Glacius- Habitantes do Desconhecido escrita por Alice Prince


Capítulo 2
CAPÍTULO DOIS - O silêncio que assombra


Notas iniciais do capítulo

Dois em dois dias? Que isso, titia Alice não conseguiu se segurar e decidiu postar logo, já que amanhã será meio impossível.
Então muito obrigada a quem esta acompanhando e a quem comentou, é um prazer ter vocês nessa breve jornada ♥
Boa leitura!



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O silêncio parecia muito estranho naquele momento, meus olhos estavam fechados e eu sentia meu corpo doer terrivelmente como se tivesse sido atingida por um caminhão, respirar parecia algo muito difícil e doloroso, como se o ar que entrasse em meus pulmões estivesse em chamas, queimando-me por dentro.

Quando abri meus olhos era como se o fizesse pela primeira vez depois de muito tempo dormindo, havia algo molhado em minha testa e minhas mãos ardiam terrivelmente, eu estava no chão de bruços muito desconfortavelmente, havia fuligem por toda minha roupa, eu me sentia desnorteada, quando consegui me erguer e me livrar do pó que estava em mim pude enfim observar o caos em que eu estava imersa.

Não fazia a menor ideia de como havia chegado aquela rua, em um momento eu estava observando uma briga inútil e fora de hora de meus amigos e depois minha mente se tornara uma escuridão, não conseguia me lembrar de nada. Senti algo quente e viscoso escorrer minha testa e gotejar me minha camisa, era o meu sangue, e o que indicava que a dor da minha cabeça era por algo bem maior do que eu imaginava. Toquei de leve o lugar de onde o sangue vinha e senti a dor se intensificar, eu odiava sangue ainda mais quando era meu, quando encarei meus dedos sujos pelo líquido escarlate senti a pernas tremerem, logo em seguida limpando do modo que consegui em minhas calças.

Os meus primeiros passos foram vacilantes e ao me escorar em um dos carros por perto senti as mãos doerem ao entrar em contato com o metal gélido, elas estavam completamente machucadas, como se eu as tivesse arrastado pelo asfalto da rua de forma violenta. Quando gritei por meus amigos senti minha garganta seca arder, como se eu tivesse inspirado muita fumaça.

O medo dera lugar ao completo pânico quando se passaram mais de vinte minutos andando por entre escombros e Deus, eu havia passado por mais de dois corpos que não tive coragem de checar. Era como se todos ou tivessem morrido ou simplesmente sumido, eu tentei recordar o que acontecera, mas minha cabeça doía tanto que eu apenas queria poder sentar e respirar sem me sentir tonta, mas me recusava a ficar ali em meio a tanta destruição.

O céu se tornara alaranjado, mas não aquele comum que se aprecia em fins de tarde, era estranho como se algo estivesse em chamas acima das nuvens, só que por todo o céu até onde meus olhos podiam alcançar. Estava mais frio que o normal e eu não sabia para que lado ir, era como se estivesse em um lado completamente oposto da cidade, eu não sabia por onde começar para poder chegar a hospedaria e estava com medo de encontrar alguém que não fosse solícito e me ajudasse.

Tomei a decisão de entrar em um grande prédio de mais ou menos uns cinco andares, a aparência era daqueles antigos prédios de tijolos escuros, na entrada uma porta grande de madeira também escura me fez me sentir ainda mais pequena do que de costume, li rapidamente uma placa com alguns dizeres sobre ser um escritório de advocacia, ignorando que a ajuda que eu precisava certamente não viria dali.

O clima dentro do prédio parecia outra realidade, calmo, o ar mais límpido, mas estava deserto, minha respiração era curta, minhas mãos doíam enquanto suavam frio, eu só queria poder encontrar alguém para me dizer o que estava acontecendo, por Deus, era a queda de um avião, não o extermínio da raça humana.

Respirei fundo quando achei uma escadaria e senti um calafrio atravessar meu corpo quando dei o primeiro passo, luzes de emergência iluminavam tudo, e eu ri de mim mesma ao pensar que as coisas não seriam tão esquematizadas se fosse em meu país, e segui rindo ao pensar em comentários que diriam sobre isso, distraída subi três lances de escada sem perceber o quanto ficava mais frio a cada segundo, eu nem me dera conta que meu grosso casaco havia sumido e eu estava com uma camisa jeans fina, manchada por fuligem e sangue.

