Mia

Resolvemos hoje nos organizar nos grupos que se apresentariam no festival.
— Mia, ainda não pensou na música? Quer ajuda com o arranjo?
— Quero... – disse me rendendo.
Disse a David que faria sozinha sem sobrecarregá-lo, eu lhe devia isso, mas o festival está cada vez mais perto e eu não pensei em nada ainda. Sempre estive concentrada só na música, mas agora estão acontecendo tantas coisas ao meu redor e comigo, estou sem concentração para escrever.
— Você já sabe o que podemos tocar? Violão, piano...? - perguntou ele.
— Eu pensei em algo mais clássico. A gente sempre toca algo agitado...
— Ah, gosto dos clássicos também. Piano então?
— Que tal piano com violino?
— É muito bonito. Mas, ei, sabe que podemos fazer um cover né?
— Eh? Verdade, né! Ain, que bom... – disse realmente aliviada.
Ele riu. — Você sempre gostou da ideia de tocarmos algo seu.
— Nosso. – corrigi – Mas é que estou realmente seca de ideias.
— Então faz assim, a gente escolhe uma música para fazer cover, mas você ainda vai pensando em compor algo. Se não conseguir nada até lá, teremos o plano B.
— Oh, que inteligente...
— Sou não é mesmo?
— Recomponha-se.
— Parei.
— Ei! Eun Ah tome cuidado! – reclamou Abigail, juntando seus materiais do chão.
— Sinto muito! – disse Eun Ah, equilibrando um monte de coisas nos braços, era tanta coisa que tampavam sua visão.
Corri para ajudar Eun Ah, e David a Abigail.
— Não, não veja isso! – gritou Abigail para David.
— Si-sinto muito. Eu não vi nada. – apressou-se em dizer.
— Por que ele não pode ver? É algum segredo? Deixa eu ver. – Filip pegou o caderninho de sua mão – O que é isso? Uma carta de amor? Hummm, Abigail está apaixonada?
— Me dê isso, seu idiota!
Ele ergueu o papel no alto quando ela foi pegá-lo de volta. Mas então David o pegou.
— Ei! – reclamou Filip.
David parecia bem sério. — Esse tipo de brincadeira não se faz.
— Aff, era só zoeira. Foi mal...
David devolveu o caderno a ela. — O-obrigada. – respondeu envergonhada.
Ele sorriu e ela pareceu mais acanhada ainda.

***

Depois de um tempo, todos os grupos foram embora. Eu estava saindo do escritório da Sra. Park, depois de guardar algumas últimas caixas, quando vi Abigail indo falar com David. Por algum motivo recuei um pouco até não poder ser vista de novo. Mas era inevitável não escutar a conversa.
— Obrigada por me ajudar naquela hora.
— De nada.
— E me desculpe ter gritado com você também.
— Não foi nada, está tudo bem. Nossos sentimentos são exclusivamente nossos, acabamos guardando eles como um segredo, então quando parecem serem expostos, a gente perde a cabeça. Isso é normal, não se preocupe.
— Você é tão legal! É por isso que... – a voz dela tremia – David eu gosto de você! – disse de uma vez.
Oh, eu realmente não deveria estar escutando isso... Algo tão particular! Desculpe Abigail, sinto muito mesmo!
— Sinto muito.
Eh?
— Mas eu já tenho alguém que gosto.
— A-ah... – estava em choque.
Eu também estava. Meus dois melhores amigos tinham alguém que gostavam e eu nunca soube disso. Magoada.
— Mas obrigado por me dizer isso.
— Sim... – escutei uma risada nervosa e passos corridos.
Espiei se a barra estava limpa para eu sair.
— Você ouviu? – perguntou apoiado na carteira, com as mãos nos bolsos.
— Ah... É... – cocei a cabeça sem graça, me aproximando.
Não sabia se devia perguntar, mas... — David você gosta de alguém?
Ele me olhou receoso, mas confirmou.
— Sério?! Quem é? - me aproximei mais, tocando seu braço.
Ele riu fraco. — Você ainda não percebeu, Mia?
— Han? O quê? Eu conheço ela? – perguntei ainda mais surpresa, pensando em todas as possibilidades. Pensei até na Camila!
Ele sorriu e, de repente, pegou uma mecha do meu cabelo de formal gentil. — É você... Eu gosto de você há muito tempo, Mia.
O-o...quê? Sem chance... Ele está brincando... comigo.
Olhei para ele. Estava sério, sem nenhum pingo de sarcasmo ou qualquer evidência de brincadeira. Sentia sua mão tremer um pouco.
— Você aceitaria sair comigo?
Mas...eu não sentia o mesmo que ele. Gostava do David, ele era uma das pessoas mais importantes para mim, mas ele era alguém da minha família, praticamente crescemos juntos, ele era como um irmão mais velho para mim!
O que eu faço? Eu jurei para mim mesma proteger aqueles que amo, aqueles que me deram a oportunidade de ter uma família mais uma vez. Eu nunca o magoaria... Então o que eu falo para ele agora? Se disser que gosto de outra pessoa ele vai se afastar de mim e me odiar para sempre. Eu não quero isso... Não mesmo.
Meu coração está acelerado, mas a sensação não é a mesma que a das últimas vezes. Está tão pesado...

