castanho claro como os meus, os olhos escuros como os da mãe, o sorriso de meu pai e as manias de Andressa – a avó materna. Manuela era a mistura perfeita do que mais amávamos. Ela era a concretização de um sonho e eu era um sortudo por ter tido a honra de ser pai dessa menina.

— Papai é hoje – disse correndo na minha direção, largando a mochila pelo caminho e abraçando as minhas pernas. Eu a peguei no colo dei um beijo na bochecha e peguei a mochila abandonada.
— É hoje minha princesa.
— A mamãe já chegou? Já falou com ela? O que ela disse?
— Não tínhamos combinado que faríamos isso juntos?
— É verdade. É que eu tô nervosa.
— Não precisa ficar meu amor. Vai dar tudo certo – eu disse querendo acreditar em minhas palavras, entramos no carro e eu a coloquei na cadeirinha.
— Você comprou?
— Sim senhora. Olha só – disse tirando o presente do meu paletó e mostrando a ela. – Gostou? Será que ela vai gostar?
— Eu amei, se ela não gostar dá pra mim que eu quero. Mas vou ter que crescer um pouquinho pra usar.
— Eu espero que cresça bastante antes de usar.

No caminho para casa, ela contava animada como foi o dia, contava o que estava aprendendo e os momentos mais divertidos que tinha tido com os novos amigos. Ela era falante (como Ana), detalhista (como eu), parecia ter energia de sobra. Vida de sobra e isso era o que eu mais amava na minha filha. 

— Papai, ela já chegou – disse Manuela olhando para o carro de Ana estacionado na garagem. O mesmo carro, desde que ela tinha 18 anos. Tentei várias vezes trocar o carro dela, mas foi a ultima coisa que havia comprado junto com a mãe, aquele carro parecia ser uma lembrança constante de Andresa. Eu entendia, é claro.
— Bom então eu acho que estamos atrasados. – saltei do carro, a peguei e entramos no apartamento.
— Mamããããeeeeeeeeeeeeeeeee – Manuela soltou minha mão e saiu correndo para procurar Ana.
— OI – Ana gritou – TÔ NA COZINHA. – eu me dirigi para lá e encontrei Ana abaixada para ficar da altura de Manuela, abraçando e enchendo nossa filha de beijos.
— Mamãe para – ela disse sem fôlego – faz cosquinha.
— Ah faz cosquinha? Então agora é que eu vou continuar. – e ela continuou, e quanto mais beijos dava, mais altas ficavam as gargalhadas de Manuela.  Ela conseguiu fugir da mãe e se escondeu atrás de mim. – Ah então agora estamos brincando de pega-pega?
— Não! Papai tem uma surpresa.
— Ah é? – Ana disse e eu pigarreei.
— Nós temos. – Manuela corrigiu.
— Bom eu também tenho uma surpresa – Ana disse e se preparou para levantar do chão e eu estendi a mão para ajuda-la. – Oi – ela disse e me deu um beijo rápido.
— Que surpresa é essa? – perguntei.
— Vamos conversar no sofá. – ela pegou Manuela no colo e nós fomos para a sala de estar.
— Fala mamãe, já sei a surpresa do papai, quero saber qual é a sua! – exigiu Manuela.
— Vocês disseram primeiro, então vocês contam primeiro. – Manuela olhou para mim e seu olhar de curiosidade claramente era o mesmo que o meu.
— Damas primeiro. – eu disse
— Mamãe primeiro.  – Manuela concordou.
— Ok. – Ana colocou Manuela em meu colo e apesar de falar com ela, ela disse cada palavra olhando nos meus olhos – o que a senhorita acha de ser promovida a irmã mais velha?
— Você... Você tá grávida? – eu perguntei.
— Eu vou ter um irmãozinho? – disse Manuela com um gritinho. Esse gritinho ela havia aprendido com Alice.
— Fiz o teste, deu positivo. – ela disse olhando para mim. Eu a puxei para meus braços e a abracei forte, muito, muito forte.
— Papaiiiiii, tá me esmagando... – disse Manuela com a voz abafada entre nós. Eu dei um pouco de espaço para ela respirar, mas mantive Ana bem próxima a mim.
— Eu te amo. Eu te amo demais – eu disse e ela corou – com você eu sou o homem mais feliz do mundo. Obrigada por ter entrado na minha vida.
— Bom, nesse caso eu é que tenho que agradecer. Obrigada por me contratar – ela brincou e se aproximou para me beijar, mas Manuela não permitiu. Ela colocou as mãozinhas pequenas sobre nossos lábios impedindo.
— Por que você não conta a outra surpresa logo antes de vocês começarem a se beijar e nunca mais parar? – disse minha filha para mim e eu ri enquanto Ana corava de novo.
— Eu não sei nem por onde começar. – eu disse.
— Bem, acho que do começo ajudaria – Ana disse e piscou para mim.
— Ai, deixa que eu faço isso – Manuela puxou meu paletó e de lá tirou a caixinha que eu guardava há dias – Mamãe, a senhora quer casar com a gente? – Ana viu Manuela abrir a caixinha com dificuldade e depois ficou olhando para mim sem piscar.
— Quer ser minha para sempre? Perante a Deus e a lei dos homens? Você me concede a honra de te amar por todos os dias da minha vida, até depois da eternidade? – o olhar de Ana dizia tudo o que eu precisava saber. Ela me aceitou. Na verdade ela já havia me aceitado há muito tempo. Ela me aceitou em seu coração e essa é a maior honra que eu poderia ter, mas minha filha ainda não entendia algumas coisas, não sabia ainda decifrar os olhares da mãe ou a respiração irregular...
— Mamãe é nessa hora que a senhora responde...
— Calma meu amor – eu disse – o raciocínio da mamãe é meio lento. Deixa ela pensar, é uma decisão importante.
— É claro que eu aceito. – Ana se jogou em cima da gente e ficava alternando se me beijava ou se beijava Manuela. Parecia completo ali, nossa família estava completa. Bem, quase... Daqui alguns meses alguém chegaria e deixaria tudo, definitivamente, completo.