Encarrei o longo corredor em que estava, as portas fechadas, as luzes fracas, tudo tão calmo, eu queria voltar e achar alguém que me levasse novamente a meu quarto, subir em um carro que me levaria para o aeroporto, embarcar em um avião que não caísse e pôr os pés no país de onde eu não devia ter saído. Tomei coragem e me encaminhei a uma das portas, queria ao menos achar um telefone, ignorando que possivelmente não havia eletricidade, estávamos no século vinte, celulares existem para isso.

Depois de checar mais ou menos duas salas típicas dos filmes policiais com suas mesas cobertas de papéis e estantes cheias de livros sobre direito eu entrei na última já descrente de qualquer coisa. Abri a porta devagar e esquadrilhei tudo rapidamente com os olhos, era só mais do mesmo...

— Deus, que porra!— Gritei sentindo meu corpo todo travar, a figura de um homem surgiu de trás da porta e me encarou curioso, meu coração batia tão rápido que eu precisei me apoiar numa poltrona que estava perto.

— O que está fazendo aqui?— A voz autoritária e grossa me perguntou enquanto ele botava a cabeça para fora da porta observando tudo.

— E-eu, desculpe, estou a procura de alguém que possa me dizer que está acontecendo.— Ele me encarou com os olhos escuros enquanto voltava para dentro da sala, parecendo estranhar meu sotaque nada rebuscado. Sorri nervosa enquanto ele se aproximava lentamente, pondo uma das mãos sobre meu rosto, olhando atentamente para minha testa, eu nem me atrevera a querer saber o quão grave estava, mas a dor já denunciava, não era uma simples batida.

— Precisa se sentar, acho que tenho alguma coisa para limpar isso...— Ele disse enquanto se encaminhava a uma porta ao lado de uma estante, mordi um dos lábios quando ele retornou com uma espécie de bolsinha e uma lanterna em mãos, a sala não tinha luz de emergência e apenas o alaranjado céu iluminava de forma precária.

Ele se ajoelhou diante de mim e me encarrou de forma séria, eu não conseguia me concentrar em apenas uma coisa, era tudo tão novo, o céu amedrontador lá fora, o jeito silencioso dele enquanto umedecia um algodão em uma solução que julguei ser soro.

— E então, o que faz uma garota sozinha por ai entrando e invadindo escritórios?— Ele puxou assunto assim que começou a limpar cuidadosamente minha testa, a ardência não era grande então me contive em uma expressão de dor e logo respirei fundo olhando em seus olhos incrivelmente escuros e duros.

— Ah qual é? Vai me dizer que não ouviu quando aquele avião caiu na rede elétrica da cidade?— perguntei incrédula, ele me olhou erguendo uma sobrancelha, negando logo em seguida.— As coisas ficaram muito feias lá fora, é impossível que não tenha notado isso…

— Eu não sei, não segui o fluxo descontrolado de pessoas para o outro lado da cidade, eu tenho muito mais com o que me preocupar do que com algum burburinho que surgiu sobre a queda de um avião.— A resposta me fez calar no mesmo instante, ele havia dito outro lado da cidade, eu não estava lembrada de ter andado tanto assim.

Enquanto ele terminava de limpar minha testa eu apenas tentei focar meu olhar em qualquer coisa que não fossem seus olhos negros, mas parecia um pouco impossível, com sua face a poucos centímetros da minha era a única coisa que eu podia olhar sem ser indiscreta olhando, por exemplo, para o teto. Quando ele terminou e se ergueu eu murmurei um obrigada em minha língua esquecendo por completo que não, eu não estava no meu país.

Toquei de leve minha testa onde ele havia feito um curativo pequeno, mas que dera conta de estancar o sangue, ele franziu o cenho vindo até mim novamente e tomando minhas duas mãos nas suas, eu sei que não era o intuito dele, mas aquilo soou um pouco rude devido ao seu tamanho, ele bufou olhando para mim de uma forma que não consegui decifrar se era boa ou ruim.

Sorri de canto arqueando os ombros como se pedisse desculpas, ele voltou a abrir a pequena bolsa de medicamentos e se dispôs a cuidar de minhas mãos, eu sequer ousei reclamar quando o soro entrou em contato com os ferimentos, estava cansada, podia sentir que meu corpo todo cederia uma hora ou outra.

— De onde vem?— questionou assim que terminou, sentando-se logo em seguida na grande cadeira atrás da mesa, o olhei enquanto ajeitava alguns papéis e esperava minha resposta, pus uma mecha do cabelo para trás da orelha e ajeitei o corpo na poltrona que parecia abraçar meu corpo com o estofado de couro marrom.

