Atro Cataclisma escrita por EvellySouza, NatyKatarynna


Capítulo 2
Capítulo 2




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   O café da manhã havia acabado há poucos minutos, todas as militares foram convocadas para a tenda de inspeção de saúde. Caminhei lentamente para o local, já sabia o que estavam planejando, mais um teste de gravidez. Faziam 4 meses desde o último, não podia ser outra coisa.

   Desde o começo de toda essa desordem mundial foi nos deixado explicito a desaprovação do comando das forças armadas quanto a gravidez, houve todo um processo de conscientização do quanto isso era inconveniente considerando a situação que estávamos vivendo e o quanto afetaria nosso desempenho físico e emocional nas operações. Após todo o caos generalizado isso nos foi vetado, com consequências graves como a destituições de nossos cargos e afastamento permanente de qualquer acampamento militar para militares graduados.

   A apreensão ia me dominando conforme a alta tenda verde ficava mais próxima, o ambiente ao redor estava lotado por diversas mulheres distribuídas em duas seções por fileiras, identifiquei-as assim que aproximei-me, graduadas e oficiais. Como capitã seria uma das primeiras da fileira, procurei me alocar atrás da Capitã Belluz e Capitã Natalie assim seria a última das capitãs presentes no acampamento.

  Corpo ereto, mãos juntas à coxa, olhar centrado no horizonte, coração batendo à mil e mente vagando perturbada pelas últimas semanas. Náuseas, enjoos, atraso menstrual, toda mulher compreende o significado de tais sintomas, mas não havia confirmação e eu nem conseguiria sem despertar suspeitas. Apenas mantive a suspeita comigo mesma, não queria preocupar Joseph.

  A agulha perfurou meu braço, o sangue subia para a seringa enquanto eu tentava aquietar minha pulsação excessiva. O teste que fazem se chama Beta HCG Quantitativo, ele é capaz de determinar a quantidade de hormônio presente no sangue e quanto tempo tem a gestação. Havia boatos que até a 10ª semana você tinha a opção de abortar, tudo por debaixo dos panos, mas isso nunca havia sido confirmado, nem seria se fosse verdade.

   O Sargento retirou a agulha e ofereceu-me um singelo sorriso que retribui enquanto mentalmente arquitetava um plano para roubar aquele frasquinho de volta, eu não podia me dar ao luxo de tentar a sorte. Esses testes normalmente ficavam prontos em 1 ou 2 horas, e meu prazo era exatamente esse, não era muito para bolar algo miraculoso. Era necessário ser prática.

   Q-0. Gravei.

   Em um rápido olhar pela mesa com todos os preparativos, fiz a contagem dos frascos, 90 no total. Quando cheguei contei 83 mulheres, ou seja, 7 frascos reservas. Segundos e um deles saltou no bolso lateral da minha calça. Dada as situações críticas que estávamos sobrevivendo não iriam repetir o exame em todas essas mulheres por conta de um frasco. Obviamente ficariam mais espertos, porém com isso eu conseguiria lidar.

   Cumprimentos, continências, reverências, saudações e uma ordem: Em meia hora esteja no complexo de armamento. Meu espaço de tempo havia diminuído drasticamente, ao sair do campo de visão dos ainda presentes ali, esgueirei-me por entre o labirinto de tendas até chegar na pequena cabana que Joseph e eu tínhamos. Procurei-a até achar na pequena caixinha que guardamos alguns itens de valor emocional. Ah! A maravilhosíssima seringa que briguei com Joseph por roubá-la, estava lá. Joguei-a dentro do bolso juntamente com frasco que havia tirado para conferir novamente, o medo de que qualquer erro bobo destruísse meus planos me fazia revisar o plano a cada 10 segundos mentalmente.

   Minutos após, estava eu analisando os civis em busca de pessoas que lembrava de ter meu tipo sanguíneo. Mallu, 5 anos de idade, chegou de Belém mês retrasado lembro de ela permanecer abraçada em mim enquanto fazia um teste sanguíneo para saber se estava contaminada com o vírus. AB+.

