Kaidan 2068 - Contos em Cyberpunk escrita por Sabonete


Capítulo 3
Ponto de Partida: O destino e o entregador (parte 3)


Notas iniciais do capítulo

Aqui começa a parte final. O climax, corrido, confuso, com sentimentos dicotômicos: ódio, raiva, paixão(?), dúvida.

A pergunta "qual é o meu propósito" paira na mente de todos, mesmo que isso não seja dito.

O fim se aproxima, e como todo o final, é doloroso.
~Como foi escrever o final desse conto para mim~

Espero que estejam gostando da leitura, da história, dos personagens e do próprio cenário que tenho apresentado para vocês até agora.

Existe muito mais. E os próximos contos, vão apresentar um pouco mais dele.



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[ Bairro Azul, em um beco, noite, total escuridão, muito calor ]

Está tudo escuro, um não consegue enxergar o rosto do outro. O som da cidade, pelos lados, por baixo e por cima, dá uma sensação de isolação que os faz se sentir seguros.

— Obrigado, você me salvou..— Disse Douglas, escorado em uma parede gelada, que transmitia um frescor a seu corpo que quase aliviava o medo de morrer que dominava todo seu corpo. – Não sei como te agradecer Aika.. eu...— Falava olhando para o escuro, sem saber ao certo onde estava a garota, que o interrompe, abraçando-o com força e impedindo-o de conseguir falar.

— Não precisa me agradecer Douglas-Kun, eu sei que você faria o mesmo por mim!— Ela murmurou baixinho com a cara enterrada no peito do entregador, que ao ouvir aquelas palavras engoliu seco, num misto de desgosto por si mesmo e um surpreendente sentimento saboroso, algo bom que ele não sentia ha muito tempo, também. Naquele momento, tudo o que ele faz é abraçá-la contra o seu peito, e olhar para cima esperando ter alguma boa idéia.

[Bairro Azul, em um restaurante simples, noite, muito calor]

Douglas acabava de sair do banheiro vestindo as roupas novas que comprará a minutos em uma loja local, a garota aparentemente ainda se trocava, pois, não estava sentada na mesa combinada. Já sentando, mexia na mochila verificando o que ainda tinha consigo. Com sorte havia deixado seu cartão guardado junto do recipiente da entrega, aquela pequena caixinha de balas.

Sua cabeça está bem confusa, ele no momento pensa no que aconteceu no beco, logo atrás do restaurante, mas a paz que aquele momento o trás é cortada seguidamente por flashes do acontecido no quarto do hotel e de como tudo o que aconteceu desde que ele foi abordado na Summer IIV.

— Porra de contato que não me conta nada...— Resmungou jogando-se na poltrona.

Uma moça que não devia ter mais do que 16 anos chega até sua mesa com um prato bem generoso de algo que Aika havia pedido. O restaurante parecia ser temático, já que a garçonete se vestia como uma empregada do século 19. Seus modos eram engraçados para ele, mas apesar da aparente brincadeira, ela parecia levar muito a sério aquilo.

Percebeu que o pacotinho de remédios que a senhora havia dado para ele no outro dia, ainda estava com as embalagens das pastilhas. Rapidamente notou o que deveria fazer ali, naquele momento. Na verdade, com segundos passados da saída da menina do banheiro, vestindo aquelas roupas tão simples, mas que o faziam ansiar por sua presença, compreendeu que devia fazer mais por aquela mulher que o salvará a vida há pouco tempo atrás.

Em um instante ativou o mapa do Bairro Azul no dispositivo que tinha em um de seus olhos, procurou algum local onde vendessem tecnologia de nível elevado para bloquear comunicação, algum scanner corporal que fosse capaz de identificar rastros de invasões de rede, e algum lugar que vendesse boas armas. Dinheiro ele tinha, o que ele precisava agora era ser discreto.

Infelizmente, descrição às vezes não é algo possível de se conseguir.

Sentiu em sua mão uma leve tremida, um leve susto o tirou do seu momento pensativo, fazendo todo o seu planejamento ser perdido levemente por alguns instantes. A informação que seu POD de comunicação o dava era interessante, ele sabia que aquela ligação sem registro só podia corresponder a alguém que sabia o que estava acontecendo. Mas acreditava que era o “contato”, o maldito sem nome que o contratou, ou assim ele queria acreditar a essa altura do campeonato.

— Pode falar..— Atendeu demonstrando algum desanimo. – Sim, está tudo bem, nada fora do normal, fica tranqüilo.— Respondeu a uma pergunta incomum para alguém que contratava pessoas para apenas fazer entregas. – Sim, estamos no prazo, está tudo pronto, a parada está aqui.— Esboçou um sorriso ao responder, notou que a pessoa do outro lado não sabia o que estava acontecendo, mas sem dúvidas, não estava mais em seu encalço.

A ligação dura pouco depois desse momento, Douglas imprime em sua voz sentimentos muito distantes dos que realmente tem, ele sabe, por experiências passadas, que mesmo os mais perspicazes não são capazes de notar suas mentiras, sua dissimulação. Apesar disso, algo o incomoda, na verdade, Aika o incomoda, já que ela vê tudo e não parece se preocupar.