Érick

Ela está atrasada, como sempre. Eu avisei que fomos chamados para ajudar no Clube de Natação, e ela disse que tinha algumas coisa para fazer no clube dela, mas que estaria aqui no horário certo.
Resolvi ir buscá-la. Provavelmente se empolgou na música e esqueceu desse compromisso.
A vi conversando com um cara loiro. David. Por que estão tão próximos? Por que ela parece tão séria e assustada?
— E-eu não posso sair com você...
Voltei alguns passos. Aquela frase me fez ficar nervoso.
...
O que estou fazendo? Me escondendo e ouvindo a conversa dos outros?
— Porque eu... Po-porque minha TIA... ela não está me deixando sair.
— Ainda é pelas notas? Mas pensei que você tivesse melhorado.
— Pois é, mas eu... MINHA TIA tem medo que eu retroceda. Vou até estudar nas férias.
— Ah, então...eu vou esperar.
— Han?
— Já esperei tanto tempo, posso esperar até que fique realmente confiante nos estudos.
Ela riu nervosa.
— Estudar nas férias? Quem diria... Estou orgulhoso de você.
Para mim já é o suficiente.
Então era isso, ela queria minha ajuda para provar para ele que se tornou madura. Ele é o garoto que ela gosta...
...
Mas que merda! Por que eu estou tão incomodado com isso?
...
Droga... Quando foi que eu comecei a gostar dela?

Mia

Ah, estou atrasada! Sensei vai ficar uma fera comigo...
Eu menti para o David e no final das contas nada mudou. Não consegui resolver nada. Argh, odeio mentir!
— Sensei, desculpe o atraso! – ele me olhou assustado, não deveria ter falado tão alto.
Mas não era minha culpa se o lugar da piscina fazia eco.
— Arrume aquelas pranchas no lugar. – disse sério sem olhar para mim.
— Certo...
Definitivamente, ele estava bravo. Eu disse que estaria aqui no horário, mas me atrasei. Ele deve ter ficado sobrecarregado.
Se eu tinha dúvidas que ele estava bravo comigo, seu silêncio e seu semblante, constantemente sério a tarde toda, não me deixaram mais dúvida alguma.
Quando acabamos, ele foi na frente sem mim. Corri pelo corredor para alcança-lo.
— Sensei! – e parei na frente dele – Está bravo comigo? Sei que me atrasei, me desculpe!
— Não estou bravo. – se desviou de mim.
— Mas.. não parece...
Ele parou, antes mesmo de começar a andar. Com as mão nos bolsos se virou para mim de volta — Quer saber, eu estou bravo sim.
Sabia!
— Mas não é por você ter se atrasado.
Han? Não? Então por que...?
— O motivo pelo qual você quer que eu continue te dando aulas... eu já sei. O real motivo.
Eu congelei. Ele sabia? Então ele sabia dos meus sentimentos?
Não consigo encará-lo.
— E esse motivo é um incômodo para mim.
O...quê...?
— I-incômodo. E- entendo... – minha voz quase não saía.
Por que meu peito está doendo tanto?
Dei meia volta e fui embora dali. Assim que saí da vista dele, comecei a correr. Nunca fui boa correndo, mas era ainda mais difícil correr chorando.
Tinha acabado de passar o portão da escola, quando alguém me segurou pelo braço.
Era David. Estava surpreso e preocupado.
— Mia, o que houve? Por que está chorando desse jeito?
Eu só queria me esconder, não queria que aquelas pessoas me vissem chorando.
David me abraçou, de um jeito que me acolheu por completo, quando viu algumas pessoas vindo.
Ficou em silêncio, só me deixando chorar.
— Foi por causa dele?
Não respondi nada. Pelo jeito, todos já sabiam do meu próprio sentimento, até mesmo antes de mim.
Ele apertou o abraço. — Deixa ele, Mia... Me dá uma chance? Eu vou te fazer feliz, eu juro.
As lágrimas começaram a cair ainda mais, eu não conseguia segurá-las. Eu não posso mudar os meus sentimentos depois que levei tanto tempo para descobrir. Mesmo que agora eu tenha que esquecê-los, não quero usar ninguém para isso, principalmente alguém tão importante como o David.
O afastei com cuidado, ainda segurando os ombros de sua camisa e ainda sem encará-lo. Não queria que ele fosse embora. Não queria que me odiasse.
— Desculpa, eu sinto muito! Por favor não me odeie.... desculpa! – e continuei a chorar e me desculpar como uma criança.
Ele pareceu não saber o que fazer por um tempo. De repente, suspirou e voltou a me abraçar, dessa vez sem tanta urgência.
— Por favor, não chora. A pior coisa para mim é ver você chorando. - ele levantou meu queixo e secou as lágrimas com a manga da blusa – Eu nunca odiaria você, Mia. - seus olhos eram tristes - Na verdade... eu é que devo desculpas.
Han...?
— Eu te conheço há muito tempo, Mia. Você é tão transparente... Eu sabia dos seus sentimentos, sabia o que sentia por mim e o que sentia por ele. Mas eu ignorei isso. Quis aproveitar o tempo, até que se desse conta por si mesma, para fazer com que me enxergasse como homem. Mas eu só fiz você ficar confusa...
Ele afagou meu cabelo. Comecei a chorar de novo.
— Por que está chorando de novo?
— Você vai se afastar de mim?
— Mia, pare de chorar. – ele estava incomodado – Eu prometi ficar sempre ao seu lado, não prometi? E eu vou! Mesmo que eu precise desistir de você.
Isso não fez sentido para mim.
— Vou cumprir minha promessa.
Com aquela frase, meu coração se acalmou. Eu não queria perder mais uma pessoa que eu amava. Porque eu amava o David, não do jeito que ele gostaria, mas eu o amava. Ele fazia parte da minha família incompleta...não podia perdê-lo.

Érick

Ela simplesmente deu meia volta e foi embora.
Disse que entendia. Ela entendeu meus sentimentos e simplesmente foi embora?
Certo. Era assim que ela iria me rejeitar? Nem para me dizer alguma coisa? Um “desculpa, mas gosto de outro” já bastava. Mas o que eu esperava de uma criança...?