   O que aconteceu em seguida me perturba até hoje, usei de sua confiança em mim para roubar seu sangue. Enchi o frasquinho dei um beijo na bochecha dela e esgueirei de volta para a tenda de inspeção de saúde com o coração apertado pelo olhinho cheio lágrimas que deixei para trás.

  Em uma tacada de sorte tudo ocorreu como planejado, usei minha patente para fazer com que o outro sargento que agora retirava sangue desviasse a atenção por dois segundos em uma conversa desnecessária iniciada por mim, enquanto atrás de mim minhas mãos localizavam o Q-0 e faziam a troca.

  E por que tudo isso se eu era uma oficial, e poderia muito bem ficar sem meu posto e criar meu filho, se é que tinha um aqui dentro? Simples, Joseph é 2º Sargento, ou seja, um graduado. E eu não poderia viver sem ele, muito menos conseguiria criar uma criança. Mas também não poderia criar essa criança sem as ‘regalias’ se assim posso dizer, que tenho como comida e remédios aqui na base.

  Mas agora nada disso importava, eu carregava um homem quase morto em meus ombros, um homem que eu amava, e que me amava infinitamente.

— Aguenta mais um pouco. – eu repetia freneticamente para ele. – Estamos chegando, só mais um pouco.

Ele gemia de dor, eu sabia o quanto isso era doloroso. Já havia visto isso milhares de vez, contudo dessa vez doía bem mais, éramos conectados de uma forma que por muitas vezes achei ser sobrenatural, agora, acredito que seja um bônus do amor.

— Me deixe... lá... e volte, precisam... de você. – ele dizia pausadamente entre um gemido e outro.

Você precisa de mim. – enfatizei, sabendo que aquela conversa não acabaria assim.

   Chegamos na nossa cabana, deitei-o sobre o fino colchonete enquanto passava a mão sobre seu rosto tentando medir a temperatura do seu corpo. Febre. Não tão alta ainda quanto vi em outras pessoas, mas o suficiente para fazer com que eu desmoronasse ao lado do dele sem saber como prosseguir. Eu queria salvar as pessoas que vi lá, queria saber se Mallu estava bem, contudo, sair de perto daquele homem não estava nos meus planos.

— Ei... Camilly, olhe para mim – Joseph não me tocava, talvez tivesse medo de me contaminar ou por dor, mas tentava me passar calma com o olhar, sempre funcionava. – Não sei quando iria me contar, ou porquê... não contou antes, mas não me importo. Eu estou feliz, muito feliz. Se eu morrer agora, iria embora tendo a... a certeza que escolhi a mulher certa... para ser mãe do meu filho. A mais linda, mais inteligente... mais forte e mais corajosa que conheci... Fui muito feliz ao seu lado. – ele falava e meu coração apertava ainda mais dentro do meu peito, lágrimas se formavam e eu começa a sentir falta de alguém que ainda estava ao meu lado.

— Eu também te amo... muito. – foram as únicas palavras que saíram.

— Eu sei... sempre... soube – ele brinca em meio à crise de tosse. – Agora vá... faça o que você... sabe fazer de melhor... Salve vidas.

   Dei um rápido abraço nele, e parei alguns segundos para observar aquele sorriso mais uma vez, ele recarregaria minhas energias para mais uma batalha pela sobrevivência.

  Corri para a saída da cabana, mas parei abruptamente.

— Um nome?

— Emma.

— E se for menino?

— Estarei aqui quando você voltar para te contar. – ele abre um sorriso imenso e com a magia que só ele tem, me faz acreditar em cada palavra dita, e me agarrando nisso corro avante, para mais uma batalha pela sobrevivência de pessoas que sequer conheço mas sinto um desejo imenso de proteger, deixando para trás quem sempre fez o mesmo, mas por mim.


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