— Temos que ir?— Pergunta a ciborgue com a boca cheia.

— Sim, temos você me ajudou e eu preciso retribuir esse favor...— Diz o rapaz, que levanta pegando sua mochila.

[Pilar de sustentação das Auto Estradas, Bloco E, Muito Calor]

A mochila agora era acompanha por algumas malas, todas contendo equipamentos variados. Aika já havia sido scaneada duas vezes, além de já estar fazendo uso das pastilhas que detectariam os nano rabos em seu organismo. Ela parecia limpa, mas a desconfiança de Douglas era muito compreensível.

Enquanto a garota se auto avalia, com um aparelho que mais parecia um aspirador de pó portátil, o entregador teclava em uma espécie de notebook, mas que ocupava uma das maletas por completo. Curiosamente um cabo ligava o pulso esquerdo de Douglas a uma das laterais do computador portátil.

Sabia que algo estava errado, alguma coisa estava causando uma confusão em sua cabeça. Já era óbvio que outra empresa desejava a sua carga, mas a forma com que seu contratante tratava disso, além de claro, seus métodos estranhos, o deixava com uma pulga atrás da orelha: Que porra estava rolando ali que ninguém queria contar para ele?

Com algum tempo e, sua rede neural, protegida por tecnologia de grau zero – aquela que apenas os Altos de maior estirpe possuíam, conectada ao computador, acessou a Nuvem, nível a após nível, até penetrar em informações sigilosas, guiado apenas pelas linhas de comunicação deixada pelo “Contato” ao entrar em contato com ele a algumas horas, enquanto ainda se recuperava do ataque no hotel.

Acessou um banco de imagens, diferentes pessoas, averiguou alguns, percebeu que pelas informações eram prospectos para cumprir um trabalho. Logo compreendeu que aqueles eram as opções de entregadores, e que por algumas diferenças notadas nas informações dos prospectos que não só o valor pedido por ele, como suas habilidades e um tipo de “perfil psicológico” foi a garantia do trabalho ganho, ou nesse caso, dado.

Indo mais a frente, achou informações que julga interessante, dois nomes de corporações: Kanahara Horizon Technology e WTC Corporation. Ambas grandes corporações com seus tentáculos agarrando diversos ramos de pesquisa tecnológica e suas aplicações. Os arquivos são pequenos dossiês que narram espionagem e contra espionagem para com tais empresas no último trimestre.

— O que diabos esse bosta do Contato tá me escondendo?— Reclamou em tom alto suficiente para chamar a atenção de Aika, que no momento estava mais interessada em assistir em seu POD um episódio de “Segundos e Esperança”.

— Têm duas mega corporações monstruosas loucas pra pegar essa caixinha de bala! Isso é surreal.. Que cacete é esse?— Olhou para o lado quando falou isso, agora preocupado com o volume de seu tom. Aika voltava a prestar a atenção do seu programa e nem sequer notou a segunda explosão do rapaz.

Chegou a um ponto complicado, em poucos clicks e códigos inseridos atingiu um local extremamente protegido, simplesmente tornando o avanço impossível.

— Hum, parece que chegamos a algum lugar, não é mesmo Dr. Contato?— Murmurou com um sorriso no rosto. Nesse momento o cabo que ligava a máquina ao seu braço esquerdo começa a brilhar em luzes azuladas. Aqueles 94 mil créditos gastos com o set de equipamentos agora valiam totalmente a pena.

Mas ele não estava preparado com o que acabava de ver. Na verdade, ele não podia acreditar. Uma foto, dois nomes.

Ellba Developments

A foto era de um senhor, com um sorriso amistoso, de cabelos brancos.

O segundo nome era: Pedro de Oliveira Bartôlo.

— Puta merda!— Douglas exclama baixinho, mais por sua falta de palavras, menos por sua surpresa.

Nesse momento o vento se agita, e um som de hélices girando em alta velocidade começa a se aproximar. Aika olha para cima, colocando seu braço na frente do rosto, tentando se desvencilhar do vento em alta velocidade que incomodava seus olhos.

— Muito bem, Sr. Cardoso, Não esperava que você fosse ser capaz de acessar esses dados.— A voz ecoava por um megafone. Ainda no começo da frase Douglas já sacava sua nova arma, agora uma pistola moderna, evitando cometer o mesmo erro do hotel.

— O que vai fazer? Atirar em mim? Faça-me o favor Sr. Cardoso, você não tem coragem!— Bradou a voz, que agora o rapaz podia compreender era a do mesmo Sr. Bartôlo, o mesmo homem da foto, alto executivo da Ellba Developments.

Aika correu para uma direção anteriormente combinada com o entregador, sabia que deveria fazer isso quando ele sacasse sua arma. A diferença das armas pré-crise e das modernas era a qualidade do material, mas sem dúvida, a capacidade automática que tornou uma simples pistolas em metralhadoras muito potentes.

O Som da arma ecoa pelo local que era calmo até um segundo atrás. O clarão ilumina a noite artificial, mostrando ao dono da voz e a tripulação do helicóptero o traje tático que Douglas vestia.