— Brasil.— Falei rápido sentindo um imenso desconforto com o olhar que ele me dirigiu, batuquei com os dedos sobre as guardas da poltrona e olhei em volta, tudo era tão sistematicamente organizado, os livros na estante estavam organizados por cor, tamanho e eu não precisava chegar perto para saber que possivelmente estavam por ordem alfabética também.— O avião realmente caiu, não é um simples burburinho, eu estive lá, ele caiu nas torres e foi horrível, estava a algumas quadras de lá e depois simplesmente acordei aqui, por acaso se deu o trabalho de olhar pela janela? As coisas estão num caos e você aqui fazendo… O que diabos está fazendo, afinal?

Ele largou um dos montes de papel que fez certo barulho chamando minha atenção de volta a ele, mordi os lábios esperando algum comentário irônico ou coisa parecida, mas o que ele fez foi erguer o corpo robusto coberto por um terno de risca de giz preto e se encaminhou até uma das janelas, afastou um pouco as persianas e observou tudo por alguns segundos, logo após voltou a sentar e me encarou com as duas mãos cruzadas sob a mesa.

— O que aconteceu com você?— Quis saber fazendo uma carreta de estranheza, eu não sei o quanto ele viu, mas aposto que no andar em que estávamos era possível ver um corpo ou outro por entre os destroços de carros e outras coisas.— E por Deus, o que faz nesse fim de mundo?

— Eu estava de viajem com uns amigos...— Ele ergueu uma sobrancelha e seus lábios traçaram uma fina linha, um belo sorriso de canto.— Não é o melhor lugar do mundo para se viajar, eu sei, mas foi de graça, tá bom? O fato é que eu não faço a menor ideia como cheguei aqui, “do outro lado da cidade” como você disse, eu estou apavorada, sei que viu o que tem lá embaixo, eu acordei lá, jogada feito uma boneca de pano, sangrando, sozinha e desnorteada…

Parei por um segundo vendo que meus pulmões pareciam queimar, minha cabeça doía terrivelmente enquanto minhas mãos apertavam minhas coxas de forma bruta, o pânico de outrora resolvera tomar conta de mim mais uma vez, as palavras sessaram e eu o encarei com os olhos arregalados, pensando pela primeira vez que meus amigos podiam ser um dos corpos jogados lá fora.

Fechei os olhos tentando me controlar, enquanto buscava respirar de forma calma e ritmada, nem me dera conta de que ele estava, mais uma vez, ajoelhado diante de mim, as mãos fortes se puseram em meus ombros e ele sussurrou que estava tudo bem enquanto acariciava de forma lenta as minhas costas.

Por minutos eu permaneci ali, envolta em meu pânico, pensamentos atordoantes se revesavam em passar por minha mente me causando um terror ainda maior, como se não quisesse me deixar calma, ele me fez olhar em seus olhos dizendo para pensar em alguma coisa boa e instintivamente pensei e minha família, minha mãe sorrindo animada com minha felicidade em sair de viajem, ele respirava em alto e bom som junto comigo e aquilo me fez me acalmar aos poucos, suas mãos agora estavam sobre as minhas, impedindo que eu me machucasse mais ainda.

— Ah, me desculpe, eu estou com medo, não faço a menor ideia do que aconteceu depois da primeira explosão do avião, não sei onde estão meus amigos e se ainda estão...— Desviei meu olhar e balancei a cabeça tentando afastar aquele pensamento.— Obrigada!

Eu estava encabulada com o toque de nossas mãos que não havia cessado ainda, mas aquilo de certa forma havia me passado uma sensação de proteção boa, eu não fazia a menor ideia de quem era aquele homem, mas toda a paciência que ele estava tendo comigo me fez admirá-lo.

— Sou Joshua.— Ele disse enquanto desfazia o toque em minhas mãos e se encaminhava a um pequeno armário ao lado de uma das estantes, o abriu e tirou de lá dois copos e uma garrafa de uma bebida que não pude identificar, mas, com certeza, não era algo que se tomava com a família no fim de tarde ao chegar em casa.

— Sofia. E eu acho que devo desculpas por simplesmente entrar em sua sala assim, tudo está tão vazio que não achei que teria alguém.— Ele piscou pra mim e pôs um dos copos na minha frente servindo o líquido de coloração amarelo queimado, o peguei receosa, o cheiro era como o de álcool misturado a algo mais, mas era convidativo, mesmo sabendo que não era aquilo que meu organismo necessitava no momento eu ousei bebericar, como eu imaginava o gosto não era dos melhores e aquilo desceu queimando, ele me encarava sentado na ponta da mesa, com o outro copo em mãos já vazio, sorri tossindo levemente, eu não era a menina que se metia em festas com amigos e bebia, o máximo que já havia ousado beber fora a metade de uma garrafa de vinho no natal com a família.