Dezoito meses depois...

Ana não seria uma dessas noivas que se atrasa. Era mais provável eu me atrasar do que ela. Por incrível que pareça eu não estava nervoso. Dentro de alguns instantes eu ia começar a viver o resto da minha vida ao lado da mulher mais maravilhosa do mundo. Mas a verdade é que o resto da minha vida havia começado bem antes, quando Ana estava me esperando na recepção da Duarte para uma entrevista.

Bem, eu achava que não estava nervoso. Mas quando começou a tocar a marcha nupcial e as portas se abriram revelando as três pessoas que eu mais amava na vida, minha garganta fechou. Ana não carregava um buquê, ela carregava nosso pequeno Artur de quase dez meses, e segurava Manuela pela mão. A cada passo eu engolia mais em seco, a cada passo eu me via diante de um futuro, de uma vida, de uma família. Uma família que eu sonhei em ter várias vezes, a família que eu achava que nunca teria. No meio do caminho, Ana parou. Não por medo ou por pensar em desistir, o sorriso e o olhar para Artur só me dizia que ele estava pesado demais para carregar com uma mão apenas. Tenho certeza que o vestido exclusivo que Marcella confeccionou deve ter dificultado as coisas.

Eu não esperava que ela entrasse com as crianças. Achei que entraria com Dan e que Manuela entraria junto com Sabrina como daminha de honra. Mas aquilo, a minha família vindo para mim... Era mais do que a realização de um sonho. Eu não sabia definir o que sentir. Eu caminhei até ela, no meio da igreja, dei um beijo na testa de Manuela, e peguei meu filho nos braços. Fizemos todo o trajeto até o altar juntos. Todos abraçados e unidos.

E quando o padre nos abençoou e a aliança deslizou para o dedo de Ana, eu vi que não tinha como explicar como tínhamos chegado até aquele momento, como o nosso amor tinha crescido, amadurecido, gerado frutos e permanecer tão forte e invicto. Mas a verdade é que algumas coisas simplesmente não tinham explicação. Elas aconteciam e pronto. E o nosso amor foi assim... Puro, incontrolável, e mais verdadeiro que tudo... ele simplesmente aconteceu.


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Notas finais do capítulo

F I M !


Gostaria de agradecer a todos que acompanharam Rafael e Ana até aqui e embarcaram comigo nessa aventura. Foi um prazer tê-lo ao meu lado. Peço desculpas pelos atrasos (que não foram poucos) mas espero, do fundo do coração, que tenham gostado de tudo o que vivemos. Este não é um adeus. É um até logo... Em breve, uma nova aventura, um novo romance para vocês se deliciarem... Beijo grande, Alanna D.



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