Trun-um

Trun-um

Trun-um

Trun-um

O barulho é alto, mas é abafado completamente com o som de uma das hélices laterais da máquina voadora explodindo em pleno ar. O mega fone cai, mas graças ao traje tático, que acaba de ser ativado em 100%, ele podia ouvir, e agora com o visor expandido em seu rosto, podia ver também. Não era o idoso que gritava enquanto a máquina entrava em colapso e explodia seqüencialmente, e sim a ruiva que deixou o “pacote” para ele ainda na estação de triagem.

Não pode pensar muito, não tinha tempo, o helicóptero hightech com um par de hélices laterais explodia no ar e seus destroços caiam por todos os lados. Ele começa a correr e graças ao traje é capaz de acelerar mais de três vezes que um ser humano normal.

Aika toma um susto quando é pega nos braços de seu salvador, que faz isso com extrema facilidade, dada a qualidade física ganha pelo traje.

[Torre 11, próximo ao último andar, muito calor, muito alto, muito perigoso]

Douglas carrega nos braços a ciborgue, ela não reclama, mas se sente desconfortável, com medo, mas algo dentro de si sabia que aquilo era necessário. Até que algo acontece.

BOOOM!

A explosão joga o rapaz e a garota através de um portal aberto, próximo a cobertura da Torre 11. Em uma tela a imagem do Sr. Bartôlo, dessa vez, o verdadeiro aparece.

— Desiste Douglas, Desiste. O barulho é o andróide da Horizon, te entregamos pra ele. Você perde de qualquer forma— Falou, com uma expressão tão limpa e assertiva que Aika olhou para o entregador como quem aceitasse a morte.

— Não!— Grita Douglas, apontando a arma na direção do andróide que surgia em seu campo de visão, atravessando o buraco causado pela explosão. Seu sobretudo então, é varado por disparos efetuados pelo rapaz, seu corpo composto por uma liga metálica, no entanto demora a ser avariado, por mais que dessa vez os projéteis estejam tendo um claro efeito.

Aika corre para o heliporto, era esse o plano, e quando Douglas atirou no monólito de metal, ela soube que ele não se entregaria e por isso voltou ao plano inicial, fugir daquele lugar.

— To te esperando! Eu sei pilotar, você só precisa vir!— Exclama a garota que invade o cockpit da Nave, um jato particular que já havia sido hackeado por Douglas.

Ela não podia ver, mas apesar do traje o andróide se mostra mais capaz, mesmo visivelmente avariado, a máquina ainda é superior às valências melhoradas de Douglas, que luta para não ser estrangulado pela máquina. Seu visor, quebrado, apenas indicava que todas as nano fibras de carbono estavam prestes a serem partidas por pressão externa.

— Desgraçado, você quer essa porcaria? É o que você quer?— Pegou em um pequeno compartimento o “pacote de balas” e com raiva enfiou-o na boca, do andróide, que não se fechava mais, graças aos danos no maxilar do assassino mecânico.

Na mesma hora, a máquina o soltou, jogando-o além do portal a dois metros de distância.

— Achei que você fosse defender o pacote até o final, você me surpreendeu Douglas. O perfil psicológico que fiz estava errado. Parabéns.— A voz ecoou pelo local, como se todas as telas próximas repetisse aquelas palavras. – É uma pena, mas obrigado, você já cumpriu seu papel.— A frase dá lugar a um silêncio mortal, Douglas corre para a nave enquanto Aika aciona os motores. Um som fino, como aquele que se ouve quando os ouvidos apitam, toma conta do lugar.

A nave se eleva, ganha velocidade.

— Aika, abre um buraco na fuselagem!— Grita Douglas ao se sentar em um dos acentos e apontar para um lugar bem específico, uma interligação de dutos de oxigênio.

— Por quê?— Pergunta a menina.

A nave já está em pleno ar quando o clarão impede que os dois, Aika e Douglas, consigam enxergar. A onda de choque da explosão se desloca quase tão rápida quanto a aceleração que a nave produz. Guiados pelo instinto, abrem fogo contra a fuselagem, atingindo os dutos que transportam oxigênio. A explosão, contudo, é ignorada pela detonação anterior, que faz tudo ir pelos ares, direto para o espaço exterior.

O Bloco E é extremamente danificado e todas as colônias registram a explosão.

FIM


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Notas finais do capítulo

Surpreende haver um vilão?
Ou a ideia de vilão se perdeu no meio dos acontecimentos?

A dupla de protagonistas - já que Aika tomou esse lugar no meio da narrativa, teve um final que agradou vocês?

Eu sendo sincero, prefiro não contar o que eu penso sobre o último parágrafo.

Mas.. se fossem vocês a escolher, acham que o casal acabou?

Bom, se vocês leram até aqui, eu agradeço do fundo do coração. Espero mesmo que tenham gostado - caso contrário, não tenho ideia do que fazem lendo tanta coisa assim D:

Breve postarei mais coisa. Mas se ao lerem, sentiram vontade de conversar sobre, falem, por favor! Enquanto os novos capítulos/contos não são postados, discutir sobre esse aqui só vai me ajudar mais!

Então.. obrigado novamente. E até mais :3



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