— Não acho que é a ideia mais inteligente beber numa situação dessas, mas sabe, as vezes o corpo só precisa de algo ao que se agarrar e descansar um pouco, o álcool sempre é uma saída amortecedora para problemas.— A voz dele agora mostrava um novo tom, calmo e despreocupado, ele largou as coisas sob a mesa e passou as mãos nos fios negros de seus cabelos o despenteando de forma atraente.— Embora não ache que esteja na idade certa para entregar seus problemas pra essa droga…

— É, não aqui, basicamente em meu país já sou considerada completamente competente enquanto aqui ainda não posso comprar bebidas sem uma identidade porcamente falsificada.— Ergui o copo e com coragem dei um longo gole me arrependendo logo em seguida, meu querido capim líquido cairia muito bem agora.

Eu não sabia muito bem sobre conversar com estranhos em um possível acidente de escala enorme, numa cidade em um país que você não faz a menor ideia como funcionam as coisas, mas beber não era uma das coisas mais recomendadas a se fazer, afinal eu era uma menina ao auge de sua juventude apavorada e desprotegia, mentalmente atordoada e facilmente poderia ser contida com pouco esforço, mas minha mente estava tão cansada de pensar em como tudo estava tão imerso em caos que estar naquela sala, apenas podendo ficar calma e bater um papo com alguém consciente me fazia esquecer que era um homem desconhecido e que eu devia temer.

— É uma cidade pequena, mas alguém já deveria ter dado as caras por aqui, quer dizer, aquilo lá embaixo? Não passa despercebido assim.— Comentou ele retirando o paletó e o jogando na poltrona ao lado da minha.— Sabe, Sofia, pode soar estranho, mas aconselho a não sair novamente por ai, não sozinha é claro, e mais estranho ainda é se eu pedir que descanse um pouco, sua aparência esta péssima.

Apertei o copo em minhas mãos, o líquido ainda lá, o pouco que eu bebera nem dera diferença em sua quantidade. Me desfiz do objeto em cima da mesa e levantei um pouco tonta, não era o álcool, era a droga do meu ferimento na testa e toda a dor do meu corpo se manifestando ao mesmo tempo.

— Aprecio a calma comigo, mas deve entender que eu não me sinta confortável com isso, por favor, não encarre isso de má forma. Eu preciso de um celular, por mais besta que seja eu quero tentar contato com a minha família...— Ele assentiu parecendo compreender meu medo, abriu uma pequena gaveta e tirou de lá a maravilha do nosso século, me entregando logo em seguida, eu me odiei no mesmo momento por parecer insegura com ele, mas o mundo sempre foi um lugar onde você não pode confiar nem mesmo na sua sombra.

Me senti uma idiota ali sendo observada por ele enquanto pegava o aparelho e via a maldita mensagem sobre não ter sinal, suspirei indignada e devolvi me sentando pesadamente na poltrona novamente. Passei as mãos em meus cabelos e olhei atentamente para elas logo em seguida, agora enfaixadas, o esmalte preto descascando levemente.

— Eu só queria saber o que realmente aconteceu.— Falei escorando meu corpo por completo no macio estofado, minha cabeça pendeu para trás e eu observei a porta fechada.— Sinto como se tivesse sido atropelada por algo enorme.

— Quem sabe.— A voz dele soou meio, divertida?— Sua aparência condiz com tal fato.

Arregalei os olhos e murmurei um está tão ruim assim? Ele sorriu e balançou a cabeça apontando logo em seguida para o copo e a garrafa perto de mim, resmunguei ao me mexer para empurrar os dois para perto dele.

— Pode descansar se quiser, prometo que não acordara sozinha, apenas alguns minutos, seu corpo precisa desligar por algum tempo para se recompor, pode confiar em mim, Sofia.— Afirmou ele enquanto soltava a gravata azul-marinho, os olhos transpassando uma aura de verdade que eu não ousei questionar, estava realmente cansada.

 


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Notas finais do capítulo

Temos os nossos dois personagens principais minha gente ♥ espero que estejam gostam de tudo, e como eu escrevi essa short toda em um único documento sem separa-la por capítulos não estranhem a diferença que um terá de palavras para o outro, não quer acabar um capítulo do nada, por isso se o próximo for mais pequeno é pq assim foi melhor a divisão.
Explicações dadas capítulo terminado, autora feliz q nem uma criança eu me despeço.
Beijinhos gélidos para vcs ♥



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